Capítulo 56 – Linha de Chegada
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O mundo havia se apagado completamente para mim e para o Mark. não tinha respondido nenhuma das vezes em que o seu irmão o chamou e nós dois temíamos pelo pior. Nós nos olhamos por alguns segundos, mas parecia horas. As lágrimas estavam em meus olhos, mas o medo definitivamente estava nos olhos dele. Mark negou com a cabeça, pois não fazia a menor ideia do que fazer. Ele não tinha sequer coragem de checar o pulso do irmão. Eu continuava olhando para o Mark, pois esperava que ele me dissesse que ele estava bem. Eu esperava que ele me dissesse que o estava bem. Por que ele não me dizia? Bem, eu também não tinha coragem para perguntar.
Estranho como o nosso corpo responde de formas tão diferentes a determinadas situações. Eu estava ali olhando para o Mark e meu coração me dizia que ficaria tudo bem, mas a minha cabeça me mostrava dezenas de lembranças e memórias de tudo o que eu havia vivido com o . Meu coração dizia que o ficaria, mas a minha mente me dizia que eu deveria me despedir. A verdade é que eu não ouvi nenhum dos dois. Eu queria mesmo era que o Mark me dissesse que ele estava bem. Era só o que eu precisava ouvir.
Mark continuava me olhando com aquele olhar perplexo e ao mesmo tempo tão perdido. Ele queria me consolar de alguma forma, mas ele descobriu que quem deveria ser consolado dessa vez era ele. Os olhos estavam sobre mim, mas a sua mente estava em negação. Ele não podia aceitar que isso tinha acontecido com ele. Ele não podia aceitar que ele não tinha feito absolutamente nada para evitar que aquela tragédia acontecesse com o seu irmão. Mark achava que havia falhado como agente do FBI, mas principalmente como irmão. Mesmo tendo convivido tão pouco tempo com o irmão, Mark tinha criado um vínculo com aquele garoto que ele odiou por tanto tempo. Mark tinha aprendido algumas lições valiosas, mas a mais importante delas, com certeza, foi: família.
Em meio àquela intensa troca de olhares, a melhor notícia veio da maneira mais inesperada. começou a se mover com dificuldade. Ao abrir os olhos e voltar daquele grande impacto, ele levantou lentamente a cabeça e olhou imediatamente para o local que tinha sido atingido pela bala. Ele não conseguia ver muito bem, mas sabia que doía bastante. Levantou a mão que pressionava o local atingido e ficou muito assustado ao ver a quantidade de sangue em suas mãos. Quando vimos o se mexer, foi como se tudo a nossa volta voltasse a ter cores, barulho e sentido. É impossível mensurar o tamanho do alívio que sentimos.
- ! - Eu disse em meio a um suspiro aliviado. Ao olhá-lo, percebi o quão assustado ele estava.
- Deus! Você me assustou, cara. - Mark acabou deixando um fraco e sincero sorriso escapar.
- Você está bem? - A pergunta pode parecer idiota, mas eu precisava saber o quão consciente ele estava.
- Sim, eu… - Ele ia dizendo, quando a dor enorme em seu abdômen fez com que ele perdesse a voz. Sua mão voltou a apertar o local baleado. - Eu… estou bem. - disse, mas seus olhos aflitos não convenceram ninguém. Era a cara dele tentar se fazer de forte em um momento como aquele. Quando ele terminou a frase, a expressão de dor em seu rosto aumentou e ele voltou a pressionar o local atingido pela bala.
- Nós vamos dar um jeito nisso, está bem? - Mark estava completamente perdido naquela situação. Logo ele, que já havia passado por situações como essa inúmeras vezes. Fazia parte de sua profissão, sabe? Ele sempre soube o que fazer, mas dessa vez ele não sabia. A única coisa que ele queria era acalmar o seu irmão.
- Nós precisamos levar ele para o hospital. Agora. - Eu disse e acabei trazendo o Mark de volta para a realidade.
- Sim, nós precisamos. - Mark me olhou e afirmou com a cabeça.
- Peguem o meu carro e vão! Eu resolvo as coisas por aqui. - Meu pai ofereceu. Era a única coisa que ele podia fazer naquele momento pelo garoto que havia salvado a sua vida.
- Certo. - Mark aceitou a sugestão na mesma hora e já foi logo tentando ajudar o irmão a se levantar. Ele tinha que levá-lo até o carro do meu pai, que não estava a menos de 3 passos dali.
- Não, pai. Você não pode ficar aqui sozinho depois do que aconteceu. Alguém pode atirar de novo e… - Eu já ia fazendo o meu discurso de filha preocupada.
- Foi… o Steven. - disse, enquanto Mark colocava um dos braços do irmão em volta de seu pescoço. A frase dele me fez olhá-lo na mesma hora.
- Vamos! - Mark disse ao irmão ao colocá-lo de pé. Ele tinha escutado o que o tinha dito, mas o momento não era de apontar culpados.
- Eu ajudo. - Meu pai foi rapidamente até eles e colocou o outro braço de em volta de seu pescoço. A frase dita pelo não havia surpreendido nem um pouco o meu pai, mas eu ainda tentava processar aquela informação.
- Steven? - Eu repeti o nome, demonstrando total perplexidade. - Pai, você não pode ficar aqui. Esse cara pode… - Eu comecei a tomar ciência da proporção de tudo aquilo.
- , veja bem o que ele fez. Acha mesmo que ele ainda está aqui? Acha que ele vai tentar de novo? - Meu pai me olhou ao parar na minha frente. - Tudo o que precisamos fazer agora é levar esse garoto para um hospital. - Meu pai era o único que demonstrava sensatez naquele momento. Não sei se é por que ele é o mais velho ou se é por que eu e o Mark estávamos realmente abalados com a situação.
- Você está certo. - Eu afirmei com a cabeça e voltei a olhar pro . - Eu abro. - Eu abri a porta de trás do carro do meu pai para que eles colocassem o ali. - Eu vou atrás com ele. - Eu disse antes de dar a volta no carro e me sentar do outro lado do banco de trás do carro. Com um pouco de dificuldade, eles colocaram o deitado no banco e a sua cabeça ficou apoiada em meu colo.
- Aqui. - Meu pai entregou a chave do carro para o Mark.
- É a chave do meu carro. - Mark também deu a chave de seu carro para o meu pai. Ele havia abandonado ele no meio da rua.
- Certo. - Meu pai pegou a chave. - Boa sorte. - Meu pai sabia que precisaríamos muito mais do que sorte.
- Vai ficar tudo bem, ok? - Eu queria acalmar o de qualquer forma e para isso, eu tive que fingir que estava calma com toda aquela situação. Ele inclinou novamente a cabeça em direção ao seu abdômen e viu novamente as mãos cheias de sangue.
- É… muito sangue. - disse com a voz trêmula. Era realmente muito sangue, mas eu não podia me apavorar naquele momento. Eu precisava fazer alguma coisa.
- Espera. - Eu disse ao estender uma das minhas mãos para trás para pegar uma toalha que o meu pai sempre deixava no carro. - Aqui. Vamos colocar isso para tentar estancar um pouco de sangue, ok? - Eu peguei a toalha e a coloquei contra o local atingido pela bala. Ele reagiu imediatamente ao meu toque com um careta de dor. - Me desculpa. Eu vou precisar ficar segurando essa toalha aqui. - Eu sabia que estava doendo, mas era necessário. Eu ainda era apenas uma estudante de medicina, mas eu sabia o básico. Só que eu nunca imaginei que precisaria colocar o meu conhecimento em prática tão precocemente.
- Ok. - afirmou com a cabeça, tentando mostrar-se forte. Mark entrou no carro naquele momento e já foi logo dando a partida no carro.
- Mark, vamos para o hospital em que eu trabalho. É o mais perto daqui e eu também conheço a maioria dos médicos. - Eu queria que o tivesse o melhor atendimento, por isso, queria levá-lo para o melhor hospital.
- Está bem. - Mark concordou imediatamente e nós trocamos rápidos olhares através do retrovisor. Deixei de olhá-lo e voltei a encarar o rosto de , que me olhava de um jeito tão intenso, mas ao mesmo tempo tão calmo. Ele estava começando a ficar mais pálido.
- Você é mesmo maluco, não é? - Eu neguei levemente com a cabeça. A resposta dele veio com um fraco sorriso, que nem chegou a mostrar os seus dentes. A atitude dele em me responder com aquele sorriso simples era tão típico dele. Vê-lo sorrir estando naquela situação foi muito difícil. Apesar de tudo, ele ainda era o . Ainda era o mesmo sorriso.
- Agora, eu sou o seu herói? - A pergunta dele foi o bastante para me destruir completamente. Era só isso? Ele só queria ser o meu herói? Tanto sofrimento e dor e ele só queria voltar a ser o meu herói. Foi impossível que as lágrimas não alcançassem os meus olhos naquele momento. Um sorriso surgiu no canto do meu rosto, enquanto eu levava uma das mãos até a testa dele, que estava coberta de pingos de suor.
- Sim, você é. - Eu completei a frase com um sorriso emocionado.
- Que bom. - pareceu um pouco mais aliviado. - Eu não sei se vou ter outras oportunidades de te convencer disso. - Ele disse em meio a duas ou três tossidas.
- Não fala assim. - Eu disse em tom de bronca.
- Quem nós estamos querendo enganar? - Ele tossiu dolorosamente mais algumas vezes antes de dizer a frase. As mãos dele estavam trêmulas e ele ficava cada vez mais pálido. O local da bala não parava de sangrar. Ele estava perdendo MUITO sangue.
- Mark, mais depressa! Ele está perdendo muito sangue. Eu já não estou conseguindo controlar. - Eu disse demonstrando mais nervosismo. A toalha já estava completamente cheia de sangue.
- Aqui. - Mark começou a tirar a camisa xadrez que ele vestia por cima de uma camiseta. - Usa isso. - Ele olhou rapidamente para trás ao me entregar a sua camisa. Eu deixei a toalha de lado e coloquei a camisa dele no local atingido pela bala. Mark voltou a dar atenção ao trânsito e dirigia em maior velocidade. Apesar de ser o mais próximo, o hospital infelizmente não ficava tão perto do lugar onde estávamos.
- Aguenta só mais um pouco. Consegue fazer isso? - Eu estava muito mais preocupada e nervosa e eu já não conseguia esconder isso dele com tanto sucesso.
- Eu estou tentando. - A expressão no rosto dele era cada vez pior. - Eu sempre soube que isso acabaria acontecendo, mas… nunca dessa forma. - Ele deixou um sorriso nervoso escapar. Sempre rindo da sua própria desgraça.
- Do que você está falando? Não vai acontecer nada. - Eu não admitia que ele falasse daquele jeito. Eu não admitiria que ele destruísse todas as minhas esperanças daquela forma.
- … - me olhou com tristeza. Ele sabia que eu estava em negação.
- Não, . Não faça isso, está bem? - Eu tentei novamente dar um sermão dele, mas os meus olhos cheios de lágrimas tiraram toda a minha credibilidade. - Ninguém vai morrer hoje. Entendeu? Eu não vou deixar. - As lágrimas não me impediram de falar aquelas palavras com extrema seriedade. Deixei de olhá-lo para tentar me recompor.
- Hey. - levou a sua mão até a minha, que ainda pressionava a camisa de Mark contra o local baleado. Ele não fez isso para pressionar um pouco mais o local atingido, mas sim para tocar a minha mão. O seu gesto me fez olhá-lo. - Não chore. - Ele pediu ao olhar em meus olhos. - Eu não quero que a minha última memória seja as suas lágrimas. Eu quero que seja o seu sorriso. - completou a frase, que me encheu de tristeza, mas que me fez esbanjar um fraco e emocionado sorriso.
- Você ainda vai ter muitas oportunidades de ver o meu sorriso. - Eu olhei em seus olhos. - E eu ainda vou ter muitas oportunidades de te irritar e fazer você me odiar. - Eu disse e o vi sorrir com o seu jeito único. - Eu ainda vou ter muitas oportunidades de te matar por ter entrado na frente daquela bala e também... vou ter várias oportunidades de te agradecer por isso... pelo resto da minha vida. - Uma das minhas mãos ainda pressionava o ferimento. As lágrimas continuavam presas nos meus olhos e ameaçavam escorrer pelo meu rosto a todo o momento.
- Seu pai é um bom homem. Ele não merecia isso. Você… não merecia isso. - A dificuldade dele em falar aumentava aos poucos. - Você precisa dele. Eu sei o quanto precisa! - Ele fez uma breve pausa. - Eu errei antes. Eu não podia errar de novo. - completou.
- E você não errou, . Você não errou. – Eu neguei com a cabeça ao olhá-lo.
- Um acerto não apaga um erro… por isso, eu… - engoliu seco. - Eu quero que me desculpe. Me desculpa se eu te fiz chorar. Me desculpa por todas as vezes que eu te fiz sofrer. - Ele ficou visivelmente mais abalado e emocionado ao pedir desculpas.
- Não. Não precisa fazer isso agora, ok? Você não pode se esforçar. Você precisa descansar um pouco e guardar todas as suas energias. - Ouvir aquilo agora era a última coisa que eu queria. Eu sabia que ele precisava se acalmar. Eu nem mesmo fazia questão de ouvir qualquer pedido de desculpas.
- Não. Me deixe dizer, está bem? Eu preciso dizer. - insistiu e chegou a fechar os olhos por alguns segundos no meio da frase, enquanto fazia uma expressão de dor. - Eu preciso muito. - Ele já não conseguia esconder a dor e o medo que sentia. - Por favor, me escuta. - ficou um pouco agitado nesse momento. Seja o que for, o que ele tinha pra dizer deveria ser muito importante. - Eu estou te ouvindo. Estou ouvindo. - Eu quis acalmá-lo imediatamente. Toquei novamente a sua testa e sequei as novas gotas de suor que tinham lá. Dediquei toda a minha atenção a ele. Mark também prestaria atenção nas palavras que o seu irmão queria tanto dizer.
- Eu quero que você saiba que eu… eu sinto muito por tudo o que te fiz passar. Eu não me orgulho dos meus erros, mas eu acho que… eles fazem parte do meu jeito estranho, torto e idiota de amar. Eu não me arrependo deles por que sem eles, talvez, nós não estivéssemos aqui agora e… eu sinceramente não consigo me imaginar passando por um momento como esse sem você do meu lado. - Ambos os olhos estavam cheios de lágrimas. Ele estava se esforçando muito para me dizer aquelas palavras e eu encarava os detalhes de seu rosto como se estivesse tentando guardá-los em minha memória.
- Eu estou aqui. Eu não vou sair do seu lado. - Eu disse em meio a um fraco sorriso.
- Eu ainda não acabei. - queria dizer mais, mas ele já estava ficando fraco demais. Os olhos voltaram a se fechar por alguns segundos. O sofrimento dele estava me matando aos poucos. Eu estava me segurando MUITO para não chorar. - Eu não sei o que vai acontecer comigo e não sei se… vou sair dessa. - A voz ficou embargada quando ele terminou a frase.
- Você vai sim! É claro que vai. - Foi realmente muito difícil me segurar naquele momento. Eu sinceramente não sei de onde veio tanta força. - Eu já disse. Nós ainda temos muito o que brigar, . - Eu disse, conseguindo arrancar mais um sincero sorriso dele. Ele fez uma pequena pausa. Eu acho que estava procurando forças para continuar.
- Eu sempre te amei tanto… e acho que sempre vou amar. Você sabe disso, não sabe? - precisava saber. Desde o incidente com o Steven, eu vinha desconfiando constantemente do que ele sentia por mim. Ele só precisava saber que eu não tinha nenhuma dúvida sobre o seu amor.
- Eu sei. - Eu já não conseguia ter qualquer controle sobre as minhas lágrimas. Uma delas já tinha escorrido pelo canto de um dos meus olhos, enquanto eu o olhava com carinho. - Eu posso sentir. - Eu completei com um triste sorriso. Ele devolveu o sorriso e demonstrou um alívio indescritível. Eu consegui ver isso em seus olhos. Minha mão ainda acariciava uma parte de seu rosto. - Eu espero que você também possa sentir. - Sim, eu estava me referindo ao amor que eu sentia por ele.
- Eu estou sentindo. - afirmou, dando o maior sorriso da noite. Ele achou que nunca mais se sentiria amado por mim. - Pra ser bem sincero, eu senti falta disso. - Ele completou a frase com o mesmo sorriso, enquanto uma lágrima solitária escorria pelo seu rosto. A frase dele também me arrancou um sorriso. Mesmo estando naquela situação, ele ainda conseguia ser o mesmo de sempre. - Ser amado por você foi a melhor coisa que me aconteceu, mas… - O sorriso foi desfeito e ele deixou de me olhar por poucos segundos. - Eu preferia que você tivesse deixado de me amar antes por que isso amenizaria muito o seu sofrimento. Eu não quero que você sofra ainda mais por mim. - As palavras dele me entristeceram ainda mais. A preocupação e o cuidado dele comigo ia me dilacerando lentamente de dentro para fora.
- Para de falar assim. - Eu pedi mais uma vez, me segurando mais uma vez para não voltar a chorar. - Eu não vou sofrer por que vai ficar tudo bem. - Eu sinceramente não sabia se as minhas palavras eram para dar esperanças a ele ou a mim.
- Mas se não ficar tudo bem… - ia dizendo, mas eu o interrompi.
- Essa possibilidade não existe pra mim. - Eu disse, séria.
- Se não ficar tudo bem… - insistiu. - Eu quero que… você seja feliz. - Ele completou a frase.
- Nem pense em fazer um discurso de despedida. - Eu o interrompi mais uma vez.
- Eu vou! - afirmou com a cabeça. - Eu estou morrendo aqui, está bem? Por isso, você vai deixar de ser tão mandona por um segundo e vai me ouvir. - Ele disse em tom de ordem. Pode até parecer mentira, mas aquela foi a frase que ele conseguiu dizer com menos dificuldade até agora. No primeiro momento, eu até cheguei a ficar surpresa, mas depois veio o ataque de tosse, que agora vinha acompanhada de sangue. - Meu Deus. - resmungou com a voz trêmula. Ele se assustou com todo o sangue que ficou em sua mão depois de ele tossir inúmeras vezes.
- Calma. - Eu pedi a ele, colocando uma das mãos em seu peito. O peito acompanhava a sua rápida respiração. Os olhos assustados encaravam suas mãos cheias de sangue. - Hey. Olhe pra mim. - Eu abaixei as suas mãos e tentei passar tranquilidade através do meu olhar. Ele me olhou, mas ainda parecia apavorado. - Fica calmo. Eu estou aqui. Eu estou cuidando de você. - O desespero era definitivamente a pior parte pra mim. Eu não sabia o que fazer e nem sabia como me controlar para não demonstrar mais desespero. Era muito difícil pedir calma a ele, quando o que menos tinha dentro de mim naquele momento era calma. - Eu estou cuidando de você. - Eu repeti de forma mais calma, enquanto voltava a acariciar o seu rosto.
- Eu estou com medo. - afirmou com os olhos marejados. Era evidente que ele estava se controlando para não chorar. Um nó se formou em minha garganta e eu já não conseguia engolir o choro. Essa não era o tipo de frase que o costuma dizer com frequência. Para ser bem honesta, aquela devia ser a primeira vez. Ouvi-lo dizer aquilo foi pior do que eu jamais imaginei. - Fica comigo. - Ele disse ao levar sua mão até a minha e segurá-la. - Não me deixa sozinho. - pediu com tristeza, enquanto ele continuava segurando minha mão com força.
- Eu não vou te deixar sozinho. - Eu neguei com a cabeça. - Eu prometo que não vou sair do seu lado. - Eu completei e logo o vi voltar a se acalmar. Aos poucos, a respiração dele foi voltando ao normal.
ainda segurava fortemente a minha mão, enquanto manteve-se algum tempo em silêncio. A princípio, eu achei que o silêncio fosse uma coisa boa. Era bom que ele poupasse suas forças. Porém, fui percebendo que ele demonstrava cada vez mais fraqueza e os olhos ameaçavam a fechar a qualquer momento. Eu sabia que eu não podia deixar ele adormecer, pois, se ele adormecesse ele poderia não acordar mais.
- . Hey! - Eu chamei por ele e ele voltou a abrir um pouco os olhos. Ele não soltava a minha mão por nada e continuava suando frio. Também notei que em alguns momentos ele sentia calafrios por todo o corpo. - Olha pra mim. - Eu pedi ao balançar sutilmente o seu corpo. - Eu preciso que você se mantenha acordado. Você pode fazer isso? - Eu estava um tanto quanto aflita. Eu sentia como se ele fosse a minha responsabilidade. Eu faria tudo por ele. A resposta de foi apenas uma afirmação com a cabeça. Parecia que ele estava se poupando. A minha aflição me fez levantar a cabeça para olhar para o Mark. Nós voltamos a trocar olhares pelo retrovisor.
- Eu sempre achei que terminaríamos juntos. - A voz de me fez voltar a olhá-lo na mesma hora. - Mesmo com… tudo o que aconteceu. Eu sempre achei que no final ficaríamos juntos. - Ele dizia como se aquilo não fosse mais acontecer. - Quando eu botei os meus olhos em você pela primeira vez… eu sabia que seria pra sempre. Eu sabia que… você seria a minha garota. - falava com dificuldade, mas dava para entender muito bem. Mesmo estando tão debilitado, ele conseguia dizer cada palavra com carinho. - Eu sempre achei que… só um cara no mundo poderia te fazer feliz e eu gostava de me convencer de que esse cara era... eu. - Ele esboçou um fraco sorriso ao dizer a última palavra. Eu o escutava com a atenção e olhava em seus olhos. - Quando eu percebi, eu não precisava mais me convencer de nada. Eu tinha me tornado essa cara e isso… fez o meu mundo, . - As lágrimas começaram a escorrer dos meus olhos sem que eu nem percebesse. Tinha sim um fraco sorriso escondido entre as minhas lágrimas, mas não era um sorriso de felicidade. Era um sorriso de admiração. Admiração pela pessoa maravilhosa que ele era e admiração pelo poder que ele tinha de acalmar o meu coração com as palavras certas. - Eu fiz tantos planos. - Ele sorriu pra mim.
- Planos? Você fez planos? - Eu sorri de forma mais descontraída, enquanto eu enxugava as lágrimas em meu rosto. - Quais planos? - Eu quis saber.
- Nós… íamos terminar a faculdade. Eu ia te pedir em casamento na nossa antiga escola e eu… ia encher todo o lugar com fotos nossas e com a sua flor favorita. Nós… nos casaríamos com o casamento dos seus sonhos. Eu ia cantar pra você no altar e depois nós íamos dançar ‘Never Gonna Be Alone’ na nossa primeira valsa. - Eu estava morrendo aos poucos.
- Talvez, nós pudéssemos dançar ‘Hey Jude’. - Eu disse, pois sabia que era a sua música favorita. O sorriso dele foi impagável e indescritível. - E depois? - Eu quis saber.
- Nós nos mudaríamos pra uma casa maior e que de preferência ficasse bem longe da loucura do centro da cidade. Uma casa com um quintal enorme para que as crianças pudessem brincar. - falava e parecia que ele estava vendo todos aqueles planos diante de seus olhos.
- Crianças? - Eu estava chorando, mas as vezes ele me arrancava um sorriso espontâneo.
- Sim. Eu sempre quis dois; um casal. - contou todo sério.
- Dois? Me parece um bom número. - Eu afirmei, olhando ele com carinho. - São planos lindos, . - Eu disse visivelmente abalada. Eu não conseguia parar de chorar.
- Você vai vivê-los. Talvez você não os viva comigo, mas você vai vivê-los. Você vai ser feliz, não vai? - Não havia vestígios de lágrimas nos olhos dele até o momento em que ele mencionou a possibilidade de não viver todos aqueles planos comigo.
- Eu vou tentar. - Eu disse, enquanto acariciava o rosto dele.
- Escuta. - pediu antes de fazer uma breve pausa. Ele parecia procurar forças. - Eu realmente acho que eu sou o cara que pode te fazer feliz, mas eu não sou o único. - Os olhos dele continuavam marejados. - Há algumas semanas, eu achava que ninguém poderia te fazer mais feliz do que eu. Eu achava que… ninguém poderia cuidar de você melhor do que eu, mas... eu estava errado. - Dava pra ver o quanto era difícil pra ele dizer aquilo. - Eu sei que você está ouvindo, Mark. - A frase dele nos fez sorrir em meio as lágrimas. Ele estava falando sobre o irmão. Mark estava sentindo uma coisa horrível no peito e mesmo esforçando-se tanto para ser forte, algumas poucas lágrimas chegaram até os seus olhos.
- Não precisa fazer isso. Não precisa se preocupar com isso. - Acariciei a sua testa e depois enterrei os meus dedos em seus fios de cabelo.
- Ele é uma boa pessoa. - insistiu no assunto. - Para ser sincero, ele é uma das melhores. Você precisa dar uma chance a ele. - E foi naquele exato momento em que a primeira lágrima escorria dos olhos do . Ao ouvir as palavras do irmão, Mark virou o seu rosto e encostou a parte debaixo dele em seu ombro, enquanto ele negava com a cabeça. - Ele vai te fazer feliz. Ele não é o melhor, mas ele é… o segundo melhor homem do mundo capaz de te fazer feliz do jeito que você sempre mereceu. Eu sei que você vai fazê-lo feliz também. - O rosto dele estava coberto de lágrimas e a respiração dele voltou a ficar intensa. Deixei de olhá-lo por poucos segundos para olhar para o Mark. O retrovisor mostrou dois olhos marejados e completamente tristes e destruídos. Eu neguei com a cabeça como se dissesse: ‘Eu não consigo mais.’.
- Vamos cuidar de você primeiro e depois nós pensamos nisso, ok? - Eu desconversei para tentar acalmá-lo. Eu sequei as lágrimas em seu rosto e depois sequei as minhas. - Nós estamos quase chegando. - Eu engoli o choro, depois de perceber que já estávamos na rua do hospital.
- Eu vou parar aqui na porta mesmo. - Mark disse ao parar abruptamente o carro em frente a porta do hospital. - EU PRECISO DE UM MÉDICO AQUI! MEU IRMÃO ESTÁ BALEADO! - Mark desceu do carro aos berros. - EU PRECISO DE AJUDA AQUI! - Na mesma hora, vieram alguns enfermeiros em nossa direção. Eles traziam uma maca.
- O que foi que aconteceu? - Um dos enfermeiros perguntou, enquanto ajudava o Mark a tirar o do carro. Eu estava embaixo do e, por isso, não podia fazer nada para ajudar.
- Ele foi baleado no abdômen. Ele está perdendo muito sangue. - Mark explicou com um nítido desespero.
- Vamos colocá-lo aqui. - O enfermeiro referiu-se a maca. Mark ajudou a colocar o irmão na maca. Ele parecia um pouco desacordado. Eu sai do carro as pressas e fui até a maca.
- Eu tentei estancar o ferimento, mas tinha muito sangue. - Eu informei ao enfermeiro, que eu nem fiz questão de cumprimentar. Eu o conhecia, mas estava desesperada demais para ser educada.
- No… meu bolso. - disse baixinho. Ele já estava sem forças.
- Há quanto tempo aconteceu? - O enfermeiro já empurrava a maca em direção ao hospital com a ajuda do outro enfermeiro. Mark e eu acompanhávamos o trajeto ao lado da maca.
- Não faz mais de 20 minutos. - Mark respondeu.
- No meu bolso. - esforçou-se mais uma vez para dizer. Ele me olhava e tentava me fazer entender algo, que ele não tinha forças para explicar.
- O que? - Eu o olhei, aflita. Eu não sabia o que ele queria dizer. Os olhos dele estavam praticamente fechados e ele estava absurdamente pálido. Honestamente, eu não sabia como ele ainda não tinha ficado desacordado.
- Vai ficar tudo bem, cara. Eu prometo! - Mark disse ao olhá-lo com extrema preocupação.
- Jaqueta… - disse bem mais baixinho dessa vez e tentou recorrer ao irmão dessa vez. Mark achou que ele já estivesse delirando.
- Seja forte. - Mark disse antes de os enfermeiros levarem a maca para dentro de uma sala.
- Vocês vão ter que ficar aqui. - Um dos enfermeiros nos afastou da porta da sala. Um médico entrou na sala as pressas.
- Mas nós… - Mark ia argumentar, mas o enfermeiro o interrompeu.
- Eu dou notícias, está bem? Só mantenham a calma e… - O enfermeiro hesitou antes de continuar. - Orem. - A frase dele só serviu para nos deixar mais nervosos. Estava mais do que óbvio que a situação de era muito delicada.
O enfermeiro também entrou na sala e nos deixou ali, desolados. Mark e eu estávamos completamente em choque. Ficamos um bom tempo olhando para a porta da sala sem dizer nada. O choque em que o Mark se encontrava era pior e maior do que o meu, que foi dando espaço a um desespero sem fim. Minha mente estava cheia de perguntas, que pareciam dilacerar ainda mais o meu coração: ‘eu iria vê-lo mais uma vez? Eu ouviria a voz dele mais uma vez? Eu disse tudo o que queria pra ele?’.
- Eu não acredito que isso está acontecendo. - Eu neguei insistentemente com a cabeça, olhando para as minhas mãos cheias de sangue. Eu não tinha mais estabilidade emocional ou física. Parecia que eu estava caindo no buraco mais fundo e mais escuro de todos e não tinha ninguém que pudesse me salvar ou que pudesse ser a luz no meio de toda aquela escuridão. A dor percorria todo o meu corpo e destruía tudo de dentro pra fora. Mark tinha escutado as minhas palavras, mas não teve forças para me olhar ou sequer para me dizer qualquer palavra de conforto.
Não demorou mais que alguns minutos para que o meu pai chegasse no hospital. Eu já tinha ido até o banheiro para lavar as minhas mãos. Eu estava inconsolável e já nem tinha forças para chorar e o Mark continuava quieto e completamente em choque. Eu nunca o vi daquele jeito. Nem mesmo quando ele descobriu toda a verdade sobre os pais deles. Os olhos continuavam fixos na porta da sala que o tinha entrado há alguns minutos. Mark sequer viu quando o meu pai chegou e foi diretamente me consolar.
- Querida… - Meu pai parou em minha frente e negou com a cabeça ao ver todas as lágrimas nos meus olhos inchados e a dor e tristeza que eu chegava a respirar. Ele me acolheu em seus braços e me abraçou. Deitei a minha cabeça em seu ombro e passei meus braços em volta dele. Ao fechar os meus olhos, algumas lágrimas escorreram pelo canto deles.
- Ele te salvou, pai. - Eu disse com a voz embargada.
- Sim, ele salvou. - Meu pai afirmou, enquanto acariciava minhas costas com suas mãos. O meu choro que era contido até então, se transformou em um choro mais sofrido.
- Isso é tudo culpa minha. - Eu disse em meio as lágrimas. - É culpa minha. - Eu repeti.
- É claro que não, filha. Foi uma fatalidade. - Meu pai ficou extremamente preocupado na hora. Ele não sabia que eu me culparia por tudo aquilo. Era um fardo pesado demais para carregar.
- Ele fez isso por mim. - As lágrimas não paravam mais de escorrer dos meus olhos. - Eu o julguei tantas vezes por ter apontado a arma pra você naquele dia e, hoje, ele quis me provar que eu estava errada. Ele não queria que eu te perdesse, pai. - O meu choro estava quase me impedindo de continuar falando. - Mas eu não posso perdê-lo também. - Eu completei a frase aos prantos.
- Você não vai perdê-lo, querida. - Meu pai terminou o abraço imediatamente para tentar me acalmar. - Vai ficar tudo bem. Ele é forte. - Ele olhou em meu rosto e começou a secar as minhas lágrimas. - Você também precisa ser forte. - Meu pai disse pacientemente.
- Ok. - Eu afirmei com a cabeça antes de respirar fundo para tentar me acalmar. Levei as mãos até o meu rosto para tentar me recompor.
- Como ele está? - Meu pai perguntou.
- Eu não sei. Levaram ele pra essa sala. Provavelmente vai retirar a bala, mas… ele perdeu muito sangue. - Eu tentei não pensar no pior.
- E o Mark? - Meu pai apontou discretamente a cabeça na direção do irmão Jonas mais velho.
- Ele… está em choque. Ele não diz nada. - Eu disse ao observar o Mark. - Eu não sei nem o que falar pra ele. - Eu queria tanto consolá-lo e tentar reconfortá-lo, mas antes eu precisava me estabilizar emocionalmente.
- É melhor deixá-lo sozinho, enquanto ele tenta absorver tudo isso. - Meu pai aconselhou.
- Sim. - Eu concordei.
- Você ligou para alguém? Avisou alguém sobre o que aconteceu? - Meu pai perguntou.
- Não. Eu… nem pensei nisso. - Mark e eu estávamos tão abalados que não tínhamos cabeça para pensar em todas as providências que devíamos tomar. Ainda bem que o meu pai estava ali.
- Eu vou ter que ir até a sua casa para buscar a sua mãe. Ela está desesperada com tudo isso e eu não quero deixá-la sozinha. - Meu pai explicou que teria que se ausentar.
- Você acha que ainda é perigoso. Você acha que o Steven pode… - Eu ia dizendo, quando meu pai me interrompeu.
- Ele atirou no próprio filho. Ele viu o filho arriscar a sua vida para salvar me salvar. Eu duvido que ele tente qualquer outra coisa. Eu duvido que ele volta a ter coragem de segurar uma arma de novo. - Meu pai afirmou com extrema segurança. Ele conhecia o Steven muito bem e sabia o quanto ele era protetor com a sua família. Steven jamais superaria o tiro que tinha dado no próprio filho. - Eu… vou ter que me ausentar por alguns minutos, mas você vai ter avisar as pessoas do que está acontecendo. - Meu pai me avisou e eu senti um nó se formar em minha garganta. - Você vai ter que avisar a família dele, . - Ele completou e foi só naquele momento em que eu me dei conta do que eu teria que fazer. Avisar os meus amigos? Ok, isso não seria problema. Com uma mensagem, eu resolveria o problema! Mas… a família do ? Como eu posso fazer isso? Como é que se dá uma notícia dessa para uma família?
- Meu Deus. - Eu suspirei, sentindo meu corpo estremecer. - Como? Como eu… dou uma notícia dessa, pai? Eu… - Eu estava prestes a ter um colapso.
- Calma. - Meu pai pediu. - Fica calma. Basta dizer e pedir que eles venham até aqui. - Ele deu a dica. - Deixe o Steven fora disso. Não vale a pena envolvê-lo nisso. Só vai trazer ainda mais sofrimento para a família dele. Diga apenas que ele foi baleado por um homem qualquer. - Meu pai me orientou.
- Eu tenho certeza que o não gostaria que a mãe dele soubesse sobre o Steven. - Eu disse. já tinha perdido a boa lembrança que ele tinha do pai. Não precisamos fazer o mesmo com a sua mãe.
- Ótimo. - Meu pai afirmou com a cabeça. - Então, você acha que pode fazer isso? Você pode ligar para eles? - Ele perguntou e eu respondi apenas com um olhar triste e aflito. - Se você preferir, eu posso ligar quando eu voltar. - Meu pai achou que pudesse estar pedindo demais.
- Não. Eu ligo. - Eu engoli seco. - É minha responsabilidade. Tudo isso aconteceu por causa de mim. - Eu ia dizendo, quando ele me interrompeu.
- Não diga isso. - Meu pai me julgou.
- Eu não sou mais criança, pai. Eu conheço as minhas responsabilidades. Eu sei que o que ele fez foi minha responsabilidade e eu também sei que é a minha responsabilidade dar a notícia para a família dele. Então, eu vou fazer isso. Não importa o quão difícil seja. - Mesmo com lágrimas nos olhos e a voz embargada, eu tentava me manter forte.
- Me espere voltar e faremos isso juntos, está bem? - Meu pai achou melhor.
- Ok. - Eu concordei.
- Eu já volto. Qualquer coisa, você pode me ligar. - Meu pai se aproximou e beijou a minha testa.
- Ok! - Eu respondi e o vi se afastar rapidamente.
Com a saída do meu pai, eu estava sozinha novamente. Mark também estava ali, mas eu mal conseguia olhá-lo sem voltar a chorar. Eu não conseguia olhar pra ele sem me perguntar o porquê de ele estar passando por mais aquilo. Depois de tantas perdas, não era justo ele perder a única família que havia lhe restado. Aí está! Mais um motivo para me culpar. Mais um motivo para sofrer.
Mesmo estando muito mal, eu estava muito preocupada com o Mark. Em vez de sentar e sofrer toda a dor que eu sentia, eu preferia me importar com o Mark, que era a pessoa mais afetada com tudo isso. é o irmão dele, sabe? Eu não conseguia nem pensar o que eu faria se alguma coisa assim acontecesse com o . Eu não fazia a menor ideia do que estava passando pela cabeça e pelo coração dele. O que eu sei é que doía muito vê-lo daquele jeito.
Eu não sabia o que o Mark estava sentindo, mas também era muito difícil pra ele entender o que ele estava sentindo, o que ele estava vivendo. Era uma sensação estranha de vazio, que de uma hora para outra era preenchida com um sentimento ruim, que ele nunca tinha sentido. Mark e não viveram uma infância juntos. Eles não tinham muitas lembranças juntos, pois não tinha dado tempo de construí-las, mas eles já se viam como irmãos. tinha mais uma pessoa com quem se importar, se preocupar e cuidar. Mark finalmente tinha alguém que tinha o mesmo sangue que o seu. Mark finalmente tinha alguém, que não deixava que ele se sentisse sozinho no mundo. Mark finalmente tinha uma família de verdade. Uma família extremamente pequena sim, mas para alguém que nunca teve ninguém aquela pequena família significava o mundo. Mark não sabia mais qual era a sensação de estar sozinho. Ele não sabia mais qual era a sensação de não ter ninguém. Ele não sabia mais como era viver sem ter alguém por quem ele se sentisse tão responsável. Ele não sabia como era viver sem o irmão.
Eu queria deixar o Mark sozinho, mas, ao mesmo tempo, eu queria abraçá-lo com toda a minha força. Eu queria tirar aquele sofrimento dele. Eu realmente deveria ir até lá e dizer algumas palavras de consolo e apoio, mas eu sabia que não conseguiria fazer isso sem deixá-lo ainda pior. Por isso, eu resolvi deixá-lo quieto por mais um momento.
Deixei de pensar um pouco no Mark para pensar no que eu deveria fazer naquele momento. Quer dizer, eu sabia o que fazer, mas eu não sabia como fazer. Encarei as minhas mãos e notei que em uma delas ainda tinha um pouco do sangue de . Olhar aquele sangue me fez estremecer novamente. Antes de reagir àquilo, eu fui rapidamente até o banheiro do hospital para lavar novamente as mãos. Depois das mãos já estarem limpas, eu encarei o espelho e quase não me reconheci. Voltei a abrir a torneira da pia e passei um pouco de água no rosto. Encarei novamente o espelho com o rosto molhado e comecei a dizer a mim mesma: ‘Você é forte ! Você é capaz de fazer isso.’.
Esperar o meu pai voltar para avisar a família do sobre o ocorrido era, com certeza, a opção mais fácil, mas também era a opção que mais demonstrava fraqueza. Eu me sentia extremamente culpada por tudo o que tinha acontecido. Eu pressionei o e o forcei, de certa forma, a tomar aquela atitude heroica. Eu tenho exigido e cobrado, indiretamente, essa atitude dele nas últimas semanas e nada no mundo me faria mudar de opinião. Eu estava muito ciente em relação a isso. Agora, seria muito fácil fugir da responsabilidade e deixar que o meu pai arque com elas, não é? É claro que seria, mas eu não consigo ser tão inconsequente. Eu sentia como se eu devesse isso ao . Eu sentia como se aquela fosse a minha obrigação.
Abandonei o banheiro e passei por um corredor cheio de pessoas, que também esperavam notícias dos médicos. Mark ainda estava no mesmo lugar e também esperava por notícias do irmão. Aproveitei para me afastar um pouco de tudo e de todos e fui até o lado de fora do hospital. Levei uma das mãos até o bolso da calça e peguei o meu celular. Ao encará-lo, eu soube que eu não conseguiria fazer aquela ligação. Deixei de olhar para o celular e olhei a minha volta com os olhos cheios de lágrimas. Era a coisa mais difícil de todas. Levei uma das mãos até o meu rosto e passei os dedos pelos meus olhos antes que qualquer lágrima escorresse. Eu respirei fundo seguidas vezes até conseguir me acalmar novamente. Suspirei longamente antes de tirar as mãos dos olhos e voltar a encarar o celular. Procurei o número da casa do , que ainda estava na minha lista de contatos. Disquei os números rapidamente antes que eu desistisse de vez de fazer aquilo. A ligação chamou 3 ou 4 vezes antes que eu ouvisse uma voz fina e doce. Era a . Justo a .
- Alô? Quem está falando? - A garotinha estava feliz da vida por finalmente ter idade suficiente para atender o telefone da casa. Quando eu ouvi a voz dela, eu entrei em pânico. era muito apegada ao irmão. Como ela ficaria ao receber a notícia? Eu não conseguia aceitar que uma pessoa tão inocente e doce tivesse que passar por algo assim. - Alôooo? - insistiu. A minha voz não saía. Com o telefone no ouvido, eu levantei a cabeça e encarei o céu, enquanto negava com a cabeça. Porque isso estava acontecendo? - Quem é? Está me ouvindoooo? - A garotinha perguntou novamente, irritada.
- Alô? - Eu consegui dizer. Minhas mãos tremiam e havia um nó em minha garganta. - ? - Eu tentei melhorar a minha voz.
- Quem é? - perguntou, desconfiada.
- Oi, linda. É a . - Eu revelei.
- Oiiiiiiiiiiiii! - A alegria de ficou evidente. - Oi, ! Não acredito que é você mesmo. - A voz dela até tinha mudado.
- Sou eu! Achei que você já tivesse se esquecido de mim. - Eu não queria que ela desconfiasse de nada.
- Eu lembro de você todos os dias. Até coloquei o seu nome em uma das minhas Barbies. - contou.
- Jura? Depois eu quero conhecê-la, viu? - Eu sorri com tristeza.
- Aham. Eu queria mesmo que você conhecesse ela. - afirmou e um silêncio se estabeleceu por poucos segundos. Estava muito difícil continuar com aquilo.
- Escuta, a sua mãe está em casa? - Eu perguntei, nervosa.
- Está! Ela… está fazendo o jantar. - contou.
- Eu posso falar com ela? - Eu perguntei com a minha melhor voz.
- Pode. Eu vou chamar. - A garotinha disse.
- Beijos, linda. - Eu disse ao me despedir.
- Beijo, . Vem me ver logo, tá? - pediu.
- Eu vou sim. - Eu afirmei, enquanto encarava o chão.
- Mãeeeee, a quer falar com você no telefone. - Ouvi a garotinha gritar.
- Quem? - Ouvi a voz da mãe questionar.
- A . - explicou.
- Ahn, sim! - A mãe lembrou-se de quem se tratava. - Alô? - Ela atendeu o telefone.
- Oi… - Eu não sabia como continuar.
- Oi, . Como você está, querida? - Como sempre, a mãe do Jonas foi muito educada.
- Eu… estou bem. - Eu nem sabia se podia dizer isso.
- Tem certeza? Não está parecendo. - A mãe de disse, desconfiada. Mesmo desconfiada, eu duvido que a tragédia com o filho tivesse passado pela sua cabeça.
- É que… - Como continuar? Eu não sabia como dar a notícia. - Deus, eu nem sei como contar isso. - Eu disse extremamente nervosa.
- O que foi que aconteceu? - Ela soube que era sério. - É alguma coisa com o ? - Eu notei a mudança em seu tom de voz.
- Sim. - Eu respirei fundo pela última vez. - Ele… - Eu hesitei. - Eu estou ligando do hospital. Aconteceu um… acidente. - Acidente não era a melhor palavra, mas a palavra ‘tiro’ poderia ser mil vezes mais assustadora.
- O que!? Meu Deus! - A mãe de entrou em pânico na mesma hora. - Ele está bem? O que… o que aconteceu? - Ela perguntou desesperadamente.
- Ele… - Fechei os olhos por poucos segundos antes de ter coragem de terminar a frase. - Ele levou um…tiro. - Eu mal terminei a frase e já pude ouvi-la chorar.
- Meu Deus… - Ela estava aos prantos. Meus olhos se encheram de lágrimas e escorreram involuntariamente pelo meu rosto.
- Calma, senhora Jonas. - Eu pedi o impossível. - Ele… está sendo atendido pelo médico agora. - Eu não queria que ela pensasse que o pior havia acontecido.
- Onde ele está? Qual o hospital? - A mãe de perguntou, engolindo o choro. O filho precisava dela. Na mesma hora, eu passei o nome do hospital e o endereço. - Eu estou indo até ai agora. - Ela afirmou.
- Ok. Estou esperando a senhora. - Eu disse.
- Obrigada. - Ela disse antes de desligar o telefone. Mesmo depois de ela ter desligado, eu continuei com o celular no ouvido. Eu neguei com a cabeça, me segurando para não voltar a chorar. A família do não merecia. O não merecia. Eu não conseguia aceitar tudo o que estava acontecendo. Pensar no sofrimento de e lembrar do choro tão desesperador de uma mãe me fez chorar novamente. Tirei o celular do ouvido e aos prantos, encarei o céu. Eu só conseguia me perguntar uma coisa: porque? Fiquei algum tempo olhando naquela mesma direção, enquanto as lágrimas escorriam livremente por todo o meu rosto. Eu queria respostas. Eu precisava de ajuda para lidar com toda aquela angustia que eu sentia.
- ? - Ouvi alguém chamar o meu nome e só fui capaz de saber quem era ao abaixar a cabeça e olhá-la. - Me ligaram do hospital. Disseram que você estava aqui. - Era a Meg. Os nossos colegas de trabalho resolveram ligar para ela quando viram o meu estado. Quando viu o meu rosto coberto de lágrimas, ela demonstrou o dobro de preocupação. - O que… - Ela nunca tinha me visto daquele jeito. Meg se aproximou e me abraçou. Ela sentiu que eu precisava daquele abraço. - Independentemente do que tenha acontecido, vai ficar tudo bem. - Meg acariciava as minhas costas, enquanto me abraçava. Eu fechei os olhos ao abraçá-la, tentando absorver toda a calma que ela estava tentando me passar.
- Eu não posso perdê-lo, Meg. Eu não posso. Não desse jeito. - Eu disse aos prantos em meio ao abraço.
- Perder quem? - Meg terminou o abraço para olhar em meu rosto. - De quem você está falando? - Ela me olhou, assustada.
- O … ele… - Eu tive que buscar forças para terminar a frase. - Ele levou um tiro e… perdeu muito sangue. Eu não sei se… - Eu ergui os ombros. Eu não conseguia terminar a frase.
- Meu Deus do céu. - Meg ficou em choque. De todas as coisas ruins, essa era a única que não tinha passado por sua cabeça.
- Ele fez isso para salvar o meu pai. Ele fez isso por mim, Meg. - Eu disse com os olhos marejados e com uma expressão de tristeza.
- Awn, . - Meg me olhou e se aproximou para mais um abraço. - Não fica assim. Você tem que pensar positivo. - Ele estava se sentindo muito mal por mim.
- É tão difícil. Dói muito. – Eu correspondi novamente ao seu abraço, que durou algum tempo. Meg só terminou o abraço quando percebeu que eu estava um pouco mais calma.
- Você está sozinha aqui? – Meg perguntou, deduzindo que a resposta seria sim, já que não viu ninguém a minha volta.
- Não. – Eu disse, tentando me recuperar de vez. – O Mark está lá dentro. – Eu disse e notei que ela estranhou a informação. – Talvez... você deva conversar com ele. – Ela com certeza poderia fazer isso bem melhor do que eu.
- Vamos entrar. – Meg apontou com a cabeça em direção a porta do hospital. Eu hesitei um pouco antes de decidir acompanhá-la. Entramos e fomos andando em direção ao Mark, que continuava paralisado. Antes de se afastar de mim para ir até o melhor amigo, Meg me olhou como se perguntasse ‘Por que ele está desse jeito?’. Ela não sabia do laço familiar entre os irmãos Jonas. – Ei, Mark. – Meg disse ao parar na frente do amigo. Ela tentou olhar em seu rosto, mas sua cabeça estava baixa. – Ei. – Meg o chamou novamente e chegou a tocá-lo. Foi nesse momento que ele foi capaz de levantar a sua cabeça para olhá-la. Ele não chorava e nem disse nada, mas os olhos demonstravam a sua tristeza e angústia. – Você está bem? – Ela perguntou, levando uma de suas mãos até o rosto do melhor amigo e acariciando-o. Meg ficou extremamente preocupada ao ver o amigo daquele jeito. Com o olhar ainda baixo, Mark respondeu a pergunta com um abraço que chegou a surpreendê-la.
Eu observava a cena há alguns passos de distância e fui capaz de sentir toda a dor dele através daquele abraço tão intenso que ele precisava dar em sua melhor amiga. Enquanto ele a abraçava, o rosto dele ficou de frente pra mim e nós pudemos finalmente trocar olhares, que pareciam pedir ajuda um ao outro. Com os braços cruzados, eu neguei com a cabeça como se dissesse a ele: ‘Eu sinto muito por tudo isso.’.
- Com licença. – Um enfermeiro disse ao se aproximar do casal de amigos. O abraço foi terminado na mesma hora e eu me aproximei rapidamente. Nós finalmente teríamos notícias. – Olá, . Meg. – Ele nos cumprimentou, pois já nos conhecíamos. – Vocês estão com o rapaz baleado, certo? – Ele queria ter certeza.
- Sim. – Eu afirmei, receosa.
- Alguém da família está presente? – O enfermeiro perguntou, seguindo o protocolo.
- É... – Eu olhei discretamente pro Mark e já pretendia contornar a situação, mas ele me interrompeu.
- Está. – Mark afirmou, sério. Meg olhou rapidamente em volta, procurando a pessoa de quem Mark estava falando. – Eu. – Ele disse sem hesitar. – Eu sou o irmão dele. – Mark afirmou e na mesma hora eu vi os olhos de Meg ficarem arregalados. Ela me olhou como se dissesse: ‘Mas do que ele está falando? Ele está maluco?’.
- Ótimo! Você pode me acompanhar até a recepção, por gentileza? Eu preciso que você preencha alguns papéis. O procedimento padrão, sabe? – O enfermeiro nem percebeu a reação estranha da Meg.
- Posso, mas... eu não tenho nenhum documento dele aqui. – Apesar de ser o seu irmão, Mark ainda não sabia algumas informações importantes como o nome completo ou a data de nascimento.
- Vou te devolver alguns pertencer que estavam com ele. Os documentos certamente devem estar na carteira. – O enfermeiro explicou.
- Ok. – Mark concordou. Eles já iam saindo, quando eu resolvi abordar o enfermeiro, que não tinha dado nenhuma notícia sequer.
- Espere. – Eu fui até ele. – Como ele está? – Eu perguntei, aflita.
- Ainda não tenho muitas notícias. Ele está sendo operado agora para que a bala seja removida e para que se possa evitar que ele continue perdendo quantidades enormes de sangue. Quando eu tiver mais notícias, eu venho falar com você. – O enfermeiro me comunicou com uma expressão de lamentação e se afastou de vez ao lado do Mark.
Fiquei algum tempo tentando me convencer de que a situação de não era tão ruim quanto pareceu. Minha maior dificuldade era, sem dúvida, me manter calma diante de tudo aquilo. Encarei novamente a porta da sala para onde o tinha sido levado. A situação dele realmente era complicada, mas o que me consolava era a qualidade do médico que estava operando ele. Era o melhor da região.
- . – Meg se aproximou repentinamente. – O Mark não precisava ter mentido sobre ser irmão do . Nós trabalhamos aqui e poderíamos dar um jeito nisso. – Ela sussurrou. Ah, é mesmo. Tem mais essa!
- Meg... – Eu a olhei, sem saber como completar a frase. – Ele não mentiu. – Eu finalmente completei.
- O QUE!? – Meg surtou na mesma hora.
- Shhhhhhh! – Eu pedi silêncio, pois estávamos em um hospital. – Olha, não dá pra te explicar tudo agora, está bem? Mas.... é verdade sim. – Eu afirmei, enquanto pedia calma com as mãos.
- Eles são irmãos? – Meg sussurrou, demonstrando indignação. – Como isso é possível? Meu Deus! – Ela estava surtando de novo.
- Só por parte de pai. – Eu complementei a notícia.
- Mas, eles... – Meg estava tentando absorver tudo. – Não. Não. Não pode ser. ! Não pode ser. – Ela não conseguia acreditar em tamanho absurdo.
- Meg... – Eu ia pedir calma a ela novamente, mas ela me interrompeu.
- Mas como eu não sabia de um absurdo desse? – Ela me perguntou.
- Ninguém sabe. – Eu afirmei.
- É por isso que o Mark está desse jeito. – Meg concluiu em voz alta. – Coitadinho. – Ela completou.
- Ele precisa muito de você agora, ok? Então, deixa as perguntas para outra hora. Só... fique ao lado dele. – Eu pedi encarecidamente.
- Claro. É... o que eu vou fazer. – Meg afirmou, apesar de tudo.
Alguns minutos haviam se passado e Mark ainda não tinha voltado, por isso, Meg me convenceu a ir até uma das salas de espera do hospital. Ficamos algum tempo sentadas lá em total silêncio. Eu já não chorava, mas minha cabeça e o meu corpo estavam anestesiados. Parecia até que eu não estava ali. Parecia que tudo aquilo acabaria a qualquer momento.
Meus pais chegaram no hospital alguns minutos depois. Minha mãe não estava aflita ou triste. Ela estava completamente desesperada. Não só por causa do que tinha acontecido com o , mas também por causa do atentado que sofremos. Steven tentou atirar no meu pai. O ex-namorado da minha mãe tentou matar o marido dela. Imagina como estava a cabeça dela? Imagina o que ela estava passando? Difícil, hum?
Era engraçado e angustiante o fato de eu me sentir na obrigação de ‘segurar a barra’ de todos ao meu redor, enquanto o meu mundo estava desabando. Minha mãe demonstrava muita preocupação comigo e estava aflita com a falta de notícias do . Quem é que teve que acalmá-la? Quem teve que se fazer de forte pra fingir que estava tudo bem? Quem é que teve que segurar o choro para não fazê-la chorar também? Eu mesma!
Havia se passado um pouco mais de 45 minutos e o Mark ainda não tinha voltado. Eu sabia muito bem o quanto demorava toda aquela burocracia de hospital e, além disso, deve ter acontecido algum problema. Eu fiquei adiando por algum tempo a ideia de ir atrás do Mark para saber o que tinha acontecido e quando eu me convenci a ir, me deparei com a mãe do Jonas, o padrasto e a . Eles tinham acabado de chegar. A urgência da situação certamente fez com que chegassem em Nova York em um tempo menor do que o comum. Eles chegaram exatamente 1 hora e 15 minutos depois de eu ligar. Ao vê-los, eu congelei por um bom tempo. A mãe do Jonas estava com os olhos completamente inchados, mas ela não chorava no momento. O padrasto estava com uma expressão de preocupação e parecia não ter total ciência sobre a situação. Ela chegou a sorrir ao me ver.
- ! – soltou a mão da mãe e veio correndo em minha direção, passando seus braços em volta da minha cintura. Troquei olhares com a mãe do antes de voltar a minha atenção para a garotinha. Me agachei para poder ver o rosto de de mais perto e ela ainda sorria, deixando em evidências alguns buracos causados pelas quedas de alguns dentes.
- Oi, linda. – Eu passei a mão pelo seu cabelo.
- Eu senti muitas saudades. – A garotinha me abraçou novamente. Meus olhos novamente foram até o rosto da mãe de , que demonstrava cada vez mais desespero. Era evidente que ela estava se segurando por causa de .
- Eu também senti. – Eu correspondi ao abraço.
- A mamãe disse que o está doente. – disse com a inocência que só ela tinha ao terminar o abraço. - Sim... – Eu afirmei com a cabeça. – Ele está doente. – Eu confirmei com um pouco de dificuldade.
- Mas.... ele vai ficar bem, não vai? – já parecia saber a resposta da pergunta, mas queria apenas ter certeza.
- É claro que vai. – Eu afirmei, colocando uma mexa de seu cabelo atrás da orelha.
- Eu disse isso para a minha mãe, mas ela estava muito nervosa. – contou.
- Isso é coisa de mãe. Elas se preocupam muito com os filhos. – Eu tentei amenizar a situação. – Você não precisa se preocupar com isso, está bem? Vai ficar tudo bem. – Eu afirmei com a intenção de tranquilizá-la.
- Está bem. – afirmou com a cabeça.
- , vamos até a lanchonete comprar um chocolate? – O padrasto de e pai de se manifestou. Ele sabia que precisava tirar a filha de lá para que a mãe de conversasse comigo.
- Eba! – adorou a ideia. – Você quer vir com a gente, ? – Ela perguntou depois de correr até o pai e segurar uma de suas mãos.
- Não. Eu estou bem. Obrigada. – Mesmo sabendo que o pior estava por vir, eu sorri mais uma vez para ela.
- Vamos. – O pai começou a levar a garota para longe. Acompanhei eles com o olhar até conseguir coragem para olhar para a mãe do e quando consegui, me deparei com seus olhos cheios de lágrimas e desespero.
- O que foi que aconteceu, ? Onde ele está? – Ela se aproximou, aflita. Eu nem sabia por onde começar.
- Eu sinto muito. – Eu já comecei a conversa me desculpando por ser a culpada por tudo o que o filho dela estava passando. Deixei de olhá-la ao abaixar a cabeça e encarar minhas mãos trêmulas. – Eu nem sei como... – Eu voltei a olhá-la com os olhos marejados. Ver todo o sofrimento nos olhos dela fez com que eu me sentisse ainda pior.
- Me conta. – Ela pediu aos prantos. O estado em que eu me encontrava já dava a ela uma boa ideia da trágica história que eu estava prestes a lhe contar. Hesitei alguns segundos para tentar encontrar uma forma plausível de contar a ela e ao mesmo tempo protegê-la de tudo aquilo.
- Aconteceu tudo muito rápido. – Eu afirmei ao olhá-la, enquanto respirava fundo para conseguir prosseguir. – Eu e o meu pai estávamos no estacionamento de um mercado. Estávamos colocando as compras no carro e... eu ouvi aquele barulho estridente e assustador. Eu não sabia ao certo o que era até ver... – Um nó se formou em minha garganta, me impedindo de continuar falando. Fechei os olhos por poucos segundos e respirei fundo novamente. – Ele... – Era tão difícil continuar aquela frase sem sentir uma dor imensa no peito e ter os meus olhos invadidos por lágrimas. – Ele se jogou na frente do meu pai. – Com as lágrimas prestes a transbordarem, eu passei uma das mãos pelos meus olhos. – Ele entrou na frente da bala e salvou o meu pai. – Eu completei a frase completamente emocionada. A emoção também tomou conta da mãe do , fazendo com que ela se aproximasse para um abraço. – Seu filho foi um herói, Sra. Jonas. – Eu fiz questão de dizer, enquanto um fraco e triste sorriso tomou conta do meu rosto. Ela deveria se orgulhar dele.
- Ele foi, não é? – Ela concordou aos prantos. – Mas... – Ela interrompeu repentinamente o abraço. – Como ele está agora? Eu posso vê-lo? – A mãe tinha muitas perguntas.
- Ele... está sendo atendido. Provavelmente, estão removendo a bala. – Eu respondi ao me esforçar para me recompor.
- Mais nenhuma notícia? – Ela me perguntou, aflita.
- Não. Eu estou esperando há quase 2 horas e ninguém ainda veio me dizer nada. – Eu expliquei.
- Se você tiver qualquer notícia, não deixe de me avisar, por favor. – A mãe de pediu, enquanto enxugava as lágrimas em seu rosto com um lenço. Provavelmente, ela não queria que percebesse que ela tinha chorado quando voltasse.
- É claro. – Eu afirmei com a cabeça. – Eu tenho certeza que tudo isso vai acabar bem. – Eu quis dar a ela uma palavra de conforto. Era a única coisa que eu poderia fazer por ela naquele momento.
- Deus te ouça, querida. – A mãe sorriu com tristeza antes de depositar um beijo carinhoso em meu rosto. Eu só consegui pensar que eu não era merecedora daquele carinho. Eu era a responsável por tudo o que ela estava passando.
A culpa que eu sentia pelo que aconteceu me consumia por dentro e ver o sofrimento daquela mãe só me fez ficar pior. A mãe de se afastou de mim para receber o apoio e consolo dos meus pais. Como todos já sabem, eles se conhecem há muitos anos devido a amizade de e . Fiquei um bom tempo observando ela conversar com os meus pais e conclui que poupá-la sobre toda a confusão relacionada ao Steven foi a melhor coisa que eu poderia ter feito. Ela já estava sofrendo tanto, que não merecia saber o merda que era o seu ex-marido.
- . – Ouvi alguém me chamar e me virei na mesma hora. Poderia ser notícias do .
- Mark. – Eu me aproximei dele na mesma hora. – O que aconteceu? – Eu queria saber se ele tinha alguma notícia.
- Ele ainda está na mesa de cirurgia. Não quiseram me falar nada. – Mark lamentou a notícia. Depois de ouvir a sua frase, desanimei na mesma hora, mas não pude deixar de notar o casaco, a carteira e o celular em suas mãos. Eram os pertences do .
- O que é tudo isso? – Eu perguntei, querendo que ele explicasse.
- Me deram os pertences dele. Eu preenchi todos as fichas com os documentos dele. – Mark mostrou a carteira.
- A jaqueta... – Foi a coisa que mais me interessou. Ele estava usando no momento do ocorrido. A parte debaixo de um dos lados dela estava sujo de sangue que, inclusive, já estava até seco. – É a favorita dele. – Eu completei a frase com um fraco sorriso.
- Essas coisas são do meu filho? – A mãe de de repente nos interrompeu. Ela olhava para as mãos de Mark.
- Sim, são. – Eu afirmei na mesma hora. Ela olhou para o Mark, tentando reconhecê-lo. – Oh, me desculpe. Eu não apresentei vocês. Essa é a mãe do , Mark. – Eu disse, apresentando-a. – E esse é o Mark. Ele... é um grande amigo do . – Eu achei melhor deixar as revelações para uma outra hora.
- É um prazer. – Mark estendeu a mão para a senhora, que parecia ser uma boa pessoa.
- Prazer. – A mãe de tentou sorrir.
- Eu estava preenchendo algumas fichas do hospital e eles me deram os documentos e essas coisas. – Mark achou que deveria explicar.
- Obrigada pela ajuda com as fichas. Eu estou tão arrasada com tudo isso, que nem me lembrei de toda essa burocracia. – A mãe de Jonas fez careta.
- Imagina. Sem problemas. Está tudo resolvido. – Mark tentou acalmá-la.
- Obrigada mesmo. – Ela agradeceu mais uma vez. – Agora, vamos esperar as notícias. – Ela disse em meio a um suspiro.
- Não deve demorar. – Era por isso que eu torcia. Eu precisava de uma ótima notícia para poder deixar essa angústia toda de lado.
Mark ficou ao meu lado por um bom tempo. Chegamos até a trocar algumas palavras, mas não falamos sobre o que estávamos sentindo com tudo aquilo. Parecia até que estávamos tentando preservar um ao outro de falar sobre o assunto para nos mantermos fortes. Estávamos fazendo isso inconscientemente um pelo outro.
- Você está certa. Não devemos contar nada disso para a mãe dele. Se o quiser, ele conta depois. – Mark concordou comigo, depois de eu explicar que não tinha revelado toda a verdade para a Sra. Jonas.
- Sim. É melhor. – Eu afirmei com a cabeça, deixando de olhar para o Mark para olhar para a mãe de . Ela estava sentada em uma das cadeiras e a cabeça parecia estar longe. Os olhos estavam fixos no chão.
- Ela parece ser uma boa pessoa. – Mark comentou depois de olhá-la também.
- Ela é incrível. – Eu afirmei com pesar. Ela não merecia estar passando por tudo aquilo.
- E quem é aquela? – Mark perguntou ao ver uma garotinha se aproximar da mãe de seu irmão. Voltei a olhar na mesma direção de antes e vi que se tratava de . Olhei para o Mark e deixei um fraco sorriso escapar.
- Espera aqui. – Eu pedi antes de me afastar dele. Fui até a e sua mãe. – , você pode vir comigo um minuto? Eu quero que você conheça alguém. – Eu mal tinha acabado a frase e ela já estava estendendo a sua mão para que eu a segurasse. Troquei olhares com a mãe dela, que consentiu que eu a levasse comigo.
- Quem? – olhou em volta, enquanto eu a levava em direção ao Mark. Ele nos olhava, esperando que nos aproximássemos. Chegamos até ele antes mesmo que eu tivesse tempo de responder.
- Eu quero que você conheça o Mark. – Eu disse assim que paramos na frente dele. – Ele é... um grande amigo do . – Eu completei.
- Oi. – Mark agachou-se em frente a garotinha para poder vê-la melhor.
- Então, você é amigo do meu irmão? – puxou assunto, enquanto o analisava.
- Irmão? – Mark levantou o rosto para me olhar, demonstrando surpresa.
- Sim! O é o meu irmão. – confirmou rapidamente e ele voltou a olhá-la.
- Jura? – Ele deixou um sorriso escapar. – E eu posso saber o seu nome? – Mark perguntou.
- . – Ela afirmou com um sorriso.
- é um nome muito bonito. – Mark elogiou e ela ficou toda boba.
- Obrigada. – agradeceu.
- Você se parece um pouco com o seu irmão, sabia? – Mark perguntou e ela fez careta. - As pessoas sempre dizem isso. – Ela rolou os olhos.
- E você não gosta? – Mark achou graça.
- Eu até gosto, mas... é que as vezes ele é um pouco chato e eu não sou. – explicou com o seu jeito único.
- Eu sei exatamente como você se sente. – Mark voltou a sorrir.
- Sabe mesmo? Você tem um irmão também? – se interessou.
- Na verdade, eu tenho. – Mark afirmou, depois de hesitar alguns segundos.
- E ele é chato também? – demonstrou curiosidade.
- Ele é muito chato. Acho até que ele é tão chato quanto o seu. – Mark rolou os olhos. – Mas... eu nem me importo, sabia? Por que mesmo com todas as besteiras que ele fala e as chatices dele, ele continua sendo o meu irmão. – Havia uma lição maravilhosa por detrás daquela frase dele e ele estava tentando passá-la para a garotinha.
- É verdade. – concordou. – O meu irmão gosta de ficar me irritando, mas eu sinto muita saudade dele. – Aquilo quebrou o meu coração de maneiras inexplicáveis.
- Você vai poder matar a saudade em breve. – Mark olhou com carinho para a garotinha. – Foi um prazer te conhecer, . – Ele estendeu uma das mãos.
- Você é muito legal. – sorriu antes. Ela ignorou completamente a mão de Mark e se aproximou, beijando o rosto dele. Ele foi pego de surpresa novamente. Sem dizer nada, viu a voltar a segurar a minha mão.
- Eu já volto. – Eu disse, me afastando e levando a garota até a mãe. Mark estava encantado com a garotinha e pensou no quanto o era sortudo por ter uma família como aquela.
A espera por notícias estava matando todos nós, que nos mantínhamos em silêncio absoluto e trocávamos olhares intensos e preocupados de tempos em tempos. Ocupávamos toda a sala de espera, pois o hospital estava pouco movimentado por causa do horário. Já passava das 11 horas da noite. Quase todos estavam ali, só faltava o meu irmão e os nossos amigos que já haviam avisado que estavam a caminho.
- Você está com frio? – Mark perguntou, virando o seu rosto para me olhar. Ele viu que os meus braços estavam cruzados e que eu estava sem blusa.
- Não, eu... – Eu neguei mesmo estando morrendo de frio. Quando sai do trabalho não estava frio, mas conforme foi anoitecendo, foi começando a esfriar.
- Pega. – Mark estendeu a jaqueta de na minha direção. Era a jaqueta que o enfermeiro tinha entregado ao Mark há algum tempo. – Usa a jaqueta dele. – Ele completou, mantendo a mão estendida na minha direção. Eu hesitei um bom tempo antes de aceitar.
- Obrigada. – Eu agradeci ao pegar a jaqueta sem ter certeza do que estava fazendo. Com a jaqueta em minhas mãos, eu passei a encará-la. Como eu já disse, era a jaqueta favorita do . Ele sempre estava usando ela. Vê-la suja de sangue me fazia sentir uma coisa horrível, que eu mal conseguia explicar. Quando eu comecei a perceber o que significava ter aquela jaqueta em minhas mãos e o peso enorme que ela tinha, o meu nervosismo foi aumentando gradativamente. Eu começava a cogitar a possibilidade de sair rapidamente de perto de todas aquelas pessoas para as quais eu queria me fazer de forte, quando o médico chegou na sala de espera. Meu coração parou.
- Vocês são a família e amigos do Jonas, certo? – O médico já sabia a resposta, pois ele me conhecia. Ele estava só tentando ganhar tempo para encontrar as palavras certas.
- Ele é o meu filho. – A mãe de levantou na mesma hora e foi até o médico. Eu me levantei, mas fiquei um pouco mais atrás, pois estava com muito medo do que iria ouvir. A expressão no rosto do médico não era das melhores.
- Você tem notícias? – Apesar de estar com um medo absurdo, Mark tomou a frente e perguntou.
- Eu tenho. – O médico afirmou, sério. Meus olhos se encheram de lágrimas em segundos. Eu já temia o pior.
- Fale, por favor. – Meu pai pressionou o médico.
- Mesmo estando em um local bem delicado, a bala foi removida. – O médico terminou a frase, mas parecia que a notícia ainda não estava completa. – O problema é que ele perdeu muito sangue. Estamos fazendo o possível para conter a hemorragia. – Ele finalmente completou.
- Não. Meu Deus... – A mãe de estava inconformada e foi rapidamente consolada pelo marido e pela filha mais nova, que não sabia ao certo o que estava acontecendo.
- Eu trago novas informações assim que as tiver. – O médico disse antes de se afastar. Eu estava paralisada e as lágrimas nos meus olhos também. Em silêncio, Mark voltou a se sentar, inclinou o seu corpo para baixo e passou a encarar o chão, enquanto as mãos ficavam em sua cabeça. Ele estava muito mal. Ele estava arrasado.
- ... – Parecia que Meg ia me consolar, mas eu a interrompi.
- Ajuda ele. – Eu pedi a ela, me referindo ao Mark. Ele merecia mais do que eu. Ele precisava mais do que eu. Meg aceitou o meu pedido na mesma hora e foi até o seu melhor amigo.
- Querida, nós... – Minha mãe também se aproximou com a esperança de me ajudar, mas eu também a interrompi.
- Eu... preciso dar uma volta. - Eu a olhei. - Ou eu vou acabar enlouquecendo. – Eu deixei claro que eu precisava ficar sozinha. Eu precisava ficar sozinha para me permitir ser vulnerável. Estava sendo muito difícil pra mim manter as aparências para todos. Eu não queria me preocupar com nenhum deles. – Eu volto daqui a pouco. – Eu disse, deixando de olhar para a minha mãe. Ela me conhecia bem e, por isso, nem tentou me impedir.
Eu ainda não tinha tido qualquer reação diante da notícia dada pelo médico. Eu continuava me segurando ao máximo. Comecei a andar pelo hospital e o fato de trabalhar lá, me ajudou a encontrar os lugares com pouca movimentação que, naquele horário, era ainda maior. Entrei em um dos corredores, onde eu sabia que a maioria das salas eram de médicos que não fariam plantão naquela noite. Parei logo no início do corredor e o encarei completamente vazio por algum tempo. Minhas mãos tremiam. Dei mais alguns passos até parar em frente ao vidro de uma das salas. Parada em frente ao vidro, eu conseguia ver perfeitamente o meu reflexo. Através do vidro, vi a jaqueta em minhas mãos, o que me fez abaixar a cabeça para olhá-la. Em um momento de fraqueza, aproximei a jaqueta do meu rosto. Era o cheiro e o perfume dele. Fechei os olhos quando as lágrimas ameaçaram a escorrer. Ainda com o perfume dele preso em meu nariz, eu abri os olhos e afastei a jaqueta do meu rosto. Voltei a encarar o vidro e tomei coragem para vestir a jaqueta favorita dele. Foi impossível que as lágrimas se acumulassem em meus olhos, enquanto eu colocava a jaqueta. Quando acabei de vesti-la, fiquei algum tempo me olhando. Um fraco sorriso chegou a surgir no canto do meu rosto, quando eu pensei no quanto ele iria gostar de me ver vestindo a sua preciosa jaqueta. Parecia até que eu estava ouvindo ele dizer que eu deveria ter cuidado com ela. Coloquei uma das mãos no bolso da jaqueta, enquanto enxugava as lágrimas em meu rosto com a outra mão.
- O que... – Eu estranhei ao sentir algo no bolso da jaqueta em que eu tinha colocado a mão. Tirei a mão do bolso, trazendo de lá a carteira de . Mark deve ter guardado lá depois que o enfermeiro deu os pertences do pra ele.
Fiquei um bom tempo encarando a carteira antes de decidir abri-la. Comecei a andar lentamente pelo corredor vazio, enquanto começava a fuçar na carteira dele. Encontrei alguns cartões e alguns documentos. Impressionante o fato de ele não ficar feio nem mesmo na foto da sua carteira de motorista. Continuei fuçando em sua carteira e não fiquei nem um pouco surpresa ao encontrar um preservativo. Como sempre, muito prevenido! O achado me arrancou um sorriso bobo. Era tão a cara dele.
Quando achei que já tivesse olhado toda a carteira, encontrei alguns cartões de visita de algumas lojas. A maioria delas era de jogos de videogame. Por que eu não estava surpresa? Bem, o que realmente me surpreendeu foi o que eu encontrei atrás daqueles cartões. Uma foto muito bem escondida. Uma foto que tiramos há dois anos, mais precisamente no dia do meu aniversário, ou seja, o dia em que ele me pediu em namoro. Estávamos no lugar que minha avó tinha descoberto. Na foto, meus braços estavam em volta do pescoço dele, enquanto eu beijava o seu rosto e ele fazia careta para foto. A cena parecia estar passando diante dos meus olhos. Eu lembrava como se fosse ontem. Fiquei algum tempo encarando aquela foto com um sorriso fraco e ao mesmo tempo tão triste no rosto. Algumas lágrimas escaparam pelos cantos dos meus olhos. Não acredito que ele tinha uma foto nossa na carteira. Quem disse que nós nunca tínhamos sido felizes?
Com a intenção de parar de me torturar, coloquei a foto novamente na carteira e a fechei rapidamente. Respirei fundo, levantei a cabeça e encarei o teto por alguns segundos para tentar me recompor. Com uma mão, recoloquei a carteira no bolso e comecei a secar as lágrimas com as mãos, enquanto dava mais alguns passos em direção ao fim do corredor. Ao terminar de secar o meu rosto, levei as mãos aos bolsos da jaqueta. Em um dos bolsos, voltei a sentir a carteira, mas o outro bolso também não estava vazio. Parecia ser um papel. Parecia tão inofensivo que resolvi tirá-lo do bolso para saber do que se tratava. Imagina se eu não estremeci completamente quando eu li ‘Para ’ escrito com a letra do do lado de fora de um envelope dobrado ao meio. Na mesma hora, me veio na cabeça as últimas palavras que o tinha me dito: ‘No bolso... jaqueta.’. Meu. Deus. Era isso! Era isso o que ele estava tentando me dizer. Ele queria que eu encontrasse esse papel.
Enquanto isso, a sala de espera ficava cada vez mais cheia. , , , e tinham acabado de chegar. Todos pareciam muito preocupados e sem saber muito bem o que tinha acontecido. Cumprimentaram cada pessoa conhecida que estava naquela sala, deixando o Mark por último. juntou-se a namorada, Meg.
- Como ele está? – perguntou, séria.
- Alguma notícia? – quis logo saber.
- O... médico acabou de sair. – Mark estava visivelmente abalado, por isso, Meg resolveu dar as notícias.
- Já removeram a bala, mas ele... perdeu muito sangue. – Meg fez uma expressão de lamentação.
- E? – queria mais detalhes.
- Estão tentando conter uma forte hemorragia nesse momento. – Meg disse, mostrando-se triste.
- Meu Deus. – já demonstrou sinais de choro. estava estranhamente quieto e apreensivo.
- Calma. – a acolheu em seus braços.
- E onde minha irmã está? – preocupou-se imediatamente comigo. Ele tinha certeza de que eu não estava nada bem.
- Ela disse que ia dar uma volta pelo hospital. Eu não sei onde... – Meg ergueu os ombros.
- Nós precisamos encontrá-la. Ela deve estar muito mal com tudo isso. – mostrou-se preocupado.
- Não. Eu vou. – disse sério. Ele não costumava falar daquela maneira, por isso, ninguém tentou insistir no assunto. – É a minha irmã. Eu vou. – Ele reafirmou, olhando rapidamente para todos e afastando-se. Ele não sabia onde eu estava. O hospital era enorme, mas ele me encontraria de qualquer jeito.
Fiquei um bom tempo encarando aquele envelope, sem qualquer coragem de abri-lo e saber do que se tratava. Cogitei deixar para abri-lo em um outro momento, mas a curiosidade de saber o conteúdo daquele envelope falou mais alto. Dei alguns passos para trás até sentir minhas costas encostarem na parede final do corredor. Comecei a abrir lentamente o envelope e desdobrei a folha que estava dentro dele. Encarando a folha pela primeira vez, a coisa que mais me chamou a minha atenção foram as rasuras. O formato do texto e das frases me fizeram perceber rapidamente que se tratava de uma música. Aparentava estar finalizada, mas as rasuras demonstravam que ainda poderia vir a alterá-la.
Só o fato de se tratar de uma música fez com que o meu corpo todo estremecesse. Meu coração estava apertado e muito descompassado. tinha escrito uma música pra mim. Ele tinha composto uma música sobre nós. O nervosismo me dominou tão rapidamente que, talvez, fosse melhor que eu respirasse fundo e me acalmasse antes de começar a ler aquelas estrofes, mas é claro que eu não fiz isso. Eu não consegui pensar em nada. Eu não consegui pensar no que era melhor para mim. Meus olhos simplesmente começaram a explorar tudo o que o queria tanto me dizer.
ACOMPANHE COM A MÚSICA:
“Pick up all your tears (Eu poderia pegar todas suas lágrimas)
Throw'em in your back seat (E jogá-las no seu porta-malas)
Leave without a second glance (Ir embora sem olhar para trás)
Somehow I'm to blame (De alguma forma, eu sou o culpado)
For this never-ending racetrack you call life (Por esse interminável autódromo que você chama de vida)
Turn right (Vire à direita)
Into my arms (Em meus braços) – A cada verso que eu lia, parecia que eu estava ouvindo ele cantar no meu ouvido. As lágrimas alcançaram os meus olhos tão rapidamente, que eu mal tive a chance de tentar segurá-las.
Turn right (Vire à direita)
You won't be alone (Você não estará sozinha)
You might (Você pode)
Fall off this track sometime (Sair dessa trilha algumas vezes)
Hope to see you on the finish line (Espero te ver na linha de chegada) – Ver a letra dele naquele papel, ler o que ele tinha pra me dizer e saber que, talvez, eu jamais poderia escutá-lo cantar aquela música pra mim me fez entrar em completo estado de desespero.
You're driving all your friends out (Você está conduzindo os seus amigos)
At a speed they cannot follow (A uma velocidade que eles não podem seguir)
And soon you will be on your own (Em breve, você estará sozinha)
Somehow I'm to blame (De alguma forma, eu sou o culpado)
For this never-ending racetrack you call life (Por esse interminável autódromo que você chama de vida) – O meu choro triplicou. A culpa pesava cada vez mais em meus ombros. Mesmo com todas as bobagens que eu disse pra ele e tudo o que eu fiz ele passar, ele ainda era capaz de ver alguma coisa em mim. Ele não tinha desistido de mim, mesmo quando eu já tinha desistido dele.
Turn right (Vire à direita)
Into my arms (Em meus braços) - Eu conseguia sentir o amor dele em cada palavra. O amor dele que antes tinha o poder de me acalmar, hoje estava me fazendo sentir uma dor que eu jamais tinha sentido. Saber que existia a mínima possibilidade de eu não ouvir mais a voz dele e de não ver nunca mais o jeito que ele olhava só pra mim me fez deslizar aos poucos pela parede. Eu já não tinha forças para ficar em pé. Eu estava literalmente desabando aos poucos. Turn right (Vire à direita)
You won't be alone (Você não estará sozinha)
You might (Você pode)
Fall off this track sometime (Sair dessa trilha algumas vezes)
Hope to see you on the finish line (Espero te ver na linha de chegada)
I did all I could (Eu fiz o que eu pude)
And I gave everything (Eu dei tudo)
But you had to go your way (Mas você teve que seguir o seu caminho)
And that road was not for me (E essa estrada não era pra mim) – Nesse momento, eu pude perceber que ele estava tentando me dizer que finalmente estava me deixando para trás como tantas vezes eu pedi a ele. Ele estava disposto a seguir em frente. Por que tudo isso teve que acontecer logo agora? O choro e o nervosismo já não me deixavam ler a letra da música com tanta clareza, mas eu continuei tentando. Eu estava sentada no chão, encostada no canto de duas paredes.
So Turn right (Então, Vire à direita)
Into my arms (Em meus braços)
Turn right (Vire à direita)
You won't be alone (Você não estará sozinha)
You might (Você pode)
Fall off this track sometime (Sair dessa trilha algumas vezes)
Hope to see you on the finish line (Espero te ver na linha de chegada)”. - A letra não era uma despedida. Ele não estava tentando me dizer que tinha desistido de mim. Ele estava tentando me dizer que independentemente do que acontecesse e independentemente de quanto tempo passasse, ele ainda estaria me esperando. Era a coisa mais bonita e mais triste que eu já tinha lido em toda a minha vida. Nada no mundo poderia me fazer sentir tão amada quanto aquela simples letra de música cheia de rasuras. Nada no mundo faria com que eu sentisse ele tão perto de mim, quanto aquela música.
Mesmo que cada palavra lida tirasse o meu chão e uma grande parte do eu coração, meus olhos se mantiveram fixos naquele papel até a última palavra. Quando acabei de ler, fiquei olhando para o papel por algum tempo, enquanto eu chorava silenciosamente. O choro silencioso e, até então, calmo, se manteve até o momento em que eu pensei que aquela música poderia ser as últimas palavras dele pra mim. Deixei de olhar para o papel e o levei até o meu peito, pressionando-o. Eu chorava desoladamente, enquanto negava com a cabeça. Eu jamais superaria o que estava acontecendo. Soltei o papel para levar ambas as mãos até a cabeça, que eu continuava balançando de forma negativa. Estava doendo muito.
já estava rodando o hospital atrás de mim há mais de 10 minutos. Ao passar por um dos diversos corredores pelos quais ele já havia passado, ele conseguiu me ver lá no fundo. Mesmo estando um pouco longe, ele me reconheceu imediatamente. não pensou duas vezes antes de começar a andar rapidamente na minha direção. Ele logo percebeu que eu estava sentada no chão e que chorava muito. Isso fez com que ele apressasse um pouco mais o passo.
Eu estava desolada e a minha cabeça estava tão ferrada naquele momento, que eu não percebi que alguém estava se aproximando. Com os olhos fechados e cansada de tanto chorar, inclinei a minha cabeça para trás e a encostei na parede. Fiquei alguns segundos naquela mesma posição tentando me acalmar, quando senti as mãos de alguém me tocarem. tinha se ajoelhado em minha frente e tocou as minhas mãos. Eu não me assustei e nem tive pressa para descobrir quem era. Trouxe o meu rosto para baixo e vi o meu irmão com poucas lágrimas nos olhos. Não trocamos qualquer palavra. Deixei de olhar em seus olhos para a olhar para a mão dele, que agora eu segurava com mais força. As lágrimas que estavam dispersando acabaram voltando. se aproximou e me abraçou quando percebeu que eu voltaria a chorar. O abraço dele me acolheu de tal forma, me fazendo inclinar a minha cabeça e deitá-la em seu ombro. Meu coração estava muito apertado e eu chorava tanto que chegava a soluçar.
- Vai ficar tudo bem. – sussurrou, acariciando a minha cabeça.
- Eu não quero ter que me despedir dele. – Eu disse aos prantos. A minha frase levou o meu irmão ás lágrimas. - A culpa é minha. - Eu mal consegui dizer a frase direito.
- . – terminou o abraço na mesma hora. – Não fala isso nem de brincadeira. – Ele completou, me olhando sério. Naquele momento, eu pude perceber que ele também havia chorado.
- Eu desconfiei dele. Eu desconfiei do amor dele. – Deixei de olhá-lo por alguns momentos ao abaixar a cabeça e encarar as minhas mãos. – Ele salvou o nosso pai para me mostrar que eu estava errada. , ele fez isso por causa de mim. Você entende? – Eu queria que ele aceitasse a realidade, que estava tão clara para mim.
- Você tem razão em uma parte. – me olhou calmamente, enquanto passava seus dedos pelo meu rosto para secar as lágrimas que já haviam escorrido. – Ele fez tudo isso por você. – Ele tinha toda a minha atenção. – Ele não fez isso para te provar nada. Ele fez isso para tentar poupar o seu sofrimento. – também parecia emocionado ao falar da atitude do melhor amigo.
- Poupar o meu sofrimento? Como? – Eu perguntei, sem entender. Sofrimento era o que eu mais senti nas últimas horas.
- Ele não queria que você perdesse alguém muito importante para você. – estava falando do meu pai. – Ele não queria que nós perdêssemos outra pessoa. – Ele se emocionou ao terminar a frase.
- Eu sei, mas... nós não podemos perdê-lo também. Eu não vou aguentar perdê-lo, . – Eu disse com a voz embargada.
- Você não vai! Nós não vamos perder mais ninguém. – afirmou, secando as lágrimas prestes a escorrer de seus olhos. Ele tentou se recompor. – O é forte demais e você sabe disso. – Ele tentou me dar esperanças. – Ele vai sair dessa, ok? – secou novamente as lágrimas em meu rosto. As palavras dele conseguiram me acalmar um pouco.
- Que bom que você está aqui. – Eu olhei para o meu irmão com carinho e ele me devolveu o olhar.
- Eu preciso que você me prometa uma coisa. – pediu, sério.
- Prometer o que? – Eu perguntei, sem saber o que esperar.
- Prometa que você nunca vai dizer ao que me viu chorando por causa dele. – continuou sério, mas conseguiu me arrancar um sorriso.
- Ele nunca vai saber. Eu prometo. – Eu afirmei com um fraco sorriso.
- Ótimo. – finalmente sorriu. – Agora, vamos voltar para a sala de espera. Você vai querer estar lá quando as boas notícias chegarem, certo? – Ele perguntou depois de se levantar e estender as mãos em minha direção.
- Eu quero. – Eu afirmei com a cabeça, levando minhas mãos até a dele. Ele me puxou, me colocando em pé novamente.
- Então, vamos. Estão todos querendo te ver. – disse, soltando a minha mão. Começamos a caminhar lado a lado. – O que tem nesse papel? – Ele perguntou, curioso.
- O coração do está aqui. Ele resolveu entregá-lo pra mim. – Eu disse, voltando a olhar para o papel, que eu ainda segurava. – Vou cuidar dele pro até ele ficar bem e resolver o que vai fazer com ele. – Eu disse ao dobrar o papel e guardá-lo novamente no bolso da jaqueta. não entendeu bem o que eu quis dizer, mas preferiu não pedir detalhes.
A presença do meu irmão me deixou um pouco melhor. Eu me sentia um pouco mais leve, pois tinha botado para fora tudo o que eu estava sentindo através das minhas lágrimas. Ler aquela letra de música foi com toda a certeza o auge de todo o sofrimento que eu tentei ignorar nas últimas horas. Botá-lo para fora e finalmente ser sincera comigo mesma foi um grande alívio. É claro que eu ainda estava aflita, nervosa e com um medo absurdo do que poderia acontecer, mas eu tinha um pouco mais de esperança agora. A culpa que eu sentia também diminuiu bastante, mas ela ainda estava lá. Eu ainda podia sentir um pouco do peso dela.
me levou para a sala de espera, onde todos ainda esperavam por notícias. Quando eu entrei na sala, todos os meus amigos se levantaram e vieram me consolar. Quem me conhecia bem, sabia exatamente como estava o meu estado emocional. Os meus amigos me conheciam muito bem. Eles sabiam que eu estava devastada. Eles sabiam o quanto o abraço deles me ajudaria.
- É tão bom te ver. – me olhou com carinho. – Quando o ligou me avisando do que tinha acontecido, eu fiquei com medo de também ter acontecido algo com você. – Ela completou.
- Eu não entendi nada. O me ligou tão nervoso. Eu entendi que alguém tinha levado um tiro e que o estava envolvido. Eu surtei. – tentou se explicar. Estava todo mundo falando ao mesmo tempo.
- Quanto tempo vai demorar para esse médico vir dar notícias? – perguntou, impaciente.
- Não deve demorar. – Meg deu o palpite.
- Como foi acontecer algo assim com o ? Um cara tão legal como ele. Eu não... – parecia não saber a versão toda da história. Aliás, quase todos não sabiam.
- O que aconteceu, afinal? – perguntou o que todos queriam saber.
- Aconteceu muito rápido. Eu nem tive tempo para parar e pensar nos detalhes. – Eu demonstrei o quanto eu estava confusa. – Eu sai do trabalho e meu pai foi me buscar. Eu tinha combinado de ajudá-lo com as compras no mercado. Na saída do mercado, estávamos colocando as compras dentro do carro e... – Eu hesitei por alguns segundos. – Eu só sei que ouvi um barulho muito alto e só percebi que se tratava de um tiro quando vi o caído nos pés do meu pai. – Eu tentei explicar sem parecer tão abalada.
- Ele... se jogou na frente da bala. – concluiu em voz alta para que os amigos soubessem. Ele demonstrou estar abalado com a informação.
- Não... – disse, incrédulo.
- Ele... – hesitou antes de concluir. – Ele salvou o pai de vocês. – Ela completou.
- Sim. – Eu afirmei com a cabeça, tentando não demonstrar o quanto aquilo me afetava.
- Uau. – não sabia o que dizer.
- Ele foi um verdadeiro herói. – Meg reconheceu, impressionada.
- Nós... tínhamos brigado. – Eu abaixei a cabeça e encarei as minhas mãos. – Foi uma briga boba e... depois aconteceu tudo isso. – Eu ainda tentava entender. – Eu sei que ele teve a melhor das intenções, mas... o que ele estava pensando? Quem é que entra na frente de uma bala por causa de... – Eu ergui os ombros, quando não consegui completar a frase. – Olha, eu não estou julgando ele. Eu sou muito grata pelo que ele fez. Eu mal consigo falar sobre isso sem que os meus olhos se encham de lágrimas. – Eu rolei os olhos, enquanto passava as mãos pelos meus olhos. – O que eu estou querendo dizer é... – Eu respirei fundo antes de continuar. – Será que realmente valia a pena para ele? Será que eu merecia tudo o que ele fez? – Eu estava em conflito comigo mesma.
- , escuta. – pediu, olhando para mim. – Quando uma coisa dessas acontece, você não tem tempo para pensar. Você não pensa se vale a pena ou não. – Ele estava tentando me ajudar. – Na hora, você tem alguns segundos para decidir entre a sua vida e a felicidade de uma pessoa que realmente é importante para você. Neste caso, haviam duas pessoas muito importantes. – deixou de me olhar para olhar rapidamente para . Ele se referia a nós dois. – Eu duvido que ele tenha pensado duas vezes. Eu tenho certeza que ele faria de novo se tivesse a oportunidade. – Ele finalmente completou. Todos os nossos amigos demonstraram comoção. Como eu já venho sofrendo e tentando lidar com isso nas últimas horas, as palavras de serviram para me acalmar ainda mais.
- Quando o sair dessa, eu vou dar uma surra nele por estar me fazendo passar por isso. – resmungou, passando as mãos nos olhos para secar as poucas lágrimas que se acumularam ali. Mesmo estando igualmente emocionados, nossos amigos riram. Me aproveitei da breve distração de todos para me aproximar do meu melhor amigo e abraçá-lo.
- Obrigada por dizer isso. – Eu agradeci durante o abraço.
- Eu estou sempre aqui por você. – correspondeu o gesto de carinho.
- Eu sei. – Eu afirmei, terminando o abraço e olhando em seu rosto. Tentei até sorrir pra ele.
- Não interprete a atitude dele como um sacrifício. Considere como um presente. Ok? Ele te deu um presente. – completou a frase levando uma de suas mãos até o meu queixo e movimentando ele sutilmente de um lado para o outro.
- Ok. – Eu afirmei com a cabeça.
Ficamos mais algumas horas sem notícias. O clima de tensão e preocupação que se estabeleceu naquela sala de espera era algo inexplicável. Todos que estava ali eram muito próximos do , por isso, estavam muito abalados com o que havia acontecido. até tentou nos distrair algumas vezes e também arriscou, mas nada tirava a aflição de todos que estavam ali. Quanto tempo teríamos que continuar esperando por uma boa notícia?
Quando achei que não teria mais que contar a história terrível que tinha acontecido naquela noite, um policial me abordou no hospital. Ele estava em busca de respostas sobre os tiros disparados em meio a uma avenida da cidade. Eu sabia que a polícia acabaria aparecendo, mas eu não achei que seria tão rápido. Ele me fez inúmeras perguntas e eu tive que explicar (novamente) tudo o que tinha acontecido. Para não envolver o Steven na história, eu disse que não sabia quem foi o autor dos tiros. Steven realmente merecia ser preso pelo que ele fez e pela pessoa horrível que ele era, mas para isso, a falsa morte dele deveria ser revelada. Isso afetaria tanto a família de , que não valia a pena. Steven não valia a pena.
Algumas perguntas também foram feitas para o meu pai e o Mark, que confirmaram toda a minha versão, que era completamente verdadeira. Eu apenas omiti o autor da tragédia. O policial também pediu alguns dados e documentos do . Chegou a falar com a mãe dele e com alguns dos nossos amigos. Depois que ele terminou de anotar alguns dados em um papel, ele finalmente acabou com todo o interrogatório quando já era mais de 4 horas da madrugada, mas antes de ir embora, ele me disse algo que me fez entender mil vezes mais a proporção do que tinha acontecido. Sem perceber o quanto aquilo me chocaria, o policial disse: ‘Seu pai teve mesmo muita sorte. Se a altura do ferido for mesma essa que vocês me passaram, o tiro que atingiu o abdômen dele atingiria em cheio o coração do seu pai.’. Isso tornou tudo mil vezes pior e mais grave para mim. Steven tinha mesmo atirado para matar o meu pai. Se o não tivesse entrado na frente daquela bala, ela teria, com certeza, matado o meu pai.
Todos a minha volta pareciam ter superado rapidamente a frase dita pelo policial, outros nem sequer a ouviram, mas ela ficou um bom tempo na minha cabeça. Não que eu já não soubesse disso antes, mas o tinha mesmo salvado a vida do meu pai. Se a bala tivesse acertado o meu pai, ele sequer estaria na situação em que o se encontrava naquele momento. Ele não teria uma só chance. Ele não teria a chance que o está tendo agora. Isso me deixou algum tempo em choque. Me mantive em silêncio para não chamar a atenção de ninguém, mas percebeu a minha inquietação.
- Tudo bem ai? – agachou-se em minha frente. Eu estava sentada em uma das cadeiras e a olhei na mesma hora.
- Sim. Eu só... estou um pouco... fora de órbita. Minha cabeça não para um só minuto. – Eu expliquei da forma que eu pude.
- Talvez seja melhor você descansar um pouco. Eu posso ir com você para casa. Eu... – ia dizendo, mas eu não deixei que ela terminasse.
- Não precisa. – Eu neguei com a cabeça.
- Mas, ... – tentou insistir, mas não conseguiu nada.
- Eu não vou sair desse hospital sem ele. – Eu afirmei com convicção. Ela não questionou a minha decisão, pois me conhecia muito bem.
- Está bem. – concordou. – Mas não fique aqui sozinha. Você vai acabar enlouquecendo. Fica com a gente. – Ela pediu, apontando com a cabeça para os nossos amigos, que conversavam em rodinha em um dos cantos da sala.
- Ok. – Eu concordei mesmo sem querer. Talvez, estar perto deles me faria bem.
- Nenhuma notícia ainda? – me olhou assim que eu me aproximei de todos eles.
- Nada. – Eu disse em tom de lamentação.
- Ok, eu preciso perguntar. – falou mais baixo, olhando rapidamente na direção do Mark. – Sou só eu ou a forma que o Mark está lidando com tudo isso é realmente estranha? – Ele perguntou.
- Ele está mesmo muito mal, não é? – teve que concordar.
- Gente, todo mundo aqui está mal. O que aconteceu é horrível. – disse em tom de bronca.
- Eu sei, mas é que eu não sabia que eles eram tão próximos. – concordou com os garotos. Os questionamentos fizeram Meg me olhar.
- Bem, eles... – Eu não sabia ao certo o que dizer. – Eles se aproximaram muito nos últimos dias. O Mark me ajudou a trazê-lo para o hospital. Talvez, ele só esteja um pouco impressionado. – Eu completei.
- Eu não sabia. – se surpreendeu com o fato novo.
- Tem muitas coisas que vocês ainda não sabem. – Eu mal tinha comentado e já estava vendo uma interrogação em cima da cabeça de cada um deles.
- O médico! – Meg afirmou repentinamente, fazendo com que todos ali esquecessem qualquer pergunta que quisessem me fazer. Eu fui a primeira a abordar o médico. Todos vieram atrás de mim.
- E então, doutor? – Eu perguntei, enquanto tentava encontrar respostas nos olhos dele.
- Como está o meu filho? – A mãe de perguntou com a voz trêmula. Meu coração estava muito acelerado. Parecia que eu ia ter um troço!
- Bom, eu não tenho boas notícias. – O médico disse em tom de lamentação. O coração, que antes estava acelerado, agora tinha paralisado.
- Fala logo, doutor. – o pressionou.
- Como vocês já sabem, o paciente acabou perdendo muito sangue no trajeto até o hospital, o que acabou ocasionando uma forte hemorragia interna. – O médico fez uma breve pausa. Meus olhos estavam fixos nele. – Nós conseguimos conter essa hemorragia antes que ela se tornasse fatal para o paciente, porém, ele encontra-se em coma no momento. – Quando médico terminou a frase, a mãe do Jonas começou a chorar descontroladamente. Ela teve que ser ajudada pelo marido. Meus pais afastaram a do local.
- Em coma? – Mark perguntou visivelmente desolado. De repente, eu tinha perdido o meu chão. Parecia que eu estava caindo lentamente em um buraco fundo e escuro que parecia não ter fim.
- Uma grande perda de sangue é uma das causas de diminuição da atividade cerebral de uma pessoa. A atividade cerebral do amigo de vocês está bem baixa, por isso, foi necessário colocá-lo em coma. Foi realmente uma sorte não termos perdido o paciente. – O médico completou. Todos estavam completamente em choque. Ninguém conseguia chora ou ter qualquer outra reação. – Os aparelhos estão mantendo ele vivo, mas eles não vão poder ajudá-lo por muito tempo. Precisamos encontrar uma rápida solução antes que os aparelhos se tornem inúteis. – As notícias ruins não acabavam, mas uma ponta de esperança surgiu dentro de mim quando eu ouvi a palavra ‘solução’ sair da boca dele.
- E qual é a solução? – Mark também se agarrou nessa esperança com unhas e dentes.
- Doação de sangue. – Como a Meg já sabia a resposta, ela respondeu antes mesmo do médico.
- Exatamente. – O médico confirmou. – Precisamos devolver uma quantidade considerável de sangue ao corpo dele para que a atividade cerebral volte antes que nós a percamos de vez. – Ele completou.
- Bem, isso não é um problema, certo? Nós temos um banco de sangue no hospital. Recolhemos doações diariamente. – Eu afirmei toda cheia de esperança. Eu sabia exatamente do que eu estava falando, pois as doações eram umas das minhas responsabilidades no hospital.
- Sim, nós recebemos, mas, infelizmente, o tipo de sangue que o seu amigo precisa está em falta nesse momento. Ele tem um dos tipos mais raros de sangue. – O médico voltou a lamentar.
- Ele é O Negativo. – Eu conclui ao fechar os olhos por poucos segundos e negar com a cabeça. Senti a pouca esperança que eu tinha abandonar o meu corpo. Quem trabalha com isso sabe o quanto é difícil receber a doação de um O Negativo. Além disso, diferente dos outros sangues, o tipo sanguíneo do era o único capaz de substituir qualquer outro tipo de sangue, mas era o único que era insubstituível, ou seja, uma pessoa O Negativo pode doar sangue para qualquer outra pessoa que tenha o mesmo sangue ou até mesmo tipo sanguíneo diferente, mas só pode receber doação exclusivamente de outro doador O Negativo. Injusto, não é?
- Não pode ser. – Mark recusou-se a acreditar. Parecia até mentira.
- Meu conselho, agora, é que vocês busquem urgentemente por doadores O Negativo. Façam o teste. Talvez, um de vocês seja compatível. – O médico disse. – Façam isso com urgência. – Ele reafirmou.
- Quanto tempo? – Mark perguntou com receio.
- É difícil dizer com exatidão, mas eu diria que... – O médico hesitou algum tempo antes de continuar. – 48 horas. – Ele disse.
- 48 horas? – estava perplexo. Todos estavam muito abalados com as notícias. e haviam se afastado um pouco, pois começaram a chorar.
- Nós vamos conseguir essas doações. – afirmou, tentando ser positivo.
- Ele vai sair dessa. Eu sei que vai. – também tentou ser positivo.
- Isso é tudo. – O médico já tinha dado todas as notícias. – Se eu tiver alguma novidade, procurarei vocês. – Ele disse antes de se afastar. Foi só ele abandonar a sala de espera para que a troca intensa e preocupada de olhares começasse entre todos que estavam ali, exceto eu. Meu olhar estava perdido em qualquer lugar daquela sala, que me parecia cada vez mais escura e fria.
- Não é possível que nenhum de nós seja O Negativo. - tentou dar esperança a todos.
- É bem raro. - Meg ressaltou.
- Eu não sei qual o meu tipo sanguíneo. - ergueu os ombros. E se ela fosse compatível?
- . - me chamou, quando percebeu que a minha cabeça estava longe. - Nós vamos conseguir. - Ele tentou me animar.
- Vocês não entendem. É muito difícil conseguir esse tipo de doação. - Eu não estava sendo pessimista. Eu estava sendo realista. - Ainda mais em tão pouco tempo. - Eu completei, olhando pra todos eles.
- É difícil, mas não impossível. - acrescentou.
- Vamos fazer os exames e descobrir se alguém aqui pode ajudá-lo. - Mark demonstrou agilidade. Ele queria resolver aquilo de uma vez, já que o seu irmão não poderia esperar muito tempo.
- Alguém aqui sabe o seu tipo sanguíneo? - Meg perguntou, aumentando um pouco mais o tom de voz.
- O meu é O positivo. - Meu pai foi o único a se manifestar. Ninguém respondeu, mas todos sabiam que as nossas chances haviam diminuído um pouco.
- Eu… - Eu hesitei algum tempo antes de continuar a frase. - O meu é A positivo. - Eu ergui os ombros como se dissesse: ‘Eu queria muito ajudá-lo, mas eu não posso.’.
- Eu também não posso doar. Eu também sou A positivo. - Meg disse com pesar. A profissão que eu e a Meg havíamos escolhido exigia que soubéssemos esses tipos de informações. Recentemente, até fizemos um trabalho sobre o assunto.
- Que droga… - Mark não conseguiu esconder o nervosismo diante daquelas informações. Alguém ali tinha que ser compatível!
- Ainda temos chance, certo? Ainda sobrou muita gente aqui. - Como sempre, mostrava-se incansavelmente otimista. Ele nunca nos deixava desistir sem antes persistir.
- O tem toda a razão. Vamos fazer os exames de sangue e ver o que acontece. De repente, a salvação de está bem aqui, nesta sala. - Meg seguiu o discurso de mesmo sabendo que a probabilidade de seu otimismo se concretizar era baixa.
- Ok! Ok! Então, quando podemos fazer esse exame de sangue? - tentou agilizar todo o processo. Estávamos perdendo minutos valiosos.
- Bem, nós podemos fazer agora. Eu posso falar com o diretor do hospital e… posso começar o meu expediente agora mesmo. Eu deveria começar a trabalhar daqui algumas horas mesmo. - Eu me prontifiquei a colaborar com as coletas de sangue. Nada mais justo, certo? Além de ter parte da culpa caindo sobre os meus ombros, aquele era o meu trabalho. não merecia nada menos que aquilo.
- Não. Eu faço, . - Meg se aproximou. - Eu sei o quanto tudo isso está mexendo com você e com a sua vida. Você não está em condições de trabalhar. Eu cubro o seu turno nesse sábado e faço as coletas de sangue. - Ela não me deixaria trabalhar naquelas condições em qualquer circunstância que fosse.
- Mas eu… - Eu ia argumentar, mas não me deixaram.
- Mas nada, . - me olhou sério.
- Deixa que ela cuida disso, . - tentou me convencer.
- Não. Eu… - Eu neguei com a cabeça ao hesitar em continuar a frase. Eu sabia que acabaria ficando mal de novo. - Eu não quero e não posso ficar aqui parada, enquanto o está daquele jeito. Eu preciso fazer alguma coisa pra ajudá-lo. Qualquer coisa. - Eu tentei parecer durona, mas a minha voz pouco embargada me entregou.
- Hey. - Mark se aproximou rapidamente antes de qualquer outra pessoa. - Eu devo isso a ele. - Eu disse isso pro Mark, que estava parado em minha frente. Ao m ouvir terminar a frase, ele segurou as minhas mãos.
- Nós vamos conseguir. Eu sei que vamos, mas… enquanto isso, eu preciso de você aqui, do meu lado. - Mark me olhou nos olhos com uma expressão triste. Ele queria sim me convencer a deixar a Meg fazer as coletas de sangue, mas ele também foi honesto em suas palavras, que me tocaram muito. Foi a primeira demonstração de fragilidade dele desde que tudo aconteceu. Mark estava tentando parecer forte nas últimas horas, mas ele deixou um pouco dessa força de lado só para me pedir que ficasse ao lado dele naquele momento tão difícil. Como eu poderia negar?
- Está bem. - Eu afirmei com a cabeça. - Eu fico aqui. - Eu disse olhando pra ele, antes de me aproximar e abraçá-lo. Mark já havia abaixado a guarda por um momento para me fazer aquele pedido e agora, o abraço que eu dava nele quase fez com que ele deixasse todas as suas forças de lado de vez, quase fez com que ele desistisse de ser tão forte.
- Obrigado. - Mark agradeceu ainda durante o abraço e o interrompeu abruptamente antes de ele ficar completamente vulnerável.
- Certo. Eu vou falar com o diretor do hospital e, conforte for, já venho chamar vocês para a coleta de sangue. - Meg avisou antes de se afastar.
Meg demorou um pouco mais de 15 minutos para explicar a situação ao diretor do hospital e convencê-lo de que tratava-se de uma emergência. Ela voltou para a sala de espera com a boa notícia que todos esperavam. Começou a chamar um por um para a sala de exames. A única que não pode fazer o exame de sangue foi a por causa de sua pouca idade.
A mãe do foi a última pessoa a ter o seu sangue coletado. Todos esperavam a Meg para saber se algum dos sangues coletados era compatível ao do . Eu tive que explicar a eles que os resultados demoravam algumas horas para ficarem prontos. Apesar de todos ali estarem aflitos, alguns começaram a demonstrar sinais de sono. dormiu nos ombros de , tirou alguns cochilos no colo de , acabava apagando de tempos em tempos sentado na cadeira e já dormia há algum tempo no colo do pai. Foi só Meg entrar na sala para que todos despertassem, ou melhor, fossem despertados. Quando eu a vi, eu não senti nada além de medo. Eu tinha medo do que eu ouviria. Alguém tinha que ser compatível.
- Os resultados já saíram? - Mark foi o primeiro a abordá-la. Como conhecia bem a sua melhor amiga, tentou conseguir respostas através de seu olhar.
- Saíram. - Meg afirmou, séria.
- E então? - a pressionou. Eu não disse nada. Apenas me levantei e fiquei esperando ela dizer, enquanto mantinha minhas mãos juntas em frente a minha boca.
- Eu acabei de checar o banco de sangue desse hospital e de outros hospitais da região. Todos continuam vazios para O negativo. - Meg começou a dar a notícia. Meu coração estava disparado e as minhas mãos estavam trêmulas. Fechei os olhos por alguns segundos, enquanto negava com a cabeça. Não pode ser. Não é possível!
- Não acredito. - ficou indignado. Todos estavam desolados.
- Mas… - Meg disse e todos voltaram a fazer silêncio e dar a ela total atenção. - Tem uma pessoa aqui que é compatível.- Ela disse e todos os corações voltaram a bater.
- Graças a Deus. - A mãe de comemorou.
- Eu sabia! - suspirou.
- Quem? - queria saber.
- Quem é compatível? - também perguntou. Acho que todos ali apostavam na mãe do .
- O Mark também é O negativo. - Meg disse e todos começaram a abraçá-lo. Eu estava feliz, mas estava em choque. Mark ajudaria a salvar o irmão. Quando eu finalmente cheguei a essa conclusão, meus olhos se encheram de lágrimas. Pela primeira vez, lágrimas de felicidade. De todos ali, Mark era a melhor pessoa para receber aquela responsabilidade. Depois de tudo o que ele passou, ele teria a chance de ajudar a salvar a família que lhe restou. Foi tão bom vê-lo tão feliz com a notícia. Ele até parecia outra pessoa.
- Vamos fazer isso agora. - Mark já queria doar o sangue.
- Ok, pessoal. Acalmem-se. - Meg pediu. - Mark ser compatível, com certeza, é uma notícia maravilhosa e vai aumentar muito mais as chances do , mas infelizmente não será o bastante. - Ela voltou a ficar séria. Conhecendo sobre o assunto, eu já sabia o que ela queria dizer. Uma bomba novamente foi jogada no meio de tantos corações aliviados e esperançosos. Me afastei dela e de todos os outros que estavam em volta dela sem conseguir me conformar.
- Como assim? - arqueou uma das sobrancelhas.
- Não será o bastante? - achou que não tivesse escutado direito.
- A doação não atende o paciente. - Meg disse.
- Traduz, por favor. - e a maioria ali não tinha entendido.
- A quantidade de sangue que o precisa nesse momento é maior do que a quantidade máxima que um doador compatível pode doar, ou seja, o precisa de mais sangue do que o Mark pode doar. - Meg explicou, deixando todos inconformados.
- Ele precisa de mais um doador. É isso? - queria ter certeza de que tinha entendido.
- É isso. - Meg confirmou.
- Não, não. Eu posso doar. Eu quero doar. - Mark estava desesperado.
- Você não pode. Ninguém pode. É uma quantidade muito grande. - Meg tentou explicar.
- Eu não me importo. Se é disso que ele precisa para viver, eu vou dar isso a ele. - Mark começou a se descontrolar. Eu escutava a exaltação dele de longe e aquilo só tornava tudo mais doloroso.
- Mark, se acalma. - Meg pediu, assustada com o comportamento desesperador do melhor amigo. - Vamos esperar. A doação pode vir de outra pessoa. Todos os hospitais da região estão sabendo da nossa necessidade. - Ela tentou mostrar que ainda havia esperança.
- E se não houver outra doação? Ele vai morrer? - Mark não conseguia se acalmar. - Eu vou deixar ele morrer? É isso? - Todos estavam muito comovidos com a reação angustiante de Mark mesmo sem saber que ele era irmão do , especialmente sua mãe. As palavras e o desespero dele me fizeram tomar uma atitude.
- Mark, vem comigo. - Eu segurei a mão dele e comecei a afastá-lo de tudo e de todos. Ele precisava se acalmar.
- Eu tenho que ajudá-lo, . Ele é o meu irmão. Eu não posso... - Mark afirmou e pela primeira vez, havia lágrimas em seus olhos. Eu o interrompi.
- E você vai. Você vai ajudar o seu irmão. Nós só precisamos de outra pessoa. - Eu fiz parecer como se fosse algo simples, mas nós dois sabíamos que não era.
- E se não aparecer outra pessoa compatível? O que acontece com ele? - Mark já não estava tão agitado. Ao final de sua pergunta, ele ficou me olhando, esperando pela resposta que eu não era capaz de dar. Continuei olhando pra ele e neguei com a cabeça, como se dissesse: ‘Não vou dizer.’. Ele entendeu perfeitamente o que eu quis dizer. Mark também balançou a cabeça negativamente e deixou de me olhar para encarar o chão.
- Mark… - Eu me senti na obrigação de consolá-lo. Me aproximei, levei uma das mãos até o seu rosto e o levantei, fazendo com que ele voltasse a me olhar. - Vai dar tudo certo. Vai ficar tudo bem. Ele vai ficar bem. - Eu disse, olhando em seus olhos. As lágrimas ainda estavam acumuladas nos olhos dele, que ficaram algum tempo me encarando.
- O que acontece? - Mark finalmente voltou a dizer alguma coisa. - O que acontece se eu resolver doar todo o sangue que ele precisa? - Ele quis saber. Ele estava calmo, mas muito triste.
- Isso não é uma opção. - Eu o olhei mais séria. Eu jamais deixaria que ele fizesse aquilo.
- Me diz. O que acontece? - Mark insistiu na pergunta. Hesitei um bom tempo antes de responder.
- Existem muitos riscos. Você pode ter uma parada cardíaca, um AVC ou uma hemorragia irreversível. Você até pode ficar na mesma situação em que o está agora, mas… você também pode só ficar desacordado por algumas horas. - Eu finalmente respondi. - É relativo. Cada pessoa reage de um jeito a perda repentina e excessiva de sangue. Para alguns, as consequências são fatais, para outros, as consequências são simples. Não dá pra dizer com certeza, mas é muito arriscado. - Eu disse, séria.
- Eu não tive a chance de salvar a minha mãe, mas eu tenho a chance de salvar ele, a única família que me restou. - Uma lágrima solitária escorreu pelo canto de seus olhos, enquanto ele me olhava com tristeza.
- Nós vamos encontrar uma outra maneira de salvá-lo. - Eu sequei a sua lágrima e aproveitei para acariciar o seu rosto.
- Não há outra maneira. - Mark negou com a cabeça.
- Talvez, tenha... - Eu disse e o olhar dele mudou repentinamente. Ele passou a me olhar de outra maneira.
- Você tem alguma coisa em mente? - Mark me olhava com desconfiança.
- Na verdade, eu tenho. - Eu sabia que poderia me arrepender daquilo mais tarde, mas se fosse para salvar o , tudo bem.
- O que? O que é que pode salvar o ? - Mark estava muito curioso. Qualquer ideia seria boa o bastante.
- Não é o que e sim… quem. - Eu não sabia qual seria a reação dele.
- De quem você está falando? - Mark mal piscava.
- Mark… - Eu neguei com a cabeça. Poderia ser a pior ideia de todas, mas ela também poderia salvar a vida do . - Você e o são O negativo. - Eu achei que ele entenderia.
- E o que isso quer dizer? - Mark não tinha entendido.
- Isso quer dizer que, cientificamente falando, existe uma possibilidade do Steven também ser O negativo. - Eu disse e ele ficou completamente sem reação. Me olhou, sem conseguir dizer nada. - Talvez, ele seja o doador que pode salvar a vida do . - Eu completei. Seria essa a chance de Steven se recompor diante dos filhos? Pra mim, ele não tinha salvação.
TROQUE A MÚSICA:
- O Steven? - Mark repetiu em voz alta. Se repetisse, talvez acreditasse dessa vez. - Não. - O desespero no rosto dele desapareceu. Não era por que ele tinha encontrado uma solução para o seu problema, mas sim porque agora ele tinha um outro problema. - Não pode ser. - Ele chegou a sorrir, achando que tratava-se de brincadeira.
- Não é certeza, mas existe uma chance. - Eu ergui os ombros. - De repente, ele pode ajudar o . - Eu disse com esperança. Ele deixou de me olhar e encarou o chão. - Mark, talvez ele possa salvar o . - Eu disse mais uma vez. Ele parecia não ter escutado da primeira vez.
- Não. - Mark afirmou assim que eu terminei a frase.
- O que? - Eu indaguei e ele levantou o rosto pra me olhar.
- Eu disse não. - Mark foi frio e calmo em sua resposta.
- Mas se não tivermos outra saída… - Eu ia dizendo e ele me interrompeu.
- Eu prefiro doar todo o meu sangue pro do que pedir a ajuda desse cara. - Mark demonstrou muita irritação ao falar do pai.
- Não fala isso nem brincando. - Eu o julguei com o olhar.
- Então, precisamos encontrar outra solução. - Mark estava mais do que decidido. Não havia qualquer margem de dúvida ou hesitação.
- Está bem. Nós vamos encontrar outra solução. - Mesmo não concordando, eu jamais discutiria aquele assunto com ele. - Ok? - Eu percebi que ele ainda estava incomodado com o assunto de seu pai. Me aproximei e toquei o seu ombro. Ele me olhou. - Vamos dar um jeito nisso. - Eu me aproximei ainda mais e coloquei meus braços em volta de seu pescoço e o abracei. Ele correspondeu ao abraço, mas ainda teve um pouco de dificuldade de deixar a inquietação de lado.
- Ok. - Mark afirmou, me abraçando mais forte e reconhecendo que eu estava apenas tentando ajudar.
Ficamos algum tempo abraçados. O abraço fez com que Mark voltasse ao seu estado normal. Ele conseguiu se acalmar. O abraço também me fez bem, mas não foi o bastante para me dar a tranquilidade que eu precisava. A ideia absurda que o Mark tinha cogitado há alguns minutos tinha me assustado muito e, para ser bem honesta, eu não duvidava que ele realmente fizesse aquilo pelo . O jeito que ele falou e o tom desesperador fez tudo parecer mil vezes mais real. Fiquei feliz por ter conseguido acalmá-lo, mas aquilo ainda me preocupava.
Passamos o resto do dia naquele hospital. Algumas pessoas tentaram me convencer a ir pra casa para descansar um pouco, mas não conseguiram. Eu precisava sim de um cochilo de 10 horas, mas como eu já disse: nada e nem ninguém me faria sair daquele hospital sem antes ter certeza de que o estava bem.
Ficamos o dia todo sem qualquer novidade. Isso quer dizer que também não tínhamos notícias boas. Meg até tentou saber de alguma coisa e também tentou liberar a entrada de alguém para visitar o , mas não conseguiu nada. Com o início da noite, as esperanças de ter notícias diminuíram ainda mais, já que o turno da Meg tinha acabado e, com isso, não tínhamos mais ninguém que pudesse nos ajudar lá dentro do hospital.
Mais uma noite no hospital. Conseguimos convencer a família de a ir para a minha casa para descansar. Meus pais os acompanharam para garantir de que teriam total conforto. Eles prometeram voltar para o hospital logo pela manhã. Os amigos estavam cansados, mas resolveram ficar no hospital para fazer companhia para mim e para o Mark. Meg chegou a ir para casa por uma ou duas horas, mas voltou logo depois.
Eu estava esgotada e acabada. Eu precisava de um banho demorado e de uma longa noite de sono. Eu também precisava comer alguma coisa, mas quem disse que eu conseguia sequer pensar em comida? Obviamente, haviam consequências, certo? Algumas tonturas e a fraqueza fez meus amigos e o meu irmão me forçarem a comer alguma coisa. nos trouxe algumas coisas da lanchonete e eu e o Mark acabamos comendo.
- Agora que você já comeu, por que não vamos pra sua casa e você toma um banho e… - tentou novamente me convencer.
- Eu não vou sair daqui. - Eu continuei firme e forte.
- , é só por algumas horas. Olha pra você. - disse em tom de bronca.
- Eu estou bem assim. - Eu não cederia tão facilmente.
- Deixa de ser mentirosa. Eu te conheço, garota! - me olhou feio.
- Vamos, ! Vai ser melhor. - foi mais gentil que os outros.
- Eu não quero. - Olhei para ele e neguei com a cabeça.
- , pode ir. - Mark resolveu intervir. - Eu fico aqui. Se eu souber de qualquer novidade, eu te ligo. - Ele disse com um fraco sorriso.
- Eu não vou deixar você aqui sozinho. - Eu afirmei.
- Ele não vai ficar sozinho. Eu fico com ele. - Meg prontificou-se. Aproximou-se do amigo e sentou-se ao seu lado. - Eu não vou sair do lado dele. Juro. - Ela completou.
- Vai. Tudo bem. - Mark afirmou com a cabeça.
- Ok. - Eu cedi depois de muita hesitação. - Eu vou, ok? - Eu disse, contrariada. - Mas é só o tempo de eu tomar um banho rápido e tirar um cochilo de uma hora. - Eu impus a condição.
- Ótimo. - concordou, aliviada.
- Então, vamos. - queria me tirar logo dali antes que eu desistisse.
- Eu vou ficar com a Meg e o Mark, ok? - disse, sentando-se ao lado da namorada. É claro que ele ficaria com ela.
- Até daqui a pouco. - disse, quando começamos a nos afastar.
- Mark… - Eu o chamei e ele me olhou.
- Eu ligo. Eu prometo. - Mark afirmou antes de eu dizer qualquer coisa. Eu concordei com a cabeça.
Durante todo o caminho até a minha casa, fiquei pensando na hora em que eu voltaria para o hospital. Parecia muito egoísta da minha parte me dar ao luxo de descansar, enquanto o estava naquela cama de hospital e o Mark virava a noite em claro naquela sala de espera. Os dois estavam naquela situação por causa de mim. O que é que eu tinha na cabeça? Mesmo contra a minha vontade, me fizeram tomar um banho e até me colocaram na cama para ter certeza de que eu dormiria. Coloquei o meu celular para despertar dali uma hora. Os meus amigos e o meu irmão aproveitaram o tempo para descansar também. Todos estavam acabados.
Uma hora depois e nem um minuto a mais, eu já estava de pé. Vesti uma calça jeans, all star, uma blusinha simples e uma jaqueta por cima. Sai do quarto e já fui acordando todos os meus amigos, avisando que eu estava voltando do hospital. Eu até falei que eles podiam ficar dormindo se quisessem, mas quem disse que eles aceitaram? Todos se levantaram rapidamente e se arrumaram para voltarmos para o hospital. Quando saímos de casa, meus pais e a família de ainda estavam dormindo. Tomamos cuidado para não acordá-los.
O banho e o breve descanso até que tinham me feito muito bem. Eu estava bem melhor do que antes, mas a minha cabeça continuava a mil. E o medo de chegar no hospital e ter a pior notícia de todas? E o medo de chegar lá e descobrir que o Mark tinha feito uma besteira? E o medo de chegar no hospital e descobrir que o ainda não tinha um segundo doador?
estacionou o carro e fomos todos direto para a sala de espera. Eu estava muto receosa. Quando chegamos na sala de espera, encontramos e Meg cochilando nas cadeiras. A primeira coisa que me veio a mente foi: Mark não estava ali! Meu coração veio parar na boca. Na minha cabeça, eu já estava imaginando as piores tragédias.
- Onde está ele? - Eu perguntei aos dois, que acordaram assustados.
- O que? - me olhou, sem entender.
- O Mark! Onde está o Mark? - Eu já estava surtando.
- Eu estou aqui. - Ouvi a voz do Mark bem atrás de mim e, de repente, eu conseguia respirar de novo. Fechei os olhos por poucos segundos, sentindo um enorme alívio. Eu me virei para olhá-lo e vi que ele segurava um copo de café nas mãos. - Alguma notícia? - Ele estranhou o meu desespero ao procurá-lo.
- Deus… - Eu neguei com a cabeça e fui até ele. - Você me assustou pra caramba. - Eu o abracei e ele correspondeu, sem entender muita coisa.
- Desculpa. - Mark levou algum tempo, mas entendeu qual era o meu medo. - Você está melhor? - Ele referia-se ao meu descanso.
- Muito melhor. - Eu afirmei, terminando o abraço.
- E então, nada ainda? - perguntou ao Mark.
- Nenhuma notícia. - Mark negou com a cabeça.
- Droga. - resmungou.
Ficamos o resto da madrugada esperando por notícias e logo pela manhã a família de chegou. A mãe de mal tinha chegado e já quis saber notícias. Eu tive que dizer a ela que não tinha nenhuma novidade e fui obrigada a vê-la chorar mais uma vez. Aquilo me destruía por dentro. Cada vez que ela tinha suas crises de choro (que eram totalmente compreensíveis, diga-se de passagem), era um enorme tumulto. Alguém tinha que tirar a de perto, outra pessoa tinha que consolá-la, enquanto todos os outros choravam em ver o seu desespero da mãe. Era a pior parte.
Passou a manhã e o início da tarde e ainda não tínhamos sequer visto a cara do médico naquele dia. A desesperadora falta de notícias me fez apelar para o supervisor do hospital. Ele era o meu chefe e eu poderia perder o meu emprego por isso, mas eu tentaria pedir a ajuda dele de qualquer forma. Eu fui atrás dele, enquanto todos os outros ficaram esperando na sala de espera. também se ausentou. Ele foi até o carro para dormir um pouco ou não conseguiria voltar para casa dirigindo naquele dia.
Falei com alguns enfermeiros e médicos até conseguir chegar até o supervisor. Não era tão fácil falar com ele. Ele era um homem muito ocupado, mas era uma boa pessoa. Ele não pode fazer tanta coisa por mim, aliás, ninguém poderia fazer. precisava das doações de sangue e ponto. Não dependia de mais ninguém. Mas a conversa com o supervisor não foi em vão. Eu consegui ao menos uma coisa com aquela conversa.
- E então? - Mark foi o primeiro a me abordar.
- Alguma coisa? - A mãe do Jonas também se aproximou.
- Nada. - Eu neguei com a cabeça, demonstrando lamentar muito. - Mas… - Eu olhei pra mãe do e fiz uma pequena pausa. - A senhora vai poder vê-lo. - Eu dei a notícia e a vi se emocionar, enquanto continuava me olhando.
- Eu vou poder ver o meu filho? - A mãe conseguiu sorrir em meio as lágrimas. Ela queria muito isso desde que havia chegado em Nova York.
- Vai. - Eu segurei a mão dela e devolvi o sorriso. Ela me surpreendeu com um abraço, que de tão forte chegou a me emocionar também.
- Obrigada por tudo o que está fazendo por nós. - Ela me agradeceu aos prantos.
- Não precisa me agradecer. - Eu terminei o abraço antes que eu começasse a chorar. - Vamos? Eu levo a senhora até a UTI. - Eu ainda segurava a sua mão, quando ela afirmou com a cabeça.
- Eu posso ir também? - nos interceptou. Eu e a mãe dela trocamos olhares.
- Não pode, querida. - A mãe acariciou o rosto da garota. - Mas eu falo pra ele que você mandou um beijo enorme. Pode ser? - Ela perguntou e a garota concordou mesmo parecendo decepcionada. - Eu volto já. - Ela afastou-se da filha e voltou a se aproximar de mim. - Podemos ir. - Ela disse.
Levei ela até a UTI e cheguei a ser abordada por um dos enfermeiros que costumava puxar o saco do chefe. Eu disse a ele que o supervisor tinha autorizado a mãe do paciente a fazer a visita e que, se por acaso ele tivesse dúvidas, ele poderia perguntar ao supervisor. Chegamos na porta da UTI e eu encontrei um outro enfermeiro, mas esse era meu amigo.
- Hey. - Eu chamei a atenção dele. - Você pode acompanhá-la até o quarto do Jonas? Ela é a mãe e está autorizada. - Eu disse e ele me atendeu prontamente.
- Você não vai entrar? - A mãe do me olhou, sem entender.
- Não. Eu… - Eu não sabia o que dizer, mas a verdade é que eu não tinha coragem para isso. Eu não tinha coragem de vê-lo. - Eu não posso entrar. - Eu dei a desculpa e ela parecia ter entendido. - Aproveite o seu tempo com ele. - Segurei a mão dela mais uma vez antes de vê-la entrar na UTI acompanhada do enfermeiro. Encarei a porta da UTI como se fosse o meu pior pesadelo. Me afastei de lá e voltei para a sala de espera.
- , vamos ter que ir embora. - se aproximou com uma expressão de lamentação. e os meus outros amigos estavam logo atrás dele.
- Já? Por quê? - Eu questionei.
- Nós temos que trabalhar amanhã bem cedo. - respondeu.
- Se pudéssemos faltar, nós faltaríamos, mas… - ergueu os ombros. Eles não podiam fazer nada a respeito.
- Eu queria muito ficar aqui. Não só por causa do , mas por causa de você… e do Mark também. - , como sempre, sendo um amor.
- Eu sei. - Eu afirmei com a cabeça. - Eu entendo. - Eu completei.
- Você vai ficar bem? - perguntou, preocupado.
- Eu vou… e o também. - Eu sorri, tentando ser otimista.
- Você vai nos ligar, certo? Se você precisar ou... pra dar qualquer notícia. - perguntou.
- Eu ligo. - Eu afirmei.
Todos começaram a me abraçar e a se despedirem de mim. Ouvi muitas palavras de apoio, de consolo e de carinho. Todos eles eram incríveis. Dava pra ver que todos estavam lamentando muito o fato de terem que ir embora, afinal, também é muito próximo de todos eles. Eles estão tão preocupados e angustiados como todos nós. Eles já iam saindo, mas ainda deu tempo de presenciarmos uma cena que nós fez esquecer tudo o que estava acontecendo por alguns segundos. Aconteceu assim que a se afastou um pouco dos meus pais, que cuidavam da garotinha, enquanto o pai dela tinha ido ao banheiro. Ela parou bem ao meu lado e encarou o sem que ele nem percebesse. Na primeira oportunidade, ela se manifestou.
- Ei, garoto. Lembra de mim? - gritou na direção do , que a olhou. Ela olhava feio pra ele. - Eu ainda continuo muito virgem, ok? - Ela disse em tom de irritação. Quem não se lembra do gafe do , que se enrolou todo para explicar para a irmã o que significava a palavra ‘virgem’ e acabou dando a ela um significado novo: linda? lembrava de tudo!
- O que? - ficou assustado. No primeiro momento, ele não se lembrou do ocorrido.
- É isso mesmo! Eu continuo virgem! - reafirmou com raiva. Todos nos entreolhamos e tentamos segurar o riso. ficou desnorteado. Meus pais, que estavam próximos, acabaram escutando e encararam o filho com olhos de julgamento.
- Eu não sei de nada! - afirmou, olhando para os pais. - Essa garota é maluca. - Ele saiu da sala para escapar dos sermões dos nossos pais.
- O que foi que ela disse? - Mark não tinha entendido nada e estava abismado.
- Depois eu explico. - Eu desconversei, negando com a cabeça.
- Garota, você salvou o nosso final de semana. - ainda estava achando graça.
- E você continua não sendo virgem. - também olhou feio para o meu melhor amigo.
- Querida, dessa vez você acertou. - disse um pouco mais baixo, recebendo um empurrão da namorada.
- Vamos logo, vai! - começou a puxar o em direção a saída.
- Me liga! - falou um pouco mais alto antes de sair pela porta. e foram logo atrás.
O momento de descontração foi muito bom pra todos ali. era mesmo uma figura! Quando o pai dela voltou do banheiro e ela ficou algum tempo ao lado dele, meus pais, a Meg e o Mark queriam saber o que tinha acontecido e porque a tinha dito aquilo. Expliquei resumidamente o que tinha acontecido e todos acharam graça, mas foram bem discretos. Mark chegou a dizer que o que a história tinha mesmo a cara do e ele tinha toda a razão.
Voltando a falar sobre o que realmente importava, ficamos algum tempo esperando que a mãe do voltasse da UTI. Ela ficou lá um pouco mais de 20 minutos e quando voltou ela estava extremamente abalada. O que mais a angustiou foi ter que deixar o filho sozinho naquela UTI. Ela queria ficar ao lado dele, mas ela infelizmente não podia. Foi muito difícil consolá-la. Nada do que dissemos a ela parecia suficiente. A única solução que encontramos foi tirá-la novamente do hospital. Estar ali naquele lugar tão pesado e a espera angustiante por notícia estava fazendo extremamente mal a ela. Conseguiram convencê-la a ir para a minha casa para descansar, comer e tomar um banho. Meus pais acompanharam ela e o resto de sua família.
- É muito difícil vê-la desse jeito. - Eu comentei com o Mark com lágrimas nos olhos, ao vê-la sair aos prantos do hospital.
- Eu sei. - Mark, que estava sentado ao meu lado, passou seu braço pelos meus ombros, me trazendo pra mais perto. Com o coração partido, eu apoiei a minha cabeça em um de seus ombros e ele me acolheu. Sua mão acariciava o meu braço, enquanto ele mantinha o total silêncio. Completou o consolo, depositando um beijo em minha cabeça.
Passamos mais uma noite no hospital. Meg nos fez companhia até determinada hora, já que ela tinha faculdade e trabalharia no dia seguinte. Aliás, eu também tinha uma rotina a seguir naquela segunda-feira, mas seria impossível. Eu já tinha decidido que não iria para a faculdade, enquanto tudo aquilo não se resolvesse, mas eu não conseguiria fugir do trabalho, o que não seria tão ruim. Trabalhar significava ficar no hospital, ficar perto do , ter acesso aos médicos, enfermeiros e também às notícias. Era o único lugar em que eu queria estar.
Quando amanheceu, eu saí do hospital e fui até a minha casa para tomar um banho e me arrumar para o trabalho. Demorei quase 1 hora e meia para voltar ao hospital. O meu turno geralmente era durante a tarde, mas o supervisor já tinha me autorizado a entrar logo de manhã. Cheguei no hospital e fui ver o Mark antes de começar a trabalhar. Eu o encontrei dormindo em uma das cadeiras da sala de espera. Me deu uma tristeza enorme vê-lo ali. Eu não queria que ele estivesse passando por isso. De todas as pessoas que passaram pelo hospital, ele foi a única pessoa que não tirou os pés daquele lugar. Eu queria poder poupá-lo de tudo isso.
Comecei a trabalhar eram 8 horas e a primeira coisa que eu fiz foi ir até a sala do médico que estava cuidando do caso do . Ele me atendeu super bem, mas não foi capaz de me dar qualquer notícia boa. Segundo ele, continuava em estado grave, mas estava estável. O quadro de saúde dele não tinha piorado, mas também não tinha melhorado. O médico me alertou que a estabilidade não significava tanta coisa. Nós já sabíamos o que aconteceria ao fim das 48 horas, que ele já havia mencionado. As máquinas que mantinham o vivo não poderiam fazer milagres. O corpo do não aguentaria muito mais tempo sem a quantidade certa de sangue. Era inevitável.
As notícias dadas pelo médico era antigas, mas ainda eram muito dolorosas. Foi impossível não ficar emocionalmente abalada, mas eu consegui me controlar na frente do médico. De qualquer forma, ele percebeu que eu não estava bem com tudo o que estava acontecendo. Ele lamentou não poder fazer tanta coisa por mim.
- Você por ir vê-lo, se quiser. - O médico tentou ajudar de alguma forma.
- Obrigada. - Eu agradeci em meio a um fraco sorriso, mas a verdade é que eu estava visivelmente abalada.
- Desculpe não poder te ajudar. Eu queria muito fazer algo por você. - O médico lamentou.
- Eu agradeço muito por tudo o que o senhor está fazendo. Eu... - Eu hesitei antes de perguntar. - Eu… fico até sem jeito de pedir e incomodar o senhor com isso, mas é algo muito importante e eu acho que o senhor pode me ajudar. - Eu não sabia se conseguiria o que eu queria, mas não custava tentar.
- Claro. Pode falar. Se estiver ao meu alcance... - O médico quis me ouvir.
O médico me ouviu, me entendeu e atendeu o meu pedido sem qualquer hesitação. Ele não era só um bom médico, mas também era uma ótima pessoa. O respeito que ele tinha de todo o hospital era extremo e, por isso, ele tinha algumas regalias. Ele tinha algumas autoridades dentro do hospital que outros médicos não tinham. Eu sabia muito bem de tudo isso e sabia que ele seria capaz de atender o meu simples pedido. Saí da sala dele com o coração extremamente apertado, mas estava feliz com a autorização que eu tinha acabado de receber dele. Fui direto contar para a pessoa mais interessada.
- Mark.- Eu o chamei assim que entrei na sala. Havia outras pessoas na sala, por isso, chamei ele no canto para podermos conversar.
- O que foi? - Mark chegou um pouco agitado. - Aconteceu alguma coisa? - Ele perguntou, me olhando.
- Calma. - Eu pedi a ele. - Ainda não tenho nenhuma novidade sobre o . Eu até falei com o médico, mas não tem nada de novo. - Eu disse e ele suspirou com desanimo. Levou uma das mãos até a cabeça e bagunçou o seu cabelo.
- Quantas horas nós ainda temos? - Mark perguntou, angustiado.
- Algumas. Não dá pra falar com certeza. O médico disse 48 horas, mas pode ser um pouco mais… - Eu ergui os ombros.
- Quantas horas você acha que ainda temos? - Mark reformulou a pergunta. Eu o olhei e neguei com a cabeça. Eu não queria dizer. - Quantas? - Ele insistiu.
- Eu diria que… até o fim do dia... no máximo. - Eu quase não consegui dizer com o nó que se formou em minha garganta.
- Deus… - Mark suspirou, negando com a cabeça. - O que nós vamos fazer? - Ele abriu os braços, demonstrando estar totalmente perdido. Afastou-se, enquanto mantinha o olhar fixo em qualquer lugar da sala. Fiquei observando ele de costas por algum tempo, sem saber o que fazer para ajudá-lo.
- Você quer vê-lo? - Eu perguntei ao me aproximar um pouco mais dele. Ele ainda estava de costas pra mim.
- O que? - Mark virou-se repentinamente na minha direção.
- Você quer ver o seu irmão? - Eu perguntei, olhando em seus olhos vermelhos. Não sei se era por causa do sono ou por causa das poucas lágrimas que estiveram acumuladas em seus olhos nas últimas horas.
- Eu… - Mark ficou surpreso. - Eu posso? - Ele aproximou-se de mim com uma outra expressão.
- Pode. - Eu afirmei e consegui ver um fraco sorriso em seu rosto.
- Eu achei que ninguém pudesse entrar. - Mark disse, enquanto tentava não se emocionar.
- Eu conversei com o médico e ele deixou que você entrasse. - Eu expliquei.
- Você… não deveria ter feito isso. - Mark negou com a cabeça e depois a abaixou para encarar o chão por alguns segundos. - Você pode perder o seu estágio por causa disso. - Ele completou. Ele estava visivelmente se segurando para não chorar. Ele ficou comovido com o meu ato, mas tentou disfarçar.
- Hey. - Eu me aproximei dele, parei em sua frente, levei uma das mãos até o seu rosto e o levantei. - Eu não me importo. - Eu neguei com a cabeça, enquanto olhava em seus rostos. - Eu faria qualquer coisa para que você tivesse a chance de vê-lo. - Eu não quis dizer, mas eu tinha consciência de que aquela poderia ser a última vez que ele poderia fazer isso. Ele sorriu com os olhos, que continuavam cheios de lágrimas.
- Ainda bem que eu tenho você. - Mark levou uma das mãos até o meu rosto e o acariciou com um dos dedos.
- Eu queria fazer mais… pra te ajudar. - Eu ergui os ombros.
- Você está ajudando muito mais do que você imagina. - Mark afirmou. - Obrigado por tudo. - Ele agradeceu.
- Não precisa me agradecer. - Eu rolei os olhos, enquanto me recuperava. - Agora, vamos parar com isso. Eu vou te levar até a UTI. - Eu sorri, passando as mãos pelos meus olhos. Ele fez o mesmo. Levei ele até a porta da UTI. Só ao chegar perto daquele lugar, minhas pernas já estremeciam. - É aqui. - Eu disse. - É só entrar. Alguns dos enfermeiros vão te orientar. - Eu disse e ele afirmou com a cabeça. - Fala que… eu mandei um oi. - Eu sorri com tristeza e o Mark me devolveu o sorriso.
- Eu falo. - Mark disse antes de se aproximar e depositar um beijo carinhoso em minha testa. - Eu nunca vou esquecer o que você está fazendo. - Ele disse, me fazendo ficar emocionada de novo. Eu nem consegui agradecê-lo. Ele entrou na UTI antes que eu tivesse forças para isso.
Mark entrou na enorme sala, que deveria ter umas 10 ou 15 camas (ou leitos, como costumam ser chamados). Cada leito era cercado por uma cortina. Algumas estavam fechadas, outras não. Mark não sabia por onde começar a procurar o seu irmão. No momento, não tinha um enfermeiro por perto para ajudá-lo. Os olhos receosos procuraram primeiro nos leitos que estavam com as cortinas abertas. Ele olhou em volta e não encontrou o irmão. Com isso, soube que o estaria em um dos leitos fechados. Mark se aproximou de alguns leitos, que podiam ser identificados através de fichas que continham os dados do paciente. Depois de procurar por alguns segundos, leu o nome do irmão na quinta ou sexta ficha. Devolveu a ficha no lugar e encarou a cortina azul-claro que, no momento, era o que separava ele de seu irmão. Tocou a cortina com receio e a abriu devagar. A expressão em seu rosto mudou quando ele viu o irmão completamente intubado. Havia aparelhos por todos os lados. As mãos dele começaram a tremer e ele deu alguns passos para se aproximar da cama. Dali, ele yinha uma visão melhor do que seria a pior cena que já tinha visto em toda a sua vida.
- Hey, cara. - Mark conseguiu dizer. Sua voz quase não saiu. Ele deixou de olhar no rosto de para olhar o resto de seu corpo. - É estranho te ver assim. - Ele disse. - Há menos de um mês, eu nem me importava se você estava vivo ou morto. Agora, ver você assim é provavelmente a cena mais assustadora da minha vida. - Ele falava como se o irmão estivesse escutando. - Tão pouco tempo e eu já fiz besteira. - Mark negou com a cabeça. - Eu deveria estar lá com você. Eu disse que nós faríamos isso juntos, não disse? - Os olhos já estavam marejados. - Eu nem deveria ter te envolvido nisso. Esse era o meu trabalho! Protegê-la era o meu trabalho, não o seu. - Algumas lágrimas finalmente escorreram de seus olhos. - Eu é quem deveria estar deitado nessa cama. Isso… não é justo. - Mark não percebeu, mas ele também estava desabafando. - Tantas pessoas estão sofrendo por causa da sua situação. Se o pior te acontecer, tantas pessoas vão ser afetadas. - Ele lamentava. - Seria tão mais fácil se fosse comigo. Eu não tenho tantas pessoas quanto você. Poucas pessoas sofreriam, porque… essas poucas pessoas são... tudo o que eu tenho. Como… você. - Mark passou uma das mãos em seu rosto para secar as lágrimas que haviam escorrido.
- Eu sinto muito, . Eu sinto muito se eu não fui o irmão que você esperava que eu fosse. Eu acho que não sou muito bom nisso. - O choro se intensificou, quando ele se desculpou. - Isso é novo pra mim, mas… eu gosto do que nós estávamos construindo. Eu gosto do fato de… não estar mais sozinho. Eu já estava até pensando no que eu deveria te dar no seu aniversário. - Ele sorriu em meio as lágrimas e fez uma pausa mais longa. Foi difícil continuar. - Eu não quero que isso acabe, . Você é o meu irmão mais novo e eu ainda nem tive a chance de te ensinar algumas coisas. Nós ainda nem passamos um feriado de ação de graças juntos. - Novamente um fraco sorriso surgiu em seu rosto. Mark realmente nunca tinha tido um feriado de ação de graças decente, por isso era tão importante pra ele. - Me desculpa, mas… isso, tudo isso… é uma coisa que eu não consigo aceitar. - Ele voltou a ficar mais sério. - Eu não consigo aceitar que eu vou perder outra pessoa sem conseguir fazer nada a respeito. Eu sei que já passei por isso algumas vezes e que eu já deveria estar acostumado, mas… cada vez que acontece parece que é pior. - O choro silencioso e sorrateiro voltou. As lágrimas escorriam dos olhos do Mark, enquanto ele encarava o irmão. - Eu quero muito te ajudar, mas… eu não sei o que fazer. Eu não sei mesmo o que fazer, cara. - Mark apoiou as mãos na beirada da cama, abaixou a cabeça e encarou o chão.
Os segundos em que o Mark ficou ali de cabeça baixa, chorando silenciosamente foram longos. Ele estava tentando se acalmar. Ele estava tentando não ceder àquele sentimento ruim e desesperador de perda que ele já tinha sentido outras vezes. Se lembrou das pessoas que ele perdeu e da chance que nunca teve de fazer alguma coisa por elas. Ele sabia bem que o tempo de estava acabando e que a chance de fazer alguma coisa sobre aquilo também estava. Mark tinha duas claras opções para tentar resolver o problema: pedir a ajuda de Steven ou doar para o todo o sangue que ele precisava. Nenhuma das opções pareciam boas. Uma delas envolvia o seu orgulho e a outra envolvia a sua vida.
- O que eu faço? - Mark perguntou em voz alta, mas a cabeça continuou baixa. - Me diz o que eu faço, cara? - Ele fechou os olhos, pois já não aguentava chorar. Voltou a ficar em silêncio e manteve os olhos fechados, enquanto algumas memórias passavam por sua cabeça. Os momentos que ele tinha passado com o nas últimas semanas surgiram em sua mente. Essas memórias pareciam que tinham surgido com o propósito de encorajá-lo a tomar uma atitude. Mark levantou o seu rosto e olhou novamente para o irmão. - Você… provavelmente vai me odiar por isso. Eu sei que vai, mas… eu preciso te tirar dessa. - Ele disse com a voz mais decidida. - Eu vou te tirar dessa. - Mark afirmou com a cabeça. - Aguenta só mais um pouco. Seja forte, irmão. Eu vou resolver isso. - Ele colocou uma das mãos sobre o peito do irmão e deu dois leves tapinhas. - Eu vou dar um jeito nisso. Eu prometo. - Mark sorriu com tristeza ao olhar para o irmão pela última vez.
Mark saiu do leito com os olhos marejados, mas com uma determinação que nunca tinha tido antes. Enquanto caminhava em direção a porta da UTI, passou um dos braços pelos olhos e secou as lágrimas que insistiam em permanecer em seu rosto. Sabendo que não tinha tanto tempo, Mark passou a andar mais depressa pelos corredores do hospital. Por sorte, acabei cruzando com ele em um desses corredores. Eu parei pra falar com ele e saber como tinha sido com o , mas ele passou direto por mim. Olhei pra trás e o vi passando pela saída do hospital. O fato me alertou na mesma hora e me fez ir atrás dele. Andei rapidamente em direção a saída do hospital e olhei para os lados para procurá-lo.
- Mark! - Eu o vi entrando em seu carro. Ele nem sequer me olhou. - Mark!! - Eu gritei mais alto, quando o vi saindo com o carro. Aonde ele estava indo daquele jeito? Mark tinha me escutado chamá-lo, mas sabia que se eu soubesse o que ele estava prestes a fazer, eu tentaria impedi-lo.
O jeito, a pressa e a determinação de Mark me fizeram ficar apavorada. Eu tinha toda a certeza do mundo que ele faria besteira. Esse era o único motivo para ele ter me ignorado daquele jeito. Independente do que fosse, eu sabia que algo muito ruim aconteceria. Uma sensação estranha invadiu o meu corpo. O meu coração ficou apertado e as minhas mãos começaram a suar frio de uma hora pra outra. Eu sabia que tinha que fazer alguma coisa, mas eu não sabia nem por onde começar. Pra onde ele tinha ido? Como eu vou achá-lo, agora?
Mark sabia exatamente o que fazer e para onde ir. O tempo limitado fez com que ele dirigisse feito um maluco pelas ruas de Nova York. Passou sinais vermelhos e andou a velocidades jamais permitidas dentro de uma cidade movimentada como Nova York. Ele praticamente teve que atravessar a cidade para chegar ao seu destino e quando chegou, não hesitou um só momento. Estacionou o seu carro em frente da casa do Steven e andou rapidamente até a porta da casa, onde bateu 3 vezes seguidas. Um rosto desconhecido atendeu a porta, mas isso não intimidou nem um pouco Mark.
- Pois não? - Um rapaz, que deveria ter a mesma idade ou talvez fosse um pouco mais velho que o Mark.
- Onde ele está? - Mark passou pela porta, empurrando o rapaz que havia aberto a porta. Adentrou a casa e não demorou para encontrar o pai, que mostrou-se surpreso ao vê-lo.
- Mark? - Steven não achava que voltaria a receber a visita do filho.
Eu ainda estava no hospital e a angustia já tinha tomado conta de mim. Uma parte de mim achava que o Mark tinha ido arriscar a sua própria vida para salvar o irmão e a outra parte, a parte esperançosa, achava que ele tinha ido atrás do Steven. De qualquer maneira, as duas opções me assustavam muito, porém, elas não me desencorajavam a tomar uma atitude. Eu tinha que fazer alguma coisa.
- ? - Meg estranhou ao me ver parada na porta do hospital. Minha mente estava distante e os olhos perdidos.
- Meg! - Eu fiquei extremamente feliz e aliviada em vê-la.
- O que foi? - Meg me olhou, sem entender. - O que aconteceu? - Ela perguntou.
- Eu preciso que você fique no meu lugar aqui no hospital por um tempo. É muito importante! - Eu olhei pra ela praticamente implorando.
- Eu fico, mas… o que… - Meg ainda estava confusa.
- Obrigada, Meg. Muito obrigada. - Eu tirei o meu jaleco na mesma hora e entreguei nas mãos dela. Eu me afastei rapidamente, sem que ela tivesse chance de me fazer novas perguntas.
Eu não pensei. Eu não pensei em nada. Eu não pensei no que eu estava fazendo. Eu não pensei no que realmente estava em jogo. Eu não pensei nos riscos. Eu não pensei que eu estava indo por livre espontânea vontade até a casa do homem que tinha me sequestrado e que tinha tentado matar o meu pai há poucas horas. Eu só sabia que eu tinha que agir rápido. Eu sabia que a única pessoa que poderia intervir em qualquer besteira que o Mark tentasse fazer era eu, simplesmente porque eu era a única pessoa que sabia o que estava passando pela cabeça do Mark. Eu era a única pessoa que sabia o que ele realmente estava sentindo. Eu era a única pessoa que poderia salvá-lo.
- Esses caras… - Mark olhou friamente pro pai e depois para os dois caras que estavam na sala com eles, um deles era o rapaz que tinha aberto a porta. - Não me diga que também são os seus filhos. - Ele ironizou. Sua vontade era lhe dar uns bons socos. Steven manteve-se sério. Estava bem claro que os dois homens tratavam-se de capangas. Eles provavelmente faziam todo o trabalho sujo pro Steven.
- O que… - Steven tinha medo de concluir a pergunta. - O que aconteceu pra você ter vindo até aqui? - Ele achou que algo pudesse ter acontecido ao .
- Você está perguntando sobre o tiro que você deu no seu próprio filho? Essa é a sua maneira torta e nojenta de perguntar sobre ele? - Mark não ficou tão surpreso com a atitude do pai.
- Ele está bem? - Steven ignorou os insultos e finalmente perguntou. A simples pergunta foi suficiente para acabar com a pouca paciência que o Mark ainda tinha. Os dois rapazes olhavam a conversa entre pai e filho sem dizer nada.
- Eu deveria te matar aqui e agora. - Mark disse. Existia mais ódio em seus olhos do que em suas palavras. Os dois capangas reagiram imediatamente e Mark estava pronto para enfrentá-los, mas Steven os impediu de se aproximarem do filho.
- Não. Eu resolvo. - Steven pediu que se afastassem. - Podem sair. - Ele deu a ordem antes dos dois caras saíssem da sala.
- Me fala. Como ele está? - Steven insistiu.
- Você está preocupado? É um pouco tarde pra bancar o pai preocupado, não acha? - Mark arqueou uma das sobrancelhas ao encará-lo.
- Eu não queria acertá-lo, ok? O tiro não era pra ele! Foi um acidente! - Steven reagiu na mesma hora.
- ACIDENTE? - Mark gritou, furioso. - Foi acidente você estar no mesmo lugar em que a e o pai dela estavam? Foi acidente você estar segurando a porcaria de uma arma? Foi acidente você apertar o gatilho? - Ele esbravejou.
- Pare de me acusar, garoto! Eu não sou esse monstro que você acha que eu sou! Eu jamais teria coragem de machucar o meu próprio filho! - Steven continuou se defendendo.
- E você acha que matar o pai da garota que ele ama ia deixar o seu filho orgulhoso? Como acha que ele se sentiria sabendo que todo o sofrimento da garota que ele ama foi causado pelo pai dele? Hein? - Mark cuspiu as palavras na cara do pai. - Me fala, Steven! Me fala como você evitaria o sofrimento do seu filho fazendo alguém que ele ama sofrer! - Ele pressionou o pai.
- Você não entende! Isso começou muito antes de todos vocês. - Steven desconversou, fingindo que as palavras ditas por Mark não tinham desmoralizado ele.
- Ah, você está falando sobre a sua vingança idiota e patética? Você está falando sobre o que te manteve vivo todos esses anos? Sobre… se vingar e machucar a família da ? - Mark perguntou retoricamente. - Meus parabéns. Você conseguiu. Eles estão todos sofrendo! Eles estão sofrendo porque o seu filho está em uma cama de hospital entre a vida e a morte. - Ele fez uma breve pausa. - Você queria destruir a vida da ? Você também conseguiu. Foram incontáveis as vezes que eu a vi chorar nas últimas horas por causa do que você fez com o e se o pior vier a acontecer com ele, eu não sei quanto tempo ela vai conseguir viver com a culpa que ela sente que, na verdade, é toda sua. - Mark fez questão de apontar o dedo pro pai. - Você também queria que a deixasse de ficar entre mim e o , não queria? Bem, ela não vai poder ficar entre nós dois se o morrer. - Ele sabia que estava pegando pesado e estava fazendo de propósito.
- PARE! - Steven já não aguentava ser torturado.
- Não é incrível como você sempre consegue o que quer, Steven? - Mark ignorou o pedido do pai.
- Foi por isso que você veio até aqui? Foi pra me acusar? Foi pra jogar em cima de mim toda a culpa que eu já carrego? - Steven perguntou, abalado.
- Não. - Mark engoliu seco. - Eu vim aqui pra te dar a chance, a última chance de agir como o pai que você nunca foi. - Ele ainda estava lutando contra o próprio orgulho.
- Do que você está falando? - Steven demonstrou curiosidade.
- O está em coma. Ele perdeu muito sangue. - Mark estava falando aquilo com muito sacrifício. Ele não queria estar fazendo aquilo. - Ele precisa de sangue. - Ele continuou explicando.
- O próprio hospital pode ajudá-lo com isso. A doação de sangue é algo muito comum nos dias de hoje. - Steven achou que estava dando uma solução ao problema.
- Acontece que ele tem um dos tipos sanguíneos mais raros. O negativo. - Mark respondeu. É claro que ele percebeu o estranho comportamento do pai quando ele ouviu o tipo sanguíneo do . - Eu descobri que eu também sou O negativo e eu estava disposto a doar o meu sangue pra ele, mas a quantidade de sangue que ele precisa é maior do que a quantidade que eu posso doar. - Mark estava mantendo-se forte.
- Ele precisa de mais um doador. - Steven concluiu visivelmente transtornado.
- É, ele precisa. - Mark afirmou, tentando traduzir a expressão em seu rosto. - Nós procuramos em todos os lugares e em todos os hospitais. Não encontramos ninguém compatível. Foi então que eu recebi uma informação importante. Adivinha? - Ele encarou o pai. - O fato de eu e o sermos irmãos por parte de pai e termos o mesmo tipo sanguíneo significa que existe uma chance, uma grande chance do nosso pai também ser O Negativo. - Mark disse vendo o pai soar frio. - Com isso, teríamos o segundo doador e conseguiríamos salvar o meu irmão. - Ele concluiu. - A única coisa que nos resta saber agora é: o seu tipo sanguíneo também é O Negativo? - Mark cerrou um pouco os olhos ao encarar o pai.
- Eu não… - Steven estava muito estranho. - Eu não sei. - Ele demonstrava muito nervosismo. A resposta do pai foi suficiente para fazer Mark odiá-lo mais do que nunca. Só pela reação e atitude do pai, ele sabia que Steven estava mentindo. Mark sentiu vontade de acabar com ele ali mesmo.
O táxi finalmente chegou até a casa do Steven. Eu senti meu corpo estremecer só ao olhar para aquela casa, que me trazia tantos traumas que eu levaria para o resto da minha vida. Eu prometi para mim mesma que nunca mais passaria perto daquele lugar e... ali estava eu. Hesitei algum tempo antes de sair do carro e só sai porque vi o carro do Mark estacionado logo ali na frente. Paguei o motorista e ele partiu, me deixando sozinha naquele lugar. Eu estava muito assustada por estar ali. Eu estava assustada por saber que eu estava perto do Steven novamente.
Levou algum tempo até que eu tivesse a coragem de me aproximar da porta. Minhas mãos tremiam tanto que eu não conseguia controlar. Steven era definitivamente o maior trauma da minha vida. Meu corpo reagia de um jeito estranho e anormal só ao ouvir falar o nome dele. Minhas pernas estavam bambas. Eu mal sabia como eu tinha conseguido chegar até a porta. Eu estava muito nervosa. Meu coração parecia que ia sair pela boca. Eu não acredito que eu realmente estava fazendo aquilo. Eu não acredito que eu estava prestes a encarar o Steven novamente.
- É mesmo, Steven? Bem, eu sempre soube que o tipo sanguíneo é algo muito importante para os soldados que vão lutar pelo nosso país na guerra. Ouvi dizer, inclusive, que cada soldado tinha o seu o tipo sanguíneo escrito em sua própria farda. - Mark estava sendo irônico e frio. Era a maneira que ele encontrou para não explodir. - Você já esteve lá, não é, Steven? - Ele estava referindo-se a época em que o Steven serviu ao exército.
- Eu já disse que não sei. - Steven foi mais rígido. - Eu nunca fui muito atento a esse tipo de detalhe. Eu não… lembro. Eu não lembro de nada. - Ele tentou melhorar a desculpa.
- Eu vou perguntar mais uma vez. - Mark estava muito indignado com a reação de seu pai diante de toda a situação, mas ele continuava mantendo-se calmo. - Você é O Negativo? - O seu tom de voz já demonstrava que ele estava perdendo a paciência.
- Eu já disse. - Steven também tevtava manter a calma.
- Steven, você é O Negativo? - Mark perguntou com um tom mais alto e mais ameaçador. Eu ainda estava parada na porta da casa e ainda estava juntando coragem para batê-la quando eu ouvi a voz de Mark.
- Não! - Steven também aumentou o tom de voz.
- RESPOSTA ERRADA! - Mark gritou, partindo pra cima do pai. Segurou a sua camisa e o olhou furiosamente em seus olhos. Ele tinha certeza que o pai estava mentindo. Ele não aceitava o fato de o pai não queria ajudar o próprio filho. Era inadmissível. Era revoltante. - VOCÊ É O NEGATIVO? - Mark estava disposto a fazê-lo dizer a verdade. Era questão de honra fazê-lo assumir que tinha o mesmo tipo sanguíneo dos filhos e que não queria ajudar o .
Ouvir os gritos de Mark me fez esquecer todo o medo e toda a fraqueza que eu tinha sentido nos últimos segundos. Sabe quando você age por impulso? Sabe quando alguém muito importante precisa de você e você larga tudo pra ir ajudá-lo? Foi o que eu fiz. Em um momento de loucura, eu abri às pressas a porta e adentrei na casa de Steven. A primeira coisa que eu vi foi o Mark segurando o pai pelo colarinho. Steven já demonstrava estar sem ar.
- Mark! - Eu corri imediatamente até eles e toquei o braço do Mark, tentando fazê-lo soltar o pai. - Mark, deixa isso pra lá. - Eu pedi e ele mal me olhou. O ódio com que ele olhava para o pai era assustador.
- Você é a pior pessoa que eu já conheci. - Mark disse com o mesmo ódio. Havia poucas lágrimas em seus olhos. Lágrimas de ódio. - Eu tenho vergonha de ser o seu filho. Eu tenho vergonha de ter o mesmo sangue que você. - Ele continuou disparando contra o pai.
- Mark, por favor. - Eu pedi mais uma vez e ele continuou me ignorando. - MARK! OLHA PRA MIM. - Eu gritei, olhando pra ele. Ele hesitou um pouco antes de me olhar com os olhos marejados. - Deixa isso pra lá. - Eu falei de forma mais calma. - Nós vamos dar um jeito nisso. Só nós dois. - Eu estava olhando em seus olhos. - Nós vamos dar um jeito nisso. - Eu reafirmei com um fraco sorriso. Mark ainda ficou algum tempo me olhando antes de resolver soltar o pai. - Vamos embora. - Eu disse, tocando o seu peito com as minhas duas mãos.
- Seja grato a ela pelo resto da sua vida. Se ela não tivesse aparecido aqui, eu mataria você. - Mark voltou a se dirigir ao pai.
- Matar o seu próprio pai? Logo você que gosta tanto de julgar as minhas atitudes de pai. Me diz: qual é a diferença entre você e eu, garoto? - Steven disse, tentando recuperar o ar.
- Você não é o meu pai. Você não significa nada. - Mark afirmou com serenidade. - Você é só mais um desses lixos humanos com os quais eu tenho que lidar no meu dia normal de trabalho. - Ele se referia aos ladrões, assassinos, traficantes e afins com os quais ele lidava com frequência devido ao seu trabalho no FBI. - A diferença entre você e eles é que você teve uma segunda chance e não soube aproveitá-la. - Apesar da raiva, foi impossível esconder a enorme decepção.
- Eu não posso ajudar. - Steven negou com a cabeça, tentando não demonstrar a tristeza que sentia naquele momento.
- Vamos, Mark. - Eu tentei empurrá-lo e até consegui, mas não por muito tempo.
- Reza, Steven. - Mark gritou em direção ao pai. - Reza pra não acontecer nada com o porque se acontecer, eu juro que volto pra acertar as minhas contas com você. - Ele ameaçou antes de abandonar a casa ao meu lado.
- Vem. Vamos pro carro. - Eu segurei a mão dele e comecei a puxá-lo em direção ao carro dele. Ele entrou e sentou no banco do motorista e eu sentei no banco do passageiro. Eu já ia colocar o cinto de segurança, quando notei que ele encarava o volante do carro em silêncio. Ele estava arrasado.
- Hey… - Eu toquei a mão dele. Eu queria ajudá-lo.
- Eu não acredito que esse cara é o meu pai. - Mark me olhou com tristeza. Os olhos estavam cheios de lágrimas.
- Nós não precisamos dele. - Eu me movi no banco do passageiro, deixando o meu corpo de frente pra ele. Segurei a mão dele e passei a acariciá-la.
- É claro que precisamos. O que nós vamos fazer agora? - Mark perguntou. - Como vamos ajudar o agora? - Ele perguntou com a voz embargada.
- Vai aparecer um doador. Eu sei que vai. - Vê-lo daquele jeito fez as lágrimas voltarem aos meus olhos. Era muito angustiante.
- O próprio filho, . - O choro de Mark aumentou. - Ele não quis ajudar o próprio filho. - Ele completou. Aquilo cortou o meu coração de maneiras incontáveis. A única reação que eu consegui ter foi abraçá-lo com toda a força. Pela primeira vez, ele realmente estava chorando no meu ombro. - Que tipo de pessoa faz uma coisa dessa? - Ele disse durante o nosso abraço.
- Esquece ele. Não vale a pena. - Eu queria muito consolá-lo, mas nada do que eu dissesse seria o bastante. - Olha pra mim. - Eu terminei o abraço e olhei em seu rosto. - Você nunca precisou dele pra nada. Você é a melhor pessoa que eu já conheci. Você não precisou dele pra isso. Você não precisou dele pra ser essa pessoa. - Meus dedos secavam as lágrimas em seu rosto. - Você não precisa dele agora. - Eu completei. - Você sempre resolveu os seus problemas sozinho. Você sempre passou por todas as barreiras que a vida colocou no seu caminho sem ele. Você também vai conseguir passar por isso sem ele. Nós vamos passar por isso sem ele. - Eu corrigi. - Você não está sozinho dessa vez. Eu estou aqui. - Eu disse, enquanto acariciava o rosto dele. Minhas palavras foram acalmando ele aos poucos.
- Obrigado. Muito obrigado por estar aqui. - Mark se aproximou e beijou o meu rosto antes de me dar mais um abraço.
- Eu disse que não ia sair do seu lado, não disse? - Eu disse, enquanto ele ainda me abraçava.
- Você disse sim. - Mark sorriu fraco ao me olhar, depois de terminar o abraço. - Aliás, você se arriscou muito vindo até aqui. Você não deveria chegar perto desse cara. - Mark me deu uma bronca.
- Eu sei disso, mas é que… - Eu hesitei antes de continuar. - É você, sabe? Eu… não podia deixar você sozinho. Eu não podia que você fizesse algo que pudesse se arrepender depois. - Eu ergui os ombros. - Quando eu ouvi os seus gritos da porta, eu não pensei duas vezes antes de entrar e te tirar de lá. - Eu completei.
- Se você não tivesse chegado, eu ia… - Mark negou com a cabeça. Não era necessário continuar.
- Eu sei. - Eu deixei de olhá-lo por alguns segundos. - Mas… vamos deixar isso pra lá, ok? Vamos pensar no que realmente importa agora. - Eu tentei fazê-lo esquecer o que tinha acabado de acontecer.
- Vamos para o hospital. - Mark concordou comigo.
- Não, espera. - Eu evitei que ele ligasse o carro. - Eu vou pro hospital. Você vai pra sua casa e vai tomar um banho. Acredite, isso vai fazer você se sentir muito melhor. - Eu sabia que teria trabalho para convencê-lo.
- Não, não precisa. Eu to bem. - Mark negou, como o previsto.
- Olha, eu sei que você quer ficar perto do . Eu sei que você quer ser o primeiro a saber das notícias, mas você também precisa se cuidar. Só um pouco. - Eu tentei argumentar. - Eu vou chegar no hospital e vou ligar para todos os hospitais da cidade para saber se tem alguma novidade sobre as doações. Eu prometo que te ligo pra dar notícias. - Eu completei.
- Eu não sei se… - Mark ia negar novamente, mas eu o interrompi.
- Por favor. Faça isso por mim. - Eu já estava implorando. - É muito difícil te ver assim. Eu sei que um tempo longe do hospital vai te ajudar muito. - Eu usei o meu último argumento. Ele me olhou, enquanto tentava negar o meu pedido novamente.
- Está bem. - Mark cedeu, contrariado. - Mas por pouco tempo. - Ele ressaltou.
- É o bastante. - Eu sorri fraco.
Mark tinha passado por muita coisa nas últimas horas. Ele estava devastado fisicamente e mentalmente. Ele precisava se afastar um pouco de tudo aquilo, pensar e se acalmar. O que ele quase fez com o Steven demonstrava que o emocional dele estava no limite. Por isso, eu insisti tanto para que ele tirasse algum tempo só pra ele. Nem que esse tempo fosse, apenas, poucos minutos. Ele pode achar que é besteira, mas eu tenho certeza que vai ajudá-lo e que vai dar a ele mais força do que ele já tem.
Fiz questão de acompanhá-lo até a casa dele. Ele insistiu em me deixar no hospital, mas fui mais rápida ao ligar para a companhia de táxi e pedir para que um taxista fosse me buscar na casa do Mark e me levasse até o hospital. Mark me deu mais um beijo e mais um abraço antes de me deixar entrar no táxi. Ele prometeu que voltaria o mais rápido possível para o hospital e me pediu mais uma vez para ligar para ele se eu tivesse qualquer notícia. O jeito que ele me olhou pela última vez deixava claro a angústia que ele sentia por não estar indo ao hospital comigo.
O caminho até o hospital foi o momento que eu tive para respirar e administrar o turbilhão de sentimentos que eu estava sentindo. Além de ter o em uma cama de hospital, eu também tive que lidar com o choro do Mark. Foi muito difícil ver a decepção e tristeza nos olhos dele por causa da atitude fria do Steven. Foi muito difícil ver o desespero do Mark quando chegou a conclusão de que a sua última esperança de salvar o seu irmão tinha sido destruída pelo próprio pai. Foi extremamente difícil me manter forte durante todo o momento. Era muito triste saber que o Steven não sabia reconhecer os filhos incríveis que ele tinha. Era devastador ver o pai virando as costas para os próprios filhos. Eu sinceramente não conseguia pensar em nada mais triste.
Cheguei no hospital totalmente abalada emocionalmente. O que o Steven fez foi assustadoramente frio e traiçoeiro. Eu me sentia suja por ter presenciado a atitude desumana e grotesca que ele teve. Eu não podia imaginar como estava a cabeça do Mark naquele momento. Só em pensar nele e no que ele estava sentindo, eu sentia uma vontade enorme de chorar. Eu precisava MUITO receber uma boa notícia da Meg ou de um dos médicos.
- Oi. - Meg me olhou assim que eu entrei na sala em que costumávamos a trabalhar.
- Oi, Meg. - Eu tentei sorrir, mas foi uma tentativa mal sucedida.
- E então? Resolveu o que você tinha de tão importante pra resolver? - Meg me perguntou ao perceber que eu estava péssima.
- Resolvi. - Eu afirmei com a cabeça sem dar qualquer detalhe. - Obrigada por ter assumido tudo aqui sozinha. - Eu agradeci.
- Tudo bem. - Meg sorriu ao negar com a cabeça. - Eu não sei o que aconteceu, mas o hospital está meio vazio hoje. Eu consegui dar conta de tudo sozinha. Acho que nem perceberam que você saiu. - Ela comentou.
- Eu deveria estar super preocupada com a faculdade e… com o que o supervisor está achando de todas as minhas atitudes e pedidos de favores, mas… eu nem estou conseguindo pensar nisso. Eu estou… - Eu ergui os ombros. Nem foi preciso eu terminar a frase.
- Eu sei. - Meg entendeu o que eu quis dizer. - O que está acontecendo com o está mexendo muito com você. Ele é importante pra você. Eu entendo. - Ela estava tentando me ajudar a desabafar.
- Nós estávamos brigados. - Eu disse em tom de lamentação. Deixei de olhá-la para encarar as minhas mãos. Lá estava eu, segurando o choro mais uma vez. - Eu disse coisas horríveis pra ele. - Eu ainda estava com a cabeça baixa.
- Por que você não vai vê-lo? - Meg perguntou, me fazendo olhá-la.
- Eu não sei se consigo olhar pra ele… daquele jeito. - Eu neguei com a cabeça.
- Você pode ao menos dizer pra ele o que você está sentindo. - Meg continuou me incentivando.
- Ele não pode me ouvir. - Eu ergui os ombros.
- Ele não vai ouvir, mas você vai poder falar. Você vai poder colocar tudo pra fora. Isso vai te ajudar. - Ela aconselhou.
- Talvez me ajude, mas… - Eu hesitei.
- Mas o que? Me dê um bom motivo para você não ir vê-lo. - Meg cruzou os braços e continuou me olhando.
- E se… essa for a minha chance de me despedir? E se for a última vez que eu vou vê-lo? - Só ao cogitar aquela possibilidade, meus olhos já se encheram voluntariamente de lágrimas. - Eu não quero ir vê-lo sabendo que pode ser a última vez. Eu não quero vê-lo por que eu sei que vou ter que me despedir dele, por que eu simplesmente não sei o que vai acontecer. - Eu tentei engolir o choro.
- Se você sente que deve se despedir, se despeça. Se você tem a última chance de vê-lo, então vai vê-lo. Não significa que será uma despedida e nem que essa realmente será a última vez que você vai vê-lo. Significa você fazer algo que vai acalmar o seu coração. Significa você fazer algo que você quer muito fazer, mas não tem coragem e força pra isso. - Meg continuava tentando me incentivar.
- Eu não sei se… - Eu neguei com a cabeça.
- Vai. Eu seguro as pontas por aqui. - Meg me deu todo o apoio e toda a força que eu precisava.
- Eu tenho que… ligar para os hospitais pra saber se tem alguma novidade. Eu disse pro Mark que eu ligaria. - Eu achei que tinha encontrado uma boa desculpa para adiar a minha ida até a UTI.
- Certo, então eu ligo. - Meg resolveu o problema. - Você vai até a UTI e quando você voltar eu já vou ter ligado pra todos os hospitais e vou ter uma resposta. - Ela realmente pensou em tudo. Fiquei algum tempo olhando pra ela, como se dissesse: ‘Sério? Você vai mesmo me fazer ir até lá?’.
- Está bem… eu vou. - Eu disse depois de respirar fundo e engolir o choro. - Eu vou fazer isso de uma vez. - Eu afirmei mesmo sem coragem alguma de sair daquela sala.
- É assim que se fala. - Meg comemorou a minha decisão.
- Espero que quando eu voltar, você tenha uma boa notícia pra me dar. - Eu disse, enquanto eu fui me dirigindo em direção a porta.
- Eu também espero. - Meg sorriu fraco e nos trocamos olhares esperançosos antes de eu abandonar a sala.
Eu caminhei lentamente pelos corredores do hospital, inclusive, peguei o caminho mais longo até a UTI. Eu sabia que seria um choque muito grande e que vê-lo acabaria com o resto do emocional que ainda me restava. A dor, a tristeza, o trauma, o choro e medo de perdê-lo fizeram parte da minha rotina nos últimos dois dias e esses sentimentos pareciam já fazer parte de mim, pois eles já não me incomodavam mais. Eu já tinha me acostumado com eles, mas ver o colocaria tudo em um novo patamar. Eu não sabia se conseguiria ser tão forte.
Encarei a porta da UTI como se ela fosse o meu pior pesadelo e só consegui tomar qualquer atitude quando um enfermeiro a abriu pelo lado de dentro. Ele estava de saída, mas foi gentil em segurar a porta aberta para que eu entrasse. Então, eu tive que entrar.
- Oi, . Veio visitar o seu amigo? - O médico me abordou repentinamente. Eu estava tão avoada, que nem o vi se aproximar. v - Sim, eu… - Eu tentei agir naturalmente.
- Ele está no terceiro leito. - O médico apontou com a cabeça. - Eu preciso resolver alguns problemas. Pode ficar à vontade. - Ele disse e já foi se afastando. Eu nem tive tempo de respondê-lo. Ele saiu, me deixando ali sozinha. Olhei em volta e todos os pacientes pareciam desacordados. Talvez, aquele fosse o momento ideal para sair correndo daquela sala e fingir que nada aconteceu. Eu juro que cogitei essa possibilidade duas ou três vezes, mas desisti depois de ficar algum tempo olhando para o leito em que ele estava, que estava cercado por uma cortina.
Estar na presença dele já foi suficiente para acalmar o meu coração. Era como se o estivesse ali ao meu lado, me acalmando para o que eu estava prestes a fazer. Foi com essa estranha calma, que eu consegui andar até o leito em que o estava. Abri a cortina com receio e antes que eu pudesse ver qualquer coisa, passei por ela e a fechei logo em seguida. Fechei os olhos por poucos segundos e respirei fundo antes de me virar de frente para a cama em que ele estava deitado. Toda a calma que eu sentia deu lugar a uma tristeza imensurável, que tomou conta de todo o meu corpo. Dei alguns passos para me aproximar um pouco mais da cama e poder vê-lo melhor. Os olhos se encheram de lágrimas na mesma hora, mas eu tentei me segurar. Eu não conseguiria ficar muito tempo ali se eu chorasse tudo o que eu precisava chorar.
- Oi, . - Eu disse com um sorriso fraco que surgiu espontaneamente em meu rosto quando eu usei o nosso antigo apelido bobo. - Você me pediu pra não chorar, então eu não vou chorar. - Eu me lembrei da nossa dolorosa conversa a caminho para o hospital. - Eu sei que você não pode me ouvir, mas eu preciso dizer. Eu preciso muito te dizer algumas coisas. - Eu tentei me acalmar ou eu não conseguiria falar. - Eu sei que nós estávamos brigados. Eu sei que eu te disse coisas horríveis que acabaram te estimulando a tomar a decisão de entrar na frente daquela bala. - Eu levei uma das minhas mãos até a dele e a segurei com cuidado. - Eu quero que você saiba que sou muito grata pelo que você fez. Você não sabe, mas quando você entrou na frente daquela bala, você não salvou só o meu pai. Você, de certa forma, também me salvou. - Eu ainda segurava a mão dele, mas meus olhos estavam fixos em seu rosto. - Mas isso não é novidade, não é? Você já me salvou tantas vezes e de tantas maneiras. Eu queria tanto poder retribuir. Eu queria tanto fazer alguma coisa pra te tirar dessa cama. Eu queria tanto sentir de novo a sensação surreal que eu sinto toda vez que você me olha. Eu queria tanto ver mais uma vez aquele sorriso ridiculamente lindo que você dava quando você se declarava pra mim. Eu queria tanto te ouvir cantar a música que você escreveu pra mim. - Os olhos voltaram a ficar marejados.
- Eu queria tanto que você estivesse aqui me dizendo que tudo vai ficar tudo bem. - Uma lágrima solitária escorreu do canto de um dos meus olhos. - Vai ficar tudo bem, não vai? - Eu perguntei retoricamente. O nó em minha garganta estava prestes a me matar. Me aproximei mais de seu rosto, levando uma das minhas mãos até a sua testa, onde eu passei a acariciar. - Quando estávamos juntos, ver os seus olhos fechados assim costumava trazer um sorriso enorme pro meu rosto. Sempre que eu tinha a oportunidade, eu acordava e ficava quietinha, enquanto te olhava dormir. Hoje, olhando os seus olhos fechados, eu só consigo sentir um peso enorme no peito e uma vontade absurda de chorar. - Algumas outras lágrimas escorreram pelo meu rosto, enquanto eu acariciava o seu cabelo. - Você precisa ser forte. Eu preciso que você seja forte porque eu não aceito perder você desse jeito. - Eu neguei sutilmente com a cabeça. - Você pode até sair daqui e optar por ficar com outra garota. Alguém que realmente te mereça. Por mim, tudo bem. Eu vou te entender, mas…te perder assim... Eu não aceito. - Mesmo sabendo que ele não estava me ouvindo, eu estava implorando por algo que ele não tinha controle. Ninguém tinha.
Foi muito, muito difícil vê-lo naquela cama com todos aqueles aparelhos em volta dele. Alguém com quem eu convivi tanto nos últimos anos. Alguém que aos poucos foi se tornando especial e essencial na minha vida. Alguém que eu cogitei tirar da minha vida tantas vezes e que, agora, eu não fazia ideia de como eu viveria sem. Era um sentimento muito intenso e inexplicável. Depois do que o tinha (quase) feito com o meu pai e com toda a história relacionada ao Steven, eu nunca imaginei que me doeria TANTO vê-lo daquele jeito e que eu teria TANTO medo que o pior acontecesse com ele. Incrível como todas as vezes que eu estou prestes a superá-lo e seguir em frente, acontece alguma coisa para me mostrar que eu ainda o amava demais.
- Independentemente do que aconteça, eu quero que você saiba que eu amo você. - Voltei a acariciar o rosto dele, enquanto o olhava com carinho. - Ser amada, não por qualquer um, mas por você, o garoto mais popular da escola, o capitão do time de futebol, o cara que eu mais odiava no mundo, o cara mais ridiculamente charmoso e bonito que eu já conheci foi ,de longe, a coisa mais insana e incrível que já me aconteceu. - As lágrimas escorriam pelo meu rosto sem que eu tivesse qualquer controle. Era um choro tímido, mas muito sofrido. - De todas as coisas que você fez por mim, a melhor delas foi, sem sombra de dúvidas, me amar da maneira que nenhuma outra pessoa será capaz de amar. Obrigada por me amar, . - Eu agradeci com um fraco e triste sorriso. - Eu achei que tivesse vindo aqui para me despedir, mas eu não vou. Eu não vou porque eu sei que você vai conseguir superar tudo isso e se, por acaso, você não superar, eu sei que você vai continuar cuidando de mim de onde você estiver e que você vai estar sempre vivo dentro de mim porque o seu coração vai continuar sempre comigo. Eu prometo. - Eu me aproximei e beijei carinhosamente a sua testa. Fiquei mais algum tempo olhando cuidadosamente cada detalhe no rosto dele. Eu sabia que aquela poderia ser a minha última chance. - Lembra que você me fez prometer que eu não te deixaria sozinho? Ao contrário de você, eu cumpro as minhas promessas. - Eu deixei um sorriso escapar, enquanto eu passava os dedos pelo meu rosto para secar as lágrimas. - Eu não posso ficar muito tempo aqui. Ninguém pode, mas… - Eu coloquei uma das mãos no bolso e tirei de lá a caneta que eu havia guardado. - Eu vou dar um jeito nisso. - Com a caneta em mãos, eu me aproximei de uma das mãos dele e fiz um pequeno coração na parte de cima dela. - Lembra disso? - Eu perguntei retoricamente. - Você não está sozinho. Eu posso não estar aqui, mas o meu coração está. - Eu afirmei antes de depositar um beijo em cima do coração que eu havia desenhado. - Eu vou te esperar na linha de chegada, . - Eu fiz menção a um trecho da música que ele tinha escrito pra mim. - Não me faça esperar, ok? - Olhei pra ele pela última vez antes de abrir a cortina e depois fechá-la. Sai imediatamente da sala ou eu não conseguiria mais sair.
Um estranho alívio. Era isso o que eu sentia. O não havia melhorado e eu não tinha nenhuma garantia de que ele melhoraria, mas falar com ele e poder dizer o que estava entalado na minha garganta foi libertador. Não que eu me sentisse menos culpada pelo que tinha acontecido com ele, mas, pelo menos, eu fiz o que eu sentia que precisava fazer. Eu o vi e eu toquei nele outra vez. O coração que eu tinha desenhado em sua mão me deixou mais calma porque, agora, eu sabia que independentemente do que acontecesse, ele jamais estaria sozinho. Isso foi reconfortante, mas não acabava com a minha angústia e preocupação.
- ! - Meg me encontrou no corredor. Eu estava tão distraída e pensativa, que mal percebi que estava parada no meio de um dos corredores do hospital.
- Oi. - Eu a olhei como se tivesse acordado de um transe.
- Tudo ok? - Meg referia-se a minha ida à UTI.
- Sim, eu estou bem. - Eu afirmei na mesma hora, tentando parecer convincente.
- Que bom. - Meg sorriu fraco. Ela percebeu que eu tinha chorado. - Eu… eu liguei para os hospitais. - Ela disse de maneira receosa.
- Nada? - Eu deduzi só pela cara dela.
- Nada ainda. - Meg afirmou com tristeza.
- Quantas horas já se passaram? - Eu não fazia ideia.
- Um pouco mais que 55 horas. - Meg disse, depois de olhar no relógio.
- Meu Deus. - Fechei os olhos, levando uma das minhas mãos até a minha testa. As 48 horas já tinham passado há algum tempo e o pior poderia vir a acontecer a qualquer momento.
- Vamos esperar. Quem sabe… - Meg ia começar a me consolar, quando o toque do meu celular a interrompeu. Deixei de olhá-la para olhar para a tela do meu celular, que eu tinha acabado de tirar do bolso.
- É o Mark. - Eu avisei antes de atender. - Oi, Mark. - Eu atendi, enquanto olhava pra Meg.
- Você conseguiu alguma coisa? - A voz dele estava péssima.
-Não, eu… - Eu fechei os olhos e respirei fundo antes de continuar. - Eu ainda não consegui nada. - Voltei a encarar Meg, que continuava me olhando com tristeza.
- Ok, então… eu… - Mark parecia um pouco transtornado. - Eu preciso que você venha até a minha casa agora.. Você pode fazer isso? - Ele perguntou. O pedido dele me causou estranheza. Não era ele que viria para o hospital?
- Claro que posso, eu… - A minha preocupação me fez querer atender o pedido dele. Olhei para o meu relógio e vi que ainda faltava um pouco mais de 1 hora para que o meu expediente no hospital acabasse. Olhei pra Meg e na mesma hora ela fez um sinal positivo com as mãos, querendo me dizer que eu poderia ir. Ela cobriria o resto do meu expediente sem problemas. - Eu estou indo. - Eu afirmei, enquanto sorria para a Meg de forma agradecida.
- Estou te esperando. - Foi a única coisa que o Mark disse antes de desligar o telefonema.
- Ele está bem? - Meg perguntou, preocupada com o melhor amigo.
- Eu não sei. Ele… estava estranho. - Eu ergui os ombros, sem saber explicar. - Combinamos de nos encontrar aqui no hospital e agora ele quer que eu vá encontrá-lo na casa dele. - Eu completei.
- Então, vá! Eu dou conta de tudo aqui. - Meg não queria que seu amigo ficasse esperando.
- Obrigada mesmo, Meg. - Eu me aproximei e beijei rapidamente o seu rosto. - Qualquer coisa… - Eu comecei a dizer.
- Eu ligo! - Eu concluiu por mim.
- Obrigada. - Eu agradeci mais uma vez.
Eu sei. É o meu trabalho. É o que eu amo fazer, mas essa parte do meu sonho parece tão insignificante diante das circunstâncias. Não seria diferente se fosse com alguém da minha família ou com algum dos meus amigos. Eu poderia até vir a perder esse estágio no futuro, mas eu não me importava. A única coisa que me importava era estar presente para todas as pessoas que eu amava e que estavam precisando de mim. Mark estava precisando de mim e eu não pensei duas vezes antes de ir até a casa dele para ajudá-lo. Se ele precisa de mim, eu estarei lá por ele. Sempre.
Evitei passar pela sala de espera, onde a família do estava. Eu não tinha boas notícias para dar, por isso, eu preferia não dar notícia alguma. Chamei um táxi, o quarto do meu dia, e fui me encontrar com o Mark em sua casa. Eu não sabia o que esperar. Para ser bem sincera, eu não achei que fosse alguma coisa grave. Quando o táxi parou em frente a casa do meu vizinho, eu paguei o taxista e sai do carro. Andei até a porta e bati na porta algumas vezes.
- Mark? - Eu chamei por ele e a porta foi repentinamente aberta. - Oi. - Eu disse ao olhá-lo. O cabelo ainda estava um pouco molhado por causa do banho e ele vestia outra roupa.
- Oi. - Mark tentou sorrir. Eu me aproximei e o abracei por poucos segundos. - Obrigado por vir. - Ele agradeceu um pouco antes de eu terminar o abraço.
- Tudo bem. - Eu olhei em seu rosto e sorri, negando com a cabeça. Deixei de olhá-lo ao adentrar na casa. Ele fechou a porta logo atrás de mim. Os poucos passos que eu dei me aproximou da sala de jantar que, diferente de outras vezes, não passou despercebida. Os objetos que estavam em cima da mesa me fizeram paralisar. Uma seringa, alguns tubos e bolsas de sangue vazias. Meu corpo estremeceu. - O que são essas coisas? - Eu perguntei, me virando para olhar pro Mark. Ele não me respondeu, mas o jeito que ele me olhou foi mais esclarecedor do que qualquer outra coisa. Eu sabia exatamente o que ele estava planejando fazer. - Não. - Eu afirmei, séria. Ele sabia que eu não o deixaria fazer aquilo. - Você só pode estar maluco. - Eu fiquei muito indignada.
- Escuta. - Mark pediu se aproximando.
- Eu não vou deixar você fazer isso. - Eu o encarei de mais de perto.
- Ele é o meu irmão. - Mark argumentou.
- Isso pode te matar. - Eu não acreditava no que eu estava ouvindo. Aos poucos, o desespero foi tomando conta do meu corpo.
- Isso vai salvá-lo! - Mark alterou o tom da voz, tentando fazer com que eu me acalmasse. Ele percebeu que eu estava surtando. - Eu posso salvá-lo. - Ele reafirmou, me olhando nos olhos. - Eu não pude salvar a minha mãe, . Eu não pude fazer nada por ela e isso dói muito. - Mark disse com muita tristeza, mas conseguiu manter as lágrimas em seus olhos. Já eu, não consegui me segurar ao ouvi-lo falar da tia Janice com tanta tristeza. - O entrou há pouco tempo na minha vida, mas… ele é a única família que me restou. - Os olhos cheios de lágrimas deixaram de me encarar por poucos segundos para encarar o chão. - Me diz: como eu vou viver sabendo que poderia ter salvado ele? - Ele voltou a me olhar.
- Talvez, isso não seja necessário. Talvez, apareça um doador. - Eu tentei um último argumento.
- Qual é! Nós dois sabemos que não vai aparecer um doador. - Ele negou com a cabeça. - Você sabe. - Mark se aproximou e segurou uma das minhas mãos. Com os meus olhos cheios de lágrimas, olhei pra ele e neguei com a cabeça como se dissesse: ‘Eu não quero que você faça isso.’. - Eu já decidi. - Ele afirmou, me fazendo chorar de vez. Ao ver o meu sofrimento, Mark me acolheu em seus braços. Eu o abracei forte e encaixei o meu rosto entre o seu pescoço e o seu ombro.
Nas últimas horas, eu estava tentando me preparar para perder o . Mesmo com muitas esperanças, eu tentava me manter ciente da situação e tentava colocar na minha cabeça e no meu coração que existia a chance de eu perder o cara que eu mais amei até hoje. Eu nunca achei que teria que me preparar para perder o Mark. Eu não estava pronta para perdê-lo. Eu sabia que existia a pequena chance de ele ficar bem, mas era um risco enorme. Ele teria que doar o dobro de sangue que uma pessoa normal e saudável pode doar. Era muita coisa e era muito perigoso. Eu estava aterrorizada.
- Eu estou bem com tudo isso. Eu juro. - Mark tentou me acalmar. - Olha pra mim. - Ele pediu, interrompendo o nosso abraço. - Está tudo bem. - Ele reafirmou e até se esforçou para dar um sorriso, mas os olhos marejados entregavam ele.
- Você é uma pessoa maravilhosa. - Eu disse pra ele em meio as lágrimas. Levei minhas mãos até o seu rosto. - Eu admiro muito, muito mesmo o que você está querendo fazer pelo seu irmão, mas é que… - Eu ia dizer, quando o choro me interrompeu. Minhas mãos desceram até a sua nuca. - Eu não quero te perder. - Eu disse com a voz embargada, enquanto negava sutilmente com a cabeça.
- Eu sinto tanto por ter te colocado nisso, mas… eu não queria ter que fazer isso sozinho. - Mark sentiu poucas lágrimas escorrerem dos seus olhos.
- Por favor, não me peça isso. - Eu pedi em meio às lágrimas.
- Você disse que eu não estava mais sozinho. Então, não me deixe sozinho. Eu preciso de você. - Mark refez o pedido de forma emocionada. Fiquei olhando pra ele por algum tempo tentando administrar o que ele estava me pedindo. Ele queria que eu ajudasse ele com a coleta de sangue. Ele não poderia coletar de si mesmo aquela quantidade alta de sangue. Ele ficaria desacordado antes de terminar.
- Não. - Eu engoli o choro na mesma hora e retirei as minhas mãos de sua nuca. - Eu não posso. - Eu recusei o pedido dele, que era demais pra mim.
- Eu sei que isso pode dar problema pra você no hospital, por isso, ninguém precisa saber. É só você dizer que me encontrou aqui e que chamou a ambulância. - Mark usou novos argumentos para me convencer.
- Não tem nada a ver com isso. Tem a ver com a loucura que você quer cometer. Eu não vou colaborar com isso. - Eu achei que esse meu discurso faria ele mudar de ideia. Eu achei que se eu não o ajudasse, ele desistiria de fazer aquilo.
- Ok, então eu faço tudo isso sozinho. - Mark estava mais do que decidido. Ele doaria o sangue para o irmão de qualquer jeito.
- Você não pode fazer isso sozinho. - Eu sabia que se ele fizesse isso sozinho, ele não sobreviveria.
- E o que eu tenho a perder? - Mark abriu os braços. - Eu te chamei aqui porque eu precisava de alguém que me ajudasse. Eu sei que não vou conseguir me manter acordado até coletar a quantidade de sangue que eu tenho que coletar e, por isso, eu precisava de alguém que impedisse que o resto de sangue que vai me restar seja coletado. Eu precisava de alguém que chamasse uma ambulância. - Ele começou a me explicar. - Mas se você não quer fazer isso, eu entendo. Eu vou fazer do meu jeito. - Mark se afastou de mim, enquanto secava as lágrimas em seu rosto com suas mãos. Eu fiquei parada vendo ele ir até a mesa de jantar e começar a tirar a seringa da embalagem.
Cada hora parecia que eu tinha um ‘novo pior momento da minha vida’. Impressionante. Todas as vezes que eu achava que não podia ficar pior, alguma coisa muito pior vinha à tona. Primeiro o quase atirando no meu pai, depois o tiro que o levou pelo meu pai e, agora, o Mark pedindo a minha ajuda para fazer algo que pode tirar a sua própria vida. Eu, sinceramente, não tinha emocional para mais nada. Eu estava devastada de diversas maneiras ou de todas as maneiras possíveis. Eu não aguentava mais chorar. Eu não aguentava mais sentir aquele medo e aquela angustia que me corroíam por dentro. O que eu realmente queria era entrar em um buraco e ficar lá o resto da minha vida para não precisar sentir mais nada, mas eu não podia. O Mark precisava de mim. Em consideração a tudo o que nós já vivemos e a pessoa incrível que ele é e sempre foi, eu não podia deixá-lo na mão. Mesmo que isso custe a tristeza que eu jamais conseguiria superar. Eu não podia deixá-lo sozinho em um momento como aquele. Além disso, eu jamais o deixaria sozinho para morrer.
- Espera. - Eu disse depois de dar alguns passos e parar ao lado dele. Peguei a mão dele que estava mexendo com os objetos que estavam sobre a mesa e fiz com que ele virasse de frente pra mim. - Você tem certeza? - Eu perguntei, olhando em seus olhos.
- Eu tenho certeza. - Mark afirmou com a cabeça. Eu via medo nos olhos dele, mas eu também via coragem. Quando ele confirmou a certeza, eu respirei fundo e tentei engolir o choro.
- Então, eu te ajudo. - Eu afirmei com tristeza. Mark sorriu com os olhos e aproximou uma de suas mãos de meu rosto, onde ele começou a acariciar.
- Desculpa por ter te colocado nisso. - Ele disse, pois percebeu o quanto eu estava emocionalmente abalada com aquilo. Ele sabia que era pedir demais, mas eu era a sua única alternativa.
- Eu não vou te deixar sozinho. - Eu toquei a mão dele que acariciava o meu rosto e o olhei com carinho. Me aproximei, beijei o seu rosto e o abracei forte. O meu receio era que aquele fosse o nosso último abraço, o que tornou tudo mil vezes mais doloroso. Enquanto eu o abraçava, uma de minhas mãos acariciava os fios de cabelo que estavam próximos a sua nuca. Com os olhos fechados, tentei mentalizar aquele momento para poder guardá-lo para sempre em minha memória.
- Obrigado. - Mark agradeceu, beijando carinhosamente a minha cabeça.
Mesmo sem estar emocionalmente pronta para ajudar o Mark com a coleta de sangue, ele estava com pressa. Ele sabia que o não aguentaria tanto tempo, por isso, quanto mais rápido coletássemos o sangue, melhor. Ainda com lágrimas em meu rosto, eu comecei a preparar a seringa e o tubo que levaria o sangue até a bolsa de sangue, que já continha uma porcentagem de PFC (líquido que evita que o sangue coagule). Com certeza, o Mark tinha conseguido tudo aquilo em um hospital. Por ser do FBI, é bem fácil conseguir determinadas coisas sem qualquer questionamento.
- Onde eu fico? - Mark me perguntou, quando percebeu que já estava tudo pronto.
- Pode deitar no sofá. É melhor. - Eu o orientei e ele foi até o sofá na mesma hora. Me sentei ao lado dele no sofá e comecei a procedimento.
Nada daquilo era surpresa pra mim, pois coletar sangue costumava ser uma das minhas rotinas no hospital, mas daquela vez, em especial, foi extremamente difícil. No começo, Mark ficou tentando me distrair a todo custo. Eu entendi exatamente o que ele estava tentando fazer e, por isso, dei a ele toda a minha atenção. Nós conversamos e trocamos sorrisos e olhares. Estava tudo bem até um pouco depois de eu começar a coletar a segunda bolsa de sangue. A segunda bolsa de sangue já extrapolava o limite de doações, que era de uma bolsa de sangue de 450ml. Portanto, a segunda bolsa de sangue já colocava o Mark na zona de risco e isso ficou mais do que claro para mim. Aos poucos, ele foi ficando cada vez mais quieto e pálido. Os primeiros sinais começavam a aparecer. Acariciei o seu rosto, fazendo com que ele me olhasse.
- Eu estou bem. - Mark tentou me tranquilizar. Tirou a minha mão de seu rosto e a levou até a sua boca para que ele pudesse beijá-la.
- Eu sei que você não está. - Eu afirmei, olhando em seus olhos. - Tudo bem. Você pode parar de se preocupar comigo agora. - Eu sabia que ele estava preocupado comigo e com o meu papel em meio a tudo aquilo.
- Eu não sei fazer isso. - Mark disse e até chegou a sorrir fraco.
- Vai ficar tudo bem, ok? - Eu quis tranquilizá-lo. - Guarde suas energias. - Eu pedi, pois sabia que se ele não se poupasse, perderia a consciência mais rapidamente.
- Eu só… preciso que você me prometa uma coisa. - Mark pediu com um pouco de dificuldade.
- Prometer o que? - Eu dei a ele minha total atenção.
- Você não vai parar. - Mark me olhou, sério. - Independentemente do que aconteça, você não vai parar. Você vai coletar todo o sangue que ele precisa. - Ele completou e logo notou a minha hesitação. - Me prometa. - Mark insistiu.
- Eu não vou parar. Eu prometo. - Eu disse o que ele queria tanto ouvir. O olhar, que antes estava apreensivo, agora, estava calmo. Ele parecia me agradecer.
Eu fiquei o tempo todo ao lado dele. Eu o vi ficar cada vez mais pálido. Eu o chacoalhei a cada piscada de olhos mais longa que ele dava. Eu segurei o choro quando vi a respiração dele ficar gradativamente mais fraca. Eu senti meu coração apertar a cada gota de sangue que enchia aquela segunda bolsa de sangue. Eu quis desistir de tudo quando apertei uma das mãos dele e não senti ele apertá-la de volta. Eu não tinha coragem de chamá-lo, pois tinha medo que ele não me respondesse. Eu estava com tanto medo de perdê-lo. Era horrível a sensação de querer gritar por ajuda, de querer fazer alguma coisa para evitar que o pior viesse a acontecer e não poder. A única coisa que eu tinha que fazer era ficar ali, vendo ele sacrificando a sua própria vida pela vida do irmão.
Os olhos já estavam há algum tempo fechados, mas ele ainda respirava. Ainda havia esperança. Em um ato involuntário, juntei minha mão esquerda com a minha mão direita, que segurava uma das mãos dele. Minhas duas mãos agora seguravam a mão dele e meus joelhos estavam dobrados ao lado do sofá. O leve movimento que eu fiz com as mãos fez com que os olhos dele despertassem repentinamente. Ele estava sendo MUITO forte. Mark virou a cabeça lentamente em minha direção para que ele pudesse me olhar. Mesmo estando aliviada por ele ainda estar consciente, meus olhos ainda insistiam em ficar cheios de lágrimas. Era muito difícil vê-lo daquele jeito.
- Você… - Mark começou a tentar me dizer alguma coisa.
- O que? - Eu demonstrei interesse em suas palavras. Me aproximei um pouco mais dele para poder entender.
- Você não é… só a única que… - Ele respirou fundo antes de continuar. - Poderia me ajudar nisso. - Mark fez uma nova pausa. Ele estava tendo muita dificuldade em terminar a frase. - Você também é… a única pessoa que… - Outra pausa. - Que eu queria… que estivesse do… meu… lado… se… - Os olhos dele foram se enchendo voluntariamente de lágrimas, enquanto ele se esforçava muito para finalizar a frase que ele precisava tanto dizer. - Se hoje… for o meu… último dia. - Uma lágrima solitária escorreu de um de seus olhos quando ele terminou a frase. Eu também voltei a chorar involuntariamente. Soltei a mão dele para acariciar o seu rosto, enquanto eu o olhava de bem perto.
- Eu amo tanto você. - Eu disse aos prantos. Meu coração parecia me dizer que era uma despedida. - Obrigada por me escolher. - Eu agradeci, enquanto enxugava a lágrima dele com um dos meus dedos. - Obrigada por sempre me fazer sentir tão amada. - Eu terminei a frase com a voz embargada.
Os olhos dele se fecharam assim que eu acabei a minha frase. Olhei para a bolsa de sangue, vi que faltava pouco para que ela enchesse. Voltei a olhá-lo. Minhas mãos tremiam por puro nervosismo e medo. Em um gesto involuntário e totalmente afetivo, aproximei o meu rosto do dele e colei meus lábios salgados e molhados nos lábios frios e pálidos dele. Mark não se moveu. Ele mal tinha sentido o beijo e essa também não era a minha intenção. Minha intenção era extravasar, de alguma forma, o carinho, amor e a gratidão que eu sentia por ele. Olhei pra ele pela última vez antes de me afastar dele para poder me sentar no chão, ao lado do sofá. Meus braços seguravam as minhas pernas encolhidas e meu queixo apoiou-se em um dos meus joelhos, enquanto eu chorava silenciosamente. Eu estava tão machucada, tão devastada de tristeza e dor e não importava o quanto eu chorasse, esse sentimento nunca me abandonava.
Fiquei ali sentada, inconsolável e sem ter coragem de voltar a olhar para o Mark e checar se ele ainda respirava. Eu olhava para a bolsa de sangue e começava a contar as gotas de sangue, enquanto me perguntava quantas gotas daquelas seriam necessárias para que aquela tortura acabasse. Foram os minutos mais longos da minha vida. Quando a segunda bolsa de sangue estava finalmente completa, eu me levantei do chão com o rosto coberto de lágrimas e me aproximei da minha bolsa, onde estava o meu celular. Aquela era, finalmente, a minha hora de entrar em ação. Minhas mãos tremiam e eu mal consegui digitar o número do hospital direito.
- Alô? Eu preciso de uma ambulância agora! - Eu afirmei em tom de desespero. Enquanto passava o endereço da casa do Mark, eu o olhava de longe. Ele continuava desacordado. Olhá-lo só me deixou mais tensa e mais nervosa. - É URGENTE! - Eu disse antes de desligar o celular.
Eu estava tão mal. O nó em minha garganta era tão grande, que eu não conseguia respirar direito. Guardei o meu celular de volta na bolsa e voltei a encarar o Mark de longe. Fui me aproximando lentamente e quanto mais perto eu chegava, mais lágrimas se acumulavam em meus olhos. Meu medo era constatar que ele já estava sem vida. Eu não conseguiria superar.
Continuei me aproximando e quando cheguei até ele, eu me ajoelhei para poder me aproximar ainda mais. Com o coração extremamente acelerado, chequei os batimentos em um de seus pulsos. Quando eu percebi que ainda haviam batimentos, um sorriso espontâneo surgiu em meu rosto, enquanto eu chorava por puro alívio. Ele era mesmo muito forte! Levei uma das minhas mãos até uma das mãos dele, enquanto eu deitava a minha cabeça sobre o peito dele. Fiquei um bom tempo chorando, enquanto tentava me acalmar.
- Nós conseguimos. - Eu levantei a minha cabeça e a aproximei do rosto dele. - Você conseguiu, Mark. - Eu disse em tom de alívio.- Vai dar tudo certo. - Eu me aproximei e beijei uma de suas frias bochechas.
A ambulância não demorou mais que 5 minutos para chegar. Ao chegar na casa e se depararem com aquela situação, começaram a me perguntar o que é que tinha acontecido, enquanto o colocavam na maca. Eu só conseguia repetir que eu tinha chegado há pouco tempo e que tinha encontrado ele daquele jeito.
Colocaram o Mark na ambulância e eu fiz questão de ir junto. Fiquei ao lado dele, enquanto os enfermeiros seguiam o procedimento padrão como: checar os batimentos, medir a pressão, entre outras coisas. No caminho do hospital, chegaram a me perguntar se eu sabia o porquê do Mark ter feito aquilo. Eu fui sincera e fiz um breve resumo sobre a situação do . Todos os profissionais que estavam na ambulância ficaram surpresos, mas também ficaram comovidos. Não é algo que se vê todo dia.
Quando chegamos no hospital, Mark foi levado imediatamente para a UTI para ser avaliado por um dos médicos. Fiz questão de levar as bolsas de sangue até banco de sangue do hospital para que fosse dado baixa no sistema do próprio hospital. Meu medo era que o sangue acabasse se perdendo de alguma maneira ou que fosse doado para outra pessoa. Mark fez a parte dele e a minha única obrigação era garantir que o recebesse o sangue doado ainda naquela noite. Eu não podia falhar.
Depois de deixar as bolsas de sangue no banco de sangue do hospital, fui direto falar com o médico que era responsável pelo . Eu precisava agilizar a transfusão de sangue. Eu precisava avisá-lo que poderíamos salvar o . Andei por todo o hospital atrás daquele médico e tive até que usar os meus contatos dentro do hospital para conseguir chegar até ele.
- Doutor! - Eu o abordei no meio do corredor. Ele tinha uma prancheta nas mãos.
- Pois não? - O médico me achou meio alterada, mas mesmo assim me deu atenção.
- Nós conseguimos a doação. Nós vamos poder salvar o . - Eu falei, eufórica.
- Ok, ok. Se acalma! - O médico não tinha entendido nada. - Fala. - Ele pediu para que eu repetisse.
- A doação que o precisava? Nós conseguimos, doutor. - Eu disse em meio a um sorriso emocionado.
- Conseguiram? Mas que ótima notícia! - O médico ficou surpreso. Nem mesmo ele tinha esperanças. - Vou providenciar a transfusão de sangue agora mesmo! - Ele afirmou, animado. - Já foi dada a entrada no banco de sangue do hospital? - O médico questionou, enquanto andava rapidamente pelo corredor. Acompanhei ele.
- Sim! Já deve, inclusive, estar no sistema. - Eu informei.
- Ótimo! Eu vou providenciar tudo! - O médico parou de andar e me olhou com um fraco sorriso. - Alguém lá em cima gosta muito do seu amigo. - Ele disse antes de sair apressadamente. A frase dele me arrancou um sorriso emocionado.
- Alguém aqui embaixo também. - Eu disse em meio a um sussurro. Eu estava me referindo ao Mark.
Um fardo enorme tinha saído das minhas costas. Parecia até que eu estava conseguindo respirar normalmente. O nó na minha garganta já não era tão grande, mas ele ainda estava lá. As coisas estavam começando a dar certo pro , mas ainda tinha o Mark. Enquanto eu não tivesse uma boa notícia dele, eu não conseguiria comemorar a provável melhora do . Por isso, fui atrás de alguns enfermeiros conhecidos para tentar conseguir alguma informação sobre o Mark. Nenhum deles foi capaz de me dar uma notícia. Mesmo estando aflita e preocupada, eu precisava fazer uma coisa importante. Eu precisava dar a boa notícia para a família do e para todos os interessados. Para isso, fui até a sala de espera. Eu sabia que eles ainda estavam lá.
- ! - Minha mãe foi a primeira a me abordar quando eu entrei na sala que, por sinal, estava bem lotada. - Onde você esteve durante todo o dia? - Ela me perguntou, depois de me dar um abraço preocupado.
- Muita coisa aconteceu, mãe. - Eu a olhei com um olhar triste e cheio de esperança. A mãe de estava perto e me olhou. - Foi por isso que eu vim aqui falar com vocês. - Eu olhei para a mãe do e consegui perceber o quão esgotada e devastada ela estava. Olhei rapidamente para a minha mãe, como se estivesse dizendo: ‘Me deixe fazer isso.’. Me afastei um pouco da minha mãe e fui até a família de , que estava sentada nas cadeiras. estava sentada entra a mãe e o pai.
- Oi, querida. - A mãe de tentou sorrir pra mim. Parei na frente dela e estendi minhas mãos para que ela as segurasse. Ela levou suas mãos até as minhas e se levantou, colocando-se em minha frente.
- Eu vim até aqui te dar uma notícia. - Eu disse, olhando em seus olhos. A expressão de cansaço desapareceu de seu rosto na mesma hora. Os olhos dela se esbugalharam, enquanto os meus foram se enchendo de lágrimas aos poucos.
- O meu filho... - Ela mal conseguia respirar direito. - Não me diga que… - Ela não conseguiu continuar e começou a negar com a cabeça, sem querer acreditar que o pior tinha acontecido. Eu simplesmente balancei a cabeça negativamente em meio a um sorriso fraco e emocionado.
- Conseguimos a doação. - Eu segurei mais forte em suas mãos e ela desabou. O choro de alívio foi inevitável. Eu a abracei carinhosamente. - Ele vai ficar bem. - Eu disse a ela, enquanto ela me abraçava muito forte. Mesmo sem entender tudo o que estava acontecendo, comemorou com o seu pai. Ela sabia que o irmão dela ficaria bem. Meus pais também comemoraram.
- Meu Deus, eu nem acredito. Eu orei tanto. - A mãe do e da não conseguia parar de chorar, mas já era possível ver um sorriso em seu rosto.
- Eu sei. - Eu estava totalmente comovida com ela. - Seu filho tem um anjo da guarda dos bons. - Eu me referi ao Mark, mas é claro que ela não sabia.
- É, ele tem. - Ela concordou em meio a um sorriso. - E, quando eu vou poder vê-lo? - A mãe dele me perguntou.
- Bem, a transfusão de sangue deve estar acontecendo nesse momento. Eu não sei dizer com certeza, mas… ele deve estar consciente até amanhã a tarde. - Apesar de já ter lido várias coisas a respeito, eu não tinha certeza.
O clima naquela sala de espera era outro. A mãe do começou a ligar para a família para dar a boa notícia e eu aproveitei a oportunidade para avisar os meus amigos. Achei mais fácil mandar uma mensagem para todos e esperar que eles me ligassem. Bem, eles ligaram! Todos estavam muito felizes e empolgados e, por isso, resolvi não contar quem tinha sido o doador e a situação em que o Mark se encontrava. Era melhor contar quando tudo já estivesse resolvido. Eu tinha esperança que tudo se resolveria. Era melhor evitar mais sofrimento. Eu podia lidar com ele sozinha, certo?
Foi bem difícil esconder a verdade da mãe do , já que ela insistiu muito para que eu dissesse quem tinha sido o doador. Também foi bem difícil ouvir ela me pedir para dar a boa notícia para ‘aquele amigo do que ficou o tempo todo no hospital e que parecia muito preocupado com o filho dela’. Sim, ela estava se referindo ao Mark. Se ela soubesse…
Diante da boa notícia, conseguiram convencer a família de a abandonar o hospital por algumas horas. Já que eles só poderiam ver o no dia seguinte, não fazia sentido que eles continuassem no hospital. Meus pais levaram eles para a minha casa. Eles até chegaram a insistir para que eu fosse para casa para descansar também, mas eu neguei sem dar muitas explicações. Eu ainda precisava de notícias do Mark. Eu só ficaria tranquila quando tivesse certeza de que ele também ficaria bem. Além disso, eu tinha que ficar e conversar com a Meg sobre o que tinha acontecido. Não daria para esconder dela a situação do Mark nem se eu quisesse, já que ela trabalhava no hospital. Ela chegou logo depois que os meus pais e a família do foram embora.
- O que foi que aconteceu? Vi os seus pais e os pais do indo embora. Eles estavam tão empolgados… - Meg me perguntou assim que chegou. Ela tinha cruzado com eles no estacionamento do hospital.
- A transfusão de sangue está sendo feita nesse momento. - Eu contei para ela com um fraco sorriso.
- Jura!? - Meg abriu um enorme sorriso. - Então, o conseguiu a doação? - Ela comemorou.
- Ele conseguiu. - Eu afirmei com a cabeça.
- Que ótima notícia! - Meg me abraçou, pois imaginava o quanto eu estava feliz. Ela não era tão próxima ao , mas nunca desejou o seu mal. É claro que ela também ficou muito feliz.
- Eu nem acredito. - Eu disse em meio a um suspiro de alívio.
- Espera. Por que você não parece tão feliz? - Meg perguntou assim que terminou o abraço.
- Eu estou feliz. - Eu tentei disfarçar.
- Mas… - Meg sabia que havia um porém.
- Ok. Você vai ficar sabendo de qualquer jeito. - Eu ergui os ombros, sem ter muito o que fazer.
- O que foi? - Meg ficou mais séria.
- Não teve um segundo doador. - Eu não dei mais detalhes, pois achei que ela entenderia o que eu quis dizer.
- Como não teve um segundo doador? Como ele está recebendo a transfusão, então? - Ela perguntou, sem entender.
- O teve apenas um doador, Meg. - Eu disse com tristeza. Demorou poucos segundos para que ela concluísse o envolvimento de Mark em tudo aquilo.
- Não… - Meg negou com a cabeça com os olhos esbugalhados. - O Mark não… - Ela não queria acreditar.
- Ele doou todo o sangue que o precisava. Ele salvou a vida do irmão. - Eu afirmei, emocionada. Falar da atitude de Mark sempre me deixaria emotiva.
- Meu Deus. - Meg começou a chorar na mesma hora, afinal, tratava-se de seu melhor amigo. - Tadinho. Ele não merecia passar por tudo isso. - Ela disse aos prantos.
- Eu tentei falar com ele, mas ele já havia decidido. Ele precisava fazer isso. Se algo acontecesse com o , eu nem sei o que ele faria. - Eu segurei as mãos dela, tentando acalmá-la, mas a verdade é que eu também estava muito desestabilizada.
- E onde ele está, agora? Você ainda não soube nada sobre a situação dele? - Mais do que nunca, a Meg queria notícias.
- Não. Ele foi trazido para o hospital há algumas horas e eu não consegui notícias. - Eu neguei.
- Não acredito. - Meg continuava negando incessantemente com a cabeça. - E se alguma coisa acontecer com ele? Como ele acha que o vai ficar? Isso foi loucura! - Ela comentou.
- Eu sei! Eu tentei fazê-lo desistir dessa ideia de todas as maneiras. Você conhece ele! Você sabe o quanto ele é teimoso. - Eu queria que ela soubesse que eu tinha feito o possível para evitar tudo aquilo.
- Eu sei, eu sei. - Meg levou uma das mãos a cabeça, reconhecendo que eu estava certa.
- O que você acha? - Eu quis saber a opinião dela. - Quais as chances dele? - Eu completei a pergunta. Ela também tinha bons conhecimentos no assunto.
- As chances dele são maiores do que as que o tinha, mas… - Meg ergueu os ombros.
- Continua sendo arriscado. Cada pessoa reage de uma maneira. - Eu completei a frase por ela.
- Eu espero que ele seja forte. - Meg juntou as mãos.
- Ele é forte. Ele vai superar tudo isso. - Eu disse antes de abraçá-la. - Ele vai voltar pra nós. - Eu acariciei as costas dela, tentando acalmá-la. Eu também estava arrasada, mas eu estava me esforçando muito para ser forte por ela. Ela precisava de mim.
- Deus te ouça. - Meg se agarrou em minhas palavras e em minhas esperanças.
Fiquei ao lado dela o resto da noite. Foram horas e horas engolindo o choro, disfarçando o desespero e ignorando o meu próprio nervosismo. Eu tinha essa mania de roubar a dor de todos a minha volta só pra mim. Eu era ótima em me fazer de forte pra todos e em consolar todo mundo, enquanto eu também precisava de consolo. Era o meu instinto de proteção falando mais alto. Era a minha dificuldade em ver as pessoas que eu amo sofrer falando mais alto. Eu não conseguia evitar.
As notícias não vinham. Nós não sabíamos o que estava acontecendo. Meg conseguiu se acalmar, mas eu estava uma pilha de nervos. Minhas mãos suavam frio e meu coração estava apertado. No final da noite, o chegou a ligar para a namorada, mas antes que ela atendesse o telefonema, eu implorei para que ela ainda não contasse para ele sobre o Mark. Tudo o que nós não precisávamos naquele momento era responder milhões de perguntas. Além disso, era impossível explicar a atitude do Mark sem contar sobre o vínculo familiar entre ele e o . Aquele não era o momento certo para contar a eles. E assim fizemos!
Amanhecemos no hospital. Mais uma noite naquela sala de espera! Eu já nem sabia há quanto tempo eu estava sem dormir. Eu não sabia como eu ainda estava aguentando. O café provavelmente ajudou. Meg e eu deixamos o hospital para irmos para casa para tomar um banho e trocar de roupa para irmos trabalhar. Nós duas trabalharíamos no turno da manhã naquele dia. Já tínhamos pedido autorização ao nosso supervisor. Mas e a faculdade? Bem, fazia dias que eu não me lembrava que ela existia.
Meg e eu começamos o nosso turno às 8 horas. A primeira coisa que fizemos foi tentar conseguir notícias do Mark. Não sabiam se ele estava na UTI ou em um dos quartos. Ninguém falava nada, o que me deixou ainda mais preocupada e receosa. Com o , nós ainda recebíamos notícias. Poucas notícias, mas ao menos sabíamos o que estava acontecendo. E com o Mark? O que será que estava acontecendo? Por que não estavam querendo nos dar notícias? Essas perguntas ficaram na minha cabeça durante toda a manhã. Mesmo trabalhando, eu não conseguia esquecer o Mark. A falta de notícias estava me matando. Foi ai que uma notícia chegou. Uma notícia trazida por um dos médicos, mas que não era sobre a pessoa que eu esperava.
- Desculpe atrapalhar o seu trabalho, mas é que você estava tão aflita que eu me vi na obrigação de vir até aqui te avisar. - O médico parecia trazer uma boa notícia.
- O que aconteceu? - Eu fiquei extremamente curiosa.
- O seu amigo… , certo? Ele acabou de acordar. - A notícia trouxe um sorriso involuntário para o meu rosto. Eu esperei tanto para ouvir aquela frase.
- Jura? - Eu não consegui esconder a minha felicidade.
- Juro. - O médico riu da minha reação. - Procurei pela família dele na sala de espera, mas não encontrei ninguém. - Ele disse.
- Eu vou ligar para eles. - Eu me responsabilizei.
- Eu vou liberar as visitas, está bem? Depois de tudo o que aquele garoto passou, ele merece receber todas as visitar que puder. - O médico só confirmou o que eu já sabia sobre ele: ele era uma ótima pessoa.
- Muito obrigada, doutor. - Eu demonstrei muita gratidão.
- Tudo bem. - O médico negou com a cabeça antes de dar alguns passos em direção a saída da sala.
- Só mais uma pergunta. - Eu tinha que perguntar. Ele parou em frente a porta e eu fui até ele. - Alguma notícia sobre o irmão do ? - Eu quis saber.
- Me desculpe. Eu não tenho notícias, pois não estou cuidando do caso. - O médico lamentou.
- Tudo bem. Eu agradeço da mesma forma. - Eu sabia que se ele soubesse qualquer coisa, ele me diria.
- Até mais. Estou torcendo para o seu outro amigo. - O médico foi gentil antes de sair de vez da sala. Meg encontrou com ele na porta e veio desesperadamente atrás de mim, achando que eu tivesse recebido notícias do Mark.
- Ele veio falar do Mark? - Meg me perguntou, aflita.
- Não. Ele veio falar do . Ele acabou de acordar. - Eu disse e Meg ficou um pouco decepcionada. A decepção não estava relacionada ao e sim relacionada a falta de notícia do melhor amigo dela.
- Finalmente uma boa notícia, não é? - Meg tentou compartilhar um pouco da minha felicidade. - Agora, você pode ir vê-lo. - Ela disse.
- Eu não sei se… tenho coragem pra isso. - Eu não demonstrei muita empolgação.
- De novo essa história? - Meg cruzou os braços.
- É difícil pra mim, Meg. Eu me sinto culpada por tudo o que está acontecendo. Como eu vou contar pra ele sobre o Mark? Como você acha que ele vai reagir? - Eu me justifiquei. - Eu causei tudo isso e agora o irmão dele está entre a vida e a morte. Como você acha que ele vai lidar com tudo isso? Como você acha que eu estou lidando com tudo isso? - Eu apontei para mim mesma.
- Ok, mas… o que você vai fazer então? - Meg questionou.
- Eu vou avisar a família dele. Eles merecem ver o antes de mim. - Eu disse antes de ir até a minha bolsa e pegar o meu celular. - Depois, eu vejo o que eu faço. - Eu comecei a digitar o número do celular do meu pai. Ele daria o recado para a família do .
Depois de avisada, a família de não demorou mais do que uma hora para aparecerem no hospital. Todos estavam muito eufóricos e ansiosos, mas só foi permitido entrar uma pessoa por vez, com exceção de , que pode entrar no quarto com a sua mãe. Ela chorou muito assim que viu o seu filho. Aparentemente, ele até que estava bem, mas ainda havia um pequeno tubo próximo ao seu nariz que ajudava a sua respiração que ainda não estava 100% normalizada.
- Mãe, pare de chorar. Eu estou aqui. - sorriu para a mãe, quando a viu chorar novamente. Ela não tinha parado de chorar desde que tinha entrado na sala.
- Você está aqui, querido. - A mãe sorriu em meio as lágrimas, aproximando-se da cama.
- Vem aqui. - segurou sua mão e a puxou para perto para abraçá-la carinhosamente. - Eu estou bem. - Ele sussurrou.
- Graças a Deus. - A mãe disse em meio a um suspiro. - Você está tão bonito. - Ela elogiou ao terminar o abraço e olhar em seu rosto.
- Você é um pouco suspeita pra falar. - a olhou com desconfiança, arrancando um novo sorriso da mãe. - E você, garota? Não vai falar nada? - Ele olhou para a , que estava muda até agora.
- Oi. - estava um pouco assustada com a situação. Nunca tinha visto o irmão em uma cama de hospital. - O que são essas coisas? - Ela referia-se ao tubo de respiração.
- Essas coisas estão me ajudando a respirar. É só por enquanto. - explicou pacientemente.
- Você está mesmo bem? - perguntou, olhando atenciosamente para o irmão.
- Eu estou ótimo. - disse com veemência.
- Se você está bem, por que a mamãe chorou tanto nos últimos dias? - finalmente perguntou. e a mãe trocaram olhares.
- Ela… estava preocupada comigo. Eu estava um pouco doente, mas agora eu já estou me recuperando. - tentou explicar de uma maneira menos complicada.
- Algumas das minhas amigas da escola não tem irmãos, sabia? Eu fiquei muito triste porque eu achei que pudesse ser como elas. Eu não queria ser filha única e se você não voltasse, eu teria que ser. - desabafou em meio a um bico. - Eu gosto de ter um irmão. - Ela completou.
- Você sempre vai ter um irmão. - estava até um pouco comovido. - Eu não vou a lugar algum, ok? Vamos ser sempre eu e você. - Ele acariciou o rosto da irmã. - Combinado? - Ele piscou um dos olhos pra ela, que segurou um sorriso. Ele estendeu uma das mãos.
- Combinado. - deixou um sorriso escapar, enquanto apertou a mão do irmão.
- Legal, então… vem aqui me dar um abraço. - a puxou para mais perto e ela curvou-se para lhe dar um abraço apertado. - Hey! É impressão minha ou você está ficando cada vez mais baixinha? - Ele a provocou.
- O que!? - terminou o abraço na hora. - Eu estou maior. Você já viu o meu salto? - A garota invocada se exibiu ao mostrar o sapatos que tinham pequenos saltos.
- Isso ai nem é salto, garota. - continuou a provocá-la.
- É claro que é! - esbravejou. - Mãe, fala pra ele! - Ela pediu, olhando para a mãe.
- Vejo que você está mais do que curado, não é, Jonas? - A mãe o olhou com desaprovação. Sabia que ele estava irritando a irmã de propósito.
- Eu não resisto. - gargalhou ao erguer os ombros.
- Você não toma jeito, não é? - A mãe negou com a cabeça. - Eu nem acredito que você está bem. - Ela acariciou o seu rosto e depois o cabelo do filho.
- Agora que o pior já passou, eu queria… - hesitou um pouco antes de continuar. - Eu queria pedir desculpas por todo o sofrimento que eu causei, mãe. - Ele segurou a mão dela.
- Não precisa se desculpar. O que você fez foi uma loucura sem tamanho, mas não foi em vão. Você salvou a vida de uma pessoa, filho, e, por isso, eu me orgulho muito de você. Eu me orgulho muito do homem que você se tornou. - A mãe disse enquanto continuava acariciando a cabeça do filho.
- Na hora em que tudo aconteceu, eu não pensei nas consequências. Eu pensei em mim e no que eu queria fazer, mas eu não pensei no sofrimento que eu causaria a todos vocês e, por isso, eu sinto muito. Você não merecia, mãe. - disse com tristeza.
- O que está feito, está feito! Está tudo bem. Esqueça tudo isso. - A mãe dele pediu.
- Aposto que eu dei um trabalhão pra todos vocês. Vocês tiveram que ficar aqui em Nova York nesse hospital. - continuou lamentando.
- Não foi trabalho algum. - A mãe negou. - A e a família dela foram maravilhosos conosco. Ela fez questão que nos hospedássemos na casa dela durante todos esses dias que estivemos aqui. - Ela contou. A expressão no rosto de mudou ao ouvir o meu nome.
- Ela fez isso? - A pergunta não veio acompanhada de um sorriso como sua mãe esperava.
- Eu dormi no quarto dela e brinquei com o cachorrinho dela. - contou.
- O Buddy! - complementou.
- Ele é muito fofinho. - estava morrendo de amores.
- Ela foi incrível. - A mãe de voltou a dizer. - Por mim, eu teria ficado aqui no hospital mesmo, mas por causa da , eu não podia. Eu nem sei o que teria feito sem ela. - Ela completou.
- Eu não esperava nada diferente vindo dela. - finalmente sorriu, mas de uma maneira não muito empolgante. Na realidade, eu diria que foi de uma maneira um pouco triste. Discretamente, ele olhou para a sua mão e viu o coração que estava ali desenhado. Ele tinha toda a certeza do mundo de que era eu que tinha desenhado. Aliás, o coração foi a primeira coisa que ele viu, quando acordou do coma.
- Ela não saiu desse hospital nos últimos dias. Aliás, ela e mais um rapaz. Um moço alto e bonito. - A mãe tentou descrever o Mark.
- O Mark. - finalmente deu um sorriso sincero.
- É esse mesmo o nome dele. - A mãe se recordou. - Ele foi um amor e uma pessoa incrível nesses últimos dias. - Ela elogiou.
- Ele é mesmo uma boa pessoa. - concordou com um certo orgulho do irmão.
Mesmo eles terem falado do Mark por um bom tempo, achou melhor não revelar ainda o grau de parentesco recentemente descoberto entre eles. O ideal era esperar que as coisas se acalmassem para que ele desse a notícia de maneira tranquila.
A visita de sua mãe e foi longa. Elas ficaram o máximo que conseguiram no quarto. Não foi surpresa para o que sua mãe fosse a primeira pessoa a entrar por aquela porta, mas a segunda pessoa foi sim uma surpresa. Acredite ou não, a Meg foi a segunda pessoa. Daquele jeito descolado e implicante dela, ela cedeu o seu celular para que e seus amigos falassem com o através de uma chamada de vídeo. Ele ficou muito feliz e empolgado ao ver todos. Era um pouco tedioso para ele ficar sozinho naquele quarto de hospital, então foi muito bom ter alguém para conversar e rir durante alguns minutos. Seus amigos avisaram que iriam visitá-lo pessoalmente assim que possível antes de desligarem a chamada de vídeo. Com o fim da chamada, foi obrigado a devolver o celular para Meg e a agradecer, com o seu jeito torto e orgulhoso de ser, a atitude dela. Ele não disse nada, mas achou bem legal da parte dela ter ido até lá para levar um pouco de alegria para ele.
Depois que a Meg saiu, a porta daquele quarto ficou o resto do dia fechada. Mais ninguém tinha ido visitá-lo, isso incluía: eu e o Mark. Seria mentira dizer que ele não ficou chateado com essa situação. O coração em sua mão mostrava que eu tinha ido visitá-lo anteriormente, mas porque que agora que ele estava acordado e consciente, eu não tinha aparecido? Por que mesmo tendo passado os últimos dias no hospital, segundo sua mãe, o seu próprio irmão não apareceu para vê-lo e para comemorar a sua melhora? ficou remoendo isso durante o dia todo.
Trabalhei o resto do dia e no final da tarde, fui requisitada por um dos médicos que, aliás, tinha me mantido ocupada durante o dia todo. Ele me pediu alguns favores, mas o único que vale a pena ressaltar foi o pedido dele para que eu fosse medir a pressão do paciente do quarto 33. Sim, esse era justamente o quarto do . Que ótimo, né? Se fosse qualquer outro médico do hospital, eu tentaria evitar aquela situação de alguma maneira, mas não com ele, o médico que tinha a fama de mais chato de todo o hospital. Com isso, eu tive que ir até lá. É claro que eu estava uma pilha de nervos e que meu coração passou a bater mais forte quando eu me dei conta de que eu iria vê-lo. Eu não sabia se estava pronta.
Antes de entrar no quarto, eu decidi que ainda não contaria para ele sobre o Mark. Era melhor ter notícias antes do que contar pra ele e deixá-lo preocupado e angustiado. Me dirigi até o quarto e fiquei um bom tempo encarando aquele número ‘33’ antes de arrumar coragem para prosseguir. Meu medo era ser julgada por ele por tudo o que tinha acontecido. Ao bater na porta do quarto, ouvi ele dizer que eu poderia entrar. Eu respirei fundo e entrei.
- Hey. - Eu disse com um sorriso nervoso. demorou alguns segundos para me responder, pois ficou me observando. Talvez, ele estivesse ficado surpreso ao me ver.
- Oi. - chegou a esboçar um fraco sorriso, que eu quase não consegui identificar.
- Você parece bem. - Eu tentei acabar com o estranho silêncio que havia se estabelecido.
- É, eu estou mesmo bem… considerando as circunstâncias. - Mais um sorriso dele e eu já estava um pouco menos nervosa, mas o meu receio da conversa que estava por vir ainda estava presente. Mais um silêncio constrangedor. Ele deixou de me olhar para olhar o que eu segurava em minhas mãos: o medidor de pressão. O olhar dele me fez lembrar o que eu realmente tinha ido fazer ali.
- Eu vim… medir a sua pressão. É parte do meu trabalho. - Eu avisei antes de me aproximar dele. Levantei o aparelho de medir a pressão e ele afastou o braço de seu corpo, deixando-o a minha disposição. Tentei agir friamente ao segurar o braço dele e colocar o aparelho. Enquanto eu colocava o aparelho para funcionar e fingia dar toda a minha atenção a ele, notei que o me olhava. O minuto mais longo de toda a minha vida. Depois de medir a pressão, tirei o aparelho do braço dele e peguei a caneta que estava dentro do bolso do meu jaleco para anotar a informação na ficha do . Os olhos dele continuavam sobre mim. Ele nem disfarçava.
- Está boa? - perguntou repentinamente. Eu estava me esforçando tanto para focar no que eu estava fazendo e para ignorar os olhares dele, que eu fui pega de surpresa com a pergunta.
- O que? - Eu deixei de olhar para a prancheta para olhá-lo.
- A pressão. Está boa? - disse com seu jeito meio debochado.
- Está. Está ótima. - Eu engoli seco e respondi na maior naturalidade. Voltei a encarar a prancheta em minhas mãos e descobri que eu não tinha cabeça ou calma para ler qualquer coisa que estivesse escrito ali. Eu já tinha anotado a informação e só continuava olhando para aquela ficha para disfarçar o quão sem jeito e nervosa eu estava com o jeito que ele me olhava.
- É só isso? - fez uma nova pergunta e, mais uma vez, eu não entendi sobre o que se tratava. Voltei a olhar pra ele e balancei a cabeça, enquanto mantinha uma expressão de dúvida em meu rosto. - Você ter vindo até aqui. Foi só pra fazer o seu trabalho? - Ele refez a pergunta, enquanto eu devolvia a sua ficha no lugar. A pergunta me deixou sem palavras por alguns segundos. Ele estava me perguntando se eu também tinha ido até lá para vê-lo.
- Não, eu… - Eu hesitei por um momento. Eu estava procurando coragem para continuar. - Eu também queria.. te ver. Eu queria… - Eu pausei novamente e abaixei a cabeça, deixando de olhá-lo por poucos segundos. Por que eu estava tão nervosa? Eu mal estava conseguindo falar direito! - Eu tenho tanta coisa pra te dizer, que eu… eu nem sei como começar. - Eu terminei a frase negando com a cabeça.
- Se você queria mesmo me ver, por que você não veio antes? - questionou. É claro que ele tinha reparado no fato de eu não ter ido vê-lo durante o dia todo. Ele sabia que eu poderia ter feito isso, já que eu trabalhava naquele hospital. - Todo mundo veio me visitar e quem não veio… me ligou. Você… não veio. O Mark não veio. - Ele pausou. - E eu tenho a impressão de que, se não tivessem te mandado vir aqui para medir a minha pressão, você nem viria. - estava pedindo explicações, mas ele não iria gostar de ouvi-las.
- É difícil… - Eu neguei com a cabeça, sem saber como me justificar. Eu não esperava que ele me questionasse dessa maneira.
- O que é difícil, ? - Os olhos dele me cobravam. - O que é difícil? - Ele repetiu, me olhando. Hesitei algum tempo até perceber que ele não cederia.
- É difícil olhar pra você e pensar que você poderia não estar mais aqui. É difícil pra mim pensar que tudo quase acabou por causa de… - Eu nem sabia como nomear. - Uma besteira; por causa de uma atitude infantil da minha parte. - Eu não abriria mão da minha responsabilidade por tudo o que tinha acontecido e eu queria que ele soubesse.
- Do que você está falando? - não estava entendendo o que eu estava querendo dizer.
- Depois do dia em que eu fui sequestrada pelo Steven e depois que tudo aquilo aconteceu entre nós e… o meu pai. Eu te julguei, eu te cobrei, eu te pressionei de todas as formas possíveis e desconfiei do amor que você dizia sentir por mim. - O assunto ia mexendo com o meu estado emocional e ia formando um nó em minha garganta, que parecia me sufocar. - Eu te induzi, mesmo que involuntariamente, a me provar que eu estava errada. - Eu estava me esforçando muito para me manter forte.
- Não. - reagiu na mesma hora, quando percebeu que eu estava me culpando por tudo. - Não. Não, . - Ele achou tão absurdo, que deixou em evidência a sua indignação com a minha insinuação. - Não pense que é culpa sua. - Ele negou com a cabeça.
- Eu sei que é, . Está tudo bem. - Eu deixei de olhá-lo para encarar as minhas mãos. Ele me olhou, cabisbaixa.
- . - Ele chamou, me fazendo voltar a olhá-lo. - Foi minha decisão. Só minha! Na hora em que tudo aconteceu, eu não pensei em nada do que você havia me dito. Na hora, eu agi por… impulso. - tentou me explicar. - Eu só pensei em… ajudar o seu pai que… estava prestes a ser punido por uma história que já nem existia mais e por uma vingança sem sentido. Eu só pensei… em poupar duas pessoas que eram importantes pra mim e que não mereciam perder outra pessoa. - Ele referia-se ao e a mim. A frase dele tirou alguns quilos das minhas costas. Não que eu não me sentisse mais culpada, porque eu me sentia, mas só em saber que ele não me culpava por nada, eu já não me sentia tão mal e sufocada.
- Eu sei que não vai fazer a menor diferença agora e que também não vai mostrar o quanto eu sou grata pelo que você fez pelo meu pai, mas… - Eu hesitei um bom tempo antes de conseguir terminar a frase. - Nós também não estávamos prontos pra perder você. Eu não estava pronta pra perder você. Não sem saber que, em algum momento, eu teria você de volta. - Eu disse exatamente o que eu estava sentindo e o que realmente aconteceu. Das outras vezes que eu achava que tinha perdido ele, eu sabia que, em algum momento, nós acabaríamos voltando, mas dessa vez foi diferente. Eu sabia que se eu o perdesse dessa vez, seria para sempre.
- Com licença. - A voz seguida de poucas batidas na porta nos interrompeu. Eu tentei me recompor quando vi que tratava-se de uma das enfermeiras do hospital. - Me desculpe, mas insistiram para que eu lhe desse notícias sobre o seu amigo. - Ela disse alto e eu não soube o que fazer na hora. mostrou-se curioso.
- Eu já volto. - Eu fui até a enfermeira, afastando-a da cama e tirando ela da sala. Aquela não era a melhor maneira do descobrir tudo. - O que aconteceu? - Eu sussurrei. Meu coração estava quase saindo pela boca. Aquela seria a primeira notícia que eu receberia do Mark desde que ele tinha dado entrada no hospital.
- Seu amigo foi muito forte, . - A frase dela não serviu para me acalmar, mas também não me deixou mais nervosa. Até então, nenhuma surpresa. Que ele era muito forte, eu já sabia!
- Como ele está? - Minhas mãos suavam frio. Eu me tremia inteira.
- Ele teve duas paradas cardíacas durante a noite. - A enfermeira deu a notícia e a minha reação foi a pior possível. Os olhos estavam esbugalhados e as mãos estavam tampando a boca e parte do nariz. Eu neguei com a cabeça, sem conseguir acreditar. - Nós conseguimos trazê-lo de volta. - Meus olhos foram se enchendo de lágrimas. Eu não conseguia me conformar. Ele não merecia passar por aquilo. - Agora, ele está medicado. Temos que aguardar algumas horas para ver como ele reagirá aos medicamentos. - Ela completou a informação. Ela terminou de dar a notícia e eu não conseguia falar. Os olhos continuavam cheios de lágrimas e eu travei completamente. - Não fique assim. - A enfermeira percebeu o quanto eu fiquei em choque com a notícia. - O pior já passou. Vamos torcer para que dê tudo certo a partir de agora. - Ela tocou o meu ombro, fazendo com que eu voltasse para a realidade. - Ele vai ficar bem. - Um último consolo por parte dela. Eu afirmei com a cabeça como se concordasse com o que ela tinha dito.
- Obrigada. - Eu consegui agradecer mesmo estando em choque.
A enfermeira se afastou, me deixando sozinha naquele corredor. Eu não sabia o que fazer. Era como se eu tivesse perdido o rumo de toda a minha vida. Pela primeira vez, eu realmente me dei conta de que eu quase havia perdido o Mark. Eu tive receio a respeito disso antes, mas não achei que pudesse ser real. Eu nunca achei que realmente aconteceria com ele. Logo com ele! A pessoa mais forte que eu já conheci. Mark já tinha passado por tanta coisa que, em algum momento da nossa história, eu passei a vê-lo como uma fortaleza na qual eu me espelhava. Eu sempre quis ser tão forte como ele. Eu sempre quis conseguir superar tudo do jeito que ele superava. De repente, alguém vem me dizer que aquela fortaleza não era tão forte quanto eu pensava e que existiu até mesmo a possibilidade de ela deixar de existir. Isso foi um baque imensurável pra mim; foi assustador.
Havia milhões de coisas em minha cabeça e em meu coração naquele momento, mas o mais importante estava bem atrás daquela porta. estava me esperando voltar para que eu respondesse todas as perguntas que eu não queria responder. Pelo menos, não naquele momento. Ele passou por tanta coisa nesses últimos dias e eu queria poupá-lo só mais um pouco. Agora, já era tarde. Eu teria que contar pra ele o que o Mark tinha feito para salvá-lo, mas como? Como eu vou fazer isso? Adentrei novamente o quarto sem saber a resposta para essa pergunta. Assim que me viu entrar, os olhos dele ficaram fixos em mim. Ele estava tentando me decifrar.
- Desculpa, eu… - Eu fiz uma breve pausa devido ao jeito que ele me olhava. - Era importante. - Eu achei que era o bastante.
- De quem a enfermeira estava falando? - A minha atitude diante da situação foi o que deixou ele com o pé atrás e é claro que ele conseguia ver vestígios de lágrimas em meus olhos. Eu sou mesmo péssima nisso.
- Nós podemos falar disso depois? Você acabou de acordar e eu não quero… - Eu neguei com a cabeça, achando que poderia convencê-lo.
- O que? Não quer o que? - me conhecia MUITO BEM. Ele sabia que havia algo errado.
- Amanhã! Eu prometo que amanhã eu… - Eu já ia adiando a situação, mas ele me interrompeu.
- Por que você não está querendo me contar? O que está acontecendo, ? - ficou ainda mais sério e preocupado. Ele sabia que a coisa era séria.
- Por favor, . - Eu pedi encarecidamente. - A única coisa que eu te peço é que você confie em mim. Agora, não é o melhor momento. - Eu queria tentar convencê-lo a deixar isso para uma outra hora.
- Eu vi o jeito que você ficou quando a enfermeira começou a falar. Eu te conheço. - ignorou o meu pedido. Ele era teimoso e não deixaria o assunto para outro dia. - Eu sei que tem alguma coisa acontecendo e se você não me contar, que Deus me ajude, mas eu vou dar um jeito de sair dessa cama e descobrir o que é. - Ele ameaçou.
- Ok. Ok. - Foi o suficiente para que eu cedesse. Não tinha mais jeito. Era tarde demais. - Mas antes, eu quero que você me prometa que vai manter a calma. Você ainda não está 100% recuperado. - Eu fiz um último pedido.
- Sério? - estava impaciente e nervoso. Ele nem sabia o que pensar.
- Me prometa. - Eu pedi mais uma vez.
- Eu prometo. - Ele prometeu, tentando demonstrar calma.
- Ok. - Respirei fundo uma última vez e pensei rapidamente por onde começar. - Quando… você chegou no hospital, você estava muito mal. Nós estávamos desesperados. - Eu fiz uma breve pausa. Eu estava tentando escolher as palavras certas. - Você estava em coma e o médico nos avisou que você precisava fazer uma transfusão de sangue. Você precisava de sangue. Você precisava de muito sangue. - Deixei de olhá-lo e encarei minhas mãos, que estavam extremamente inquietas. - Todos nós achamos que você ficaria bem, afinal, doação de sangue é algo tão comum nos dias de hoje, certo? - Ao fazer a pergunta retórica, voltei a olhá-lo. - Bem, essa foi primeira rasteira que nos foi dada. O médico nos informou que você tem um dos tipos sanguíneos mais raros e que só poderia receber a doação de sangue com o mesmo tipo que o seu: O Negativo. - A cada palavra dita, eu ficava mais nervosa. Eu comecei a suar frio e minhas mãos tremiam.
- Eu não sabia disso. - me interrompeu. Ele parecia um pouco surpreso.
- Nós procuramos doações no banco de sangue do hospital e no de todos os outros hospitais da cidade. Não tinha uma doação sequer e você precisava de no mínimo dois doadores porque a quantidade de sangue que você precisava era bem maior do que uma pessoa saudável poderia doar. Foi aí que nós finalmente encontramos um doador. - Mais uma hesitação minha. Eu não queria continuar.
- Quem? - ainda não conseguia entender a extensão do problema.
- O Mark. - Eu disse e o vi deixar um fraco sorriso escapar. Pensar que o Mark tinha ajudado a salvar a sua vida fazia com que ele se sentisse importante. Ele gostou de concluir que o seu irmão realmente se importava com ele. - O fato de vocês serem irmãos provavelmente está relacionado com a compatibilidade sanguínea. - Eu disse e o concordou com a cabeça.
- E o que aconteceu depois? - Ele queria que eu continuasse.
- Bem, nós… continuamos procurando um segundo doador. Nós procuramos muito e esperamos o máximo que podíamos. - Eu pausei. Chegou a hora. Eu mal conseguia respirar corretamente. Minhas mãos estavam geladas e um nó se formava aos poucos em minha garganta. A sensação era a pior possível.
- E vocês encontraram, não é? Se eu estou aqui. - deduziu. A ficha dele realmente não tinha caído ainda.
- Esse é o problema, . Nós não encontramos. - Abaixei os olhos, deixando de olhá-lo por poucos segundos. - Mas… como? Se eu precisava de todo o sangue, como eu… - Ele ergueu os ombros, sem entender. Ele se perguntava o que eu estava tentando dizer a ele. Eu respirei fundo e engoli seco.
- Você recebeu a quantidade de sangue que você precisava, mas… você não recebeu de dois doadores diferentes. - Meus olhos tristes encaravam ele, enquanto eu esperava ele chegar a triste conclusão do que o irmão mais velho tinha feito. Ele ficou me olhando insistentemente e parecia me indagar com o olhar: ‘O que isso quer dizer? O que você está querendo me dizer?’. Quando ele finalmente concluiu, seu olhar forte e indagador tornou-se triste e assustado.
- Não… - Foi a única coisa que ele conseguiu dizer em meio a um suspiro. deixou de me olhar e eu notei seus olhos percorrerem as paredes do quarto. A ficha estava caindo. O mundo dele estava desabando. - Não. Não pode ser… - Ele não conseguia acreditar. Ele não queria acreditar. - Ele não pode ter feito isso! Ele não.. - começou a negar incessantemente com a cabeça e eu notei seus olhos se encheram instantaneamente de lágrimas.
- Calma. - Eu toquei uma de suas mãos e a segurei. A coisa que eu mais queria agora era acalmá-lo.
- Você não podia ter deixado ele fazer isso. !- puxou a mão que eu segurava, me fazendo olhar em seu rosto. - Me diz que você não deixou ele fazer isso. - Ele estava transtornado. Eu não tinha o que responder. A tristeza em meus olhos e o gesto com a cabeça soou pra ele como o ‘sinto muito’ que eu não conseguia pronunciar.
- Meu Deus. - suspirou, enquanto negava novamente com a cabeça. Saber que o Mark arriscou a sua vida para salvá-lo era de longe a maior e a pior coisa que já tinham feito por ele. Ele sabia que a intenção do irmão mais velho foi a melhor de todas, mas a intenção não mudava a forma como o estava se sentindo naquele momento.
O silêncio dele só serviu para me deixar mais angustiada. Eu queria abraçá-lo e queria consolá-lo, dizendo que tudo ia ficar bem, mas o simples gesto dele de soltar a minha mão me fez perceber que alguma coisa havia mudado. Eu fiquei alguns longos minutos ao lado dele e ele não conseguiu me olhar uma só vez. Eu não sabia o que ele estava sentindo, mas eu sabia que o sentimento que estava relacionado a mim não era bom. Eu estava muda ao lado dele, mas ainda tinha coragem para olhá-lo. Foi com essa coragem que eu vi uma lágrima solitária escorrer de um dos olhos dele. Além de ser uma lágrima solitária, era também a lágrima mais dolorosa e triste que eu já havia visto percorrer naquele rosto que eu conhecia tão bem.
O que o sentia era uma mistura maluca de decepção, tristeza, dor, amor e preocupação. Ele não sabia e nem poderia administrar tudo aquilo sem deixar que ao menos uma lágrima escorresse de seus olhos. Apesar de ele e o Mark terem se aproximado muito nos últimos dias, jamais esperaria uma atitude tão extravagante da parte dele. Não que ele não achasse que o Mark fosse uma boa pessoa. Pelo contrário! confiava no irmão e sabia muito bem a pessoa incrível que ele era. Ele só ficou extremamente surpreso com a atitude nobre, bonita e ao mesmo tempo tão triste do irmão mais velho. Tudo o que aconteceu dizia muito sobre o tipo de pessoa que o Mark era e, principalmente, sobre o tipo de relação que os irmãos Jonas teriam dali pra frente.
Eu não sabia se eu ia embora ou se eu fazia companhia pra ele. Eu não sei se ele queria a minha companhia. Eu não sabia se ele queria ouvir a minha voz ou me ver. Honestamente, eu não sabia o que fazer. Olhando pra ele, eu não conseguia ver nada além de tristeza. Os olhos estavam baixos e estavam fixos nas mãos dele. A lágrima que tinha escorrido pelo seu rosto já havia secado, mas nos olhos dele havia mais um bocado delas. Eu pude vê-las quando ele finalmente voltou a me olhar. O olhar que me desarmou completamente e basicamente me fez sentir vontade de implorar por desculpas.
- Eu tentei. - Eu afirmei, engolindo o choro que quase havia me impedido de falar.
- Você me conhece muito bem. Você sabia que eu jamais concordaria com essa besteira que ele fez. - também estava engolindo o choro, mas ele conseguia falar com mais frieza do que eu.
- Eu sei. - Eu concordei com ele.
- Você era a única pessoa que sabia sobre tudo. Você era a única pessoa que sabia sobre eu e o Mark. Você era a única pessoa que poderia ter evitado que ele arriscasse a vida dele por mim. - me falou o que eu já sabia, mas não tinha coragem de assumir. Não tinha coragem porque eu sinceramente não sabia se conseguiria carregar mais esse fardo.
- Eu sei! Eu sei que eu poderia ter evitado tudo isso, mas… ele estava tão certo sobre tudo. Ele estava tão feliz por poder te ajudar. - Eu tentei justificar algo que não tinha justificativa.
- E em mim? Alguém pensou sobre como eu ficaria se o meu irmão morresse pra me salvar? Alguém pensou como eu conseguiria viver com essa culpa? - Naquele momento, ele parecia mais irritado. Mesmo com lágrimas nos olhos, ele estava muito irritado.
- Eu falei com ele. Eu tentei fazer ele mudar de ideia, mas… eu… - Eu ergui os ombros, sem saber como continuar. Naquele momento, eu me perguntei: ‘será mesmo que eu tinha feito tudo o que eu podia para evitar que o Mark colocasse sua vida em risco pelo irmão?’.
- Eu nunca pedi que você fizesse nada por mim e tudo o que eu fiz por você, eu fiz por vontade própria. Ninguém precisou me dizer. Ninguém precisou me pedir. - olhou em meus olhos. - É uma pena que, mesmo depois de tanto tempo e depois de tanta coisa que nós passamos, você não seja capaz de fazer algo por mim. - As palavras dele me acertaram em cheio. As palavras dele couberam tanto ao que eu sentia em relação a mim mesma e faziam tanto sentido, levando em consideração a culpa que eu sentia, que eu resolvi abraçá-la de vez. Uma coisa tão ruim foi crescendo dentro de mim que a minha vontade era sentar e chorar tudo o que eu precisava chorar, porém, o pouco de dignidade que ainda existia em mim me manteve de pé ao menos para olhar pra ele e concordar com as palavras que ele tinha me dito.
- Eu te entendo completamente. - Deixei de olhá-lo para esconder as lágrimas em meus olhos.
- Não, você não entende. - respondeu na mesma hora.
- Eu entendo. - Eu insisti, voltando a olhá-lo. - O que o Mark fez por você foi o mesmo que você fez pelo meu pai. - Eu fiz a comparação. - Sobre o meu pai, eu só posso te agradecer com todo o meu coração. Sobre o Mark, não há nada que eu possa dizer além de… sinto muito. Eu sinto muito se te decepcionei. - Continuei engolindo o choro. Deixei de olhá-lo, pois já pretendia sair do quarto. - Eu… vou te deixar sozinho. - Não voltei a olhá-lo e também não olhei pra trás. Só encarei a porta e fui saindo com a culpa nas costas, o nó na garganta e as lágrimas nos olhos.
Quando saí para o lado de fora do quarto e fechei a porta atrás de mim, o choro foi espontâneo. Eu me sentia uma inútil. Apesar de ter doído muito ouvi-lo falar aquelas coisas, o estava certíssimo. Quem mais poderia evitar que o Mark se arriscasse pelo irmão se não eu? Eu era a única pessoa que sabia sobre a relação de irmão entre eles. Eu era a única pessoa que soube o que o Mark queria fazer a tempo de impedi-lo. esperava essa atitude de mim. Ele esperava que eu o impedisse e que pensasse nele e em como ele se sentiria. Ele esperava que eu salvasse o irmão dele da mesma maneira que ele havia salvado o meu pai. Eu sei que eu tentei fazer o Mark mudar de ideia, mas essa sensação de que eu poderia ter feito mais é que me matava. As palavras do não doeria tanto se a carapuça não tivesse me servido tão bem.
Aquela seria a última conversa que eu teria com o em dias. Eu sempre dava algum jeito para que as notícias do Mark chegassem até ele. Eu sabia o quanto ele deveria estar preocupado e aflito e sempre acabava pedindo para um enfermeiro ir até lá e informá-lo sobre o irmão. A primeira boa notícia veio naquele mesmo dia, durante a noite: Mark estava fora de perigo. Finalmente um bom motivo para chorar. Um choro de alívio e de felicidade. e Mark estavam fora de perigo. Eu nem sabia o quanto eu havia desejado e pedido por isso. Mesmo com a culpa em meus ombros, eu estava muito mais aliviada. Aos poucos, o mundo a minha volta ganhava cores e sentido novamente.
Mark voltou a ficar consciente no final da tarde de quarta-feira. Eu fui avisada logo que ele acordou, pois eu ainda estava trabalhando no hospital naquele horário. Quando eu soube, fui imediatamente conversar com o médico responsável por ele. Eu precisava muito vê-lo. Só assim eu teria certeza de que ele estava bem e que todo aquele pesadelo havia acabado. Mark ainda estava na UTI, mas eu consegui convencer o médico a me deixar vê-lo por alguns minutos. Eu estava muito ansiosa para vê-lo e para contar a ele que o plano dele de salvar o havia dado certo.
Entrar na UTI foi uma sensação totalmente diferente da que eu sentia da última vez que eu estive lá. Assim que eu abri a porta, Mark foi a primeira pessoa que eu vi. O leito dele ficava bem ao lado da porta. Quando ele me viu, os olhos dele sorriram. Ele estava feliz por estar me vendo novamente. Ele achou que não teria mais essa oportunidade. Eu me aproximei com um discreto sorriso no rosto, enquanto ele me acompanhava com os olhos. Parei ao lado dele e fiquei olhando pra ele feito boba. Ele realmente estava bem! Ele estava bem ali!
- Por que você está me olhando assim? - Mark perguntou em meio a um sorriso.
- Assim como? - Eu me fiz de boba.
- Como se eu fosse um fantasma. - Ele fez careta.
- Você é um fantasma? - Eu arqueei uma das sobrancelhas e ele segurou o riso. Mark levou a sua mão até a minha e a segurou.
- Me diz você. - Ele referia-se ao fato de ele estar tocando em minha mão. A frase dele me arrancou um sorriso fraco. Eu não conseguia acreditar que ele estava bem ali!
- Espera. Eu preciso ter certeza. - Eu soltei a mão dele, me aproximei e o abracei. Só eu sabia o quanto eu precisava daquele abraço. Ele me acolheu com o mesmo carinho de sempre. Apesar de estar muito feliz em me ver, Mark ainda precisava saber de uma coisa. A coisa mais importante.
- Me diz que deu certo. - Mark pediu, enquanto ainda nos abraçávamos. - Me diz que ele está bem. - Com os olhos fechados e o coração na mão, ele esperava pela minha resposta. Terminei o abraço, pois fazia questão de dar a notícia olhando em seus olhos.
- Ele está bem. - Eu disse, tentando conter a minha empolgação. A expressão no rosto dele foi impagável!
- Você está falando sério? - Mark estava prestes a explodir de alegria.
- Estou! - Eu confirmei.
- , olha pra mim. Você não está mentindo, está? - Mark achou que eu pudesse estar mentindo para preservá-lo.
- Olha pra mim! Olha nos meus olhos. Você vai saber que eu não estou mentindo. - Eu disse, olhando pra ele. Mark me encarou e não demorou absolutamente nada para que ele confirmasse que eu realmente estava falando a verdade.
- Eu não consigo acreditar. - Mark estava feliz, mas ele também estava em choque e um pouco emocionado.
- Você conseguiu! - Eu toquei o ombro dele.
- Nós conseguimos! - Mark me corrigiu na mesma hora. - Eu não teria conseguido sem você. - Ele completou.
- Agora, sabendo que tudo deu certo, eu fico muito feliz por ter ajudado, mas… - Eu hesitei continuar.
- Mas… - Mark me incentivou a continuar.
- E se não tivesse dado certo, sabe? E se tivesse dado tudo errado? - Eu olhei pra ele, demonstrando estar confusa sobre o assunto. - As vezes, eu acho que não fiz o que eu podia para te convencer a desistir dessa loucura. Eu não consegui evitar. - Eu ergui os ombros. A verdade, é que eu precisava desabafar sobre as verdades que o tinha jogado na minha cara.
- Por que você está falando isso? - Mark estranhou. Apesar de tudo ter acabado bem, eu ainda parecia um pouco triste. Eu não queria falar mas, ao mesmo tempo, eu precisava falar! Enrolei algum tempo para decidir se eu contaria a ele ou não. - Fala comigo. - Ele mostrou-se preocupado.
- Eu… falei com o . - Eu deixei de olhá-lo por alguns momentos.
- Ele já acordou? - Mark ficou surpreso.
- Ele acordou ontem. - Eu informei a ele.
- Sério mesmo!? Eu achei que demoraria um pouco mais. - Mark ficou muito feliz em saber que seu irmão já estava consciente.
- A transfusão de sangue foi imediata. Imagino que isso tenha ajudado. - Eu comentei.
- Como ele está? - Mark quis saber.
- Ele está ótimo. Ele só um está um pouco abatido, mas fora isso, parece que nada aconteceu com ele. - Eu contei a ele.
- E… ele… já sabe? - Mark referia-se ao seu ato heroico.
- Sim, ele já sabe. Ele perguntou por você e eu tive que contar. - Eu ergui os ombros.
- Como ele reagiu? - Ele perguntou com um certo receio.
- Da pior maneira possível. Você conhece o seu irmão, né? - Eu rolei os olhos ao negar com a cabeça.
- Agora eu entendi o porquê de você estar assim. - Mark já havia deduzido tudo.
- Não é nada disso. Eu não estou de jeito nenhum. - Eu neguei na mesma hora. - Vocês dois estão bem e estão a salvo. Isso é tudo o que importa pra mim agora. - Eu desconversei. O cara acabou de acorda de um coma. Por que eu estou compartilhando os meus dramas com ele?
- O que foi que ele te falou? -Mark quis saber.
- Não foi nada. - Eu continuei desconversando.
- O sendo idiota, pra variar. - Mark resmungou.
- Não, ele não foi um idiota. - Eu neguei. - Talvez, ele até estivesse com a razão dessa vez. - Eu disse como se estivesse em dúvida, mas aquilo era mais do que fato pra mim.
- Olha, eu não sei o que ele te disse, mas… eu posso te afirmar com toda a certeza do mundo que você foi perfeita nesses últimos dias. Em todos os aspectos! Eu não sei o que eu teria feito ou o que teria acontecido se você não estivesse do meu lado todos esses dias. - Sabendo que eu estava mal, Mark achou que eu precisava ouvir aquilo. A frase dele me arrancou um sorriso emotivo.
- Obrigada por essas palavras. Elas vieram no momento certo. - Eu me aproximei, beijei carinhosamente o rosto dele e voltei a abraçá-lo. As palavras dele fizeram com que a culpa pesasse um pouco menos e fizeram com que eu me sentisse melhor. Esse era o poder que o Mark tinha sobre mim.
Com o Mark e o bem, eu pude voltar a minha vida real; ao mundo real. Eu pude voltar pra casa, pra minha cama e pro meu travesseiro. Eu pude dormir sem medo de ouvir o meu telefone tocar durante a noite com a pior notícia que eu poderia receber. Eu pude tomar banho sem a pressa em ter que voltar para o hospital. Eu pude comer uma comida descente pela primeira vez naquela semana. Eu estava cansada e esgotada mental e fisicamente. Eu já nem lembrava como era a minha vida antes de tudo aquilo acontecer. Eu teria que me readaptar.
Apesar de estarem no mesmo hospital, Mark e demoraram quase 2 dias para terem a oportunidade de se reencontrarem, já que o permaneceu no quarto, enquanto o Mark precisou ficar mais algum tempo em observação. Durante esses dois dias, eu passava na UTI para ver e conversar com o Mark sempre que podia. O mesmo não aconteceu com o . Eu não me sentia mais tão próxima a ele. Eu não sentia que tinha clima para um reencontro e eu também não tinha a mínima vocação para ser cara de pau.
Sempre que aparecia algum trabalho na área dos quartos, eu delegava para a Meg. Eu estava mesmo evitando, de todas as formas, encontrá-lo. Mesmo estando afastada dele, eu sempre dava um jeito de saber notícias sobre ele e também de passar a ele todas as notícias sobre o Mark. Foi dessa maneira que o descobriu que o irmão sairia da UTI naquele dia e iria para o quarto. Foi dessa maneira que o reencontro dos irmãos aconteceu.
Quando o Mark entrou em seu quarto, estava lá esperando por ele. A reação, a troca de olhares, tudo! Tudo aconteceu de maneira mais impactante pro , enquanto pro Mark foi tudo mais descontraído. Mesmo existindo a vontade, o abraço entre irmãos não aconteceu. Eles nunca realmente souberam como lidar um com o outro e com essa coisa de irmãos. Eles achavam um pouco constrangedor essa demonstração gratuita de sentimentos.
- Como você está? - foi o primeiro a se manifestar. Eles estavam frente a frente.
- Olha, eu já estive pior. - Mark afirmou com um sorriso descontraído.
- Eu soube. - manteve-se sério.
- E você? Achei que demoraria mais alguns dias para eles deixarem você levantar da cama. - Mark disse, enquanto o analisava.
- Bem, eles não deixaram. - deixou um fraco sorriso escapar e imediatamente sentiu o olhar de julgamento do irmão.
- Como é que é? - Mark o olhou feio.
- Se alguém entrar aqui, eu vou ser obrigado a me esconder embaixo da sua cama. - comentou, demonstrando estar mais descontraído.
- Você é mesmo muito irresponsável, não é? - Mark negou com a cabeça ao dar a bronca.
- Você é o irmão mais velho. Você precisa ser responsável, eu não. - ergueu os ombros.
- Eu não sei se você lembra, gênio, mas você também é irmão mais velho. - Mark referia-se a .
- O que? A ? - fez careta.
- Eu conheci ela. - Mark contou.
- Adorável, né? Aposto que ela te odiou. - riu.
- É claro que não! Ela me adorou! - Mark afirmou com um sorriso maldoso.
- Até parece! Ela odeia todos os meus amigos e, as vezes, eu acho que ela me odeia também. - desacreditou.
- Bom, nós não podemos culpá-la por isso. - Mark ergueu os ombros e fingiu lamentar.
- Muito engraçado. - sorriu ironicamente.
- Agora, falando sério. - Mark ficou mais sério e hesitou poucos segundos para perguntar. - Você... está mesmo bem? - Os olhares que eles trocavam mudou. afirmou com a cabeça antes de responder qualquer coisa.
- Eu estou bem. - disse. - Graças a você. - Ele completou.
- Isso… é ótimo, cara. - Mark sorriu, demonstrando tranquilidade diante da resposta dada pelo irmão mais novo.
- É… isso é ótimo… agora, mas… - não tinha certeza se devia tocar no assunto.
- Mas o que? - Mark questionou. Parecia que ele sabia o que estava por vir.
- Mas poderia ter sido tudo diferente. - resolveu falar.
- Como assim? - Mark não entendeu.
- As coisas poderiam ter terminado de uma maneira bem diferente, Mark. E você sabe disso. - foi mais enfático. Ele sabia bem que o irmão sabia do que se tratava. - No que você estava pensando? - Ele questionou. Mark deixou de olhá-lo e sorriu sarcasticamente.
- Eu não sei porque eu não estava esperando por isso. - Mark rolou os olhos. - Isso é bem a sua cara mesmo. - Ele voltou a olhá-lo.
- Como você esperava que eu reagisse? Você poderia ter morrido, aliás, você quase morreu. - argumentou a seu favor.
- Bem, eu estou bem aqui, não estou? - Mark respondeu na mesma hora.
- Qual é! Você sabe do que eu estou falando. - o pressionou.
- , olhe pra nós! Nós estamos bem. Está tudo bem! Por que voltar nesse assunto? Nós não podemos simplesmente aproveitar essa oportunidade de estarmos juntos de novo? Nós não podemos comemorar por um segundo? - Mark não queria discutir. Ele só queria ficar bem com o irmão de uma vez por todas. Ele queria trégua.
- Cara, isso não sai da minha cabeça desde o momento em que eu soube o que você tinha feito. - falou com mais jeito para não parecer grosseiro. Essa não era a sua intenção.
- Esqueça isso! - Mark pediu e o negou com a cabeça como se dissesse ‘Eu não consigo!’.
- Você quer saber o que eu pensei no momento em que eu soube de tudo? - ignorou o pedido de Mark e continuou tentando expor os seus argumentos. - Eu pensei: ‘O que eu vou fazer se esse cara morrer? Como eu vou viver sabendo que ele morreu pra me salvar e eu não pude fazer nada por ele?’. - Discretas lágrimas surgiram nos olhos de . Ele disfarçou.
- E como você acha que eu viveria sabendo que tive a chance de te salvar e não salvei? - Mark debateu na mesma hora. Ele estava um pouco mais irritado que o .
- Me salvar? - Ele indagou. - Esse não é o seu trabalho. - negou com a cabeça.
- Sério? E quem foi que disse que não é o meu trabalho? - Mark arqueou uma das sobrancelhas. - Não me diga que é mais uma dessas suas regras de irmãos? - Ele sorriu com ironia.
- Sério? Acha mesmo isso engraçado? - perguntou, incrédulo.
- Sabe o que eu realmente acho engraçado? Você estar aqui me julgando por salvar o seu traseiro e limpar a sua bagunça, só pra variar. - Mark perdeu um pouco a paciência.
- Minha bagunça! Você não tinha nada que se intrometer. - devolveu a grosseria.
- Você está se escutando? Você fala e eu só consigo ouvir ‘eu, eu, eu, eu’. - Mark rolou os olhos. - Eu não sei se você percebeu, mas você não está sozinho no mundo. Existem pessoas ao seu redor. Pessoas que se importam com você. Pessoas que se importam com o fato de você estar vivo ou morto. Pessoas que jamais superariam se o pior acontecesse com você. - Mark estava se referindo, principalmente, a família do , que entendeu exatamente o que ele quis dizer. O argumento de Mark o fez pensar por algum tempo. Mark chegou a pensar que tivesse ganhado aquela discussão.
- Agora, eu entendi. - afirmou com a cabeça. Ele ainda parecia um pouco pensativo.
- Entendeu o que? - Mark arqueou uma das sobrancelhas.
- Entendi o porquê de você ter feito o que fez. - não foi muito claro. - Eu tenho uma família. Eu tenho amigos. Eu tenho pessoas a minha volta que sofreriam se algo pior acontecesse comigo, mas… você não tem. Não é isso? - Ele tentou explicar o ponto de vista do irmão e demonstrou não concordar com ele. Mark ficou um pouco cabisbaixo com o assunto.
- Não foi só por isso. - Mark tentou se justificar, mas sua frase não o convenceu e deu ao a certeza de que a sua teoria estava certa.
- Que droga, Mark. - resmungou, irritado.
- Não fica bravo comigo, cara. - Mark negou com a cabeça e deixou de olhá-lo. - Eu sei que você não concorda com o que eu fiz, mas... - Ele voltou a olhar para o irmão mais novo. - Você não entende. Eu precisava fazer isso. - Mark completou ao erguer os ombros.
- Como pôde passar pela sua cabeça que o que você fez por mim evitaria dor e tristeza? Como você pôde pensar que não haveria ninguém aqui pra sofrer a sua perda? - questionou, sem conseguir acreditar. - Você tem uma família! Você tem a mim. - Ele queria que o Mark soubesse. - Não ouse cogitar, nem por um segundo, que você está sozinho. Você não está!- As palavras do o surpreenderam. - Se o seu trabalho é cuidar de mim, saiba que o meu trabalho também é cuidar de você. - Saber que o irmão mais novo se importava daquela maneira deixou o Mark extremamente comovido. Ele nunca teve isso antes.
- Eu… agradeço por você estar me dizendo isso. - Mark ficou até sem jeito.
- Me agradece? - o olhou com reprovação. - Eu não estou falando isso pra te agradar, não. Eu estou falando sério! - Ele reafirmou. - Se algum dia eu ver você falando de novo sobre estar sozinho ou qualquer coisa nesse sentido, eu quebro a sua cara. Entendeu? - ameaçou e logo viu o irmão deixar um sorriso escapar.
- Quebra a minha cara? Você e mais quantos? - Mark provocou, fazendo com que risse com deboche.
- Cala a boca. - rolou os olhos e estendeu uma das mãos na direção de Mark. Ele encarou sua mão antes de levá-la até a de . Um aperto de mão que parecia ser a primeira demonstração de afeto entre os irmãos. Apesar de ser um pouco orgulhoso e odiar demonstrar qualquer tipo de sentimentalismo perto do irmão mais velho, decidiu que aquele simples aperto de mão parecia pouco diante de tudo o que eles passaram. - Qual é!Vem aqui. - puxou a mão de Mark e o acolheu com um abraço. Um abraço que o Mark não esperava receber tão cedo. A princípio, ele ficou sem saber como reagir. Não demorou muito para que o abraço fosse correspondido. Mark tocou as costas do irmão. A atitude do irmão mais velho arrancou um fraco sorriso de .
- Me desculpa por tudo o que eu te fiz passar e… - começou a dizer, enquanto eles continuavam abraçados. - Obrigado pelo que você fez. - Ele completou.
- Tudo bem, irmão. - Mark sorriu totalmente emocionado, enquanto dava um ou dois tapas leves nas costas do irmão. O abraço foi terminado.
- Você chora como um bebê. - sacaneou o irmão assim que viu os seus olhos cheios de lágrimas.
- Vai se ferrar. - Mark esbravejou, mas deixou um engraçado sorriso escapar.
- Idiota. - fez careta.
- Babaca. - Mark devolveu na mesma moeda.
- Licença. - Uma voz os interrompeu repentinamente, enquanto alguém abriu a porta do quarto. achou que estava ferrado. - Como você… - Meg ia dizendo e parou ao ver que o melhor amigo estava companhado. - Mas… o que você está fazendo aqui? - Ela disse em tom de bronca.
- Eu estou fazendo compras. Não deu pra notar? - ironizou.
- Você não pode ficar aqui, engraçadinho! Aliás, você não pode ir a lugar algum. - Meg respondeu, irritada.
- Para com o drama. Eu já estava saindo. - a olhou com indiferença.
- Estava não. Você está saindo! Agora. - Meg apontou em direção a porta.
- Espera. Eu só… - voltou a olhar pro Mark, mas foi novamente interrompido.
- Você me ouviu ou vai me obrigar a chamar os enfermeiros pra te levar de volta pro seu quarto? - Meg ameaçou.
- Isso é mesmo necessário? - achou que ela estivesse exagerando.
- Você pode não acreditar, mas estou prezando pela sua saúde. O médico recomendou repouso absoluto. Então, seja responsável e faça o repouso necessário. - Meg afirmou. - Se você não quiser fazer isso por você, faça pelas pessoas que você ama e que sofreram horrores por sua causa nos últimos dias. - Ela completou com uma lição de moral que o já tinha escutado naquele dia.
- Ok! Eu entendi. - Apesar de as palavras ditas por ela terem causado um certo incomodo nele, foi obrigado a concordar com ela. - Eu te vejo depois. - Ele se despediu rapidamente do irmão.
- Se cuida. - Mark disse ao vê-lo sair pela porta.
- Juro que ainda não consigo aceitar essa história de que esse idiota é o seu irmão. - Meg disse em um tom de voz mais baixo.
- Ele não é tão ruim quanto parece. - Mark fez careta.
- Eu assumo que ele já foi bem pior, mas eu continuo não suportando ele. - Meg rolou os olhos.
- Eu entendo essa sua repulsa por ele. Eu entendo mesmo. Você sabe! Mas… dá uma chance pra ele. - Mark pediu com jeitinho.
- Ah não… não me peça isso. - Meg negou com a cabeça.
- Por favor! Por mim! - Mark insistiu com um sorriso encantador no rosto.
- Ta… eu… posso tentar. - Meg acabou cedendo mesmo estando contrariada.
- Yay! - Mark comemorou aos risos.
- O que eu não faço por você, né? - Meg desaprovou a sua comemoração com o olhar.
Para o Mark, a conversa com o tinha sido libertadora. Foi a confirmação de que eles realmente estavam mais unidos do que nunca e que, apesar das brigas bobas, eles eram irmãos e se viam como irmãos de uma maneira que nunca tinha acontecido antes. Pela primeira vez, Mark tinha alguém do seu lado, alguém da família, alguém do seu sangue dizendo a ele ‘Hey, eu estou aqui! Você não está sozinho.’. Essa sensação era indescritível para ele. Ele nunca achou que se sentiria tão familiarmente ligado a alguém de novo. Ele nunca imaginou que teria alguém que chamaria de irmão.
Já para o , a conversa com o Mark tinha sido um pouco mais intensa e profunda. Não que ele não tenha ficado feliz com o fato de eles terem finalmente se acertado. Ele estava muito feliz e empolgado por ter, pela primeira vez, um irmão mais velho. Porém, a conversa tinha ido um pouco mais além para ele. Mark foi capaz de arriscar a sua vida por ele. Alguém tem noção da proporção disso? já era irmão de há tempos e sempre disse que faria tudo por ela, mas nunca imaginou que os sentimentos envolvidos em uma afirmação como essa eram muito maiores do que as palavras demonstravam ser. Você só entende esse conceito de ‘fazer tudo por uma pessoa’ quando esse tudo é realmente tudo. Bem, o Mark tinha feito tudo pelo . Ele tinha certeza que se sua mãe pudesse, ela também teria feito tudo por ele. Esse é o verdadeiro significado de família. Você ama tanto essas pessoas que você chama de família, que faria qualquer coisa no mundo para ajudá-los, salvá-los e vê-los felizes. Chegar a essa conclusão fez com que o pensasse: ‘o que eu estou fazendo pela minha família?’.
Os dias tediosos que ele passou repousando naquela cama de hospital serviram para que ele entendesse que as suas atitudes, apesar de dizer respeito a sua vida, também dizia respeito a todos que, consequentemente, sofriam com elas. A atitude de ter entrado na frente daquela bala era um bom exemplo disso. estava ciente de que fez aquilo porque quis. Ninguém mandou ou pediu que ele fizesse aquilo. Seu coração mandou que ele tomasse aquela atitude tão repentina, que ele jamais se arrependeria de ter tomado. Mas era inevitável não pensar nas consequências que a sua atitude gerou em sua família. Mark quase perdeu a sua própria vida para salvá-lo. Pelo que soube, sua mãe tinha emagrecido vários kg e sofreu mais do que qualquer pessoa; e tinha até ficado um pouco mais carinhosa com ele, pois a possibilidade de perder o seu irmão realmente a traumatizou. Tanto sofrimento e tristeza por uma simples atitude. Atitude tomada com o coração sim, mas que ia além do amor que ele sentia por qualquer garota no mundo, nesse caso, eu.
Mark recebeu alta 3 dias depois de ir para o quarto e ia visitar o irmão todos os dias durante 1 semana. Em uma dessas visitas, pode reunir toda a família: Mark, sua mãe, o padrasto e a . Foi nesse encontro que ele contou sobre o filho que o Steven Jonas tinha tido antes de conhecer sua mãe. Não houve qualquer tipo de ressentimento por parte da mãe do que, na verdade, ficou bastante emocionada com a notícia. não entendeu muito bem e certamente levaria alguns dias para entender, mas de uma coisa ela sabia: aquele garoto tinha salvado o seu irmão.
- , você já conhece o Mark, não é? - queria ter certeza que a irmã se lembraria do Mark.
- Aham. - afirmou com a cabeça, indo até ele. - Você lembra de mim? Sou amiga da . - Ela perguntou, olhando para o Mark, que tinha agachado em sua frente para poder vê-la de mais perto.
- É claro que eu me lembro. Como eu esqueceria uma garota tão linda como você? - Mark foi gentil e na mesma hora viu um sorriso surgir no rosto da garota.
- Agora eu entendi porque ela gosta de você. - comentou, fazendo careta. Mark segurou o riso e pediu que ele ficasse quieto.
- Obrigada. - agradeceu, sem jeito. Ela ficou algum tempo em silêncio, pensando se aquele era o momento certo para dizer o que estava em seu coração. Ela decidiu que sim. - Eu… não te conheço muito bem e não estou entendendo nada dessa conversa de adulto de vocês… - Ela olhou rapidamente para os pais e logo voltou a olhá-lo. - Mas eu queria te falar uma coisa. - estava séria. Ninguém que estava no quarto fazia ideia do que ela estava prestes a dizer.
- Eu estou te ouvindo. - Mark também ficou sério, dando a ela toda a atenção que ela merecia.
- Minha mãe me contou sobre o que você fez. Ela me contou que você salvou a vida do meu irmão. - Os olhos dela se encheram de lágrimas. Ela parecia nervosa, pois não queria chorar. A frase fez com que e Mark trocassem olhares. sorriu para ele como se dissesse ‘Você merece esse reconhecimento.’. Mark não soube como agir, mas voltou a olhá-la. - Eu queria te agradecer muito. - Ela agradeceu visivelmente emocionada.
- Não precisa. - Mark negou com a cabeça, achando a atitude dela a coisa mais doce e fofa de todas.
- Eu sei que eu brigo muito com ele e que ele adora ficar me irritando, mas ele é o meu irmão e eu ficaria… muito triste se eu não pudesse ver… ele mais. - quase não conseguiu terminar a frase por causa do choro. Mark estava quase morrendo com aquela atitude e com aquelas palavras ditas pela garotinha.
- Se depender de mim, você vai poder brigar com ele pra sempre. - Mark disse em meio a um sorriso e com poucas lágrimas em seus olhos. deixou um fraco sorriso escapar antes de se aproximar e abraçá-lo com força.
A cena foi tão inocente, mas também foi muito forte. Todos no quarto ficaram emocionados. Ninguém esperava uma atitude assim de uma criança. pegou todos de surpresa, mas foi da melhor maneira possível. Ao ver aquela cena e ver toda a sua família unida e feliz, chegou a conclusão do que teria que fazer. Ele não faria por ele, ele faria por sua família. Ele faria isso, principalmente, para preservar sua família. Ele faria isso para ter mais momentos como aquele que tinha acabado de presenciar.
Durante toda a semana que o permaneceu no hospital, eu consegui evitá-lo. Eu não voltei a vê-lo desde a conversa que tivemos em que eu contei pra ele sobre a atitude de Mark para salvá-lo. A família de ficou mais alguns dias hospedados na minha casa e foi por eles que eu soube que a saúde dele nunca esteve melhor e que ele só continuava no hospital para cumprir os 7 dias de repouso que o médico havia recomendado. Com o estado de saúde do , a família dele optou por voltar para Atlantic City para resolver assuntos financeiros e até mesmo resolver a situação de na escola e dos pais em seus respectivos trabalhos. também já tinha insistido bastante para que eles voltassem para casa para resolverem suas coisas e para que eles não se preocupassem com ele, pois já estava tudo mais do que bem.
Quando a família de foi embora, Mark passou a ser o meu único informante. Na verdade, ele fazia isso sem qualquer intenção e sem nem perceber. Eu nunca perguntava sobre o diretamente, mas ele sempre acaba comentando alguma coisa. E foi dessa maneira que eu soube que ele receberia alta naquela sexta-feira. A notícia era duplamente boa. Primeiro porque o voltaria a viver sua vida normalmente e segundo porque eu voltaria a viver normalmente a minha rotina dentro daquele hospital.
As altas dos pacientes costumavam a acontecer no período da manhã, portanto, eu já estava bem mais tranquila no final da tarde daquela sexta-feira, pois deduzi que ele já tinha deixado o hospital. Atendi o meu último paciente era um pouco mais de 7 horas da noite. Meg já tinha ido para casa, mas acabei fiquei um pouco enrolada com uma garotinha, que não queria me deixar colher o seu sangue. Demorou algum tempo, mas eu consegui acalmá-la e terminar o meu trabalho. Deixei a sala junto com a mãe e a garotinha e acabamos conversando por alguns minutos. Me despedi delas e a mãe me agradeceu mais uma vez por toda a minha atenção e delicadeza com sua filha.
Eu estava exausta. O dia tinha sido longo. A notícia boa é que era sexta-feira, portanto, eu teria o final de semana todo para descansar e colocar os meus estudos em dia, mas, naquele momento, eu só queria pegar as minhas coisas e ir para casa. Bati o meu ponto de saída do hospital e fui em direção a sala que era usada por mim e pela Meg. Eu tinha que deixar o meu jaleco lá e pegar a minha bolsa. Abri a porta da sala com a mesma naturalidade de sempre e assim que adentrei na sala me deparei com ele, a pessoa que eu havia evitado naquela última semana. Os olhos dele ficaram imediatamente fixos em mim. Ele queria saber qual seria a minha reação, que internamente tinha sido muito pior do que fisicamente.
- Desculpa invadir a sua sala assim. - Ele estava com o quadril apoiado em uma das mesas da sala e assim que terminou a frase, se afastou dela e começou a vir na minha direção. - Mas… eu precisava muito falar com você. - Ele completou ao parar em minha frente. Eu demorei alguns segundos para cair na real.
- Claro. Nós podemos conversar. - Eu afirmei com a cabeça, sem saber o que esperar daquela conversa. Estar perto dele me fez ficar um pouco chateada por causa da última conversa que tivemos. Não, eu não estava chateada com ele porque, pra mim, ele estava com toda a razão. Eu estava chateada com toda a situação em si. Eu não esperava encontrá-lo tão cedo.
- Eu não sei se estou atrapalhando o seu trabalho. Talvez, eu… - estava tentando adiar aquela conversa mais uma vez. Era o que ele tinha feito durante toda a semana.
- Não, não está atrapalhando. Na verdade, eu já estava indo embora. - Eu o interrompi.
- Ok, então. - esboçou um discreto e nervoso sorriso. - Bem… - Ele deixou de me olhar e passou a olhar para qualquer outro lugar da sala. Ele estava procurando as palavras certas. - Eu não sei por onde começar. Eu… tenho pensado nisso nos últimos dias e tenho tentado adiar essa conversa ao máximo, mas… - hesitou mais uma vez. - Eu recebi alta hoje. Não sei se você ficou sabendo. - Ele me comunicou.
- É, eu soube. - Eu afirmei com a cabeça. - Estou feliz por você. - Eu sorri fraco.
- É, eu achei que esse dia não chegaria nunca e que, portanto, eu conseguiria ficar adiando esse momento, mas… como hoje é o meu último dia aqui, eu sinto que preciso fazer isso hoje. - O mistério que ele estava fazendo e o nervosismo mais do que evidente dele estavam me deixando um pouco receosa.
- Certo. - Eu estava esperando que ele finalmente dissesse o que tanto queria.
- Primeiro, eu queria me desculpar pela forma que falei com você da última vez que estivemos juntos. - O nervosismo continuava com ele, mas agora ele conseguia olhar nos meus olhos. - Você não merecia ouvir nada daquilo. Eu fui pego de surpresa com tudo o que tinha acontecido, mas nada justifica. - Os olhos dele me passavam sinceridade.
- Não, você não precisa se desculpar. Você tinha toda a razão. Eu não podia… - Eu estava prestes a confirmar que eu realmente era culpada por tudo, pois era exatamente assim que eu me sentia, mas ele me interrompeu.
- Não. - disse negando a cabeça. - Não faça isso. - Ele pediu. - Não ache que você tem qualquer culpa em tudo isso, porque você não tem. - Ele reafirmou.
- Ok. - Eu afirmei da boca pra fora, pois sabia que era isso o que ele queria ouvir.
- Eu estou falando sério. - Ele percebeu que eu não afirmei com sinceridade. - Não faça isso. Eu estou te pedindo. - ficou ainda mais sério.
- Não é tão fácil quanto parece. - Eu disse antes de abaixar a cabeça e deixar de olhá-lo por um momento. - Só eu sei o que eu passei nesses últimos dias, o que eu senti e as coisas que eu vi. Eu vi você em uma cama de hospital. Eu vi o Mark em uma cama de hospital. Eu vi a sua mãe sofrer mais do que qualquer outra pessoa no mundo e eu sabia que você tinha sacrificado tudo por mim e que o Mark, consequentemente, tinha sacrificado tudo por você. - Meus olhos foram se enchendo de lágrimas, enquanto eu falava.
- Você não pode se culpar por uma decisão que foi minha. Você não pode se culpar pelo Mark ter feito de tudo pra limpar a bagunça que eu fiz. - A maneira como aquilo parecia me machucar doía mil vezes mais nele. - Eu realmente entrei na frente daquela bala por você. Eu não vou negar isso, mas… continua sendo uma decisão minha. Minha decisão. Era o meu coração me dizendo pra fazer aquilo. Era o amor que eu sentia… - Ele fez uma pausa antes de corrigir o tempo verbal. - Que eu sinto por você me mandando fazer aquilo. - Eu escutava com atenção, mas ele dizendo que ainda me amava fez tudo ganhar uma proporção muito maior dentro de mim. Os olhos já estavam cheios de lágrimas, então não foi nada difícil para que algumas delas escorressem pelo meu rosto. Foram essas lágrimas que fizeram ele se aproximar ainda mais e segurar o meu rosto com suas mãos, enquanto seus dedos secavam as lágrimas e o caminho por elas percorrido. - Eu quero que você saiba que eu não te culpo por absolutamente nada. Eu sei que você deu o seu melhor todos esses dias. Eu sei que você não saiu desse hospital enquanto não soube que eu estava fora de perigo. - Também haviam poucas lágrimas nos olhos dele, que não deixavam de olhar nos meus um só segundo. - Eu também sei que você hospedou a minha família na sua casa durante todos esses dias. - Eu neguei sutilmente com a cabeça como se dissesse ‘Isso não foi nada demais.’. - Minha mãe me contou tudo isso. - contou com um fraco sorriso no rosto, afastando a sua mão do meu rosto, mas mantendo a proximidade. - Ela também me disse que eu deveria te agradecer por tudo isso. E… eu disse pra ela que não daria pra fazer isso porque nós tínhamos brigado. - Ele fez uma breve pausa. - E então, ela resolveu me dar um conselho. Ela me disse que eu deveria deixar de ser tão orgulhoso… - Ele falou, me fazendo sorrir involuntariamente. O meu sorriso fez com que ele olhasse por poucos segundos para os meus lábios. - E que eu deveria vir te procurar porque você era uma garota maravilhosa e era a garota perfeita pra mim. - Novamente uma pausa. Ele gostava de me ver sem jeito.
- E o que você disse pra ela? - Eu quis saber.
- Eu não disse nada, pois não queria decepcioná-la. - A resposta dele não era a que eu esperava ouvir.
- Decepcioná-la? - Eu arqueei uma das sobrancelhas, tentando entender.
- Decepcioná-la sim, porque se eu fosse dizer o que eu realmente queria, eu diria que o conselho dela tinha sido totalmente desnecessário porque, na verdade, tudo o que ela tinha me dito, eu já sabia desde… - ergueu os ombros. - Desde sempre. - Ele completou. Ele estava mesmo se declarando? Meu coração já estava quase saindo pela boca, mas alguma coisa me dizia que não era exatamente isso o que ele queria dizer.
- Mas… - Eu sabia que teria um ‘mas’. Ele não poderia estar tão nervoso só porque estava se declarando, certo? Quando me ouviu dizer a palavra que ele estava prestes a pronunciar, o olhar dele parecia lamentar.
- Mas… - Respirou fundo antes de continuar. - Mesmo sabendo de tudo isso, eu… eu não posso. Eu não posso ficar com você. - Os olhos tristes continuavam me encarando, esperando uma reação. Eu não estava tão surpresa. Para ser honesta, eu sabia que a nossa conversa ou a nossa história acabaria daquela maneira, mas eu não sabia que doeria tanto. Eu achei que estivesse mais preparada para lidar com aquilo.
- Eu entendo. - Mesmo com os olhos marejados, eu sorri pra ele. Independente de qualquer coisa, eu continuava sendo grata a ele por tudo o que ele tinha feito por mim e por tudo o que ele tinha me feito sentir.
- Eu não quero que você pense que… - começou a dizer, mas eu o interrompi.
- Você não precisa se justificar. - Eu sabia que ele não me devia qualquer tipo de satisfação, afinal, nós não estávamos em um relacionamento. Quando terminei a frase, fiz um favor para nós dois e me afastei, indo para o fundo da sala. Encarei uma das mesas. Eu estava de costas pra ele agora.
- Mas eu quero. - insistiu, me olhando ainda de costas. - Eu não quero que você pense que eu estou fazendo isso porque eu não amo você. - Fechei os olhos, tentando controlar o choro, a tristeza e qualquer outra dor que eu sentia dentro do meu peito. - Eu estou fazendo isso porque eu amo você. Eu amo tanto, que esse amor não me deixa enxergar nada e nem ninguém ao meu redor. Esse amor tem me consumido durante toda a minha vida e, de repente, eu deixei de dividi-lo com outras pessoas. Pessoas que me amam. Pessoas que se importam comigo. Minha família – As explicações dele começavam a fazer sentido pra mim. A justificativa dele foi o que mais me pegou desprevenida. Demonstrou um lado maduro e genuíno dele que, no fundo, eu sabia que existia. Apesar de genuíno, não tornava aquilo menos doloroso, mas, de qualquer forma, me fez ter vontade de olhá-lo. Me virei pra ele e mantive a distância. - O nosso amor foi tão intenso que eu seria capaz de fazer qualquer coisa por ele. Eu fiz tudo por ele. Sem pensar em qualquer consequência. E esse foi o meu erro. - Eu não fiz nada além de concordar com a cabeça com o que ele dizia. - Não me entenda errado. - Ele achou que, talvez, eu tivesse entendido erroneamente.
- Não. Eu entendi perfeitamente. - Eu tentei tranquilizá-lo deixando um fraco sorriso em evidência.
- Eu não me arrependo de nada que eu fiz. - deu poucos passos em minha direção. - Esteja certa de que se acontecesse tudo de novo, se eu tivesse outra oportunidade, eu entraria na frente daquela bala mais uma vez… mais cem vezes. - Ele queria que eu soubesse.
- Eu sei que sim. - Eu afirmei novamente com a cabeça, mas dessa vez com um sorriso mais emocionado.
- E é exatamente por isso que isso… nós… tem que acabar. - Era visível a batalha interna que estava acontecendo dentro dele, enquanto ele dizia aquelas palavras, que ele não queria dizer. - Eu não me importo de entrar em algumas brigas ou correr alguns riscos por você, mas… eu não posso continuar fazendo isso, quando isso interfere na vida ou nos sentimentos da minha família. - ergueu os ombros. Os olhos estavam cheios de lágrimas. - Eu soube o quanto a minha mãe sofreu nos dias em que eu fiquei entre a vida e a morte. A ficou traumatizada por quase perder o irmão mais velho e o Mark… Ele praticamente sacrificou a vida dele por mim. Tudo isso só por causa de uma atitude inconsequente minha. - ergueu os ombros como se estivesse lamentando. Nada mais precisava ser explicado. - Eu não sei se você é capaz de entender isso agora, mas… eu realmente preciso fazer isso. Eu preciso fazer isso por eles. - Ele deu mais alguns passos e parou na minha frente. Os olhos dele percorreram rapidamente o meu rosto.
- Eu queria que você pudesse se ver através dos meus olhos agora. Só assim você entenderia o quanto eu estou orgulhosa por te ouvir falar com tanto coração e ao mesmo tempo com tanta maturidade. - Minha frase fez com que uma lágrima solitária escorresse por todo o seu rosto em meio a um sorriso triste. A lágrima foi resultado do alívio que ele sentiu ao me ver ser tão compreensiva com tudo o que ele tinha dito.
Pra quem conhece o há tanto tempo e sabe de todas as brigas, todos os atos de egoísmo cometidos por ele por causa desse amor que ele sentia por mim, mas que, na verdade, fazia parte de quem ele era, jamais imaginou que ele tomaria uma atitude como essa. Mesmo sendo diretamente afetada pela decisão dele, vê-lo abrir mão de algo tão precioso pra ele por causa de sua família era a maior prova do homem que ele havia se tornado. Ele já não era mais aquele garoto que costumava roubar as minhas batatas no intervalo da escola. Isso me deixava imensuravelmente orgulhosa.
- Eu estou ciente do que está em jogo e do que eu, inevitavelmente, vou acabar abrindo mão com essa decisão. E mesmo sem saber se ainda existe alguma coisa dentro de você, que você costumava sentir por mim, essa decisão acaba te afetando também e, por isso, eu… - Ele continuaria falando se eu não o tivesse interrompido.
- Não se preocupe comigo. Eu vou sobreviver. - Eu tentei tornar tudo menos doloroso. - E você também vai. - Levei uma das mãos até o rosto dele e sequei a lágrima que havia escorrido pelo seu rosto há poucos segundos.
- Você é forte e tem muita gente que te ama do seu lado. - Mantive minha mão em seu rosto e passei a acariciá-lo. Eu estava me segurando muito naquele momento para não chorar.
- Só Deus sabe o quanto eu queria que você também estivesse do meu lado. - levou uma de suas mãos até a minha mão, que continuava tocando o seu rosto.
- Vai ser melhor assim. - Eu também tentei me convencer. Desvincilhei minha mão da dele. Era o momento de me despedir. - Saiba que eu te desejo o melhor do mundo. Você vai ser feliz. - Eu afirmei com um sorriso, mas as lágrimas começassem a escorrer dos meus olhos. Foi inevitável.
- … - Ele tentou se aproximar, quando viu que eu estava chorando, mas eu me afastei.
- Eu estou bem. - Eu comecei a secar as lágrimas em meu rosto, enquanto me dirigia em direção a porta. - Eu vou ficar bem. - Eu sorri pra ele mais uma vez antes de abrir a porta da sala e sair.
O jeito que eu sai daquela sala fez tudo ficar mil vezes mais doloroso para o . Ele sentiu sim uma vontade enorme de ir atrás de mim e fazer qualquer coisa para colocar um sorriso de volta em meu rosto, mas ele não podia. Já que ele tinha tomado a decisão de seguir em frente, ele tinha que começar naquele momento. ficou algum tempo na sala, esperando que eu saísse de vez do hospital e, também, tentando se acalmar. O que estava feito, estava feito! Não dava pra voltar atrás.
Não é preciso nem dizer o estado em que eu me encontrava ao sair do hospital. Não que isso já não tivesse acontecido outras vezes comigo e com o . Aconteceu muitas vezes, mas nunca dessa maneira. Pela primeira vez, terminamos sem ao menos ter qualquer relacionamento. Nós nunca precisamos estar em um relacionamento para saber o que um sentia pelo outro. Era mais do óbvio. Todo mundo sabia! Mas o que realmente tornava essa vez diferente de todas as outras era o motivo. Não foi por ciúmes. Não foi por egoísmo ou orgulho. Não foi por causa do ex ou da ex ou por falta de confiança. O amor não tinha acabado, então também não era por falta de amor. Não foi pela distância ou pra preservar um ao outro. Dessa vez, foi por algo infinitamente maior: a família. Ele terminou a nossa história, enquanto se declarava pra mim. Ele terminou, quando queria continuar. Acredite: foi muito mais doloroso do que as outras vezes.
Eu fui pra casa e chorei. Chorei quando cheguei na minha casa. Chorei enquanto fazia os meus trabalhos atrasados da faculdade. Chorei enquanto esperava a pizza que eu havia pedido chegar. Chorei quando coloquei a cabeça no meu travesseiro e faria isso nas noites seguintes também. O relacionamento que eu e o tivemos não era do que tipo que se supera. Era do tipo em que você segue em frente da melhor maneira que consegue. Era isso o que eu faria.
demorou um pouco mais de 10 minutos para sair da minha sala. Ele já não chorava mais, mas continuava bastante abalado. Ele nunca imaginou que sairia pela porta daquele hospital sem um enorme sorriso no rosto. Mesmo estando chateado, o sorriso finalmente apareceu quando ele viu o irmão esperando por ele do lado de fora. Mark estava apoiado em um carro que, por acaso, era o carro do . Os irmãos trocaram sorrisos de longe. Apesar de tudo, estava feliz por ter recebido alta, por ver o seu irmão bem e por reencontrar o seu precioso carro.
- Você trouxe o meu carro. - afirmou todo sorridente, enquanto aproximava-se do irmão. Os olhos estavam fixos no carro.
- Ele é todo seu. - Mark tirou a chave do bolso e a jogou em direção ao , que a pegou no ar.
- Eu estou de volta, amigo. - admirou o carro e tocou levemente a lataria. - Foi você que o lavou? - Ele perguntou, olhando para o irmão, que estava ao seu lado.
- Foi. E deu bastante trabalho, viu? - Mark respondeu.
- Não exagera! Ele não está tão limpo assim. - fez careta e rapidamente recebeu olhares impacientes do irmão.
- Você está me zoando, né? - Mark perguntou, irritado.
- É claro que eu estou. - se entregou. - Não precisa ficar nervoso, Markey. - Ele voltou a debochar. Ouviu o irmão chamá-lo por aquele apelido bobo e acabou deixando um sorriso escapar.
- É bom ter você de volta, cara. - Mark estava feliz por ter o irmão por perto.
- É bom estar de volta. - respondeu com o mesmo sorriso. Mark achou que era o momento certo para um abraço entre irmãos. Dessa vez, a atitude foi de sua parte e foi imediatamente correspondida pelo . Depois do abraço, os irmão se olharam.
- Entra ai. Eu preciso que você vá em um lugar comigo. - apontou a cabeça em direção ao carro.
- Que lugar? - Mark perguntou, vendo o irmão entrando no carro.
- Entra logo! - não deu qualquer justificativa. Mark atendeu o seu pedido, sem entender nada.
se recusou a dizer o lugar para onde estavam indo, pois sabia que o irmão se recusaria a ir até lá. Manteve o segredo durante grande parte do caminho. Mark só não percebeu antes o lugar para onde o irmão estava levando-o, pois distraiu-se por alguns minutos com o celular. Deixou de olhar para o celular, quando percebeu que o carro parou. O assunto que ele tratava no celular era importante, mas ele também estava curioso para saber onde eles estavam. A surpresa não foi nada boa.
- Mas o que nós estamos fazendo aqui? - Mark perguntou ao olhar para a casa de Steven através do vidro do carro. Ambos continuavam no carro.
- Eu preciso conversar com o Steven e você vai comigo. - respondeu antes de descer do carro.
- Eu vou? Você está maluco! - Mark recusou-se imediatamente.
- Ok, se você não sair desse carro, eu vou trancar o carro e você vai morrer ai dentro. - forjou uma ameaça ao abaixar-se e olhar para o irmão através da janela do carro.
- Eu quebro os vidros. - Mark falou com indiferença.
- E eu quebro os seus braços. - esbravejou assim que ouviu ele ameaçar o seu carro.
- Eu não vou entrar lá. - Mark voltou a recusar. - Por que você quer que eu vá com você? - Ele questionou.
- Alguém precisa me segurar se, por um acaso, eu ficar com vontade de matar o Steven. - explicou, recebendo olhares tediosos do irmão.
- E o que te faz pensar que eu vou te segurar e não, te ajudar a matar ele? - Mark arqueou uma das sobrancelhas.
- Ok, James Bond. - fez careta ao olhá-lo. - Você não vai precisar falar nada. Não precisa nem olhar pra ele. - Ele sugeriu.
- O que você tem de tão importante pra falar com esse cara? - Mark perguntou, irritado.
- Desce logo do carro. - desconversou.
- Eu tinha me esquecido do quanto você gosta de encher o meu saco. - Mark saiu do carro contrariado.
- Você não faz nada sem reclamar? - perguntou ao ver a sua irritação.
- Presta a atenção! Eu não vou falar nada. Eu não vou fazer nada! E você, vai ficar me devendo uma. Aliás, mais uma! - Ele esbravejou.
- Eu entendi! - afirmou, impaciente. - Vamos logo, rainha do drama. - Ele deixou de olhar para o irmão mais velho e dirigiu-se em direção a porta. Mesmo contrariado, Mark o acompanhou. Achou melhor não falar nada, mas tinha certeza que se o soubesse que o pai se recusou a salvar sua vida, eles não estariam ali naquele momento. bateu na porta duas ou três vezes e ela foi imediatamente aberta por um homem que, apesar de ser desconhecido, eles já sabiam que trabalhavam para o Steven.
- O que vocês querem? - O homem conhecia bem os dois filhos de Steven, mas não gostava de tê-los por perto. Sempre acabava em confusão.
- Bom, eu não queria ser tão objetivo, mas já que você perguntou: doces ou travessuras? - debochou do homem e conseguiu até colocar um sorriso discreto no rosto de Mark.
- Você acha que eu tenho cara de idiota? - O homem desconhecido não gostou nada da brincadeira.
- E, ai? - olhou para o Mark. - O que você acha, Markey? - Ele perguntou, analisando o rosto do homem.
- Eu não sei se idiota é a palavra certa, mas… eu acho que pra um pau mandado tá bom, né? - Mark percebeu que o desconhecido estava irritado e resolveu ajudar o irmão.
- Eu também acho. - concordou aos risos.
- Escuta aqui, seus… - O cara estava prestes a ficar mais violento, quando alguém tocou o seu ombro por trás.
- Esqueça isso. Deixa que eu resolvo. - Steven apartou a briga que estava prestes a começar. O desconhecido saiu com cara feia, deixando apenas o pai dos garotos na porta. estava mais a frente e o Mark bem mais atrás. Ele não fazia questão alguma de estar ali. Só estava por causa do .
- Não acredito… - Steven ficou visivelmente comovido ao ver o filho. Ele não teve muitas notícias sobre o estado de saúde dele durante o tempo em que ele esteve no hospital. Mark rolou os olhos. - É tão bom te ver, garoto. - Ele ia se aproximando para abraçar o filho, mas se esquivou.
- Hey, hey! - afastou-se. - Corta essa, ok? Eu não vim aqui pra isso. - Ele disse, friamente. Adentrou na casa, passando pelo pai sem nem olhá-lo. Steven olhou para o Mark, que o olhava com total desprezo.
- Oi, Mark. - Steven tentou cumprimentar o filho.
- Não dirija a palavra a mim, Steven. É melhor e mais seguro pra você. - Mark também foi frio ao passar pelo pai e adentrar na casa.
- Então, eu não quero ocupar muito o seu tempo, por isso, vou logo ao ponto. - queria falar logo e ir embora. Steven deu a ele sua atenção. - Eu não quero nem saber os seus motivos insanos para ter puxado o gatilho daquela maldita arma. Eu não quero saber do seu passado e nem da sua vingança idiota. - Ele foi direto ao ponto. - Acabou… entre eu e a . - finalmente disse.
- Acabou? - Steven demonstrou surpresa e Mark também, mas esse último ao menos disfarçou.
- Não fica empolgadinho, não. Você não teve qualquer influência sobre a minha decisão. Eu não fiz por você. Meus motivos foram muito melhores e muito mais dignos. - referia-se a família, mas o pai não sabia. - De qualquer forma, eu não vim aqui só pra te contar isso. Eu vim aqui pra te dizer que você já pode parar com esse teatro de pai protetor ou seja lá como você gosta de chamar. - Ele demonstrou indiferença. - Eu e ela não estamos mais juntos, por isso, eu vim aqui pedir, aliás, eu vim exigir que você a deixe em paz. - foi bem claro. - Independentemente de quais fossem os seus motivos, eles não existem mais. Deixe ela em paz. Deixe a família dela em paz. Deu pra entender? - Ele nem ao menos tentou ser educado. - Se eu souber que você chegou perto dela, eu juro que vou vim bater na sua porta e não vai ser pra termos um programa pai e filho. Fui claro, Steven? - Mark ficou impressionado com o tom do irmão. Foi bastante intimidador.
- Isso é mesmo necessário? É necessário ameaçar o seu pai por causa dessa garota? - Steven irritou-se com o tom do filho.
- Pra quem quase matou o próprio filho, você está pedindo muito, não acha? - ironizou.
- Você sabe que aquela bala não era pra você. - Steven debateu.
- Até poderia não ser direcionada a mim, mas se acertasse em quem você queria acertar, me machucaria da mesma forma, mas… eu não espero que você entenda ou se importe com isso. - rolou os olhos, achando que estivesse perdendo tempo ali.
- Mas é claro que me importa. Que tipo de pai você acha que eu sou? - Steven perguntou, sentindo-se insultado. Mark se segurou muito naquele momento para manter-se fora da conversa. As últimas atitudes de Steven demonstravam exatamente o contrário e ele sabia disso, mas o não.
- O pai que você tem mostrado ser desde que voltou dos mortos. - rebateu imediatamente.
- Você pode até não acreditar, aliás, você pode acreditar no que quiser, mas saiba que eu me lembrei de você em todos esses dias e torci mais do que você imagina pela sua saúde. - Steven tentou sensibilizar o filho. A frase foi a gota d’água para o Mark.
- Chega dessa palhaçada! - Mark passou pelo e colocou-se em sua frente, ficando cara a cara com o Steven. - Chega de tentar parecer exatamente o oposto da pessoa que você realmente é! Quem você pensa que é pra manipular todos a sua volta desse jeito? - Mark esbravejou contra o pai. sabia o que o irmão tinha ressentimentos do Steven, mas o seu comportamento e explosão repentina o surpreendeu.
- Eu… - Steven até tentou falar, mas o filho mais velho não deixou.
- Cala a sua boca que agora eu vou falar! - Mark gritou em sua direção. - Eu estou pouco me fodendo para a pessoa que você era antes ou o tipo de relacionamento que vocês dois tinham. - Ele referia-se ao Steven e ao . - Eu, ao contrário do , nunca criei qualquer expectativa em relação a você e é só por isso que eu quis poupá-lo de saber o bosta que você é. - Mark estava fora de si. - Honestamente, eu não queria nem vir aqui, pois não queria ter que olhar pra sua cara de novo. Eu não queria vir para evitar passar raiva e para não ter que ver cenas patéticas desse seu teatro de quinta categoria! - Ele apontava o dedo na cara do pai. não estava entendendo bem o que estava acontecendo. - Eu prometi pra mim mesmo que eu não falaria nada e que eu não perderia o meu tempo dirigindo a palavra para uma pessoa tão repugnante, mas não deu pra ficar calado. - Mark olhou rapidamente pro . - Você pode fazer o que quiser comigo. Eu não me importo e não faço a mínima questão de ser o seu favorito. Você pode mexer comigo, se você quiser, mas você não vai mexer com o . - Ele disse.
- Alguém pode me explicar o que está acontecendo aqui? - intrometeu-se, pois começou a ficar preocupado. Do que eles estavam falando?
- Acontece que o pai do ano ai… - Mark olhou para o irmão e depois apontou a cabeça em direção ao Steven. - Era compatível com o seu sangue, . Ele poderia ter sido o seu segundo doador. Ele poderia ter salvado a sua vida. Eu mesmo vim até aqui e implorei para que ele fizesse a doação. Expliquei pra ele toda a situação e o estado crítico em você se encontrava e ele… simplesmente… recusou. - Mark explicou, olhando pro Steven com desprezo. ficou em choque com a notícia e demorou algum tempo para assimilar o que tudo aquilo realmente queria dizer.
- Isso… é verdade? - olhou para o pai. Apesar das desavenças, nunca esperou algo tão cruel de seu pai. Steven parecia envergonhado com o seu comportamento. Os olhos estavam um pouco marejados e ele não conseguia falar. - Me diz, Steven: isso é verdade? - Ele perguntou outra vez. sabia que o Mark não mentiria sobre isso, mas ele queria ouvir o pai assumir a covardia. O silêncio e a expressão facial de Steven foi o bastante para responder a pergunta. demorou poucos segundos para reagir da maneira que qualquer outra pessoa no mundo reagiria. Ele foi pra cima de Steven, agarrou a sua camisa e o pressionou contra a parede. - Seu desgraçado! Você tem noção do que poderia ter acontecido por causa desse seu egoísmo de merda? Você tem noção!? - esbravejou. Ele referia-se ao que poderia ter acontecido ao Mark.
- Eu… não doei porque eu não quis. Eu não doei porque eu não podia doar. - Steven disse de maneira fragilizada.
- Não podia? - ironizou.
- Eu não podia doar porque… - Steven hesitou antes de continuar a frase. Não tinha mais como e porque esconder. - Eu estou doente. Eu tenho uma doença grave e terminal nos pulmões e, por isso, não posso fazer doações de sangue. - Ele finalmente fez a grande revelação, que tirou imediatamente o ódio dos olhos de seus filhos. Sem dizer absolutamente nada, soltou o pai e então, olhou para o irmão mais velho. Eles perguntavam um ao outro ‘E agora?’.
Capítulo 57 – Exposed Party
OUÇA A MÚSICA ABAIXO,ENQUANTO LÊ:
- Você está mentindo. - Mark foi o primeiro a se manifestar.
- Não. - Steven negou imediatamente.
- Você está mentindo! - Mark acusou novamente. - Sua máscara caiu de vez, não é? Você só está procurando um motivo para se justificar. - Ele completou, indignado.
- Você realmente acha que eu não salvaria a vida do meu filho se eu pudesse? - Steven argumentou.
- Eu acho! Aliás, eu sei! - Mark respondeu na mesma hora.
- Eu já te disse isso uma vez e vou dizer de novo: eu não sou o monstro que você pensa ou que você quer que eu seja! - Steven demonstrou irritação.
- Você não acredita nele, não é? - Mark deixou de dirigir a palavra ao Steven para que não perdesse a paciência de vez e encarou o irmão, que ainda não havia se manifestado sobre o assunto. o olhou, mas manteve-se em silêncio, o que deixou o irmão bastante preocupado. - ! - Ele chamou a atenção do irmão, tentando incentivá-lo a responder. Ele parecia um pouco distante. - , você não acredita nesse cara, né? - Mark repetiu a pergunta com tanta ênfase, que o foi obrigado a voltar para a realidade.
- Não. - o olhou, um pouco contrariado, e afirmou. - É claro que não. - Ele completou, vendo uma expressão de decepção no rosto do pai.
- … você sabe que eu jamais deixaria que algo de ruim acontecesse com você. Você sabe! - Steven tentou apelar para o lado emocional.
- MAS VOCÊ DEIXOU! - Mark perdeu o controle novamente. Ele simplesmente não conseguia tolerar tanto falso moralismo. - VOCÊ DEIXOU! - Ele reafirmou, apontando o dedo bem na cara de seu pai. - E você tem muita sorte de eu ter conseguido resolver tudo isso sozinho e a tempo, porque se eu não tivesse, você não estaria aqui fazendo esse falso drama, que chega a me dar nojo. - Nesse momento, afastou o irmão do pai.
- Vocês têm que acreditar em mim. Ao menos você, . - Steven tentou mais uma vez.
- Eu não vou perdoar você, Steven. E não é nem por mim. Eu não me importo com os seus deveres e obrigações de pai. Eu não me importo se você está preocupado ou não com a minha felicidade, mas… eu me importo com ele. - Ele apontou para o irmão. - Eu me importo se ele arrisca a vida dele por mim porque você simplesmente não conseguiu agir, ao menos uma vez, como o pai que um dia você foi. - foi sincero e, inevitavelmente, grosseiro. - Tirando tudo isso, eu acho que posso te agradecer ao menos por uma coisa. - Ele fez uma breve pausa. - Obrigado, Steven, por não ajudar a salvar a minha vida e por não alimentar a esperança dentro de mim de que você, lá no fundo, poderia ser o mesmo de anos atrás. Muito obrigado. - foi extremamente frio. Steven não pode acreditar no que tinha escutado e o Mark chegou até a sentir um pouco de orgulho, apesar de se sentir um pouco mal pelo irmão. - Bem, o eu recado já está dado. Procura um novo alvo pra essa sua obsessão doentia. - Ele deixou de olhar para o pai e virou-se, olhando para o Mark. - Vamos. - foi saindo em direção a porta e o irmão foi logo atrás dele, sem dizer absolutamente nada.
- Você consegue acreditar nisso? - Mark perguntou com indignação, enquanto eles se aproximavam do carro. - Quando eu penso que esse cara passou de todos os limites, ele me vem com essa! - Ele completou. - Ele sabe que foi longe demais dessa vez e está tentando nos sensibilizar. - Eles já estavam no carro, mas o Mark continuava furioso. - Agora, ele está tentando se fazer de vítima e fazer de nós os culpados. Qual o problema com esse cara? - Mark terminou a frase e notou que o irmão continuava calado. Ele nem ao menos o olhava. - ! - Ele chamou pelo irmão, que parecia estar com a cabeça bem longe dali. o olhou na mesma hora, demonstrando estar um pouco confuso. Eles trocaram olhares por poucos segundos. - Não me diga que… você acreditou nele? - Por um momento, Mark torceu pela resposta negativa, mas a expressão no rosto do irmão o fez desistir. - Ah não, cara! - O irmão mais velho negou com a cabeça, incrédulo.
- É claro que não! Deixa de ser idiota. - desconversou, demonstrando irritação.
- Olha pra você! - Mark referia-se a expressão no rosto do irmão.
- Ok! Quer saber? Ele pode mesmo estar falando a verdade, mas não faz a menor diferença porque eu não me importo! Eu não me importo se ele está morto, se está vivo ou se ele é a porra de um walking dead. - Ele se exaltou mais do que gostaria. - Feliz? - Perguntou retoricamente. - Agora, vamos logo pra casa. O que era para ser feito, já foi feito. - Ele disse de maneira mais calma.
- Ir pra casa? Minha casa você quer dizer. - tinha falado com tanta autoridade e com tanta estupidez, que Mark procurou qualquer coisa que pudesse questioná-lo.
- Sério?! Serio mesmo que você quer começar uma briga aqui e agora? - nem conseguia disfarçar o quanto a notícia que seu pai tinha dado havia deixado ele nervoso.
- Brigar? Você acabou de sair do hospital. - Mark rolou os olhos.
- E? - se fez de bobo apenas para não demonstrar fraqueza.
- E ai que eu não sou de chutar cachorro morto. - Mark demonstrou indiferença com o tom ameaçador do irmão.
- Quem você está chamando de cachorro morto? Me respeita, palhaço! - Mesmo sabendo que o irmão tinha razão, não perdia a compostura nunca.
- Cala a boca e dirige. - Mark ignorou os insultos. Sabia que o irmão dizia qualquer coisa para não perder uma briga.
- ‘Cala a boca e dirige’. - imitou o irmão, usando uma voz mais fina. Mark não respondeu, mas deixou de olhar a tela do seu celular por um momento para rolar os olhos em meio a um suspiro.
Não dava pra negar. O tinha mesmo ficado um pouco abalado com a possível doença grave que o pai tinha. Apesar das desavenças e dos erros contantes do Steven, ele ainda era o seu pai. Diferente do Mark, tinha um grande passado com aquele homem que tinha sido o herói de toda a sua infância. Uma época que foi tão feliz e que foi interrompida por um trauma que marcou toda a sua adolescência. Bem, o trauma continuava o mesmo, mas o pai não, pelo menos, não completamente, mas isso não fazia a menor diferença. Steven ainda era o pai e o ainda era o filho.
Naquela noite de sexta-feira, depois de tanto chorar por causa do meu último encontro com o , eu me encontrava na minha cama. Passava alguma coisa na TV e eu mal estava prestando à atenção. Meus olhos encaravam o teto do quarto, enquanto as últimas frases ditas pelo ecoavam na minha cabeça. As batidas das portas de um carro me trouxeram para a realidade. Ainda deitada na cama, eu olhei em direção a janela do meu quarto. Eu sabia que o e o Mark tinham acabado de chegar. Eu bem que tentei me conter. Eu juro que tentei, mas eu tive mesmo que ir até a janela e abrir discretamente a cortina do quarto. Eu só queria ir até lá para recebê-lo e dar as boas vindas, depois de todo aquele tempo que ele ficou no hospital. Eu não podia. Se o realmente queria se afastar, e confesso que ele realmente tinha o melhor motivo de todos para fazer isso, eu respeitaria a sua decisão.
- Precisa de ajuda? - Mark perguntou, cuidadoso com o irmão.
- Não precisa. - afirmou, segundos antes de fazer careta ao tentar sair do carro. - Está bem. Me dá uma mão aqui. - Ele cedeu, irritado. odiava ficar dependendo dos outros.
- Ok. - Mark estendeu uma das mãos, a segurou e o irmão o puxou.
- Valeu. - Ele agradeceu.
- Dá pra andar? - Mark ainda estava preocupado.
- Por quê? Você vai me carregar no colo? - perguntou em tom de deboche.
- Eu posso tentar se você… - Mark brincou, aproximando-se do irmão.
- Ei! Ei! Não se aproxima. - esquivou-se, fazendo com que o Mark gargalhasse.
- Vem logo! - Mark o apressou, andando em sua frente. foi logo atrás, pois estava andando um pouquinho mais devagar do que o normal. - Entra ai! - Ele destrancou a porta da casa e entrou. entrou atrás.
- Tem certeza que posso ficar aqui na sua casa? Eu poderia ter voltado pra Atlantic City, mas não quero atrapalhar a minha mãe. Ela fica preocupada demais. - perguntou e, em seguida, se explicou.
- Essa não é a minha casa. É a nossa casa. - Mark fez questão de corrigi-lo. não conseguiu conter o sorriso ao ouvir a frase do irmão.
- Você está querendo dizer que nós somos um casal agora? - sempre brincava para desconversar nos momentos de irmãos.
- Se esse é mais um dos seus jeitos tortos de dizer ‘obrigado’, bem… de nada! - Mark ironizou.
- Nós podemos deixar esse momento comovente de irmão para outra hora? Eu preciso muito jogar uma partida. Joga comigo? - apontou para o seu videogame, que estava instalado na TV da sala do Mark.
- Previsível. - Mark riu, enquanto rolava os olhos. - Vai jogando aí! Eu vou levar suas coisas para o quarto de hóspedes. - Ele levantou-se do sofá.
- Que? Quarto de hóspedes? - arqueou uma das sobrancelhas.
- Você não pode ficar morando no meu sofá o resto da vida, né? - Mark pegou a mala e algumas outras coisas do irmão, que estavam no canto da sala.
não disse mais nada, mas ficou bastante surpreso e feliz com a notícia. Ele finalmente dormiria em uma cama novamente! Apesar de estar bastante feliz com a cama nova, o que realmente o deixou radiante foi a atitude do irmão mais velho. Mesmo estando bastante em choque com a notícia, voltou a dar toda a sua atenção para a TV e o videogame em sua frente. Ele ligou o jogo como se fosse a primeira vez. Começou a jogar, quando o Mark aproximou-se, sentou-se ao seu lado e pegou o controle do videogame.
- Eu começo! Não vou ter dar moleza não. - Mark provocou, sem olhar para o irmão. , no primeiro momento, não disse nada. Ele apenas sorriu.
- Obrigado, irmão. - finalmente agradeceu por tudo. Mark o olhou e sorriu, sem dizer nada.
- Isso é realmente lindo, mas eu sinto muito informar que eu vou acabar com você. - Mark tentou levar o momento um pouco mais na brincadeira, pois sabia como aqueles momentos eram para o .
- Quero só ver! - voltou a sua atenção para a TV com um enorme sorriso. Fazia algum tempo que ele não tinha um momento feliz e tranquilo como aquele. Apesar de tudo o que tinha acontecido naquele dia, estava imensamente feliz.
Quatro semanas se passaram e eu tive que reconhecer: foi bem difícil ficar fugindo e evitando encontros com o durante todo esse tempo. Infelizmente, a minha relação com o Mark acabou sendo um pouco prejudicada com essa situação. Diferentemente do que acontecia antes, eu não ia mais na casa dele e nós também não fazíamos nada juntos, pois se fizéssemos, o também teria que ser convidado. Porém, mesmo com todas essas divergências, o Mark sempre dava um jeitinho de me ver ou me encontrar quando eu chegava ou saia de casa. Esse jeito dele de tratar toda essa situação me fez sentir um pouco mais de admiração por ele. Admiração sim, pois na situação em que ele se encontrava, seria muito mais fácil para ele se ele desistisse de mim. Ele nunca desistia de mim. Mesmo sem receber qualquer tipo de esperança ou qualquer outra coisa em troca, o Mark continuava se preocupando e cuidando de mim.
Agora, quanto ao , eu fiquei realmente muito orgulhosa de mim mesma por conseguir ficar sem vê-lo e evitá-lo por um mês. Sim, um mês já havia se passado. Eu quis muitas vezes olhar pela janela, quando ouvia o carro dele sendo estacionado na garagem da casa do Mark ou quando ouvia a voz dele reclamar do Mark por causa da maneira que ele havia estacionado o carro. Foi muito difícil e desconfortável para mim, mas foi necessário.
Dois meses depois e as coisas começavam a voltar ao normal. Não que eu já tivesse superado o ou o que tinha acontecido, mas eu já não ficava pensando tanto nisso e nem me preocupava tanto no que aconteceria dali pra frente. Porém, o meu sossego não durou tanto quanto eu gostaria. Na verdade, durou até aquela sexta-feira a tarde, exatamente no momento em que eu recebi o telefonema da minha melhor amiga, . Ela me ligou para me dar a notícia de que ela e o resto do pessoal viriam para Nova York no dia seguinte para fazer uma visita surpresa ao . Bem, eu não a culpo. Ela não sabia dos últimos ocorridos e, por isso, não sabia que estava me dando uma péssima notícia. Como eu evitaria o , sendo que todos os nossos amigos estariam em Nova York? Como eu evitaria uma reunião de amigos que, inevitavelmente, aconteceria?
- Você estará em casa, certo? - me perguntou ao perceber que eu não havia me manifestado nos últimos segundos.
- Eu… - Eu tive um colapso mental. O que eu ia dizer? Qual era a desculpa? - Eu… vou trabalhar. - Eu finalmente respondi.
- Não brinca! - pareceu decepcionada.
- Pois é… eu já tinha combinado com… o meu chefe. - Eu fechei os olhos, me odiando por estar mentindo para a minha melhor amiga.
- Não acredito! - suspirou. - Mas… e a noite? Você estará em casa no sábado a noite, né? - Ela fez uma nova pergunta.
- Eu não sei. Eu não sei até que horas vai o… plantão no sábado. Faz alguns sábados que eu não trabalho, então… - Mais uma mentira.
- Você está falando sério mesmo? - achou que eu pudesse estar brincando.
- Estou! - Eu confirmei na mesma hora. - Mas, a casa estará a disposição de todos vocês, é claro. Vocês podem dormir aqui. Eu chego a tempo de ver todos vocês antes de dormir. - Eu arrumaria um jeito de vê-los.
- Bom, pode ser. Melhor que nada, não é? - já não estava tão empolgada quanto antes.
- Hey, não fique assim, está bem? As férias estão chegando e vamos dar um jeito de nos reunir, ok? Eu prometo! - Eu não sabia como isso aconteceria, mas… um problema de cada vez!
- Ok! - concordou.
- Que horas vocês vão vir amanhã? - Eu perguntei, pois precisava saber exatamente o período que eu teria que permanecer fora de casa.
- O trabalha até a hora do almoço, então eu acho que nós vamos almoçar e ir.- Ela explicou. - Vamos ter que ir embora no domingo de manhã porque o tem um compromisso com o pessoal da faculdade. Ele tem que ensaiar a apresentação de um seminário ou algo assim. - Ela contou.
- Que pena! Bem, ao menos vamos nos ver no sábado a noite. - Eu lamentei. - De qualquer forma, eu vou deixar a chave da casa com o Big Rob e vou avisar a ele que vocês vão vir. - Eu disse.
- Está bem. - afirmou.
- Eu não estarei em casa, mas fiquem à vontade, ok? Eu vou tentar voltar pra casa o mais rápido possível. - Eu já estava triste por pensar que não passaria mais tempo com todos eles.
- Obrigada, ! Eu te vejo amanhã! - sorriu ao ouvir as minhas palavras.
- Até amanhã. - Eu respondi.
- Amo você. - Ela disse, esperando a minha resposta.
- Eu também. - Eu sorri fraco ao responder e desliguei o celular em seguida.
Eu juro que, por um momento, eu pensei: ‘Por que eu tinha que arcar com as consequências de uma decisão que foi tomada pelo ? A decisão foi dele, não minha!’. Evitar um clima ruim? Evitar recaídas? Eu não sei explicar. Eu sentia que devia isso a ele. Pra que deixar as coisas mais difíceis pra ele? Pra que forçar um reencontro que só vai servir para nos deixar desconfortáveis? Respeitar a decisão mais madura que ele já havia tomado era a melhor coisa que eu podia fazer por ele.
Depois da ligação, a primeira coisa que eu fui fazer foi falar com a Meg. O plantão daquele sábado seria dela, por isso, além de pedir a ela para trabalhar em seu lugar, eu ainda teria que dar uma ótima desculpa para pedir isso a ela. Tentei encontrar uma boa justificativa até o final do nosso expediente no hospital, mas foi praticamente impossível. Com isso, eu tive que falar com ela sem saber muito bem o que eu iria dizer.
- Amanhã? - Meg estranhou o meu pedido.
- É! Na… semana que vem eu tenho um compromisso, então… seria melhor se eu trabalhasse nesse sábado e não… no próximo. - Eu tentei ser bem convincente.
- Tudo bem, mas eu achei que você ia querer ficar com os seus amigos amanhã. - Meg continuou estranhando o meu pedido.
- E você vai querer ficar com o , certo? Eu vou fazer isso por vocês dois também. - Agora sim eu tinha uma boa justificativa.
- Ok, deixa eu ver se entendi. Você está me pedindo para trabalhar no meu lugar amanhã que, por acaso, seria o seu primeiro dia de folga nos últimos… eu não sei… 2 meses? - Meg me olhou, arqueando uma das sobrancelhas.
- Exatamente. - Eu confirmei.
- Ok! Você está doente. - Meg afirmou na mesma hora.
- Meg… - Eu rolei os olhos.
- É sério! Você só pensa em trabalhar e… fazer horas extras. O que você está querendo? Dormir com o diretor-chefe do hospital? - Ela perguntou em tom de ironia.
- Fala baixo! - Eu a olhei feio.
- Você não tem mais vida social. - Meg disse, demonstrando preocupação.
- Olha só quem fala! - Eu fiz careta.
- Ei, isso não é justo! Eu não acho legal sair sem o . É só por isso que eu não tenho saído. - Meg se defendeu.
- Olha, você está exagerando. - Eu cruzei os braços.
- Estou? Me diz ai qual foi a última vez que você saiu pra algum lugar. - Meg também cruzou os braços, me desafiando. - Não! A Biblioteca de Medicina não conta! - Ela se antecipou.
- E que tal um encontro? - Eu cerrei os olhos na direção dela.
- Um encontro? Você foi a um encontro? - Meg ficou desconfiada.
- Eu não fui a um encontro. Eu vou a um encontro. - Eu estava improvisando.
- Posso saber com quem? - Meg continuava desconfiada. - Se você disser o nome de algum personagem de Grey’s Anatomy, eu te mato. - Ela ameaçou.
- Eu não ia dizer. - Eu neguei com a cabeça. Ok, talvez isso tivesse passado pela minha cabeça.
- Com quem? - Meg insistiu.
- Com… - Eu hesitei algum tempo antes de concluir a frase. O motivo era bem simples: eu não tinha um encontro. Nos segundos em que fiquei pensando em um bom nome, um dos enfermeiros do hospital passou por nós. Ele era simplesmente o cara mais tedioso que eu já havia conhecido e já tinha me convidado para sair mais de 4 vezes. - Com o Knox. - Foi a melhor companhia que eu consegui arranjar em menos de 30 segundos.
- Com o Knox? - Meg fez careta. - Você está falando do cara que almoça todos os dias sozinho no vestiário do hospital? - Ela estava perplexa.
- Qual é! Ele é bonitinho. - Eu argumentei.
- O nome dele á Knox, ! - Meg não conseguia se conformar.
- É só um encontro. Eu não vou me casar com ele. - Eu rolei os olhos. Ela sempre era muito radical e dramática.
- Ok! Você deve saber o que está fazendo. - Meg achou melhor nem insistir no assunto. - Então, você vai trabalhar amanhã e vai sair com o Knox a noite. Uau! Sua vida realmente está uma droga. - Ela debochou.
- Para com isso! - Eu disse, tentando não rir do comentário dela. O velho ‘rir pra não chorar’, sabe?
- Já parei. - Meg gargalhou. - De qualquer forma, obrigada. A sua insanidade me deu algumas horas a mais com o . Obrigada! - Ela agradeceu com o seu jeito torto de sempre.
- Tudo bem. - Eu respondi, negando com a cabeça.
- Nos vemos por ai. - Meg se aproximou e beijou o meu rosto, depois de pegar a sua bolsa, que estava sobre a cadeira. - Me liga pra contar sobre o encontro com o Knox, ok? Não esquece de levar um energético para se manter acordada. - Ela brincou e eu a reprovei com o olhar.
- Dá logo o fora daqui. - Eu disse aos risos.
Fiquei algum tempo observando ela se afastar. O que eu estava fazendo? Olhei para trás e avistei o Knox no final do corredor. Ele olhava o quadro de avisos dos funcionários. Estava tão concentrado, que não me viu encará-lo por mais ou menos 5 minutos. Sim, eu estava tomando coragem para ir até lá. Não pode ser tão ruim, pode? Além disso, seria muito bom me distrair. Eu estou aceitando qualquer coisa.
- Oi… - Eu me aproximei e ele me olhou imediatamente.
- Oi, . - Knox sorriu pra mim.
- Lendo os avisos, huh? - Olhei para o quadro em nossa frente.
- Estou. Eu sou meio distraído e costumo deixar muita coisa passar. - Ele riu.
- Eu também. - Eu também ri, apenas para não deixá-lo sem graça. O silêncio constrangedor começou e aquela foi a minha deixa.
- Então, eu… eu estava pensando em fazer alguma coisa amanhã a noite e estava me perguntando se… de repente… você vai estar livre amanhã. - Eu estava mesmo chamando o cara pra sair. Quando foi que eu virei essa pessoa?
- Amanhã? - Knox pareceu surpreso. Só me faltava levar um fora. - É claro! Claro! Eu estou livre. - Ele não escondeu a empolgação.
- Legal. - A empolgação dele me fez sentir um pouco de vergonha alheia.
- Eu passo te pegar na sua casa. - Knox demonstrou educação e cavalheirismo.
- Não, não! Não vai ser necessário. Eu… não vou estar em casa. Eu… vou ao restaurante. - Eu neguei imediatamente. - Você estava pensando em um restaurante… certo? - Eu fiz careta. Eu nem mesmo sabia onde nós iríamos.
- Estava. Você gosta de comida japonesa? - Ele perguntou.
- Perfeito. - Eu confirmei.
- Você tem algum restaurante favorito? - Knox me perguntou.
- Aquele… ao lado do Shopping. Perto daqui. - Eu não tinha certeza se ele conhecia.
- Lá é ótimo! - Ele concordou. - 20hrs? - Perguntou.
- Pode ser. - Eu afirmei com a cabeça.
- Então, eu te encontro lá amanhã. - Knox sorriu.
- Até amanhã. - Eu estava um pouco constrangida com o que tinha acabado de fazer, mas me afastei sorrindo como se não houvesse amanhã.
Cheguei em minha casa no início da noite e foi só no momento em que eu entrei no meu quarto e olhei para a minha cama que eu notei o quanto eu estava exausta. Eu só queria deitar, dormir e acordar na semana seguinte. O cansaço extremo era resultado do excesso de trabalho nas últimas semanas. Não trabalhar no dia seguinte era tudo o que eu mais precisava, mas eu teria que abrir mão disso também. Por quanto tempo eu vou aguentar essa vida?
Acordei um pouco mais cedo do que o normal naquele sábado pois, além de me arrumar para o trabalho, eu ainda teria que separar as roupas e as coisas que eu usaria para me arrumar pro meu encontro com o Knox, já que depois que eu saísse do trabalho, eu não poderia voltar para casa. Arrumei uma pequena mochila e levei algumas coisas para o carro. Conferi dezenas de vezes se realmente eu não havia esquecido de nada antes de sair de casa. Deixei a chave da casa com o Big Rob para que os meus amigos e o meu irmão pudessem deixar suas coisas e também deixei a chave para que a moça que eu havia pagado para fazer uma boa faxina na casa pudesse entrar.
Ao contrário de mim, Mark e acordaram um pouco mais tarde. Ambos não trabalhariam naquele dia e não tinham nenhum tipo de obrigação. Mark sabia da surpresa que os amigos fariam para o irmão e seu único trabalho era manter o em casa até a hora que eles chegassem. Apesar disso, ele pôde seguir um pouco da sua rotina diária sem prejudicar a surpresa. Ele leu as páginas policiais do jornal, foi até a padaria para preparar um café da manhã descente. Sua ida até a padaria também serviu para que ele estranhasse o fato do meu carro não estar na garagem. Ele achou que tivesse me escutado dizer que eu não trabalharia naquele sábado.
Eu estava literalmente trabalhando à base de café. Era só 1 hora da tarde e eu já havia perdido a conta de quantos cafés eu já havia tomado. Aquela era a única maneira de me manter acordada e atenta ao que eu precisava fazer. O período da manhã era sempre mais complicado porque era o período menos movimentado do hospital e também era o período ao qual eu não estava acostumada a trabalhar. O grande movimento de pacientes no período da tarde me deixava mais agitada e, consequentemente, mais acordada. Honestamente, não estava sendo nada fácil ser eu nos últimos meses.
Passado poucas horas do horário do almoço, e os amigos estavam chegando em Nova York. Mark tinha feito um bom trabalho até então, já que o não havia desconfiado de nada. A missão do Jonas mais velho pôde ser considerada cumprida no instante em que a campainha foi tocada. estava na mesa de jantar, analisando algumas cláusulas do contrato com o Yankees e o Mark estava sentado no sofá da sala.
- Ei! Você não vai atender? - perguntou, demonstrando impaciência. A campainha já havia sido tocada mais de 3 vezes. Mark queria que o irmão atendesse. Era parte da surpresa!
- Fica à vontade. - Mark fingiu indiferença.
- É a sua casa! - A verdade é que o estava com preguiça de ir até a porta.
- Você nunca lembra disso na hora de comer toda a minha comida, não é? - Mark respondeu com um falso sorriso.
- Você nunca cansa de jogar isso na minha cara, né? - rolou os olhos ao levantar-se da mesa e ir lentamente em direção a porta. Encarou a porta, a destrancou e virou a maçaneta.
- SURPRESA! - Os gritos foram tão inesperados, que chegaram a assustá-lo.
- Mas o que… - não conseguiu nem reagir. , , , e o abraçaram e já foram entrando na casa. - O que vocês estão fazendo aqui? - Ele riu ao perguntar. Estava perplexo em ver todos os amigos ali.
- Nós gritamos ‘surpresa’. Você não ouviu? - perguntou, sentando-se no sofá, depois de cumprimentar o Mark. Aliás, todos o cumprimentaram, é claro.
- E você deveria pelo menos fingir que está feliz. - brincou.
- Está brincando? Eu estou feliz! - tentou compensar seus maus modos. - Eu só estou um pouco surpreso. - Ele sorriu, empolgado. - Vocês são sempre muito ocupados. Não acredito que conseguiram vir todos de uma vez. - Ele completou.
- Nós arrumamos tempo pra você! - sorriu.
- Sinta-se importante. Ela não tem arrumado tempo nem pra mim. - reclamou.
- Não repara. O tem andado bastante sentimental nesses últimos dias. - negou com a cabeça.
- E a sua namorada, ? Vai arrumar tempo pra você? - achou que Meg não viria.
- Ela deve estar chegando. - sorriu, vitorioso.
- Como eu senti falta de vocês! - estava em êxtase com a presença dos amigos e com as discussões bobas.
- Cara, nós conte como tudo isso aconteceu! - perguntou, curioso. - Você já está 100% recuperado? - Ele perguntou.
- Estou! Está tudo bem! - tranquilizou todos. - Eu… estava passando por um mercado. Reconheci o carro da e vi um cara armado se aproximando dela e do pai dela. - Mesmo querendo, ele não podia contar toda a verdade. - Eu não tive tempo de fazer mais nada a não ser entrar na frente do Sr. . Foi… espontâneo, sabe? - O que ele podia contar, ele contaria.
- Eu nunca vou cansar de te agradecer. - o olhou com admiração.
- Eu já percebi. Você me liga quase todos os dias para agradecer. - riu, negando com a cabeça.
- Sentimental demais. Eu disse. - entrou na brincadeira, fazendo a maioria rir.
- Ele salvou a vida do meu pai. Eu dou até um beijo na boca dele se ele quiser. - se explicou. - Mentira. Não dou não. - Ele fez careta, rindo.
- E depois? Do que você se lembra? - quis voltar ao assunto.
- A e o Mark me colocaram em um carro e me levaram para um hospital. Eu apaguei logo depois que cheguei no hospital e… só acordei dias depois. - continuou a explicação.
- Graças ao Mark. - disse ao sorrir para o amigo.
- Não foi nada. - Mark negou com a cabeça em meio a um sorriso sem jeito.
- Todos nós fizemos o teste de compatibilidade. Ninguém era compatível! - contou.
- Eu soube! - afirmou com a cabeça. - Se não fosse o Mark… - Ele achou que nem precisava terminar a frase.
- Agora, o Mark é o seu herói. Existe coisa mais irônica do que isso? - comentou.
- Você ficaria surpreso se soubesse. - Mark riu, sem emitir qualquer som. Ele referia-se ao fato de eles serem irmãos.
- Você está mesmo morando aqui? - quis saber.
- Provisoriamente sim! - confirmou.
- Então, agora vocês são melhores amigos? - perguntou, perplexo.
- Não exatamente. - respondeu e olhou para o Mark. Ele queria avisá-lo que contaria a notícia aos amigos.
- Um casal? - sugeriu, fazendo careta.
- Ele não faz muito o meu tipo. - Mark negou com a cabeça.
- É… seus olhos e a sua boca não são muito parecidos com os da mesmo. - concordou, recebendo olhares do .
- Se vocês não são melhores amigos e nem são um casal, o que vocês são, afinal? - estava confusa e curiosa.
- Eu tenho uma pequena história pra contar para vocês. - tentou segurar o sorriso. - Acho melhor vocês se sentarem. - Ele apontou para o sofá. Quem ainda não estava sentado, se sentou.
- Você vai contar mesmo? - Mark riu, surpreso. Ele achou que o irmão demoraria mais algum tempo para contar. afirmou com a cabeça.
- Não acredito que o vai finalmente assumir que é gay. Eu estou emocionado. - disse extremamente empolgado.
- Fica quieto. Deixa ele falar. - deu a bronca no namorado.
- Meu pai, antes de se casar com a minha mãe, namorou uma garota e a engravidou. - começou a contar.
- Não esperava menos do pai do Jonas. - ironizou, interrompendo o amigo.
- Shhhhh! - cutucou o namorado. - Continua. - Ela sorriu para o .
- Ele… engravidou uma garota mais nova. O nome dela era… Janice. - continuou.
- Janice… tipo a tia do ? - estranhou a coincidência.
- Não existe só uma Janice no mundo não, viu? - responde, achando a possibilidade completamente remota.
- Nesse caso, existe! - afirmou com um sorriso forçado no rosto.
- Mentira! - abriu a boca. arregalou os olhos.
- Como é? - estava perplexa.
- Espera! Você está dizendo que o seu pai engravidou… a minha tia Janice? - quase nem conseguiu concluir a frase.
- Então, você tem uma irmã? - também estava em choque.
- Ou um irmão. - corrigiu.
- Não pode ser. - desacreditou. Mark estava presenciando toda a conversa e estava até achando graça da reação de todos.
- Eu tenho um irmão. - confirmou a notícia.
- Nós conhecemos ele? - perguntou.
- Na verdade, ele está nessa sala. - Quando terminou a frase, todo mundo se entreolhou.
- Não! - foi a primeira a se manifestar.
- Impossível! - não conseguia acreditar.
- Você está querendo dizer que o Mark é filho da tia Janice e que ele é o seu irmão? - jamais superaria a notícia.
- Vocês são irmãos? - perguntou, fazendo careta.
- Essa é a coisa mais louca que eu já ouvi. - ainda estava boquiaberta.
- Não. Não! Isso é mentira. Vocês estão tentando nos sacanear. - se recusou a acreditar.
- É verdade, . - Mark confirmou, fazendo careta.
- Estou chocada. - não escondeu a perplexidade em seu rosto
- Se você é filho da tia da e do , então… você e a … - arqueou uma das sobrancelhas.
- Eles são primos! - completou a frase do amigo.
- Não somos primos de sangue. A tia Janice era adotada. - corrigiu os amigos.
- Eu sempre esqueço disso! - disse, demonstrando mais tranquilidade.
- Nós… deveríamos ser primos de consideração, mas eu acho que nem isso nós somos, já que nós crescemos sem saber de nada. - Mark adicionou.
- Você não sabia também? - quis saber.
- Não. Eu descobri recentemente também. - Mark contou.
- Eu continuo impactada. - negou com a cabeça.
- Se existe coisa mais irônica no mundo do que o fato de vocês dois serem irmãos, eu desconheço. - comentou, segurando o riso.
- Bem, isso explica o mesmo gosto por garotas. - não se conteve e acabou rindo.
- Haha. Muito engraçado. - fuzilou o amigo com os olhos e negou com a cabeça. Mark levou tudo um pouco mais na brincadeira. Ele já esperava essas brincadeiras.
- E a já sabe disso? - perguntou.
- Sabe. - Mark confirmou.
- Deixe-me adivinhar: os meus pais também já sabem. - fez cara de tédio.
- Eles também sabem. - Mark confirmou outra vez.
- Sempre o último a saber. - suspirou.
A novidade rendeu uma longa conversa entre todos que estavam ali. Houve deboche, risos e perplexidade por um bom tempo. Muitas perguntas foram feitas, mas algumas não puderam ser respondidas. Steven era um assunto proibido e ninguém poderia desconfiar que ele estava vivo. Ele era um problema exclusivo dos irmãos Jonas.
Meu turno no hospital acabou um pouco mais de 7 horas. Quer dizer, o turno acabou bem antes, mas eu acabei fazendo algumas horas extras. A vontade de ir para casa era enorme e a vontade de dar o bolo no Knox era ainda maior, mas eu não podia fazer isso. Mesmo estando cansada, fui até o estacionamento do hospital, peguei a minha roupa no carro e voltei para o hospital para me trocar em um dos vestiários. Apesar da minha pouquíssima vontade de impressionar o Knox, eu ainda era vaidosa e eu ainda estava indo para um encontro. Eu queria estar bem vestida (VEJA A ROUPA AQUI) e até investi um pouco na maquiagem. O cabelo ficou básico mesmo, já que não dava para fazer tanta coisa a respeito no vestiário de um hospital. Fazia tanto tempo que eu não tinha um encontro, que dava até para se dizer que eu estava um pouco animada. Não com a companhia, mas sim com o fato de ter que me arrumar e sair. Eu não fazia isso há algum tempo.
Sai do hospital discretamente e voltei para o estacionamento. Entrei no meu carro e passei um pouco de perfume antes de dar a partida no carro. O restaurante ficava bem perto do hospital, por isso, não demorei quase nada para chegar até lá. Quando desliguei o carro e já me encontrava no estacionamento do restaurante japonês, pensei em desistir novamente daquela ideia estúpida, porém, o manobrista do restaurante me encorajou a descer do carro.
- Bem vinda, senhorita. - O manobrista foi gentil ao abrir a porta. Não tinha mais jeito. Eu tive que descer.
- Obrigada. - Entreguei a chave do carro para ele e me afastei, caminhando até a entrada do restaurante. Ao chegar na porta, usei o meu sorriso mais falso de todos ao acenar para o Knox de longe, que só faltou subir em cima da mesa para que eu o encontrasse lá dentro. - Estou com ele. - Eu disse ao Maître que havia me recepcionado.
- Eu a acompanho até a mesa. - O Maître foi educado, como sempre. Ele me levou gentilmente até a mesa.
- Oi, Knox. - Eu tentei parecer animada ao cumprimentá-lo. Ele já foi logo se aproximando e beijando o meu rosto.
- Oi. - Knox estava visivelmente animado.
- Já escolheram o que vão beber? - O garçom que estava bem ao lado do Maître perguntou.
- Eu quero… - Eu estava pronta para pedir água, quando Knox me interrompeu.
- A carta de vinhos, por favor. - Knox estava mesmo tentando me impressionar.
- Aqui está. - O garçom entregou a carta de vinho nas mãos dele. Knox olhava a carta com muita atenção, mas eu tinha certeza que ele não fazia ideia do que estava fazendo. - Se me permite sugerir, o 5° vinho é o favorito dos nossos clientes. - O garçom achou que ele precisasse de ajuda.
- Pode ser esse. Obrigado. - Knox concordou imediatamente.
- E o que desejam comer essa noite? - O garçom perguntou. Já fui logo pedindo o meu prato para que o Knox não pensasse em se antecipar dessa vez. Logo depois de mim, ele também fez o pedido dele. - Pois não. - O garçom se afastou, depois de anotar os nossos pedidos, nos deixando sozinhos pela primeira vez naquela noite.
- Você está muito bonita. - Knox aproveitou a primeira deixa.
- Obrigada. - Eu agradeci em meio a um sorriso. - Gostei da sua camisa. - Tentei retribuir o elogio.
- Obrigado. Ela é nova. - Knox contou, olhando para a peça em seu corpo. Nós trocamos sorrisos, visivelmente sem assunto. - E como estava o hospital hoje? - Ele puxou assunto.
- Bastante movimentado. - Eu respondi com uma careta.
- Finais de semana são os piores. - Knox reclamou. - Muita gente e a supervisora fica no nosso pé. - Ele também fez careta. - Você conhece ela? Ela é muito chata. Uma bruxa, na verdade. - Knox começou o assunto que, acredite: durou mais ou menos 15 minutos. Sim! Ele ficou 15 minutos reclamando da supervisora dos enfermeiros. Só ele falou! Eu só afirmava, negava com a cabeça e me controlava para não bocejar. Os 15 minutos mais longos de toda a minha vida.
Ao contrário do que acontecia no restaurante japonês, todos estavam se divertindo na casa do Mark, que já se sentia um antigo membro do nosso grupo de amigos. O laço familiar entre ele o só serviu para aproximar ainda mais todos dele. Diferentemente de mim e do Knox, assunto não faltava para eles. Eles estavam sempre contando coisas, sacaneando e rindo um dos outros. A conversa entre todos eles só foi interrompida com a chegada da pizza, que o havia pedido há mais ou menos 40 minutos.
- Vocês colocaram a mesa, agora deixem que eu tiro. - Mark ofereceu-se, levantando da mesa. Eles haviam acabado de jantar. - Você me ajuda, Meg? - Ele pediu para a melhor amiga, que parecia ter entendido o recado.
- Claro. - Meg também se levantou, pegou alguns pratos e talheres e foi para a cozinha atrás do melhor amigo.
- Você sabe da ? - Mark finalmente perguntou. Ele achou muito estranho o fato de eu não ter aparecido para reencontrar os meus amigos.
- Você não vai acreditar. - Meg segurou o riso.
- O que? - Mark ficou muito curioso.
- Ela foi a um encontro. - Meg disse, rindo. - Ela não te contou? - Ela perguntou.
- Não contou. - Mark tentou demonstrar indiferença com a notícia. - Com quem? - Ele não conseguiu se segurar.
- Com o cara mais chato de todo o hospital. Só de falar nele, eu já fico sonolenta. - Meg disse, bocejando.
- Ela… gosta dele? - Mark sorriu para não demonstrar sua verdadeira reação.
- Gosta dele? Eu acho que ela nunca tinha falado com ele até ontem. - Meg fez careta. - Eu não sei o que deu nela. Até trabalhar no meu lugar ela quis. - Ela disse.
- Como assim? - Mark arqueou uma das sobrancelhas.
- O sábado era meu essa semana. Ela trabalhou nos últimos sábados e ia folgar hoje, mas ontem ela me pediu para trabalhar no meu lugar. Eu não entendi nada. - Meg negou com a cabeça. A frase da amiga fez com que as coisas fizessem um pouco mais de sentido pro Mark. Ele sabia exatamente quais eram os meus motivos.
- Não sei como não pensei nisso antes. - Mark sorriu, negando com a cabeça.
- Pensou no que? Está maluco? - Meg fez careta, confusa.
- Você sabe onde está sendo esse encontro? - Mark ignorou as perguntas da amiga.
- No restaurante japonês. - Meg lembrou da breve conversa que havíamos tido naquela manhã pelo celular. - O favorito dela. - Ela completou.
- Sei qual é! - Mark disse, aproximando-se e beijando o rosto da melhor amiga. - Obrigado. - Ele agradeceu.
- Obrigado pelo quê? - Meg não tinha entendido nada. - Hey! Mark! - Ela gritou, vendo o amigo sair da cozinha.
- Pessoal, eu vou ter que dar uma saída. Aconteceu… um imprevisto no trabalho. Eu vou ter que… - Mark pegou o seu casaco que estava pendurado na cadeira e foi se dirigindo em direção a porta. Sabendo bem qual era o trabalho do irmão, não estranhou sua saída repentina. - Fiquem à vontade. - Ele gritou, antes de sair pela porta.
- Eu nem sabia que o Mark trabalhava. - comentou.
- E como você acha que ele banca uma casa como essa? - respondeu, desmerecendo a afirmação do amigo.
- Com a pensão que a sua família paga para ele… talvez? - sugeriu, segurando o riso.
- O que? Uma pensão? - arqueou ambas as sobrancelhas. - Como eu não sabia disso? Não é possível! - Ele reclamou.
Enquanto o tentava superar o fato de ser o último a saber de tudo, Mark aguardava ansiosamente pelo táxi que ele havia chamado através do celular. Ele resolveu chamar o táxi, quando percebeu que eu tinha ido com o meu carro. Se tudo ocorresse como ele imaginava, o carro dele seria totalmente desnecessário. Assim que o táxi chegou, ele entrou e falou o endereço do restaurante japonês para o taxista.
- Nenhum dos enfermeiros aguenta ela. - Knox continuava reclamando.
- Aham. - Eu não estava aguentando mais. Parecia que estávamos ali há uma hora, mas só haviam se passado 25 minutos. Nem a comida havia chegado ainda. Como eu vou sobreviver? - Então, a comida está demorando, né? - Eu tentei mudar de assunto.
- Está mesmo. Onde está o garçom? - Knox olhou em volta e não encontrou o garçom que havia atendido a nossa mesa. - Se você vê-lo, me avise. - Ele pediu, voltando a me olhar. - Mas então, você não vai acreditar no que aquela mulher fez semana passada! - Knox estava tentando me matar de tédio. Não era possível!
- O que? - Eu estava me controlando muito para não me levantar e ir embora. Era simplesmente o pior encontro de todos os tempos.
O taxista deixou o Mark em frente ao restaurante, ele pagou a corrida e dirigiu-se até a porta do restaurante. Ficou com receio de ser visto e decidiu olhar através de um dos vidros da janela do estabelecimento. Os olhos dele percorreram por todo o salão antes que ele me encontrasse. O sorriso no rosto dele foi completamente involuntário, quando ele viu a minha expressão de tédio e de saco cheio. Era impressionante a maneira como ele me conhecia. Só ao me olhar de longe, ele já sabia que eu estava desesperada para sair dali. Ainda achando muita graça da minha situação, ele pegou o seu celular e discou o número do meu celular.
- E ai ela entrou na sala e falou que… - Knox estava no auge da história mais chata da história, quando o meu celular começou a tocar em cima da mesa. Eu estava tão desesperada, que o toque do meu celular pareceu a música mais linda que eu já tinha escutado.
- Desculpa. Eu tenho que atender. - Eu fingi lamentar. - Alô? - Eu já sabia que era o Mark. Eu nunca fiquei tão feliz com um telefonema.
- Ele é tão ruim assim? - Mark riu silenciosamente ao perguntar. Ele observava a minha reação através do vidro da janela do restaurante.
- O que aconteceu? - Eu tentei evitar o sorriso.
- Sorria pelo menos. Eu já estou ficando com pena do cara. - Mark estava gargalhando no telefone.
- É muito grave? - Eu fingi preocupação. Knox me olhou, assustado.
- Pra você não esperar nem a comida chegar, deve ser bem grave mesmo. - Mark brincou, sem conseguir parar de rir.
- E onde você está? - Eu estava séria por fora, mas por dentro eu estava morrendo de tanto rir. Eu era uma excelente atriz.
- Eu estou aqui fora. Vim te resgatar. - Mark continuava me observando do lado de fora.
- Ok! Não saia daí! Não se mova. Eu estou indo, está bem? - Eu olhei para o Knox, que não demonstrou tanta decepção.
- Eu não vou me mover. - Mark afirmou, antes que eu terminasse a ligação.
- O que aconteceu? - Knox perguntou na mesma hora.
- Uma amiga minha levou um escorregão e acabou se machucando. Ela sempre me liga pra esse tipo de coisa. Ela não tem mais ninguém além de mim. - Eu odiava mentir, mas era extremamente necessário naquele momento. Questão de vida ou morte!
- Coitada. - Knox lamentou.
- Me desculpa! Eu vou ter que ir. - Eu disse com uma expressão de tristeza.
- Eu entendo totalmente! Pode ir! - Knox foi totalmente compreensivo. - Qualquer dia desses eu termino de te contar a história. - Ele completou. Ele estava me sacaneando, né?
- Combinado. - Eu forcei um sorriso, me levantando da mesa. - Desculpe novamente. - Eu me desculpei pela segunda vez.
- Fica tranquila! Melhoras para a sua amiga. - Knox disse, enquanto eu começava a me afastar.
- Valeu! - Eu sai rapidamente, ou melhor, desesperadamente do restaurante. Eu não aguentava ficar mais um minuto ali. Ao sair para o lado de fora, me afastei da porta para que o Knox não me visse e olhei para os lados, tentando encontrar o Mark. Sorri espontaneamente ao vê-lo encostado em uma das paredes do restaurante, bem ao lado de uma das janelas. Eu comecei a andar na direção dele e quando ele me viu, deu o sorriso mais lindo de todos.
- Eu não me movi! - Mark ergueu as mãos.
- Eu nunca fiquei tão feliz em te ver! - Eu me aproximei aos risos e o abracei.
- Sua cara estava ótima! Você não faz ideia. - Mark comentou, rindo.
- Como você veio parar aqui? - Eu fiquei curiosa.
- A Meg me contou sobre o encontro e sobre esse cara. Deduzi os seus motivos para estar aqui nesse restaurante e não na minha casa com os seus amigos. Resolvi vir até aqui e não pretendia te ligar ou interferir no seu encontro de qualquer maneira, mas quando eu te olhei por essa janela, eu não tive outra opção. Você estava implorando por ajuda. Eu não consegui evitar. - Mark contou com o seu bom humor de sempre.
- Eu estava ficando maluca lá dentro! Sério! - Eu disse e o vi rir novamente. - Pensa na pessoa mais chata que você já conheceu! - Eu fiz uma breve pausa. - Ele é 3 vezes pior! - Eu completei. - Sério! Muito obrigada por ter vindo! - Eu agradeci, olhando-o com carinho.
- Tudo bem. - Mark negou com a cabeça. - Vamos sair daqui? - Ele perguntou.
- Vamos! Ele não pode me ver. - Eu fiz careta, antes de começar a andar em direção ao estacionamento. Mark me acompanhou. Esperamos que o manobrista trouxesse o meu carro.
- Quer que eu dirija? - Mark se ofereceu e eu não pensei duas vezes antes de aceitar. Entramos no carro e colocamos o cinto de segurança. Mark deu a partida no carro e saímos do estacionamento do restaurante. - E ai? Pra onde? - Ele perguntou, dividindo a sua atenção entre o trânsito e eu.
- Para qualquer lugar, exceto a sua casa… ou a minha. - Eu iria para qualquer lugar com ele. Mark era sempre a melhor companhia.
- Certo. - Mark entendeu exatamente o que eu quis dizer. - E… você está com fome? - Ele perguntou.
- Para ser bem sincera, eu estou morrendo de fome. Você não faz ideia da quantidade de comida que eu tinha pedido naquele restaurante. - Eu disse e ouvi ele gargalhar.
- O que você quer comer? - Mark me levaria para qualquer lugar.
- Qualquer coisa. - Eu ergui os ombros, demonstrando indiferença.
- Que tal… um hambúrguer? - Mark perguntou, enquanto passávamos em frente a uma hamburgueria bem famosa na cidade.
- Perfeito! - Eu respondi na mesma hora.
- Certo. - Mark entrou com o carro na direção do restaurante e nos deparamos com uma fila enorme no drive thru.
- Nossa. Vai demorar. - Eu fiz careta. Com a fome que eu estava, seria um martírio enfrentar aquela fila.
- Vai. - Mark concordou. - E se entrássemos para comer? Pode ser mais rápido. - Ele sugeriu.
- Pode ser. - Eu concordei. Ele saiu da fila e seguiu em direção ao estacionamento do local que, apesar de estar bem lotado, tinha algumas vagas.
- Vamos lá. - Mark disse, abrindo a porta do carro. Eu fiz o mesmo e nós andamos até o restaurante.
- Uma mesa para dois, por favor. - Mark disse assim que a recepcionista do estabelecimento se aproximou.
- Eu peço mil desculpas pra vocês, mas o local está lotado! Vocês se importam de esperar uma das mesas desocupar? - A recepcionista nos olhou com muito pesar. Mark e eu nos olhamos.
- Eu… posso pedir para viagem? - Eu encontrei uma outra solução.
- É claro que sim. - A recepcionista afirmou.
- Então, eu vou fazer isso. - Eu estava com muita fome e não podia esperar.
- É só se dirigir ao balcão. - A recepcionista nos acompanhou até o local indicado por ela.
- Obrigada! - Eu agradeci.
O balconista me atendeu extremamente bem e anotou detalhadamente o meu pedido, que incluía refrigerante e batata frita. Mark pediu com jeitinho para que ele tentasse agilizar o meu pedido e o rapaz pareceu ter entendido. Depois de pagar pela comida (ele não me deixou pagar), Mark e eu esperamos até que o meu pedido ficasse pronto. Conversamos por aproximadamente 15 minutos até que o garçom trouxesse o meu pedido em um pacote. Peguei o pacote e o Mark pegou o meu refrigerante e nos dirigimos até a saída do restaurante.
- Ainda bem! O cheiro estava me matando. - Eu me referia ao cheiro delicioso de hambúrguer.
- Estava muito bom mesmo. Me deu até vontade de jantar de novo. - Mark concordou, enquanto andávamos até o carro.
- Eu te dou um pedaço do meu. - Eu disse assim que chegamos no carro.
- Onde você vai comer? - Mark quis saber se eu queria que ele me levasse para algum lugar.
- Aqui mesmo. - Eu coloquei o pacote com o meu lanche em cima do carro e me sentei com cuidado no capô. Mark achou graça da minha atitude. Ele adorava aquele meu jeito simples de ser. Não era qualquer garota que comia um hambúrguer no meio de um estacionamento, em cima do capô de um carro. - Meu Deus! Está divino! - Eu suspirei logo depois da primeira mordida. Mark sorriu, me observando. Ele estava apoiado no capô, bem ao meu lado. - Dá uma mordida. - Eu estendi o lanche na sua direção.
- Não. Pode comer. Obrigado. - Mark recusou, reconhecendo a minha educação por oferecer mesmo estando faminta.
- Qual é! Pega só um pedaço. - Eu insisti. - Você é o meu encontro agora. Não pode me deixar comer sozinha. - Ele não escondeu a sua reação extremamente fofa ao me ouvir dizer que ele era o meu encontro.
- Eu sou o seu encontro? - Mark sorriu de maneira doce.
- Você ficou com essa responsabilidade no momento em que você arruinou o meu primeiro encontro. - Eu ergui os ombros.
- Arruinei? Eu te salvei. - Mark riu, sem emitir som.
- Isso é o que você diz. - Eu mantive os ombros erguidos, mas deixei um sorriso escapar. Trocamos sorrisos por alguns segundos, antes que ele cedesse ao meu hambúrguer.
- Eu vou aceitar, mas só porque eu nunca recusei um hambúrguer na minha vida. - Mark se aproximou e deu uma mordida no hambúrguer, enquanto eu segurava o lanche. - Nossa! Está bom mesmo. - Mark concordou, impressionado.
- Eu disse. - Eu disse, tomando um gole do meu refrigerante. - E ai? Meus amigos são assim tão chatos para você tê-los deixado sozinhos na sua casa e estar comigo aqui nesse estacionamento? - Eu puxei assunto, enquanto comia as batatas.
- É claro que não. - Mark sorriu, negando com a cabeça. - Eles estão tão impactados com as bombas que o contou para eles, que eu tenho certeza que eles não vão nem sentir a minha falta. - Ele disse.
- Bombas? - Demorou alguns segundos para que eu me desse conta do que se tratava. - Ah! Ele contou? Contou sobre… vocês? - Eu também fiquei um pouco surpresa. Achei que ele esperaria mais um pouco mais para contar.
- Contou. Ele só omitiu a parte do Steven, é claro! - Mark confirmou.
- E qual foi a reação deles? - Eu fiquei curiosa.
- Sinceramente? Eu acho que eles vão levar alguns meses para assimilar tudo. - Mark disse, fazendo careta e me arrancando um sorriso.
- Foi o que eu imaginei. - Eu disse, rindo. Ficamos algum tempo em silêncio e ele chegou até a tomar um gole do meu refrigerante.
- Então, é isso o que você faz para fugir dos seus problemas? Faz horas extras no trabalho e vai a encontros horríveis. - Mark perguntou, sem qualquer tom de julgamento. Eu já tinha terminado de comer.
- Sobre as horas extras no trabalho, eu assumo. - Já que ele conhecia bem os meus motivos, eu não me sentia desconfortável com aquela conversa. - E até concordo com a parte do encontro, mas a parte do horrível eu não tenho tanta certeza, já que a noite ainda não acabou. - Eu disse, sorrindo fraco. - Eu ainda posso ter um ótimo encontro essa noite. - Faltou tanta sutileza da minha parte, que eu fiquei até um pouco sem graça. Mark entendeu exatamente o que eu quis dizer.
- Se depender de mim, você terá. - Mark sorriu de maneira encantadora. - Mas… e você? Vai me deixar salvar o resto da sua noite? - Ele estendeu uma de suas mãos na minha direção.
- É claro que sim. - Eu segurei a mão dele e com ela, ele me puxou e me ajudou a descer do capô do carro. Teria sido mais fácil se eu não estivesse vestindo saia. - O que você tem em mente? - Eu quis saber.
- Nós podemos dar uma volta. - Mark sugeriu.
- Pode ser, mas acho que vamos demorar um pouco para sair daqui. A fila para sair está enorme. - Eu fiz careta, olhando a fila bem atrás dele.
- Vamos a pé. - Mark deu poucos passos na minha frente, esperando que eu o acompanhasse.
- Não é muito perigoso? Já já está um pouco tarde. - Eu fiquei um pouco receosa.
- Você está segura comigo. - Ele sorriu pra mim de uma maneira que me convenceria de qualquer coisa.
- Certo. - Eu andei até ele. - Eu tinha esquecido que o meu encontro era com um agente do FBI. - Eu disse em um tom baixo, quase sussurrando. Ele riu sem emitir qualquer som.
- E então, como foi o seu dia? - Mark perguntou, enquanto andávamos lado a lado.
- Foi… muito melhor do que eu imaginava. - Eu respondi, virando o meu rosto para olhá-lo. - Se você tivesse me perguntado isso há 30 minutos, a minha resposta seria bem diferente. - Eu completei.
- Eu poderia dizer o mesmo. - Mark também me olhou.
- Suponho que você deva ter respondido muitas perguntas. - Eu deduzi, pois conhecia bem os meus amigos.
- Muitas. - Mark confirmou com a cabeça.
- Ei, olha! - Eu interrompi a nossa conversa. - É uma cabine de fotos. - Eu segurei a mão dele repentinamente e o arrastrei até uma cabine de fotos, que havia sido montada no meio da calçada. Era um pouco comum nas ruas de Nova York nos finais de semana. - Vamos? - Eu perguntei para ele, parando ao lado da cabine. - Nós não temos muitas fotos juntos. - Eu complementei com a intenção de convencê-lo.
- Vamos. - Mark não parecia tão empolgado quanto eu, mas ele gostou da ideia.
Tivemos que esperar um casal sair de lá de dentro da cabine e, enquanto isso, conversamos com o senhor responsável pelas fotos. Ele nos disse que era só seguir as instruções que apareceriam no monitor, que ficava dentro da cabine. O casal saiu e nós entramos. Conseguíamos nos ver no monitor, o que tornava tudo mais engraçado. Sorrimos somente na primeira foto. Na segunda, decidimos que faríamos uma careta e nas duas últimas, nossas poses foram extremamente espontâneas, já que não conseguíamos parar de rir da careta que havíamos feito na segunda foto.
- Vamos ver! - Saímos da cabine, ansiosos para vermos as fotos, que eram impressas na hora. - Meu Deus. - Eu voltei a rir.
- Olha a sua cara. - Mark também ria.
- A primeira ficou linda. - Eu disse, encantada.
- Quanto custa? - Mark deu atenção ao senhor, que esperava para receber o seu pagamento. Ele informou o valor e o Mark pagou, depois de pedir uma cópia das fotos. Ele queria guardar aquelas fotos. - Aqui. - Ele me entregou o cartão com as 4 fotos.
- Apesar de tudo, eu adorei as fotos. - Eu disse, olhando as fotos novamente. Voltamos a andar pela calçada.
- Eu também. - Mark sorriu ao olhar mais uma vez para o cartão em sua mão. - Eu vou guardá-las para não me esquecer nunca dessa noite. - Ele colocou o cartão cuidadosamente em seu bolso. Eu também guardei o meu cartão na minha bolsa, tentando não demonstrar o quão boba eu estava diante do comentário dele.
- E agora? - Eu perguntei, querendo saber o que faríamos a seguir. Andávamos lentamente pela calçada e eu percebi que ele estava se esforçando para pensar em uma alguma coisa.
- Ok. Eu tive uma ideia. - Mark parou repentinamente. Olhei para ele, ansiosa. - Não surta, ok? - Ele riu em meio a uma careta e me deixou extremamente desconfiada. Eu ainda estava sem entender até o momento em que ele agarrou uma das minhas mãos e me puxou.
- O que você está fazendo? - Ele estava me arrastando para dentro de academia de dança, que ficava naquela mesma calçada.
- Você gosta de dançar, não gosta? - Mark disse em um tom de voz mais baixo.
- Gosto, mas você odeia. - Eu respondi no mesmo tom de voz.
- Eu te disse que você ia se divertir, não disse? - Mark parou repentinamente e fez questão de dizer aquilo olhando pra mim. - Se você está feliz, eu estou feliz. - Ele completou com um sorriso admirável.
- Está bem, mas… - Eu olhei por cima dos ombros dele. - É uma aula particular. Não podemos invadir. - Os argumentos dele já haviam feito com que eu me derretesse toda. Eu ainda estava tentando ser racional, mas o sorriso bobo não saia do meu rosto.
- Eu te prometo que não vou deixar que você saia presa daqui. - Mark brincou, me fazendo rir.
- Tudo bem. - Eu ri, sem emitir qualquer som. - Mas… como vamos fazer? Não podemos simplesmente entrar e dizer: ‘Olá, viemos invadir a aula de vocês. Vamos dançar o que hoje?’. - Eu disse e ele gargalhou.
- Eu sei! Vamos esperar a música começar e ai nós entramos no meio dos outros alunos. A professora nem vai perceber. - Mark definiu o plano.
- Certo. - Eu disse, afirmando com a cabeça.
Ficamos bem atrás da porta e espiávamos através das frestas, esperando a música recomeçar. A professora explicou alguns passos de dança antes de colocar a música para tocar. Aquela era a nossa deixa! Entramos na sala rapidamente, mas tentamos não fazer tanto alarde. Poucos alunos que estavam no fundo da sala perceberam a estranha movimentação, mas a professora não viu absolutamente nada. Os alunos continuavam fazendo os passos, que continuavam sendo demonstrados pela professora e eu e o Mark começamos a imitá-los, sem fazer ideia do que estávamos fazendo. A música que tocava era uma valsa e, consequentemente, os passos eram lentos.
- Eu nunca vi ninguém dançando valsa sozinho. - Mark sussurrou na minha direção. Tentei olhá-lo feio, mas o sorriso no meu rosto me entregou.
- Isso. Agora, peguem o seu respectivo par. - A professora orientou, respondendo (sem querer) a dúvida do Mark. Ele se aproximou de mim e antes de me tocar, olhou para os casais ao nosso lado para ter certeza de que ele levaria as suas mãos aos lugares certos. Mark colocou uma de suas mãos nas minhas costas e a outra teve seus dedos entrelaçados nos meus. A mão que me restou, coloquei em um de seus ombros. - Nesse primeiro momento, comecem devagar. Mantenham a postura. - A professora orientou novamente. Mark e eu endireitamos os nossos corpos na mesma hora, o que nos fez sentir vontade de rir.
- A professora está vindo. - Eu disse em um tom de voz baixo. O receio que fossemos descobertos era enorme.
- Continue dançando. - Mark pediu, tentando me manter calma.
- Levantem mais esses cotovelos. - A professora deu a dica ao passar por nós. Mark e eu continuamos nos olhando e trocamos sorrisos.
- Como eles estão fazendo isso com os pés? - Mark perguntou, incomodado por não conseguir acompanhar os passos.
- Você está se saindo bem. - Eu o tranquilizei.
- Agora, façam o giro como eu demonstrei anteriormente. - A professora falou novamente. Fizemos o giro, mas mantemos os olhos nos outros casais para que não errássemos nada. Dançamos por um bom tempo e acabamos pegando o jeito da coisa.
- Eu ainda não acredito que estamos fazendo isso. - Eu sussurrei, olhando nos olhos verdes dele que pareciam me hipnotizar.
- Já está se divertindo ou… - Mark perguntou, enquanto continuávamos dançando entre os casais.
- Eu não sei. Eu acho que eu preciso de um pouco mais de tempo para responder. - Eu disse em um tom sério, mas ele percebeu que eu estava brincando.
- Ah! É mesmo? - Mark ironizou, fingindo estar ofendido. - Talvez você mudasse de ideia se eu dançasse um pouco melhor. - Ele afastou repentinamente o nosso corpo, me girou duas vezes seguidas e me trouxe novamente para perto, antes de jogar o meu corpo pra trás, me fazendo rir alto. Nós dois estávamos rindo e demoramos algum tempo para perceber que havíamos chamando a atenção de todas as outras pessoas da sala.
- Me desculpem, mas esses passos não fazem parte da minha aula. - A professora nos deu a bronca. Mark e eu nos recompomos na mesma hora.
- Eu sinto muito. Não queríamos atrapalhar a aula. - Mark tentou reverter a situação.
- Qual o nome de vocês mesmo? - A professora nos olhou de cima a baixo. Ela estava desconfiada.
- Nós somos… Alejandro e … Consuelo. - Mark tinha acabado de inventar os nomes. Eu tive que pressionar meus lábios para não rir. De onde ele tirou aqueles nomes?
- Ok. - A professora acreditou, mas manteve a desconfiança. - Eu vou apenas conferir a minha lista de alunos. - Ela virou-se de costas e começou a ir para um dos lados da sala, onde ficava a sua mesa. Mark e eu nos olhamos. Estávamos encrencados, mas o riso ainda estava em nosso rosto.
- Algum plano, Alejandro? - Eu sussurrei. Ele olhou discretamente em volta.
- Nós vamos correr em 3, 2… - Mark também estava sussurrando. - 1. - Ele terminou a contagem e no segundo seguinte, agarrou a minha mão e me levou às pressas até a porta. Nós saímos correndo de mãos dadas pelo corredor da acadêmia e corremos mais um pouco quando chegamos na calçada. Só paramos de correr quando vimos que estávamos longe da acadêmia de dança.
- Eu corri tanto, que até esqueci que eu estou de salto. - Eu disse, ofegante. - E de saia. - Eu fiz careta, descendo um pouco mais a minha saia.
- Você foi ótima. - Mark me tranquilizou.
- E você também foi. - Eu devolvi o elogio. - Você dançou muito bem. - Eu fiz questão de elogiá-lo.
- Eu já estou até pensando em abandonar a minha carreira no FBI. - Mark brincou.
- Você não dança tão bem assim. - Eu devolvi a brincadeira.
- Hey! - Ele fingiu me olhar feio e eu não consegui conter a risada.
- Sério. - Eu disse, depois que eu consegui parar de rir. - Você literalmente salvou a minha noite. Eu nem sei como te agradecer. - Eu o olhei com carinho.
- Eu sei como. - Mark não pensou duas vezes antes de responder. Confesso que não esperava por aquilo. - Me paga um sorvete. - Ele sorriu, apontando a cabeça na direção de a um carrinho de sorvete que tinha logo a nossa frente.
- Pago quantos você quiser. - Eu afirmei, enquanto nos aproximávamos do carrinho de sorvete. Pedimos os sorvetes ao sorveteiro e eu paguei pelos dois com todo o prazer do mundo. No fundo, eu sabia que o Mark só tinha usado o sorvete como desculpa para que eu me sentisse melhor por tudo o que ele tinha feito por mim.
- Eu tenho que dizer uma coisa: esse é o melhor encontro que eu já tive. - Mark disse, enquanto tomávamos o nosso sorvete. Andávamos lado a lado pelas calçadas de Nova York.
- Fazia muito tempo que eu não me divertia tanto. - Eu concordei com ele.
- Não foi um encontro muito convencional, né? Nós pulamos algumas etapas, mas não fez a menor falta pra mim. - Mark apenas comentou.
- Quer saber? Você tem razão! Nós pulamos a parte das perguntas. Você não perguntou sobre o meu trabalho, sobre a minha família ou sobre as minhas ambições para os próximos anos. - Eu disse.
- Deve ser porque eu já sei as respostas de todas essas perguntas. - Mark disse como se fosse óbvio.
- Ok. Já sei! - Eu tive uma ideia. - Você… tem que me contar uma coisa sobre você que eu ainda não sei. - Eu o desafiei.
- Você já sabe de tudo! - Mark tentou me fazer desistir daquela ideia.
- Eu duvido que eu saiba de tudo. - Eu cerrei os olhos.
- Olha, andamos tanto pelos quarteirões, que voltamos ao estacionamento da hamburgueria. - Mark apontou para o estacionamento logo a frente.
- Não muda de assunto. - Eu sabia o que ele estava fazendo.
- Eu não sei o que contar. - Mark tentou me despistar. Estávamos entrando novamente no estacionamento. Estava ficando muito tarde.
- Me conta alguma sobre mim. - Eu tentei ajudá-lo. - Alguma coisa sobre você e eu que eu ainda não saiba. - Eu melhorei a proposta.
- Eu conto, mas você vai primeiro! - Mark jogou a encrenca pra mim.
- Isso não é sobre mim. É sobre você. - Eu argumentei.
- Isso é sobre nós. - Mark me corrigiu. - Me conta alguma coisa que eu não saiba sobre nós e eu prometo que faço o mesmo. - Ele insistiu.
- Ok! Justo. - Eu não via porque não ceder.
- Muito justo. - Mark concordou.
- Eu preciso pensar. Espera. - Eu disse, apoiando as minhas costas na porta do meu carro. Mark estava parado na minha frente e me olhava, enquanto eu pensava.
- Lembrando que tem que ser uma coisa que eu ainda não saiba. - Mark reforçou. - E tem que ser uma coisa significativa. Não pode ser uma coisa boba. - Ele complementou.
- Ok. Eu já sei. - Eu disse um pouco mais séria. Eu não tinha certeza se eu queria mesmo dizer aquilo em voz alta. Não que fosse algo errado ou algo que eu me arrependesse, mas era uma coisa minha e eu não sentia necessidade nenhuma de expor isso pra alguém.
- Eu estou ouvindo. - Mark me deu toda a sua atenção.
- Eu vou te contar, mas eu não quero ouvir qualquer reclamação ou agradecimento, ok? Apenas ouça. - Eu impus a condição.
- Está bem. - Mark concordou, mas ficou um pouco desconfiado com a minha exigência. O que poderia ser?
- Ok. - Eu respirei fundo antes de começar a dizer. - Quando toda a coisa do Steven veio à tona e aconteceu tudo aquilo comigo e com o , eu… - Eu hesitei por alguns momentos, mas continuei olhando nos olhos dele. - Eu pensei mais de uma vez em voltar pra Atlantic City. Meus pais imploraram para que eu voltasse. Era mais seguro lá. Era longe do Steven. Era longe do , mas… também era longe de você. - Deixei de olhá-lo por um momento e coloquei uma mecha do meu cabelo atrás da orelha.
- Eu não entendi. - Mark continuou me olhando, confuso.
- Eu não quis voltar pra Atlantic City por você. - Eu disse sem demonstrar qualquer arrependimento. - Eu não queria que você ficasse sozinho. - Eu completei. Continuei olhando pra ele e acabamos trocando longos olhares em meio a um silêncio ensurdecedor. Eu o conhecia bem o suficiente para perceber que ele estava impactado com a minha revelação.
- Eu não acredito que você… - Mark negou com a cabeça.
- Sem reclamações. Lembra? - Eu o interrompi, antes que ele terminasse a frase.
- Eu sei. Eu sei. Você tem razão. - Mark negou com a cabeça novamente, sorriu desajeitadamente e levou as mãos aos rostos por poucos segundos. Ele estava tentando se recompor. - Minha vez, né? - Mark tentou seguir em frente.
- Sua vez, herói. - Eu afirmei com o meu melhor sorriso. Eu percebi que ele ainda estava perplexo.
- Sabe, é engraçado ver você me chamando assim. - Mark devolveu o sorriso. - Você deve saber que você também me salvou, quando você se mudou para a casa ao lado da minha. - Ele ficou um pouco mais sério. - Não que isso seja uma novidade pra você, mas naquela época a minha vida estava péssima. Eu tinha perdido a namorada, meu melhor amigo e toda a família que havia me restado. Eu não tinha nada. Eu nem mesmo tinha uma vida. Eu achava que nunca mais seria feliz e, por isso, acabei pensando em fazer muitas besteiras. - Ele estava contando com a serenidade que só alguém que superou muita coisa poderia ter. - E ai, você apareceu. Você mudou tudo pra mim. Você me mostrou que eu podia ser feliz novamente. Você me fez ver que, talvez, eu pudesse ter uma vida de novo. Você foi a única pessoa que foi capaz de me impedir de desistir. - Mark dizia cada palavra olhando em meus olhos. - E agora, eu tenho amigos, eu tenho um irmão e tenho uma vida de novo. Eu devo tudo a você. - Ele sorriu fraco, quando percebeu o quão abalada eu fiquei com a sua revelação. Devolvi o sorriso e me aproximei para abraçá-lo. Coloquei meus braços em volta de seu pescoço e ele me acolheu, como sempre.
- Obrigada por me contar. - Eu o abraçava tão forte, que tive certeza que ele conseguiu sentir o meu coração acelerado. Mark era uma pessoa tão incrível e sempre me fez tão bem, que era muito difícil controlar os meus sentimentos quando se tratava dele. Era a coisa mais pura que eu já tinha sentido por qualquer pessoa.
- Você está quebrando as regras. Não pode agradecer. - Mark tentou deixar o clima menos pesado.
- Você está certo. - Eu terminei o abraço, rindo. - Foi involuntário. - Eu fiz careta.
- Você está bem? - Ele percebeu que eu ainda estava abalada.
- Eu estou bem. É que… você pegou um pouco pesado. Eu não estava preparada. - Eu me justifiquei.
- Você também pegou bem pesado. - Mark respondeu. Um barulho vindo da minha bolsa interrompeu a nossa conversa.
- Espera. - Eu sabia que era o meu celular. - É a . Está me perguntando onde eu estou. Eles já estão na minha casa. - Eu resumi a mensagem que eu havia recebido.
- Seu plano funcionou! - Mark referia-se a minha fuga constante do .
- Sempre funciona. - Eu pisquei uma dos olhos pra ele. - Você dirige? - Eu pedi.
- Claro que sim. - Mark concordou. Eu joguei a chave em sua mão e fui para o outro lado do carro. Entramos no carro e seguimos para casa.
Ao chegarmos na minha casa, Mark e eu mal tivemos tempo para nos despedir, pois o meu irmão e os meus amigos não podiam saber que havíamos saído juntos. Infelizmente, eu não pude dizer a ele tudo o que eu queria dizer, mas os meus amigos não me deram tempo para ficar chateada por isso. Foi tão bom vê-los e abraçá-los novamente. Nós conversamos por horas e praticamente não dormimos naquela noite. Mark também não teve muito trabalho com o , já que a desculpa do trabalho tinha funcionado muito bem.
Na manhã seguinte, acabei acordando cedo, mas não tive coragem de levantar da cama. Eu sabia que o e os meus amigos ainda iam se despedir do e eu não podia correr o risco de encontrá-lo do lado de fora da casa. Consegui evitar novamente aquele reencontro, já que todos vieram se despedir de mim no meu quarto. Eles mal me deixaram levantar da cama, pois sabiam que eu precisava descansar, pois eu havia trabalhado muito no dia anterior. Me despedi com carinho de cada um deles e antes de irem embora, eles reforçaram a ideia de fazermos algo juntos no próximo feriado prolongado. Eu não prometi nada, mas também não neguei.
Quando eles saíram da minha casa, continuei na cama e do meu quarto consegui ouvi-los do lado de fora da casa. Eles se despediram do e do Mark. Eu não me atrevi sequer a olhar pela janela. Na verdade, eu nem ao menos tinha forças para isso, pois eu realmente estava muito cansada. Fazia semanas que eu estava exausta e parecia que eu nunca conseguia estar completamente descansada, por isso, promete a mim mesma que só sairia daquela cama naquele domingo para comer e ir ao banheiro.
As próximas semanas continuaram sendo cansativas. Juntou trabalho com a época de provas da faculdade. Quando eu não estava no hospital ou na faculdade, eu estava em casa estudando ou dormindo em cima dos meus livros de medicina. Foram semanas terríveis que eu queria esquecer. Eu mal consegui dar toda a atenção que o Mark merecia. Nós nos vimos sim quase todos os dias, mas sempre era muito rápido. De fato, eu precisava muito de férias.
Tudo indicava que as minhas férias antecipadas começariam no próximo feriado, que já estava bem próximo. O hospital me deu folga, isso queria dizer que eu teria 4 dias para descansar. Eu nunca tinha tido uma oportunidade tão incrível para hibernar por 4 dias seguidos. Esse era realmente o meu plano até eu receber o telefonema do . havia convidado todos para passar o feriado na casa do lago da tia Janice. Era o tipo de proposta que seria difícil de recursar.
- Não vou trabalhar. - Eu respondi, quando o meu melhor amigo perguntou.
- Então, você tem que ir. A , a e o também conseguiram folga no trabalho nesse feriado. - Eu estava ciente que o não desistiria até me convencer, mas o que realmente me chamou a atenção foi o fato de ele não ter mencionado o .
- E quem mais vai? - Eu perguntei, mas não consegui ser tão discreta quanto eu gostaria. - Vocês vão levar mais algum amigo de vocês ou… - Eu tentei consertar.
- Se o que você está querendo saber é se o vai, ele não vai. - respondeu com cara de tédio.
- Não era isso o que eu estava querendo saber. - Eu respondi, me fazendo de desentendida.
- Está bem. Vamos fingir e seguir em frente. - insistiu em sua afirmação. - Nós convidamos ele, mas ele disse que não vai. - Ele completou.
- Bem, eu vou ver o que eu consigo fazer. Eu não vou trabalhar, mas tenho alguns trabalhos da faculdade para finalizar. - Eu não quis dar certeza de nada.
- Vai ver o que consegue fazer? , você já foi melhor do que isso, sabia? O que está acontecendo com você? - perguntou, contrariado com a minha resposta.
- Eu sei! Me desculpa! - Eu me senti mal. Eu sabia que estava em falta com todos eles. - Eu prometo que vou tentar ir, ok? - Eu demonstrei que me esforçaria.
- Está bem. - concordou, mas parecia decepcionado.
- Eu amo você e sinto a sua falta. - Eu quis tentar agradá-lo, pois sabia que ele estava contrariado comigo.
- Eu também. - respondeu, antes de desligar a ligação.
Obviamente, eu me senti a pior pessoa do mundo. Eu queria muito passar o feriado prolongado com todos eles e aquela oportunidade era maravilhosa, já que o não estaria lá. Porém, eu realmente tinha alguns trabalhos da faculdade para finalizar. O que eu deveria fazer? Bem, a minha única opção foi tentar desesperadamente terminar aqueles trabalhos antes do feriado. Se eu conseguisse terminar, eu iria ao encontro dos meus amigos na casa do lago, caso contrário, eu passaria o feriado todo trancada dentro de casa e embaixo de dezenas de livros.
A situação do era um pouco parecida com a minha. A princípio, ele havia recusado o convite dos amigos e inventou uma desculpa qualquer, pois tinha certeza que eu viajaria com todos eles, já que a casa do lago era da minha família. Para o , era muito óbvio que eu estaria lá e, por isso, ele achou melhor evitar o reencontro, mas isso não mudava a enorme vontade que ele sentia de ir passar o feriado com eles. Quando acabou falando casualmente durante uma conversa deles que eu não iria para a casa do lago com eles, não pensou duas vezes: ele decidiu ir.
Véspera de feriado e já era madrugada quando eu finalizei o meu último trabalho. Isso queria dizer que eu conseguiria passar o feriado ao lado dos meus amigos, porém eu não consegui nem comemorar tal feito, pois acabei me jogando na minha cama e dormindo 2 segundos depois. O meu cansaço me fez decidir que eu dormiria até tarde na manhã seguinte e só viajaria para a casa do lago depois do almoço.
arrumou as suas malas, pegou o seu carro e saiu logo pela manhã naquele feriado. O GPS levaria ele até a casa do lago, já que ele tinha combinado de encontrar os amigos lá. Eu acordei um pouco depois das 11 horas. Pensei em convidar o Mark para ir comigo mesmo sabendo que já tinham feito o convite a ele, mas desisti quando me lembrei que ele estava trabalhando. Alias, foi exatamente por isso que ele não pode ir viajar conosco. Segundo o próprio Mark, ele tinha alguns trabalhos e reuniões importantes naquele final de semana e não poderia faltar de maneira alguma.
A noite de sono realmente havia me feito muito bem. Acordei uma outra pessoa. Arrumei as minhas coisas, comi qualquer coisa que eu encontrei na geladeira e coloquei as malas no carro. Como a dispensa da casa estava completamente vazia, decidi passar no mercado e comprar comida para ajudar a abastecer a casa do lago, que obviamente estava às mínguas. Antes de sair de casa, pedi ao Big Rob para olhar e alimentar o Buddy nos próximos 4 dias. Resolvi não avisar o e nem os meus amigos que eu estava indo encontrá-los, pois eu queria fazer surpresa. Eu estava extremamente empolgada para o feriado prolongado. Seria inesquecível!
chegou na casa alguns minutos antes que o e o resto do pessoal, pois a localização ficava mais perto de Nova York do que de Atlantic City. A Meg tinha viajado para Atlantic City na noite anterior para ir de carona com eles. Quando todos chegaram, abriu a casa e a mostrou para os nossos amigos. Todos ficaram perplexos e apaixonados pela casa. As portas e as janelas foram imediatamente abertas, já que o cheiro de mofo era bem presente. Cada casal escolheu o seu respectivo quarto e o ficou com um quarto só para ele.
- E ai, o que vamos almoçar? - perguntou, depois que percebeu que todos já haviam se acomodado.
- Mal chegou e já quer comer. - negou com a cabeça.
- Eu não tomei café da manhã. O ficou me apressando. - respondeu, lançando olhares maldosos para o amigo.
- Na verdade, ninguém conseguiu tomar café da manhã. - fuzilou o meu irmão com os olhos.
- Eu não estou nem ai. Eu avisei todo mundo o horário que nós íamos sair. - respondeu, sem qualquer remorso.
- Você chegou bem antes na minha casa. - cruzou os braços.
- Na casa do também. - Meg concordou com um sorriso maldoso.
- Mentira! Eu cheguei na hora exata! - debateu na mesma hora.
- Amor, você chegou antes. - teve que reconhecer.
- Ninguém respondeu ainda o que nós vamos comer. - interrompeu a discussão.
- Mesmo com todas as reclamações, eu vou ser solidário com todos vocês. Vocês vão comer o melhor churrasco da vida de vocês. - sorriu, se sentindo importante.
- E cade o churrasqueiro? - arqueou sobrancelha.
- Está nessa sala. - disse, se gabando.
- Cadê? Não estou vendo. - o sacaneou, olhando embaixo das almofadas do sofá e da mesa.
- Sou eu, palhaço. - respondeu, irritado. Todos riram.
- E você sabe se o seguro da casa cobre incêndios? - continuou a irritá-lo.
- O que eu sei é que os três babacas vão me ajudar ou ninguém vai comer nessa casa hoje. - disse em tom de ordem.
O final da manhã deles terminou em brincadeiras e risadas. Quando eles finalmente resolveram começar a preparar o almoço, todos foram para o quintal da casa. Os garotos ajudaram o a mexer na churrasqueira, enquanto as garotas observavam e riam das trapalhadas de todos eles. ficaria no comando da churrasqueira e os outros garotos revezariam a ajuda. O dia estava extremamente ensolarado e não poderia estar mais perfeito.
Depois de dirigir um pouco mais de uma hora, eu finalmente cheguei na casa que tinha sido uma grande parte da minha infância, mas que eu não frequentava há alguns anos. Ao final daquela longa estrada de pedras, eu via a casa que costumava ser o lugar favorito da tia Janice. Confesso que estranhei a enorme felicidade que eu senti ao vê-la. A saudade era maior do que nunca, mas a casa me trazia lembranças tão boas, que eu não consegui olhar para ela e sentir a tristeza que eu já previa sentir.
A promessa de um final de semana incrível com os meus melhores amigos me fez ter certeza de que aquela casa continuaria sendo um lugar repleto de boas lembranças e momentos inesquecíveis. Estacionei o meu carro ao lado do carro do e mesmo com o carro desligado, meus olhos não saiam daquela casa. Se eu pudesse, eu ficaria olhando para ela e relembrando tudo o que eu vivi ali durante todo o final de semana.
Demorei alguns minutos para sair do carro. Eu estava com tanta saudade de todos, que eu resolvi deixar para pegar as minhas malas depois. Eu queria vê-los logo! Me dirigi até a porta e antes de tocar a campainha, as risadas do e do me chamaram a atenção. Eles eram tão escandalosos, que eu conseguia ouvi-los dali. As risadas trouxeram um sorriso involuntário para o meu rosto e despertou em mim uma vontade de surpreendê-los. Resolvi tentar a sorte e girei lentamente a maçaneta da porta. Estava aberta! Aquela era a minha chance!
- Jonas, é a sua vez de buscar as cervejas. - gritou da churrasqueira. Os garotos tinham combinado de revezar.
- Não! É a vez do . - achou que valia a pena tentar, já que ele estava com preguiça de ir até a cozinha.
- Eu busco e você ajuda aqui com o churrasco! O que você acha? - disse em um tom irônico e ameaçador.
- Ok! Ok! Eu pego. - rolou os olhos. - Você anda passando tempo demais com a Meg. - Negou com a cabeça.
- Esse é o meu garoto. - Meg gargalhou, piscando um dos olhos para o namorado.
- Não começa, ruiva. - passou por ela, mas evitou olhá-la. Foi preguiçosamente até a cozinha casa, chegou a abrir a geladeira, mas um barulho que parecia vir da sala de estar da casa chamou a sua atenção.
Quando entrei na casa, minha cabeça foi a mil. Eu não conseguia acreditar que eu estava ali novamente. Meus olhos percorriam toda a casa, enquanto minha mente explodia com todas aquelas memórias. Os móveis, a decoração, as paredes… estava tudo exatamente igual a última vez que eu estive ali. Eu estava em êxtase e o sorriso no meu rosto não me deixava mentir. Fiquei tão distraída, que mal percebi que eu tinha companhia.
- Eu… posso te ajudar? - perguntou, sem saber quem era. Eu estava de costas para ele, por isso, ele não me reconheceu, mas eu tenho certeza que se ele não tivesse feito a pergunta tão rápido, ele acabaria tendo a sua resposta. Pelo menos, foi o que aconteceu comigo. Aquela voz repentina me pegou tão desprevenida, que eu não tive tempo de raciocinar. Eu já fui logo virando o meu corpo para descobrir de quem se tratava.
Quem diria que voltar àquela casa não seria o momento mais impactante da minha viagem? Dois idiotas que não conseguiam ter qualquer reação. A troca de olhares foi intensa, mas ninguém teve coragem de dizer uma só palavra. E lá estava ele: camisa regata, bermuda, chinelos e um boné com a aba virada para trás na cabeça. Ele não disse nada, mas os olhos dele não negavam o fato de ele também ter reparado em mim. O meu shorts não era tão curto e a minha blusa não era decotada (VEJA AQUI), mas ele notou que o meu cabelo estava com um corte diferente e estava um pouco mais cumprido do que eu costumava deixar.
- Oi! - Eu não sei de onde veio. Eu simplesmente falei.
- Hey. - tentou sorrir, mas ficou bem claro o seu incomodo ao me ver. Mesmo com o cumprimento simples, nós continuamos parados e mudos. Nos olhávamos sem conseguir interpretar o que o outro estava pensando e sem saber como reagir.
- Eu não vou fazer. Eu sou péssima na cozinha, vocês sabem! - disse, enquanto passava pela porta que dava a passagem para a casa. Meg e estavam com ela.
- Ela tem razão. - concordou na mesma hora.
- Não pode ser tão ruim assim! - Meg desacreditou. Elas adentraram na casa sem prestar muita atenção ao que estava acontecendo em volta.
- Jonas! O que você está fazendo? - perguntou ao ver o amigo de costas. Elas ainda não tinham se aproximado o bastante para me ver.
- Daqui a pouco o vai… - parou de falar quando ela e as meninas se aproximaram um pouco mais e acabaram me vendo.
- ! - sorriu ao me ver. Deixei de olhar para o pela primeira vez desde que eu havia chegado naquela casa.
- Não acredito que você veio! - foi a primeira a se aproximar para me abraçar.
- É, eu… - Eu ia dizendo, sem saber muito bem como continuar aquilo.
- Você não me contou que vinha! - Meg também se aproximou, beijando carinhosamente o meu rosto.
- Eu… decidi de última hora. - Eu disse com um sorriso, tentando disfarçar o que eu estava sentindo. - Eu… vou falar com os meninos. - Eu arrumei a primeira desculpa para sair daquela sala. Fui saindo e não consegui evitar uma nova troca de olhares com o . Ele continuava paralisado.
- É a … vindo ali? - cerrou os olhos. Ele sabia bem o que estava vendo, mas as circunstâncias o fez duvidar.
- Você veio! - sorriu, depois de virar-se e me ver. Eu continuei me aproximando deles.
- Eu disse que ela vinha! - se gabou.
- Primeiro: eu sei o que vocês fizeram! Segundo: eu vou matar vocês! - Foi o que eu disse a eles assim que os alcancei.
- Oi pra você também! - me olhou, irritado.
- Não vem com essa! - Eu esbravejei.
- Ok, calma! - pediu, fazendo gestos com a mão.
- Vocês me disseram que ele não estaria aqui! - Eu estava furiosa, mas, ao mesmo tempo, estava angustiada.
- Nós dissemos que ACHÁVAMOS que ele não estaria aqui. É diferente! - se defendeu.
- Você mentiu pra mim, ! - Eu o fuzilei com os olhos. - Todos vocês mentiram! - Eu neguei com a cabeça. - O que eu vou fazer agora? - A pergunta foi retórica. Eu só estava pensando alto.
- Ok, eu não ia dizer nada, mas a ideia foi toda do ! - se sentiu mal na mesma hora e resolveu entregar o amigo.
- Ei! - o olhou feio.
- Ele tem razão! Foi ideia dele. - concordou com o .
- E vocês não pensaram duas vezes antes de me ajudar, né? - estava furioso. Eu estava tão atordoada, que nem estava prestando a atenção discussão deles.
- Eu vou embora. - Eu disse, depois de pensar por alguns segundos em meio a briga deles.
- Não vai nada! - me olhou feio.
- Vocês não entendem! Eu não posso ficar aqui. - Eu não quis dar detalhes.
- O que… ela está fazendo aqui? - perguntou para as meninas assim que eu saí da sala.
- Querido, eu não sei se você percebeu, mas essa casa é dela. - Meg respondeu na mesma hora.
- É mesmo? - perguntou, irônico. - E como foi que descobriu isso? Nos seus livros de anatomia? - Ele completou a ironia. - Vocês disseram que ela não viria. - ignorou a Meg e deu toda a sua atenção a e .
- Nós dissemos, mas… - forçou um sorriso antes de terminar a frase.
- Ah não! - entendeu exatamente o que tinha acontecido. - Me digam que vocês não estão bancando o cúpido pra cima de mim. - Ele cruzou os braços e continuou a olhá-las.
- Nós somos as cupidas mais lindas que você já viu, não somos? - sorriu em meio a uma careta. Ela sabia que estava encrencada.
- Oh… - rolou os olhos e suspirou longamente.
- A boa notícia é: eu não estou envolvida nisso. - Meg ergueu os ombros. - Não fica decepcionado, mas… eu nunca fui ‘Team Jonas’. - Ela sorriu e piscou um dos olhos pra ele.
- Bem, eu não posso te culpar. Eu sempre fui ‘Team ’. - ergueu os ombros, demonstrando indiferença.
- Jonas! - condenou o comentário dele.
- Ela começou! Vocês viram! - se defendeu. - Aliás, eu não sei nem porque eu estou discutindo com essa garota. Ela é o menor dos meus problemas! - Ele fez careta.
- Fica calmo e me escuta! Nós cogitamos sim a ideia de bancarmos o cúpido, mas acabou não dando certo. Nós convidamos sim a pra vir, mas ela disse que não poderia vir. Estamos tão surpresas quanto você. - tentou explicar.
- E em nenhum momento vocês pensaram em me contar que ela poderia aparecer aqui? - perguntou, mantendo-se desconfiado.
- Não. - afirmou com um sorriso forçado.
- Isso é mesmo ótimo! - esbravejou, deixando de olhá-las. Ele não sabia o que fazer. - Vocês são minhas amigas! Vocês supostamente deveriam me ajudar! - Ele voltou a olhar para elas, furioso.
- Nós estamos ajudando! - tentou acalmá-lo.
- Ah, qual é! - Ele rolou os olhos. As garotas se entreolharam, sem saber o que fazer pelo amigo.
- Olha, todo esse drama é mesmo necessário? Se a presença dela te incomoda tanto, por que você continua aqui? A porta está bem ali! - Meg apontou.
- Meg, você não está ajudando. - olhou feio pra ela.
- Não, eu estou falando sério! Eu esperei semanas por esse final de semana. Estar com vocês, o e até mesmo com esse babaca do . - Meg parecia estar desabafando. - Eu não vou deixar você estragar o nosso feriado simplesmente porque você não aguenta ficar 3 dias na mesma casa que a . - Pela primeira vez, não tratava-se de implicância por parte da Meg. Ela estava sendo sincera.
- Você não faz a menor ideia do que você está falando, mas… talvez, eu deva ir embora mesmo. - Ele estava irritado com a Meg por julgá-lo sem nem ao menos saber qual era o verdadeiro problema, mas a sugestão para que ele fosse embora talvez não fosse não ruim assim.
- Não. - reagiu na mesma hora.
- Vai ser melhor assim. - percebeu que a e a tinham ficado chateadas com a sua decisão. Ele começou a se afastar e ir em direção aos quartos.
- Não vai ser melhor. - segurou o amigo pelo braço e o puxou de volta.
- Há quanto tempo não temos um final de semana como esse, ? Há quanto tempo planejamos vir nessa casa? - tentaria a última cartada.
- Você sabe como foi difícil conciliar os compromissos, o trabalho e a faculdade de todo mundo para podermos nos reunir aqui. Você sabe como vai ser difícil fazer isso acontecer de novo. - usava os mesmos argumentos comigo do lado de fora da casa. Parecia até que eles tinham planejado.
- Eu sei, mas… - sabia que a amiga estava certa, mas isso não deixava as coisas mais fáceis pra ele.
- Eu queria ficar, mas… - Eu neguei com a cabeça. As palavras de só me deixaram mais confusa.
- Então, fique! Vamos aproveitar o final de semana. Isso não é sobre você e a . É sobre você e os seus amigos. - sabia que tinha feito o seu melhor. Bastava saber se tinha sido o suficiente para convencê-lo.
- É sobre estarmos todos juntos! - argumentou, me pedindo para ficar.
- Ok. Eu fico. - e eu concordamos juntos em ficar.
- Mas, eu tenho uma condição! - Eu me adiantei.
- Condição? - fez careta. estava fazendo a mesma exigência na sala da casa.
- Eu sabia que teria uma condição. - suspirou.
- Sem cúpidos nessa casa! - impôs a sua condição.
- Sem comentários maldosos e constrangedores sobre nós dois. - Eu também defini a minha condição.
- Feito! - Os garotos concordaram.
- Combinado! - As garotas também concordaram.
- Agora que o drama foi resolvido, nós podemos voltar lá pra fora? Eu estou com fome. - Meg estava querendo dizer isso há algum tempo.
- Não estou vendo ninguém te segurando. Fica à vontade! - ironizou, apontando na direção do quintal da casa.
- Eu estou bem à vontade, afinal, não sou eu que vou passar 3 dias com o meu ex. - Meg sorriu, vitoriosa. - Boa sorte, lindo. - Ela piscou um dos olhos antes de se afastar e ir em direção ao quintal da casa.
- Uau! Ela é boa. - comentou, admirada.
- Nunca critiquei. - também demonstrou admiração.
- Eu ainda estou aqui! - rolou os olhos e suspirou longamente.
- Ah, ok! Vamos lá pra fora. - afirmou, depois de uma longa gargalhada.
- Eu preciso urgentemente de novas amigas. - negou com a cabeça, enquanto caminhava em direção ao quintal ao lado das meninas.
- Não fala assim! Você sabe que ninguém te aturaria por tanto tempo. - o abraçou desengonçadamente. Eles pararam na geladeira para pegar as cervejas.
Foi só colocar os pés no quintal da casa, para que ele não ouvisse mais nada do que as garotas diziam pra ele. Ele só pensava em uma coisa: ‘aja naturalmente.’. Mesmo estando de costas, eu percebi que o se aproximava só pelos olhares dos garotos. Confesso que fiquei nervosa, mas sabia que seria muito mais fácil lidar com aquilo com tantas pessoas a nossa volta. O problema mesmo era quando estávamos sozinhos.
- E esse churrasco, sai ou não sai? - tentou parecer descontraído e já foi logo se aproximando dos garotos.
- Está saindo tanta fumaça dessa churrasqueira que daqui a pouco os bombeiros aparecem. - disse, balançando uma das mãos de um lado para o outro.
- Para de reclamar e vê se me ajuda. Pega todos os ventiladores que você encontrar lá dentro. - deu a ordem.
- Eu ajudo. - se prontificou.
- E vocês, tentem fazer alguma coisa comível naquela cozinha. Nós precisamos de um plano B. - olhou para mim e para as outras garotas.
- Eu… não sei se interessa pra vocês, mas eu trouxe muita comida de Nova York. Está tudo no meu carro, se vocês… - Eu achei que eles não gostariam da ideia.
- Graças a Deus! Estamos salvos! - sorriu, aliviada.
- Ei! - tentou intervir.
- Minha heroína! - Meg se aproximou e me abraçou. - Ei, ei! E o meu churrasco? - Meu irmão ficou emburrado na mesma hora.
- Que churrasco? - arqueou uma das sobrancelhas. - Faz mais de uma hora que você está nessa churrasqueira e a única coisa que saí dela é fumaça. - Ele fez careta.
- Eu não sei vocês, mas eu vou comer churrasco. Você está comigo, não é, ? - achou que o melhor amigo o apoiaria.
- Cara… - negou com a cabeça. - É melhor parar antes que você coloque fogo na casa. - Ele lamentou.
- Traidores. - resmungou, enquanto fuzilava os amigos com os olhos.
- Qual é, ! Não tem problema. Nem todo mundo sabe fazer churrasco. Está tudo bem. - Eu tentei consertar a situação e consolá-lo.
- Faz 15 minutos que você chegou e você já está me irritando! Por que você me odeia? - continuava me olhando feio.
- Como eu poderia odiar o melhor irmão que eu poderia ter no mundo? - Eu forcei um sorriso, enquanto o abraçava a força.
- Ok, ok. Eu entendi. - fez careta, tentando me afastar.
- Aqui. Isso foi tudo o que encontramos. - disse, aproximando-se com dois ventiladores nas mãos. estava bem ao lado dele.
- O que está acontecendo? - percebeu que algo está acontecendo ali.
- Não vai ter mais churrasco. - resumiu.
- Como assim não vai ter mais churrasco!? - perguntou com os olhos esbugalhados e com uma voz de indignação.
- A trouxe comida. - Meg contou.
- Você trouxe comida? - me olhou, arqueando uma das sobrancelhas. - De que tipo de comida estamos falando? - Ele perguntou, demonstrando interesse.
- Lasanha? - Eu respondi, sabendo que era a comida favorita dele.
- Ela realmente disse lasanha ou eu só estou com fome? - sussurrou para a namorada, que ainda estava ao seu lado.
- Ela disse! - respondeu aos risos. Na mesma hora, soltou os ventiladores.
- Eu nem estava tão a fim de comer churrasco mesmo. - ergueu os ombros. A reação dele fez com que todos rissem.
- Lasanha? Pegou pesado, hein? - negou com a cabeça, tentando segurar o sorriso.
- Eu trouxe a sua lasanha favorita também. - Eu sorri pro meu irmão.
- Não dá pra odiar essa garota. - passou um dos seus braços pelos meus ombros.
- Ela salvou o nosso almoço. - gargalhou.
- Ok, seus interesseiros. Eu preciso de ajuda pra tirar as coisas do carro. - Eu disse, me afastando da churrasqueira. Os garotos se disponibilizaram na mesma hora e a Meg e a também. não se moveu, quando percebeu que o foi o único que não havia saído do lugar.
- Sério? - cruzou os braços ao olhá-lo.
- O que foi? Eu fiquei para apagar a churrasqueira. - inventou uma desculpa qualquer.
- Não precisa fazer isso. - rolou os olhos. - Não é como se ela fosse te agarrar a qualquer momento. - Ela completou.
- Eu estou bem aqui. - sorriu, demonstrando que tinha um bom argumento.
- Então, qual é o seu medo? Você tem medo de perder o controle perto dela? Você não tem autocontrole. É isso? - perguntou, provocando-o.
- Eu tenho autocontrole. - debateu na mesma hora.
- Você não tem autocontrole. Você mal consegue olhar pra ela. - insistiu.
- Ok! Eu não se esse é mais um desses seus joguinhos para me manipular, mas eu vou te provar que eu tenho autocontrole e que eu consigo conviver com a , se eu quiser. - odiava ser desafiado, pois sempre que isso acontecia, ele se sentia obrigado a provar o contrário. - Começando agora! - Ele afirmou, antes de abandonar a churrasqueira e sair andando em direção ao interior da casa.
- Hey! Como eu vou apagar essa churrasqueira sozinha!? - gritou ao vê-lo se afastar. - ! - Ela tentou chamá-lo mais uma vez. - Droga. - Ela esbravejou, concluindo que teria que fazer aquilo sozinha.
O que não se faz por comida, não é mesmo? Todos estavam me ajudando a tirar as minhas malas e as compras que do carro. Eu tirava uma mala ou sacola do carro e repassava para um deles, que levavam quase tudo para o quarto que eu ficaria (as compras foram deixadas na cozinha). Em uma só viagem, o meu irmão e os meus amigos já haviam levado quase tudo para dentro da casa. Faltava apenas uma mala e uma sacola pesada. Como não tinha mais ninguém a minha volta, resolvi tentar levar tudo sozinha. Com isso, descarreguei a mala e a sacola e as coloquei no chão para poder fechar o porta-malas e trancar o carro. Em seguida, fiz a minha primeira tentativa de levar a mala e a sacola, mas não consegui dar mais de três passos com elas. Na segunda tentativa, eu tentei segurá-las de uma outra maneira. Eu estava tão entretida em arrumar um jeito de levar aquilo para dentro da casa, que não notei que alguém se aproximava.
- Precisa de uma ajuda? - A voz me fez olhá-lo. Eu reconheci a voz dele, mas estava surpresa por vê-lo ali.
- Não. Eu… - Eu fiz uma outra tentativa de levar a sacola e a mala, mas fracassei novamente. - Ok. Eu preciso de ajuda. - Eu fui obrigada a aceitar a ajuda.
- Deixa que eu as levo pra você. - se aproximou para pegar a minha bagagem e eu automaticamente me afastei. Eu queria evitar aproximações estranhas.
- Obrigada. - Eu agradeci, sem jeito. Fiquei parada bem ali, observando ele se afastar e entrar na casa com a minha bagagem. Me senti um pouco boba por não ter aceitado a ajuda dele logo de primeira, mas nada que eu não pudesse superar. Além disso, o meu motivo para tal atitude era extremamente nobre: eu só estava respeitando a decisão dele de se afastar de mim. Voltei para dentro da casa e segui as vozes, que vinham da cozinha.
- Não acredito que vocês já estão fazendo a lasanha! Vocês estão realmente com fome. - Eu fiquei perplexa ao entrar na cozinha.
- Sinto muito, mas eu estou em fase de crescimento. Vocês sabem! - justificou a sua fome e fez todos rirem.
- Imagina só quando ele crescer de vez! - Meg gargalhou.
- Já começa a pensar nas dietas que você vai ter que obrigá-lo a fazer no futuro, . - brincou.
- Você disse ‘dieta’? - fez careta. - Bem, essa é a minha deixa! - Ele levantou-se da cadeira. - Vamos, ! Eu vou te mostrar o seu quarto. - veio em minha direção.
- Espera. Vocês não vão precisar de ajuda? - Eu olhei para os que estavam cozinhando.
- , se nós fizermos a comida, o que os nossos escravos vão fazer? - disse em voz alta para que os outros ouvissem. Ele virou-se para rir dos amigos no momento exato em que o atacou um tomate em sua direção. Foi por pouco, mas ele conseguiu se esquivar.
- Hey! - abriu os braços ao olhar feio para o meu irmão.
- Até que você se esquivou bem. Eu tenho que reconhecer. - fingiu estar impressionado.
- Vocês podem parar de brincar com a comida? - deu a bronca.
- Fala isso pro ogro do seu namorado. - apontou para o meu irmão e, na mesma hora que o viu cerrar os olhos em sua direção, ele sorriu. - Brincadeira! - Ele deu o seu melhor sorriso.
- Vai logo mostrar o quarto para a , amor. - riu, fazendo sinal para que o namorado fosse de uma vez.
- Vamos. - Eu o chamei e ele me acompanhou. Eu conhecia muito bem a casa, por isso, eu sabia onde ficavam os quartos.
- É por aqui. - apontou na direção dos quartos.
- Aham. - Eu concordei, demonstrando que já sabia onde ficava.
- Eu esqueci que você já esteve aqui antes. - riu de si mesmo.
- Muitas vezes. - Eu ri junto com ele.
- Certo! - fez careta. - Então, aqui… é o meu quarto e o da . - Ele apontou para uma das portas.
- Eu não estou surpresa. - Eu o olhei com um sorriso safado.
- Esse é o do . - Ele mostrou e me olhou. - Por que você ficou tão séria de repente? - aproveitou para se vingar.
- Não começa! - Eu o fuzilei com os olhos.
- Aqui… é o quarto do seu irmão e da . - apontou.
- Ew! - Eu fiz careta. Ele riu.
- O quarto da Meg e do fica logo ali na frente e o seu é esse aqui. - apontou com a cabeça para a porta que estava logo a nossa frente.
- Oh! Sério? Bem em frente ao banheiro? Odeio ficar em frente ao banheiro! Eu fico acordando toda hora com essa porta abrindo e fechando. - Eu reclamei.
- Era esse quarto ou o que fica na frente do quarto do . - ergueu os ombros.
- Eu amei o meu quarto! - Eu mudei de ideia na mesma hora.
- Foi o que eu pensei. - riu sem emitir qualquer som.
- Vamos ver como vocês deixaram as minhas malas. - Eu me adiantei e empurrei a porta do quarto, que estava apenas encostada. Adivinha quem foi a idiota que esqueceu que o tinha acabado de levar as minhas coisas para o meu quarto? Sim! Ele estava lá! E pior: foi surpreendido com um porta-retrato nas mãos.
- Ei, cara. - foi o único que conseguiu falar alguma coisa. Ainda bem que ele estava comigo!
- Hey! - sorriu, sem jeito. - Eu vim trazer… as coisas da e acabei ficando curioso com a foto. - Ele falava como se eu nem estivesse ali.
- Não tem problema. - sorriu, tentando tranquilizar o amigo. - Não é? - Ele me olhou, esperando que eu me manifestasse de alguma maneira.
- Claro! Sem problemas. - Eu neguei com a cabeça e forcei um sorriso.
- Certo. Eu… - apontou em direção à porta. - Eu vou voltar lá pra fora. - Ele disse, antes de sair do quarto sem conseguir me olhar.
- Ok. - suspirou, percebendo o clima estranho.
- Ainda bem que você estava aqui comigo! Seria muito estranho se estivesse só eu e ele. - Eu respirei, aliviada.
- Mais estranho do que já foi? - me olhou.
- Acredite: é possível! - Eu fiz careta.
- E… o que tem nessa foto? - deixou de me olhar e aproximou-se do criado-mudo, que ficava ao lado da cama.
- Somos eu e o . Eu acho que nós tínhamos uns 10 anos. - Eu conhecia muito bem aquele porta-retrato.
- Que bonitinhos. - sorriu. - É uma bela foto. Por que ela continua aqui? - Ele perguntou.
- A minha tia costumava colocá-la ai todas as vezes que nós vinhamos pra cá. Esse quarto costumava ser meu e do . - Eu gostava de contar aquela história.
- Sério? - interessou-se na história.
- Eu tinha medo de dormir sozinha e o costumava fazer xixi na cama durante a noite por não conseguir chegar ao banheiro a tempo, então nós dormíamos aqui. - Eu contei.
- Espera. Você disse que o costumava fazer xixi na cama ou eu estou louco? - segurou o riso.
- Não! Você não vai falar nada! - Eu não acredito que tinha contado pra ele. O ia me matar!
- Não me peça isso! - negou com a cabeça, morrendo de rir.
- Para! Ele me fez prometer que eu não contaria pra ninguém! - Eu tentei me manter séria.
- Não! Por favor, não me peça isso. - pediu mais uma vez.
- Me prometa! - Eu precisava ter certeza de que ele não falaria nada.
- Não! - fez careta.
- , me prometa! - Eu pedi mais uma vez.
- Ok. - Ele me olhou, emburrado. - Eu prometo não dizer nada. - Ele suspirou, chateado. - Mas saiba que você é responsável por destruir a piada do século. - disse com um bico.
- Você vai pensar em outra coisa. Eu tenho certeza. - Eu toquei o ombro dele, tentando consolá-lo.
- Ok. Ok. - rolou os olhos. - Vamos voltar pra cozinha. Eu estou morrendo de fome. - Ele pareceu ter se conformado.
Chegamos na cozinha agindo como se nada tivesse acontecido. superou o fato de não poder sacanear o e eu e o fingimos que não tínhamos nos reencontrado naquele quarto. Quando sentamos na mesa para almoçar, sentamos em lugares opostos na mesa. Era tão óbvio o quanto estávamos evitando um ao outro.
O calor estava estarrecedor naquela tarde e decidimos que iríamos na piscina depois que organizássemos a bagunça enorme que havíamos feito na cozinha durante o preparo do almoço. Os garotos ajudaram a retirar as coisas da mesa, enquanto eu e a garotas cuidávamos da louça. Juntos, conseguimos terminar de organizar e limpar tudo bem mais rápido do que esperávamos, por isso, alguns optaram por dormir um pouco e outros, como eu, resolvemos ficar conversando em volta da piscina. Conservamos um pouco mais de uma hora, quando os dorminhocos resolveram acordar. Na verdade, eles foram acordando aos poucos. A Meg foi a primeira, depois foi o , o e por fim, a . O foi o único que permaneceu dormindo.
- Vamos entrar na piscina, ? - me convidou, levantando-se da cadeira. Ela ia até o quarto dela para colocar o biquíni.
- Eu não sei se estou com coragem para entrar agora. Eu até já estou com o biquíni, mas continuo sem coragem. Pode ir. Eu vou esperar mais um pouco. - Eu não queria atrapalhá-la. A maioria já estava na piscina e eu não queria que ela não entrasse por minha causa.
- Está bem. Eu volto já. - afastou-se e entrou na casa. Continuei observando o meu irmão e os meus amigos na piscina.
não demorou mais do que 5 minutos para voltar com os seus trajes de piscina. Ela entrou na água e foi carinhosamente recebida pelo . Continuei ali sentada, embaixo de um guarda-sol. Eu estava me divertindo bastante vendo todos eles brincarem e jogarem água uns nos outros, mas toda a diversão desapareceu quando, pela visão periférica, eu vi saindo da casa a única pessoa que ainda estava dentro dela.
Eu não me atrevi a olhar para ele, mas senti os olhares dele sobre mim. Ainda sonolento, ficou sem saber o que fazer. Ele tinha 3 opções: entrar na piscina mesmo sem estar com vontade para tal, deitar-se na espreguiçadeira que estivesse mais longe de mim e bancar o mal educado ou sentar-se na cadeira que estava bem ao meu lado para quebrar de uma vez por todas aquele clima insuportável.
ficou um bom tempo parado na porta da casa, pensando no que era melhor a se fazer. Eu estava muito tensa e até suspirei de alívio quando notei que ele entrou novamente na casa. Para mim, ele tinha achado melhor voltar a dormir, pois essa era a melhor maneira de me evitar. Cheguei a me entreter novamente com as brincadeiras bobas que aconteciam dentro da piscina e não percebi quando ele voltou para a porta. Eu só notei a presença dele, quando ele puxou a cadeira ao meu lado e se sentou. Eu congelei.
- Trouxe uma pra você. - deslizou uma garrafinha de cerveja pela mesa e a deixou na minha frente. Ele também tinha trazido uma garrafa para ele. A frase dele parecia um pedido de trégua.
- Você pode ser preso por isso, sabia? - Eu sorri, pegando a garrafa com uma das mãos. Teoricamente, eu ainda não tinha idade para beber.
- Não seria a primeira vez, não é? - disse com a maior tranquilidade, trazendo um sorriso involuntário para o meu rosto. Tomei um gole da cerveja e ele fez o mesmo. Meus olhos continuavam fixos na piscina, mas a verdade é que eu já nem estava prestando a atenção no que acontecia dentro dela. Eu só queria que ele achasse que eu estava entretida com outra coisa que não fosse ele. também olhava para a piscina, tentando parecer distraído. - Então, o que você acha? - Ele perguntou repentinamente. - Eles armaram para nós dois? - referia-se aos nossos amigos e ao fato de estarmos naquela casa. A pergunta dele trouxe um novo sorriso para o meu rosto.
- Sem dúvidas. - Eu respondi com convicção, antes de tomar um outro gole de cerveja.
- Então, eu não sou o único. - concluiu, mantendo os olhos na piscina.
- Eles também te disseram que eu não vinha? - Eu deduzi.
- Disseram. - confirmou com um sorriso. - Eles são bons. - Ele reconheceu, me fazendo rir sem emitir qualquer som.
- Eles são bons. - Eu concordei com ele. A conversa começou a fluir tão naturalmente que, por um momento, eu esqueci que deveria manter meus olhos na piscina e virei o meu rosto para olhá-lo. Quando percebeu que eu olhei pra ele, também acabou cedendo e também me olhou, sorrindo. Não vou dizer que olhar pra ele, olhar nos olhos dele e ver o sorriso dele tão de perto foi a coisa mais normal do mundo. Foi intenso para ele também.
- E o que nós vamos fazer a respeito? - Ele me perguntou, querendo saber o que eu tinha em mente.
- Que tal se só… curtíssemos o feriado? - Eu sugeri, erguendo os ombros. Deixei de olhá-lo.
- E nós deveríamos continuar agindo como dois idiotas ou… - ficou um pouco sem jeito ao perguntar.
- Foi estranho pra você também? - A frase intrigante dele me fez olhá-lo novamente.
- Está me matando, na verdade. - foi tão sincero, que chegou a me surpreender.
- E se tentássemos agir normalmente? Eu quero dizer, já que estamos aqui e temos o mesmo objetivo de passar o feriado com os nossos amigos, nós poderíamos fazer um esforço. - Eu propus.
- Eu gostei. - afirmou com a cabeça.
- Legal. - Eu sorri, tentando parecer feliz, mas eu estava aterrorizada. Como é que eu podia agir normalmente com ele? Onde eu estava com a cabeça?
- Temos um acordo? - estendeu sua garrafa de cerveja, esperando que brindássemos.
- Temos. - Eu levei a minha garrafa de cerveja até a dele. Depois de brindar, levei a minha cerveja até a boca e bebi um gole enorme. - Eu… vou pra piscina. - Eu coloquei a cerveja sobre a mesa e me levantei. Eu nem ao menos o convidei para ir comigo ou agradeci pela bebida. Eu só queria sair dali. Era muita coisa para processar tão rápido.
Era muito difícil ficar sozinha com ele sem parecer que éramos um casal ou que estávamos pensando em ser um casal. Havia sim uma zona de segurança entre interagir um com o outro e nos mantermos afastados o suficiente para respeitar o pedido que o havia me feito naquele hospital. Aquela zona de segurança era onde eu deveria estar e, naquele momento, essa zona de segurança era dentro da piscina.
Em qualquer outra situação, eu tiraria a minha roupa ali mesmo, tomaria um sol e depois pularia na piscina, mas esse não era o caso. Eu não queria que o pensasse que eu pudesse estar tentando provocá-lo, por isso, fui de roupa até o outro lado da piscina e tirei discretamente a minha roupa. Mesmo de longe, senti os olhares dele sobre mim e isso me fez querer entrar ainda mais rápido na piscina. Depois de tirar a minha roupa, eu não demorei mais do que 10 segundos para pular na água.
A piscina acabou sendo a melhor coisa para mim, pois eu acabei me distraindo bastante com o meu irmão e com todos os meus amigos. Por um momento, cheguei até a esquecer que o estava logo ali. Era nesses momentos que eu conseguia entender que a falta que eu sabia que sentia de todos eles era muito, muito maior do que eu imagina. Independentemente de qualquer coisa, ter ido passar o final de semana com eles foi a melhor decisão que eu já havia tomado.
Saímos da piscina quando o sol começou a se pôr. Para a minha sorte, o não cogitou entrar na piscina em nenhum momento. Mesmo com o nosso singelo acordo, nós ainda parecíamos evitar um ao outro. Pode parecer exagero para quem vê tudo isso do lado de fora, mas para nós dois era muito importante manter a distância.
Antes de sairmos da piscina, definimos que faríamos uma fogueira naquela noite. O clima estava ótimo para isso e tínhamos muitas caixas de marshmallow no armário. Diante disso, os garotos resolveram sair da piscina antes e tomarem banho primeiro para que eles pudessem ir atrás de lenha para acendermos a fogueira, enquanto eu e as garotas nos arrumávamos. Eu e as garotas esperamos que eles desocupassem os banheiros e entramos logo atrás deles.
O quintal da casa era enorme e tinha um espaço ideal para que a fogueira fosse acesa. Os garotos tiveram um pouco de dificuldade de conseguir a lenha. Se não fossem os vizinhos, eles não teriam conseguido e não teríamos marshmallows naquela noite. Quando eles terminaram de acender a fogueira, eu e as garotas separamos as caixas de marshmallows e os espetos. Nos sentamos em volta da fogueira e para não perder o costume, e eu sentamos bem longe um do outro.
- Vocês fizeram um ótimo trabalho! - elogiou os garotos.
- Eu quase carreguei toda a lenha sozinho. - reclamou.
- Até parece! Meus dedos estão todos ferrados de carregar esses negócios. - respondeu, sem deixá-lo levar o mérito sozinho.
- Você só ajudou por causa dos marshmallows. - debochou do amigo.
- A verdade é que só conseguimos a lenha por causa de mim. Eu fui muito educado com o vizinho, ele foi com a minha cara e nos deu toda a lenha. - entrou no meio.
- Você pediu mesmo pro vizinho? - perguntou, surpresa.
- Está mais pra implorar. - corrigiu.
- Ele nos deu a lenha, não deu? - desconversou. - Come o seu marshmallow ai e fica quieto. - Ele disse, fazendo com que os amigos rissem.
- Nossa. Está delicioso. - Meg suspirou, após morder o seu segundo marshmallow.
- É o melhor que eu já comi. - Eu concordei.
- Foi a que comprou. Arrasou, amor. - aproximou e selou rapidamente os lábios da namorada.
- Ei, nós podíamos fazer alguma coisa, né? - sugeriu.
- Vamos cantar. É o que as pessoas fazem, né? - achou que seria uma boa ideia.
- Quais pessoas? - olhou para o amigo, desconfiado.
- Nos filmes. - respondeu como se fosse óbvio.
- Que tipo de filme você anda fazendo ele assistir, ? - fez careta. cerrou os olhos na direção do amigo.
- É uma boa ideia. - concordou.
- Ninguém sabe cantar aqui, gente. Estou cansada de ser humilhada pela e pelo Jonas. - Meg fez careta.
- Imagina, Meg. - Eu rolei os olhos, sem jeito.
- Já está até acostumada, né? - provocou Meg.
- Qual é, galera. Estamos em volta de uma fogueira e sozinhos. Quem se importa com quem canta mal ou bem? Vamos só cantar. Não é uma competição. - tentou nos conscientizar.
- Eu apoio! - Eu fui a primeira a concordar com ela.
- para presidente. - brincou, mostrando que concordava com a amiga.
- Está bem, mas… não temos nem um violão. - ergueu os ombros.
- Quem disse que não temos? - perguntou, levantando-se e andando rapidamente para dentro da casa. Voltou segundos depois com um violão nas mãos e o entregou ao , que era o único que sabia tocar o instrumento ali.
- Prestou pra alguma coisa, . Parabéns! - bateu palmas.
- Ok. Isso é ótimo, mas… por que diabos você tem um violão? - arqueou uma das sobrancelhas.
- Eu comprei há alguns anos porque pretendia aprender a tocar, mas acabei descobrindo que o meu único talento mesmo é na cama. - riu e olhou para a namorada, que revirou os olhos.
- Pena que o seu talento não tem a mesma duração que uma música, não é, amor? - respondeu e foi imediatamente ovacionada por todos.
- Você, mais do que ninguém, sabe que isso não diminui o meu talento. - respondeu, levando tudo na brincadeira.
- Eu sei. - riu, abraçando-o e beijando-o.
- Isso foi fofo, mas… vamos cantar? - Meg tentou voltar ao foco.
- O que vamos cantar? - perguntou.
- Cada um poderia escolher uma música. - Eu sugeri.
- Boa! - apoiou a ideia.
- Mas tem que ser música boa! - adicionou.
- Tem que ser músicas que todos conhecem. Não venham com essas músicas de menininhas não. - complementou.
- A música tem que agradar a todos. - ressaltou.
- Combinado! - aprovou as condições.
- Esperem. Eu só preciso afinar o violão. - pediu, enquanto afinava o violão.
Cantar não me incomodava tanto. Não tinha problema se eu cantasse uma música com o , desde que todos os nossos amigos cantassem junto. O que poderia vir a ser um problema era ver o tocando violão novamente. As últimas vezes que isso aconteceu, estávamos juntos. Uma delas, inclusive, foi no nosso pedido de namoro, em que ele cantou ‘Never Gonna Be Alone’ pra mim. Vê-lo com aquele violão nas mãos me trazia boas lembranças, mas eu preferia não ter que recordá-las.
Começamos a selecionar as músicas, mas sem deixar os preciosos marshmallows de lado. foi o primeiro a escolher a música e a escolha realmente não me surpreendeu: ‘It’s My Life’ do Bon Jovi. O segundo a escolher a música foi o , que também não surpreendeu, já que tratava-se de sua banda favorita: ‘How To Save A Life’ do The Fray. foi a terceira e escolheu ‘Free Fallin’ do John Mayer, aliás, o destruiu no violão nessa. Ele era muito bom. Quando chegou a vez dele de escolher, eu tinha certeza que ele escolheria uma música dos Beatles.
- Eu escolheria Beatles, mas vocês não vão saber cantar. - rolou os olhos, contrariado. - Então, pode ser ‘Use Somebody’ do Kings of Leon. - Ele definiu.
- Boa escolha! - vibrou.
Aquela fogueira foi definitivamente a coisa mais divertida que nós já fizemos. Estávamos cantando todos juntos e com muita empolgação. Foi uma coisa extremamente única entre nós, que pareceu ter nos unido ainda mais. Nem mesmo parecia que eu e o passaríamos o resto do feriado nos evitando. Estávamos rindo, cantando e comendo marshmallows. O que poderia ser melhor do que isso?
Era o que puxava as músicas para que os outros entrassem na música no momento certo. Foi assim que ele fez com a música pedida pela : ‘Wonderwall’ do Oasis. Nós cantamos como nunca. Apesar de eventualmente nos olharmos enquanto cantávamos, o clima não ficou nem um pouco estranho entre eu e o . O que realmente me surpreendeu, na verdade.
- Eu tinha me esquecido dessa! - Eu vibrei, depois de terminarmos de cantar a música pedida pela . - Ok, minha vez. - Eu disse, pensativa.
- Uma boa, vai! - Meg pediu, empolgada.
- ‘A Thousand Miles’ da Vanessa Carlton. - Eu fiquei feliz por ter me lembrado dessa. - Vocês conhecem, né? - Eu perguntei para os garotos mesmo tendo certeza de que eles conheciam.
- Infelizmente. - disse, segurando o riso.
- Como poderia não conhecer! - assumiu.
- Por um acaso, eu sei tocar. - brincou, fazendo com que todos rissem.
- Vamos, ! Canta igual você canta quando está no chuveiro. - Eu entreguei o meu irmão, que foi zoado por todos.
- Prazer culposo. Já ouviram falar? - se defendeu, tentando parecer sério.
Mais uma música que foi cantada por todos, mas que foi, de longe, a mais engraçada. Foi muito engraçado ver os garotos cantando a música, enquanto faziam dancinhas no refrão. Foi memorável. A música pedida pelo também não ficou atrás, ele pediu ‘Time Of Your Life’ do Green Day. Naquela altura do campeonato, nós já tínhamos comido todos os marshmallows do mundo, mas continuamos cantando, afinal, ainda faltava a música pedida pela Meg, que seria a última da noite.
- Depois de pensar muito, eu já sei qual escolher. - Meg disse, empolgada. - Eu quero ‘Never Gonna Be Alone’ do Nickelback. - Ela disse com a maior inocência do mundo. Ninguém disse nada. Para falar a verdade, acho que todo mundo parou de respirar por 5 segundos. e eu acabamos trocando olhares constrangedores. - O que foi? É um hit! Não é possível que ninguém conheça. - Ela não entendeu o motivo do clima. Não dava para culpá-la. Ela era a única que não estava presente no dia em que o me pediu em namoro.
- Meg. - tentou avisá-la.
- O que foi? - Ela sussurrou, olhando pra ele. Ela não sabia o que estava acontecendo.
- Não. Tudo bem. - Eu impedi que o a julgasse por aquilo. - Nós podemos cantar mais essa, não é? - Eu perguntei ao , demonstrando que para mim estava tudo bem e que, portanto, só dependia dele.
- É claro que podemos. - afirmou, sem pensar duas vezes.
- Vocês conhecem a letra, não é, pessoal? - Eu estava tentando fazer tudo funcionar. A Meg não tinha culpa e, assim como todos os outros, ela também deveria ter a sua música tocada e cantada. Todos confirmaram que conheciam a música. - Boa escolha, Meg. É a minha favorita. - Eu pisquei para ela. Não queria que ela se sentisse culpada por nada.
Quase 4 minutos de músicas. Quase 4 minutos de coração disparado e de borboletas no estômago. E eu não estava falando só de mim. Eu também me referia ao . Mantive meus olhos fechados durante toda a música para evitar olhar para ele, mas eu ainda conseguia vê-lo mesmo com os olhos fechados. Eu estava revivendo aquela noite na minha mente. Eu me lembrava dos detalhes. Eu me lembrava da roupa que ele estava usando. Eu me lembrava de tudo. tocou toda a música com a cabeça baixa. Ele fingiu o tempo todo que estava acompanhando seus dedos no violão, mas a verdade é que a sua mente estava bem longe dali. Eu e ele estávamos com o pensamento no mesmo lugar naquele momento.
Apesar de todo o clima, todos cantaram a música exatamente como cantaram as anteriores. Ao final da música, nós comemoramos o sucesso da noite com aplausos. A recordação que a última música nos trouxe não conseguiu tirar o sorriso do rosto de todos que estavam ali. Todos estavam muito felizes com o quão incrível havia sido aquela noite. Sabe aquele tipo de coisa que você vive e sabe que vai lembrar daquilo o resto da sua vida? Foi aquela noite para cada um que estava em volta daquela fogueira.
O horário nos fez abandonar a fogueira. Os garotos se responsabilizaram por apagar a fogueira e eu e as garotas levamos os marshmallows e as outras coisas que haviam sobrado para dentro da casa. Nós ainda estávamos recordando e rindo de alguns momentos que aconteceram durante a cantoria. e estavam admiradas com a habilidade do para tocar violão e não falavam de outra coisa. Meg aproveitou para se aproximar e descobrir o que tinha acontecido na última música.
- O que foi que eu fiz de errado? Eu não entendi. - Meg sussurrou, me olhando com preocupação.
- Não foi nada. Nem se preocupa. - Eu tentei evitar o assunto.
- Como não foi nada? Todo mundo mudou do nada! - Meg insistiu. - Qual o problema com a música? - Ela perguntou novamente.
- Não é nada demais. - Eu rolei os olhos, tentando demonstrar indiferença. - O cantou ‘Never Gonna Be Alone’ pra mim quando me pediu em namoro. - Eu não queria que ela se sentisse mal.
- Não acredito. - Meg fez careta e levou as mãos ao rosto.
- Não, Meg. Não tem problema. Sério! - Eu tirei as mãos dela do rosto. - Você não sabia. - Eu completei.
- Agora que você falou, eu lembrei. Eu acho que você mencionou alguma coisa sobre isso pra mim um dia. - Ela se lembrou. - Eu nem lembrava disso. - Ela estava se sentindo muito mal com aquilo.
- Para com isso, Meg. - Eu neguei com a cabeça. - Não tem problema. Eu já disse! Nós cantamos e deu tudo certo. - Eu quis acalmá-la.
- Desculpa mesmo. - Ela pediu, lamentando. - Eu não sinto muito pelo , mas por você sim. - Ela completou, me fazendo rir. Me aproximei e a abracei entre risos.
- Está tudo bem. - Eu reafirmei, finalizando o assunto.
Minha conversa com a Meg foi 100% verdadeira. Realmente estava tudo tão bem, que chegou a me surpreender. Assim como todas as outras pessoas da casa, eu fui dormir extremamente feliz. A noite tinha sido maravilhosa e memorável. Os meus problemas com o não atrapalharam em nada. Aliás, eu acho que nem haviam mais problemas. Para mim, estava tudo resolvido e superado. Já para o , as coisas eram um pouquinho mais complicadas, mas nada com o que ele não conseguisse lidar. Para ele, o que tratava-se de mim era sempre um pouco mais complicado do que o convencional, mas isso não faria daquela noite menos especial para ele.
Acordamos bem cedo na manhã seguinte, pois havíamos combinado de ir até o lago, que ficava bem próximo da casa da tia Janice. As garotas vestiam biquínis por baixo de suas roupas e os garotos vestiam regatas e shorts para nadar. Como fazia muito tempo que não visitávamos aquele lago, e eu não tínhamos certeza se ainda era possível nadar nele. e eu ainda estávamos agindo normalmente um com um outro. Não fazíamos mais tanta questão de mantermos distância um do outro. Não estávamos pensando sobre o que já tinha acontecido entre nós. Na verdade, era como se nada tivesse acontecido.
- Meu Deus. Continua igualzinho! - Eu fiquei perplexa ao me aproximar do lago.
- É muito bonito aqui. - disse, perplexo.
- A ponte e a árvore ainda estão aqui. - sorriu pra mim. Ele referia-se a uma pequena ponte que terminava no meio do lago. Bem ao fim dessa ponte, havia uma árvore enorme, que fazia uma sombra maravilhosa sobre o lago. A árvore também tinha uns cipós enormes, que permitia que os visitantes se agarrassem e se jogassem no lago. Era incrível.
- Vocês brincavam aqui quando eram crianças? - quis saber.
- Muito. - afirmou com um sorriso nostálgico.
- Minha mãe não gostava muito que pulássemos aqui. Ela tinha medo que acontecesse alguma coisa e só nos deixava ficar no raso. - Eu apontei na direção da parte rasa do lago.
- Mas a tia Janice sempre nos trazia aqui quando ela não estava por perto e nos deixava pular dessa ponte. - lembrou aos risos.
- A tia de vocês era maravilhosa. - fez questão de nos dizer.
- Ela era. - Eu concordei na mesma hora.
- O Mark iria gostar de conhecer esse lugar. - me olhou com um fraco sorriso.
- Ia mesmo. - Eu afirmei em meio a um sorriso. Era incrível para mim ver o falando daquele jeito e desejando que o irmão estivesse ali conosco. Demonstrava que ele realmente se importava e isso era tudo o que poderia desejar ao Mark.
- Quem vai primeiro? - apontou em direção ao lago. Todos nós trocamos olhares.
- As damas primeiro. - olhou para mim e para as garotas.
- Eu vou, seus medrosos. - Meg rolou os olhos, antes de aproximar-se da beirada da ponte. Ela ficou de costas, enquanto começava a tirar suas peças de roupas. E com ‘ficou de costas’, eu quis dizer que ela deu a chance para que alguém a empurrasse. Imagina se o perderia essa oportunidade. nem teve tempo de impedi-lo.
- Não! Não. - Foi o que Meg conseguiu dizer antes de cair na água.
- Ops. - forçou um sorriso e abriu os braços.
- Idiota! - Meg esbravejou, tentando jogar água na direção dele com os braços.
- Nós vamos nos vingar por você, Meg! - gritou, depois de trocar olhares com e .
- Como assim vão se vingar? - não levou a sério.
- Você empurrou ela e, agora, nós vamos te jogar. - fingiu lamentar.
- Uma ova! - fez careta, pensando em como fugir. Ele estava preso na beirada da ponte e não tinha pra onde correr. - Esperem! - Ele tentou evitar que os amigos se aproximassem, mas foi inútil. - Não. Vamos conversar! - Os garotos o ignoraram completamente e seguraram ele. segurou um dos braços, segurou o outro e o segurou as pernas. - MEU CELULAR! ESPERA. - Ele pediu, fazendo um escândalo.
- Dá pra mim. - se aproximou e pegou o celular do bolso do amigo. Meg estava gargalhando de dentro do lago.
- Ok. Vão com calma. - pediu, enquanto os garotos riam. - Deixa eu me preparar… - Ele começou a pedir, mas nem conseguiu terminar a frase. Os garotos fizeram uma rápida contagem e o jogaram no lago.
- Obrigada, meninos. - Meg fez um coração com as mãos.
- Eu vou agora. - se prontificou. cuidou para que ninguém a pegasse desprevenida, enquanto ela tirava suas peças de roupa. Ela foi a primeira de nós a pular no lago, depois de se balançar no cipó. foi logo em seguida. Depois, foi a minha vez e a vez da . foi o último a pular.
Passamos praticamente a tarde toda no lago. Só paramos para comer algumas coisas que havíamos trazido em uma cesta de piquenique. Foi muito divertido. Terminamos a tarde, fazendo uma competição de saltos no lago. foi o campeão da brincadeira e ficou se gabando durante todo o nosso caminho para a casa. Não dava para julgá-lo. O salto dele no lago realmente tinha sido memorável.
Ao voltarmos para a casa, resolvemos tomar banho, antes que preparássemos algo para o jantar. Estávamos com tanta fome, que nem deu tempo de preparar algo mais elaborado. Comemos alguns salgados prontos, que a havia trazido de Atlantic City. Após o jantar, nos reunimos na sala para jogar conversa fora. A maioria fez isso, enquanto bebia garrafas de cerveja e alguns goles do vinho que a Meg havia trazido.
Depois de todas as bebidas, alguns estavam mais bêbados do que outros. e estavam especialmente bêbados. tinha bebido bem pouco e para ser sincera, não me lembro de ter visto o tomar alguma coisa que não fosse água. As garotas também estavam um pouco alteradas, mas nada que chegasse perto dos meus conhecidos vexames. Para não dizer que eu não havia tomado nada, eu tomei sim dois ou três goles de cerveja, mas eu não cheguei a ficar instável.
- Ok, acabou a cerveja! - informou a todos, depois de forjar uma ida até a cozinha. Ele sabia que a maioria já havia bebido demais e, por isso, achou melhor mentir.
- O que ele quis dizer com ‘acabou a cerveja’? - olhou para o meu irmão, confuso.
- Ele quis dizer que você bebeu tudo! - o olhou, irritado.
- EU? - apontou pra si mesmo.
- Foi o . - rolou os olhos.
- Foi o Jonas. - Meg tentou defender o namorado.
- Você está drogada? O Jonas nem bebeu. - respondeu, apontando para o .
- Eu sei. Foi só pra não perder o costume. - Meg disse antes de começar a rir sozinha.
- Vocês deram droga pra ela? - perguntou, olhando para os amigos.
- Se ela está drogada, todas vocês também estão. - defendeu a namorada.
- Eu estou drogada? Eu não consigo me lembrar. - arregalou os olhos. - ! Eles me deram drogas? - Ela puxou o namorado.
- Meu Deus. - Eu estava perplexa com toda a cena que eu estava vendo e não consegui evitar a risada. me viu rindo e se aproximou.
- Nós devemos continuar presenciando essa comédia ou devemos bancar os responsáveis e mandar todo mundo pra cama? - perguntou ao sentar-se ao meu lado.
- É uma proposta bem tentadora. - Eu olhei pra ele, sem conseguir parar de rir.
- Hey! Do que vocês estão rindo? - nos interrompeu, nos olhando feio.
- Tem algum palhaço aqui, por acaso? - cruzou os braços. Ele estava bêbado! Ele nem sabia do que estava falando.
- Palhaços? Onde? - entrou em pânico.
- Nós somos os palhaços! - tentou explicar.
- O QUE? Há dois minutos nós eramos usuários de drogas e agora nós somos palhaços? Que tipo de suruba é essa? - parecia confusa.
- Minha nossa! Você está bêbada, amor. Fica quietinha e me deixa resolver. - colocou uma das mãos sobre a boca da namorada. - Do que vocês estão rindo? - Ele voltou a encarar o e a mim.
- De vocês, é claro! Vocês estão tão bêbados! - tentou falar sério com o meu irmão, mas foi impossível.
- Vocês estão péssimos. - Eu tive que concordar com ele.
- Oh, nos desculpem se não somos bêbados tão legais como vocês dois. - disse, fazendo careta.
- Me desculpem se eu não estou em cima de um palco agora cantando o que eu não tenho coragem de falar na cara de . - ironizou. Desnecessário essa, hein?
- Me desculpem se eu não estou sofrendo por ter meu coração quebrado. - também ironizou.
- Ok, esperem… - Eu ia argumentar a meu favor e a favor do também, mas fui interrompida.
- Me desculpem se eu não estou soletrando todas as minhas palavras. - acompanhou os garotos e foi apoiada por todos. O que isso? Um complô?
- Já está bom, né? - tentou acabar com o assunto.
- Me desculpem por não perder a minha virgindade, hoje. - sorriu para o , sentindo-se vitorioso. Pesada essa, hein?
- Me desculpem se eu não estou tentando fazer sexo nos bastidores de um show de uma banda qualquer. - Meg repentinamente soltou essa bomba. Ela lembrou-se daquela vez em que eu a abandonei em um barzinho para sair às presas com o . Na mesma hora, todos olharam para ela, perplexos.
- Espera, o que ela quis dizer… - estava bêbado demais pra entender.
- Ok, todo mundo pra cama! - antecipou-se, antes que as coisas piorassem.
- Eu estou exausta mesmo. - suspirou.
- Você entendeu o que ela… - ainda estava um pouco perdido e tentou pedir a ajuda da namorada.
- Eu já nem lembro o que ela falou. - negou com a cabeça.
- Ela disse que… - parou de falar e ficou pensativo. - Do que nós estamos falando mesmo? - Ele olhou pra ela, confuso.
- , eu quero dormir. - rolou os olhos, sem paciência.
- Vocês conseguem ir para os seus respectivos quartos ou precisam de ajuda? - perguntou em um tom mais alto para que todos ouvissem.
- Eu não posso dormir aqui mesmo? - perguntou, apontando para o sofá.
- Deixa que eu levo você e a . - me olhou e rolou os olhos.
- Eu ajudo o e a . - Eu disse, segurando o riso.
- Eu não estou tão ruim. Eu posso encontrar o nosso quarto. - Ouvi o dizer para a Meg.
- Vamos. - Eu fui até o , virei o corpo dele na direção dos quartos e comecei a empurrá-lo. nos acompanhou lentamente. - Por aqui. - Nos aproximamos dos quartos. - Não! Aqui não! - Eu segurei a , que estava entrando no quarto errado. - É esse aqui. - Nós paramos em frente a uma porta e eu a abri. entrou, ele estava meio cambaleando. entrou logo atrás dele. - Vocês preferem tomar banho? Vai ajudar. - Eu propus.
- Não. Eu só quero dormir. - disse, jogando-se na cama.
- Dormir? - olhou pra ela, decepcionado.
- Se você chegar perto de mim, eu te jogo da cama. - ameaçou, sem mover-se na cama.
- Mas nem se… - começou a dizer, mas eu interrompi porque eu não queria ouvir.
- Ok! Eu vou deixar vocês sozinhos. - Eu saí de fininho e fechei a porta.
Apesar de ter achado tudo aquilo muito engraçado, era horrível ficar com aquele cheiro de bebida impregnado nas minhas roupas e até mesmo no meu cabelo. Como eu disse, eu não tinha bebido, mas eu tinha várias pessoas bêbadas ao meu redor. O cheiro era tão forte, que parecia que era eu que tinha bebido. Com isso, eu resolvi tomar outro banho antes de ir dormir. Passei no meu quarto e optei, por causa do calor, por pegar a camisola ( VEJA AQUI) que eu havia trazido e fui para o banheiro.
Depois do banho, demorei mais algum tempo no banheiro, pois fiquei secando um pouco o meu cabelo. Eu não gostava de dormir com ele muito molhado. Escovei os dentes e vesti a minha camisola. Eu estava prestes a sair do banheiro, quando decidi colocar o hobby por cima da camisola, pois não sabia se ainda havia alguém acordado na casa. O banheiro ficava em frente ao meu quarto e parecia bastante silencioso do lado de fora, mas não custava nada, certo? Abri a porta do banheiro com muito cuidado e fiz o mesmo ao passar pelo corredor. Entrei lentamente no meu quarto, tomando cuidado para não bater a porta. Após fechar a porta, dei alguns passos em direção a cama e peguei o meu celular que estava em cima dela. Dei uma rápida olhada nas minhas redes sociais e me mantive completamente entretida por alguns segundos. Foi nesse momento, que alguém que estava logo atrás de mim cobriu os meus olhos. Minha primeira reação foi o susto.
- Adivinha quem é. - Era a voz do sussurrando no meu ouvido. Eu me arrepiei da cabeça aos pés e um sorriso espontâneo surgiu no meu rosto. Mesmo se ele não tivesse dito nada, eu reconheceria o perfume.
- O único cara dessa casa com coragem suficiente para entrar no meu quarto, mesmo o meu irmão estando no quarto ao lado. - Eu disse, rindo sem emitir som.
- Você está tentando me fazer ir embora? - tirou as mãos dos meus olhos.
- Não! É claro que não! - Eu me virei para olhá-lo e me certifiquei de fechar o meu hobby na mesma hora. Estávamos bancando os amigos, mas era melhor não abusar, certo? - Mas você deve estar ciente disso. - Eu ergui os ombros. Devo dizer que ele estava vestindo algo bem casual: um jeans velho e uma camiseta regata preta larga. Mesmo assim, ele continuava muito bonito.
- Seu irmão só vai acordar daqui uns 10 dias. - brincou, me fazendo rir. - Sério! Você precisava ter visto. Ele caiu na cama dormindo. Ele parecia uma pedra. - Ele contou.
- Ele nunca ficou tão mal. - Eu disse, surpresa. Eu queria me sentar e como a cama poderia soar como um convite, eu resolvi me sentar na mureta que tinha em volta da enorme janela do quarto, que ficava um pouco mais baixa do que o normal. Ele aproveitou a minha ida até a janela para observar o que eu vestia. Mesmo sem deixar quase nada à mostra, gostou do que viu. Aliás, quando é que ele não gostava?
- Eu nunca vi ninguém ficar tão mal quanto ele! - concordou comigo, mantendo a discrição. - Quer dizer, vi sim, né. - Ele me olhou de um jeito malandro, referindo-se aos meus dias de bebedeira.
- É exatamente por isso que eu tento evitar as bebidas alcoólicas. - Eu cerrei os olhos em sua direção. - Obrigada por me lembrar. - Eu deixei um sorriso escapar.
- Pode até ter sido uma experiência horrível para você, mas me garantiu umas boas risadas. - riu, sem emitir som. - E você também riu de todos hoje, por isso, você não pode me julgar. - Ele disse.
- Eu não vou te julgar, mas só porque o seu argumento é muito bom. - Eu disse e ele gargalhou.
- Eu sabia que ele era bom. - disse, deixando a risada de lado.
Depois das boas risadas que nós demos, um silêncio repentino se estabeleceu no quarto. Para que ficasse menos constrangedor, virei a cabeça para olhar para o lado de fora da janela. O céu estava extremamente estrelado e a lua cheia ajudava a clarear o quarto. também deixou de me olhar e aproximou-se novamente do criado-mudo, pegando pela segunda vez o mesmo porta-retrato nas mãos. Quando eu voltei a olhá-lo, ele ainda encarava a foto com um fraco sorriso no rosto.
- Qual o motivo da obsessão com essa foto? - Eu realmente fiquei intrigada. Não podia ser só curiosidade. Ele deixou de olhar para foto por poucos segundos para me olhar e logo depois voltou a olhá-la. Deu alguns passos na minha direção e parou na minha frente.
- O seu vestido. - finalmente disse.
- Meu vestido? Qual o problema com o meu vestido? - Eu o olhei com desconfiança e tirei o porta-retrato de suas mãos. Encarei a foto, procurando algum problema com o meu vestido e não consegui encontrar nada.
- Você estava usando ele no dia do acidente. - Ele explicou, sentando-se ao meu lado na janela. - Você estava usando ele no dia em que eu te conheci. - completou.
- Você… está falando… sério? - Eu olhei pra ele, achando que ele pudesse estar brincando.
- Eu juro que estou. - confirmou com um fraco sorriso no rosto. Seus cotovelos estavam apoiados em suas coxas e o rosto estava virado para mim.
- Uau… Eu não me lembrava. - Eu voltei a olhar para foto, sem acreditar. - Como… - Eu estava tão perplexa, que não consegui falar de primeira. - Como… você lembra disso? - Olhei novamente pra ele.
- Como eu poderia não me lembrar. - disse um pouco mais sério.
- Não. Sério! Como você lembra? - Eu ainda não estava acreditando que ele realmente se lembrava.
- Bem… - não sabia bem como falar. O sorriso tímido deixou isso bem claro. - Foi um dia bem marcante e importante pra mim, sabe? Eu… - Ele ergueu os ombros. - Eu não sei. Eu só… lembro. - completou.
- Provavelmente é por causa do seu pai. Foi um dia muito traumatizante por causa do que aconteceu com ele. - Eu disse apenas para que ele soubesse que eu não estava pensando que o que ele sentia por mim tinha alguma coisa a ver com aquilo.
- O engraçado é que eu não consigo me lembrar qual das camisas do Yankees ele estava vestindo naquele dia, mas eu consigo me lembrar perfeitamente o que você estava vestindo. - As palavras dele me deixaram um pouco nervosa. De repente, haviam borboletas no meu estômago.
- Isso é… - Eu nem sabia como descrever.
- Eu sei! É loucura. - A breve troca de olhares que tivemos, fez com que ele se afastasse. Ele manteve-se sentado, mas inclinou o seu corpo para trás e apoiou suas costas na janela.
- Eu duvido que, quando aquele acidente aconteceu e você me viu pela primeira vez, você imaginou que um dia nós viveríamos tudo o que nós já vivemos juntos. - Eu disse, sem olhá-lo.
- Eu acho que nem mesmo Shakespeare imaginaria algo assim. - sorriu, achando graça do meu comentário.
- Você tem razão. Talvez, Shakespeare fosse preferir um final mais trágico para nós dois. - Virei o meu rosto para trás para poder olhá-lo.
- E por que não um final feliz? - voltou a inclinar o seu corpo para frente, deixando-o na mesma direção que o meu. A simples aproximação dele fez com que eu me afastasse um pouco, me sentasse de frente para ele e a apoiasse as minhas costas na parede.
- Porque somos nós! As coisas sempre dão errado pra nós dois, lembra? - Eu disse com bom humor.
- Você provavelmente está certa, considerando que nos conhecemos em meio a um acidente em que o meu pai forjou a sua própria morte. - concordou, antes de mudar a posição de seu corpo e ficar de frente pra mim, apoiando suas costas na parede.
- E depois teve a perda de memória. - Eu fiz careta.
- Você está se referindo a primeira ou a segunda vez? - fingiu estar confuso e acabou deixando um sorriso escapar.
- Da primeira. - Eu afirmei com um olhos cerrados e um sorriso no rosto.
- E ai, você resolveu namorar o cara mais babaca do colégio, que coincidentemente era o meu maior inimigo. - Ele me julgou com os olhos.
- E você com a líder de torcida mais popular do colégio! Dava pra ser mais clichê? - Eu devolvi, me sentindo vitoriosa.
- É claro que dava! Eu me apaixonar justamente pela única garota que não queria ficar comigo naquela escola. - riu, sem emitir som.
- Convencido. - Eu neguei com a cabeça.
- Realista. - Ele abriu os braços.
- Ok! E ai, nós fomos para Nova York. - Eu quis retomar a brincadeira e a linha do tempo dos problemas que tivemos. - Eu fiquei doente. - Eu lamentei.
- Não. Isso foi bom! Nós demos o nosso primeiro beijo. - me corrigiu.
- É… eu acho que dá pra se dizer isso. - Eu disse, demonstrando estar em dúvida.- Oh! E eu descobri sobre a sua listinha. - Eu fiquei feliz por ter lembrado daquela.
- Está bem! Eu assumo a culpa por está pequena parte da história. - cedeu, me fazendo rir.
- Não é a pior parte, mas faz parte do meu top 3. - Eu disse.
- Você tem um top 3 dos meus erros? - me olhou com uma careta engraçada.
- Você não tem? - Eu devolvi a pergunta, segurando o riso.
- Nós temos que discutir isso, mas antes eu preciso lembrar que quando essa besteira da lista aconteceu, você foi pra festa com o Mark, que diga-se de passagem: é o meu irmão. - retomou o assunto anterior.
- Nem vem! Ninguém sabia que o Mark era o seu irmão naquela época. - Eu me defendi.
- Isso não muda os erros. - disse, tentando manter-se sério.
- Aham. - Eu fuzilei ele com os olhos.
- E o que vem depois? - perguntou, pensando alto.
- O meu segundo acidente. - Eu lembrei.
- E a sua segunda perda de memória. - complementou. - Você se lembrava de todo mundo, exceto de mim e o Peter. - Ele lembrou.
- Não foi culpa minha. - Eu ergui os ombros.
- É, mas você se deixou ser enganada pelo Peter pela segunda vez. - fez a ressalva.
- E depois eu me apaixonei por você pela segunda vez. Não conta? - Eu tentei reverter a situação.
- É um bom argumento. - mostrou-se satisfeito.
- Oh, e você deu em cima da Chelsea! - Eu novamente fiquei feliz por lembrar.
- E você beijou o Peter. - retrucou na mesma hora.
- Ok! Vamos pular essa parte, né? - Eu mordi o meu lábio inferior em meio a um sorriso desajeitado.
- E o que vem depois disso? - Ele me perguntou.
- Nós fomos presos. - Eu lembrei.
- Qual é! Isso foi divertido. - gargalhou ao se lembrar.
- Foi, mas poderia ter sido evitado, né? - Eu argumentei. - E depois disso? - Eu perguntei, em dúvida.
- Acabou, né? Acho melhor pararmos por aqui. Eu estou com sono mesmo. - demonstrou que pretendia se levantar, mas eu segurei o seu braço quando me lembrei do que vinha a seguir.
- Agora, vem a Amber! - Eu o fiz continuar sentado. - Me desculpa. - Eu coloquei uma das mãos na minha boca e fiz careta. - Subiu uma ânsia de vômito. - Eu brinquei e ele me olhou, negando com a cabeça.
- Ela era a minha amiga! - se defendeu, achando graça da minha reação ao falar o nome da infeliz.
- Ela era apaixonada por você! Como você não conseguia enxergar isso? - O assunto ainda me deixava um pouco indignada.
- Eu fui cego, ok? Eu assumo. - teve que reconhecer.
- Ah! Obrigada! - Eu fiquei feliz ao ouvir ele reconhecer.
- Mas depois teve a sua ida pra Nova York. - tentou mudar o assunto.
- Sim! O que nos remete novamente a Amber. - Eu voltei a julgá-lo com o olhar.
- Eu fiz besteira, ok? Pare de me julgar. - pediu, me fuzilando com os olhos. - Não foi você que começou a namorar o meu irmão logo depois? - Ele sorriu.
- De novo: ninguém sabia que ele era o seu irmão. - Eu me defendi novamente.
- Eu já disse que não gosto desse seu argumento. - tentou manter-se sério, mas acabou rindo.
- Vamos de uma vez para a real tragédia dessa história: Steven. - Eu lamentei por tocar no nome dele.
- Steven… - rolou os olhos. - De todos os problemas que nós tivemos, esse foi o mais difícil de aceitar. - Ele disse, chateado.
- É… ele virou a nossa vida de cabeça pra baixo. - Eu falei um pouco mais séria.
- Ele foi o pior. - concordou, balançando a cabeça para cima e para baixo. - E é exatamente por isso que essa linha do tempo que nós acabamos de fazer termina com ele. - Mesmo estando chateado, ele tentava parecer conformado.
- Quer saber? Nós não precisamos falar sobre isso. Nós já relembramos tudo mesmo. - Eu tentei mudar o assunto.
- Sim. Vamos falar do top 3 dos meus erros. Eu fiquei curioso. - olhou em meus olhos.
- Tem certeza? - Eu achei que poderia não ser muito agradável para ele.
- Eu tenho que ter o direito de me defender. - justificou a sua curiosidade.
- Certo. - Eu olhei no rosto dele e trocamos sorrisos sem nem perceber. - No meu top 3, a Amber definitivamente está no primeiro lugar. - Eu fui sincera.
- Sério? - desacreditou.
- Eu odeio ela. Muito! - Eu me justifiquei.
- Não me surpreende nem um pouco. Você sempre se sentiu muito ameaçada por ela. - rolou os olhos.
- Como é que é? - Eu arqueei uma das sobrancelhas.
- O que foi? Você sabe que é verdade. - achou graça da minha reação.
- ‘Você sabe que é verdade.’ - Eu engrossei a voz e repeti a frase dele, enquanto fazia careta.
- Para com isso! - começou a rir.
- É impressionante o fato de você continuar defendendo ela mesmo depois de tudo. - Eu não estava levando tudo tão a sério quanto parecia.
- Ok, ok! Eu acho que você entendeu errado. O que eu quis dizer é que você sempre se sentiu ameaçada por ela sem necessidade alguma. - tentou se explicar.
- Isso soou bem melhor. - Eu ergui os ombros, reconhecendo. - Mas não justifica o seu erro! - Eu ressaltei.
- Eu sei. Não tem como eu me defender desse. - também reconheceu.
- Bom mesmo. - Eu tentei dizer mais séria, mas ele voltou a rir.
- E qual é o segundo lugar do seu top 3? - Ele perguntou.
- A lista! É claro. - Eu o julguei com o olhar.
- Eu era jovem e… imaturo. - explicou-se na mesma hora.
- E idiota. - Eu completei.
- E isso também. - reconheceu. - Faz muito tempo. Você não pode me condenar por isso. - Ele abriu os braços.
- Eu sei, mas… eu também não posso tirar isso do meu top 3. - Eu argumentei.
- Justo. - Ele ergueu os ombros. - Faltou o número 3. - esperou que eu falasse.
- O seu apartamento. - Eu cruzei os braços.
- O que tem o meu apartamento? - não entender.
- Você deixou que ‘ela’ te ajudasse a decorar o seu apartamento. Esse… foi um erro cruel. - Eu neguei com a cabeça.
- A Amber de novo? Espera! Mas isso não estava incluso no primeiro lugar do seu top 3? - ficou confuso.
- Não! São fatos diferentes. Coincidentemente, diz respeito a mesma pessoa, mas são erros diferentes. - Eu tentei explicar pra ele.
- Esse foi totalmente involuntário. - se defendeu.
- Mas continua sendo um erro. - Eu ergui os ombros, tentando mostrar que eu não podia fazer nada a respeito.
- Está bem. Eu tenho que reconhecer que o seu top 3 me surpreendeu. - mostrou-se impressionado.
- É, mas… eu estou me sentindo um pouco mal por ter ficado aqui enumerando os seus erros. - Eu disse, deixando de olhá-lo. Quem gosta de ficar ouvindo alguém falar e julgar os seus erros?
- Tudo bem. Eu tenho ciência de todos os meus erros. Além disso, nós conseguimos superar todos eles, certo? - tentou fazer com que eu me sentisse melhor.
- Certo. - Eu concordei, enquanto pensava que, mesmo superando tudo aquilo, não tinha sido o bastante para nos manter juntos. Acho que nós dois pensamos a mesma coisa. - Por que você também não faz um top 3? Nós ficaríamos quites. - Eu sugeri, tentando melhorar o clima.
- Agora? Eu nunca pensei nisso. - ficou um pouco indeciso.
- É claro que já pensou. Todo mundo pensa nessas coisas, mesmo que inconscientemente. - Eu tentei incentivá-lo. - Qual é! São só 3. - Eu insisti.
- Ok. Eu vou fazer isso! E vou fazer porque eu sou competitivo demais para deixar que o seu top 3 seja melhor que o meu. - disse, me fazendo rir.
- É um bom começo. - Eu ainda estava rindo.
- O primeiro lugar do meu top 3 dos seus erros é… - pensou algum tempo antes de continuar. - Sem dúvida, aquela sua carta de término. Você inventou que estava com outro cara! - Ele afirmou, indignado.
- Eu não sei se você lembra, mas eu fiz isso por você. - Eu tentei argumentar.
- Fez por mim? Você me convenceu de que tinha me traído com outro cara. - ainda achava aquilo um absurdo.
- Está bem! Talvez, tenha sido um erro. - Eu reconheci, sem muita empolgação.
- É o topo do meu top 3. É um erro gigantesco! - corrigiu.
- Podemos trocar de brincadeira? Eu não gosto mais dessa. - Eu brinquei, sabendo que ele ia me julgar.
- Oh, não! Eu estou me divertindo bastante. - riu, sabendo que eu estava brincando.
- Pra quem não queria brincar, você está muito animadinho. - Sem pensar, inclinei um pouco o meu corpo em sua direção e fiz careta, mantendo o meu rosto em frente ao dele.
- Posso continuar o meu top 3? - olhou detalhadamente o meu rosto.
- Vai em frente. - Eu sorri discretamente.
- O meu segundo lugar é… - Ele pensou menos dessa vez. - Você não ter evitado a doação de sangue do Mark. - lamentou por dizer aquilo. - Me desculpa. Eu sei que a sua intenção foi boa, mas… foi um erro que me marcou bastante e que envolvia muita coisa. - Ele tentou ser sincero. De repente, a brincadeira ficou um pouco mais séria.
- Eu entendo completamente o seu lado e o seu ponto de vista. - Eu fui totalmente compreensiva. - Eu acho que esse foi o meu erro involuntário, sabe? Acabou acontecendo. - Eu tentei explicar. O assunto era um pouco delicado para nós. Provavelmente porque era bem recente.
- Eu sei disso! É exatamente por isso que esse é o segundo lugar do meu top 3 e não o primeiro. - A frase dele conseguiu me arrancar um sorriso.
- Você é muito generoso. - Eu ironizei, voltando a olhar para ele.
- Eu sei que sou. - sorriu, olhando nos meus olhos. Um estranho silêncio se manteve, enquanto trocávamos olhares. A coisa ficou mais séria quando os olhos dele desceram sutilmente até os meus lábios. Meu instinto involuntário foi me levantar da janela. Aquilo me assustou um pouco. - Você não quer ouvir o meu terceiro lugar? - ficou um pouco sem graça com a minha atitude repentina, mas tentou seguir em frente.
- Qual é? - Eu não quis demonstrar tanto pânico com o que tinha acontecido. Me virei para ele e vi a sua cabeça baixa. Achei que alguma coisa estava errada. - Qual é o terceiro lugar? - Eu repeti a pergunta, fazendo com que ele levantasse o seu rosto e me olhasse.
- Seu terceiro maior erro foi… - hesitou poucos segundos antes de continuar. - Eu acho que… foi ter vindo passar o feriado aqui. - Confesso que fui pega de surpresa.
- Por quê? - Eu olhei pra ele mais séria e cheguei a dar alguns passos na direção dele. - Por que eu não deveria ter vindo? - Aquilo me incomodou um pouco, pois parecia que ele estava me acusando ou tentando insinuar alguma coisa.
- Eu estava indo bem, sabe? Sem te ver nessas últimas semanas… e te evitando de todas as maneiras possíveis. E… de repente, você aparece aqui e… estamos aqui conversando e eu já nem me lembro mais dos meus motivos pra ter me afastado de você. - disse, mantendo-se sentado.
- Foi pela sua família. - Eu fiz questão de lembrá-lo. - Você se afastou... pela sua família. - Eu completei, sensibilizada com o que eu estava ouvindo.
- E por que, olhando pra você agora, isso não faz o menor sentido pra mim? - Ele parecia um pouco confuso.
- Faz sentido, . Você só… não quer aceitar isso. - Apesar de tudo o que eu estava sentindo naquele momento, eu não queria que ele voltasse atrás em uma decisão tão importante pra ele. Depois de ouvir a minha frase, ele se manteve algum tempo em silêncio e parecia pensar bastante. Vê-lo naquela total confusão, fez com que eu me sentisse mal por ter estar ali e por aquela conversa que acabamos de ter. Eu voltei a me aproximar dele e me sentei novamente ao lado dele, pensando em algum jeito de reverter tudo aquilo. - Olha, eu sinto muito por ter vindo e por ter deixado as coisas mais difíceis pra você. Eu espero que você entenda que a minha intenção nunca foi te deixar confuso ou… bagunçar com os seus sentimentos ou com as suas decisões. - Eu estava olhando para ele, mas o olhar não era correspondido.
- Pare de se desculpar. Você mal sabia que eu estaria aqui. Você não tem culpa de nada. Nós não temos culpa de nada. - negou com a cabeça. - Eu olho pra nós dois agora, relembrando todos os problemas que tivemos que superar e... eu só consigo pensar em uma coisa. - repentinamente virou o seu corpo em minha direção e passou a me olhar nos olhos. - Por que nós? Por que nós tivemos que passar por tudo isso? Por que nada disso aconteceu com o seu irmão e a ou… com a e o ? - Ele parecia um pouco frustrado.
- Por que se acontecesse, talvez, eles não fossem capazes de superar como nós fizemos. - Eu dei o meu palpite.
- O que você quer dizer? Que eles não se apaixonaram como nós? Que o nosso amor era maior que o deles? É isso? - hesitou antes de o usar os verbos da frase no passado.
- Eu acho que… não existe amor maior ou menor. O que existe são maneiras diferentes de se viver o amor. A nossa maneira era diferente. - Eu fui completamente sincera. A minha resposta à pergunta dele fez com que o jeito que ele me olhava mudasse. Um breve silêncio deixou tudo ainda mais intenso.
- Se a nossa maneira é assim tão diferente e… errada, por que é que toda que eu olho pra você, mesmo depois de um término como o que tivemos, eu sinto que ainda existe algo inacabado entre nós? - Quando ele percebeu que me pegou desprevenida, seu olhar desceu novamente até os meus lábios por poucos segundos.
- Talvez, você só esteja confundindo o inacabado com a sua dificuldade de aceitar que realmente acabou. - Em um momento de fraqueza, meus olhos também desceram até os lábios dele. Era tão errado, mas o fato dos nossos rostos estarem tão próximos me fez perder um pouco o senso da realidade.
- Se realmente acabou, por que o meu coração continua reagindo a você? - pegou uma das minhas mãos e a levou até o seu peito para que eu pudesse sentir o seu coração, fazendo com que nossos rostos ficassem ainda mais próximos. O coração dele batia tão forte quanto o meu. - Por que a única coisa boa que aconteceu comigo nesse último mês foi ter sonhado com você todas as noites? - Ele aproximou um pouco mais o seu rosto do meu. Ele só deixava de olhar nos meus olhos, quando desviava o olhar até os meus lábios. - Por que é que só em pensar em beijar você, eu esqueço que algum dia existiu algum motivo que me levasse a não fazer isso. - Mais uma aproximação por parte dele e eu já nem conseguia pensar em mais nada que não fosse ele. Eu já conseguia sentir a respiração quente dele nos meus lábios.
- Essas perguntas… - Eu estava tão atordoada por tentar tanto evitar aquilo e não conseguir, que fechei os meus olhos para tentar terminar a frase. Neguei sutilmente com a cabeça e sorri fraco. - Essas perguntas são suas, mas elas também poderiam ser minhas. - Ao me ver fechar os olhos, aproximou ainda mais o seu rosto do meu, fazendo com que a ponta dos nossos narizes se tocassem. Ele também fechou os seus olhos, tentando evitar uma nova aproximação.
- Você sabe a resposta, não sabe? - Os lábios dele acabaram tocando sutilmente os meus, enquanto ele sussurrava.
Meu coração estava tão apertado, que até parecia que ele estava implorando para que eu tomasse uma atitude naquele exato momento. Todo o meu corpo estava reagindo a proximidade dele. Eu não conseguia pensar em nada além da boca dele tão próxima a minha. Tentei me controlar nos primeiros segundos, mas não teve jeito. Eu tive que beijá-lo. O beijo foi tão esperado por nós dois, que até parecia o nosso primeiro beijo. Nossos lábios se tocaram e se mantiveram colados, sem que fizéssemos qualquer movimento. O momento foi tão mágico, que não houve qualquer tipo de malícia ou afobação.
- Eu… - começou a sussurrar, interrompendo repentinamente o beijo. A ponta dos nossos narizes ainda se tocavam. - Eu queria tanto que vivêssemos isso. - A frase dele fez com que eu abrisse os meus olhos. Ele já tinha aberto os dele. - Eu queria tanto. - reafirmou, angustiado. - Mas… eu… - Ele olhou em meus olhos. - Eu... não posso. - Ele se afastou e se levantou repentinamente. No primeiro momento, eu não soube como reagir ou até mesmo como me sentir. Eu não sabia se eu estava brava, arrependida ou triste. Eu achava que tinha cometido um erro. Eu não deveria ter beijado ele.
- Eu não… - Eu não sabia se eu me desculpava ou se eu mandava ele sair do meu quarto. Me levantei e fiquei olhando para ele, que continuava de costas para mim.
estava parado em frente a porta do quarto. Ele a encarava, tentando decidir se sairia por ela ou se a trancava e ficava de vez. A decisão era difícil e ele ficou algum tempo tentando encontrar respostas dentro de si mesmo para tomar uma atitude. O coração dizia uma coisa e o cabeça dizia o oposto. A razão e a emoção estavam iniciando a ‘3° Guerra Mundial’ dentro dele e aquilo só o deixou mais angustiado.
- Me desculpa, . - Eu finalmente consegui dizer alguma coisa. - Eu não queria… - Eu estava extremamente nervosa. - Eu não devia… ter feito isso. - Eu estava me sentindo péssima. Ele me provocou e se aproximou, mas eu tinha que ter sido mais racional. Eu tinha que ter impedido aquele beijo. não disse absolutamente nada. Ele apenas tocou a maçaneta da porta e eu estava certa de que ele ia sair do quarto e ia me deixar falando sozinha. - Vamos fingir que nada disso aconteceu. - Eu sugeri, dando alguns passos na direção dele. - Eu vou juntar as minhas coisas e vou voltar pra Nova York amanhã bem cedo e… nós podemos fingir que nada disso aconteceu. - Eu estava desesperadamente procurando uma maneira de me sentir melhor. O silêncio dele só me deixava cada vez mais angustiada. - Fala comigo, . - Eu pedi. Ele manteve-se em silêncio, mas percebi que ele havia feito algum movimento com as mãos. Eu imaginei que ele fosse sair do quarto e tentei dizer mais alguma coisa. - Por favor, diz alguma coisa. - Eu pedi outra vez e continuei sem qualquer resposta.
Eu olhei para ele pela última vez, conformada com a maneira que aquela noite terminaria. Abaixei a minha cabeça e encarei minhas mãos inquietas por poucos segundos. Eu ficaria ali, encarando elas o resto da noite, se o meu rosto não tivesse sido repentinamente puxado para cima pelas mãos do segundos antes de ele colar os nossos lábios. O beijo não chegou a ser aprofundado, pois o o interrompeu antes. As mãos dele continuavam em meu rosto e eu tive um pouco de dificuldade para abrir os meus olhos.
- Eu não quero esquecer. - afirmou, olhando em meus olhos. - Eu não quero pensar em mais nada que não seja você. - Ele negou com a cabeça. - Eu só quero ficar com você. - Seus olhos desceram até os meus lábios. - Eu quero ficar com você sem pensar no que isso vai me custar. - disse antes de me beijar mais uma vez.
Dessa vez, o beijo foi imediatamente aprofundado. As mãos dele continuavam no meu rosto e os dedos dele estavam entrelaçados nos fios do meu cabelo. O beijo foi longo e calmo, mas teve uma intensidade fora do normal. Estávamos aproveitando todo o tempo perdido naquele último mês. Quando parecia que ele estava prestes a terminar o beijo, suas mãos desceram pelo meu cabelo, deslizaram pelas minhas costas e alcançaram a minha cintura. puxou o meu lábio inferior, mas acabou não desgrudando os nossos lábios. Ele começou a dar lentos passos, empurrando o meu corpo para trás. Meus olhos estavam fechados, mas eu sabia que ele estava indo em direção a cama.
- Você está falando sério? Acha mesmo uma boa ideia? - Eu descolei os nossos lábios e abri os olhos para encará-lo.
- Você não precisa fazer nada que você não queira. - tirou suas mãos da minha cintura e as colocou no ar, demonstrando que eu poderia desistir a qualquer momento. Olhei para ele, como se dissesse: ‘Muito engraçado!’. Ele respondeu com um sorriso. Seu corpo continuou empurrando o meu e no momento em que eu percebi que a cama estava logo atrás de mim e que as mãos dele continuavam afastadas do meu corpo, eu segurei a camisa dele e o puxei junto comigo. Eu cai na cama e trouxe o corpo dele por cima do meu. Para ele, foi o bastante para que ele entendesse que eu havia aceitado a sua proposta. Com a proximidade dos nossos rostos, foi inevitável que não nos beijássemos novamente. Os cotovelos dele estavam apoiados no colchão para evitar que todo o peso do corpo dele recaísse sobre o meu.
- Espera. - Eu finalizei abruptamente o beijo. Ele me olhou, sem entender. - Você esqueceu que o está no quarto ao lado? - Eu arqueei uma das sobrancelhas. Eu queria ter certeza de que ele sabia o que estava fazendo.
- Não esqueci. - negou com a cabeça, mantendo seus olhos em meus lábios. - Eu me resolvo com ele depois. - disse antes de se aproximar e selar os meus lábios. Ele puxou o meu lábio inferior, começando um novo beijo. Mesmo estando extremamente surpresa com a resposta dele, eu correspondi ao beijo. Joguei o meu corpo contra o dele propositalmente, trazendo o meu corpo para cima do dele. Continuei a beijá-lo, mas a última frase dele continuava na minha cabeça e estava me deixando eufórica. Eu tive que interromper o beijo mais uma vez.
- Você realmente disso isso? - Eu perguntei, sem conseguir esconder a minha felicidade.
- O que eu disse? - não sabia sobre o que eu estava me referindo.
- Você disse que vai se resolver com o meu irmão depois. - Eu repeti a sua frase.
- E eu vou. - confirmou, me arrancando um sorriso espontâneo.
- Você faria isso? - Eu estava muito surpresa. Obviamente, nós estávamos falando sobre sexo. Eu não conseguia acreditar que nós finalmente iriamos parar de mentir e parar de fingir que nada tinha acontecido.
- Por você? - perguntou retoricamente. - Me diz o que eu não faço por você, . - Ele sorriu de maneira doce, antes de colocar uma mecha do meu cabelo atrás da minha orelha.
- Você está diferente. - Eu comentei, sem conseguir evitar o tom de admiração. Eu me referia a maturidade dele.
- Isso é bom? - perguntou, curioso.
- É muito bom. - Eu tentei não soar como uma idiota apaixonada, mas eu definitivamente falhei. Eu não consegui evitar uma reaproximação e o beijei.
O nosso beijo era algo surreal. Dizer que nossos lábios faziam o encaixe perfeito parecia pouco para explicar. Era mágico. Os dedos dele se enroscaram no meu cabelo, afastando os fios de cabelo do meu rosto. Quando o beijo se intensificou um pouco, desceu suas mãos até a minha cintura e com um pouco de dificuldade desfez o laço do meu hobby. Com o laço desamarrado, ele subiu suas mãos até os meus ombros e foi tirando lentamente o hobby. Jogou o hobby em qualquer lugar e voltou a total atenção de suas mãos para mim.
Na primeira oportunidade, jogou o seu corpo sobre o meu, colocando-se novamente em cima de mim. Minha mão esquerda deslizou automaticamente até a sua nuca. Os lábios dele deslizaram até o meu queixo e chegaram até o meu pescoço. Os beijos carinhosos e ao mesmo tempo tão calorosos me deixaram um pouco mais ofegante. Desci minhas mãos pelas costas dele, segurei a barra de sua camiseta e a puxei para cima. interrompeu os beijos para me ajudar a retirar sua camiseta e logo que nos desvincilhamos dela, ele voltou com os beijos, enquanto uma de suas mãos subia pela minha coxa, levantando parcialmente a minha camisola. A empolgação exagerada com os beijos em meu pescoço me fizeram puxar o rosto dele para cima para que eu voltasse a beijá-lo. acompanhou o meu ritmo sem fazer qualquer questionamento, mas as mãos dele ainda estavam trabalhando bastante. Percebendo que tudo estava indo rápido demais, uma importante dúvida me veio em mente e eu tive que interromper o beijo para saná-la.
- Você está com o preservativo ai, certo? - Eu perguntei, olhando pra ele. Na hora eu percebi que havia algum problema. O olhar de desejo dele mudou repentinamente. Ele fechou os olhos e negou com a cabeça, como se estivesse insultando a si mesmo mentalmente. - Você não tem preservativo? - Eu refiz a pergunta, surpresa. - Está no seu quarto? - Eu não imaginei que o problema fosse tão grande.
- Não. - respondeu em tom de lamentação.
- Ok. - Eu coloquei minha mão sobre o peito dele e o tirei de cima de mim. - Como assim você não tem? Você sempre tem. - Eu estava perplexa.
- Foi aquela promessa idiota. - resmungou, irritado.
- Promessa? - Eu não achei que tivesse escutado direito. Não podia ser. - Você prometeu que não faria sexo? - Eu não conseguia acreditar. - Pra quem você fez essa promessa? Pro meu irmão? - Eu deduzi na mesma hora.
- Pro meu irmão. - respondeu, rolando os olhos.
- Ok! Isso está ficando cada vez melhor. - Eu ri, pois não conseguia acreditar no que ele estava dizendo. - Você prometeu ao Mark que não faria sexo… comigo? - Eu tinha que ter entendido errado.
- Mais ou menos. - respondeu em meio a uma careta. - Ele tinha certeza que você vinha pra cá nesse feriado e me fez deixar os preservativos lá. - Ele completou.
- Essa é a coisa mais idiota que eu já ouvi. - Eu estava irritada com o fato de ele ter deixado as coisas irem tão longe, sabendo que não tinha preservativos.
- Eu sei. – teve que concordar.
- Ok! Deixe eu ver se eu entendi: você não tem preservativos e você está na minha cama. Por quê? - Ele sabia muito bem que sem preservativos o sexo era inadmissível.
- Eu esqueci completamente. Eu… - também estava incomodado com a situação. - Espera. Eu vou resolver isso. - Ele disse, levantando-se da cama.
- O que você vai fazer? - Eu perguntei.
- Tem outros 3 casais nessa casa. Não é possível que não tenha um preservativo nessa casa. - disse, colocando a camiseta novamente.
- Você está maluco? - Eu até me sentei na cama de tão perplexa que eu havia ficado com a ideia.
- Você já se viu com essa camisola? Você é que deve estar maluca. - disse, sério. Eu deixei um sorriso escapar. - Não se mova! Eu já volto. - Ele saiu do quarto com toda a pressa do mundo.
Apesar da determinação, estava um pouco receoso com o que iria fazer. Se não fosse tão necessário, ele não se arriscaria tanto. Já do lado de fora da porta do meu quarto, ele olhou para os lados, sem saber qual quarto invadir primeiro. Ele tinha três opções e duas delas eram mais fáceis, pois e estavam muito bêbados e deveriam estar dormindo feito uma pedra. era um grande risco, pois era o que menos tinha bebido naquela noite e o único que provavelmente estava consciente.
Ciente das suas duas opções, resolveu investir no primeiro. Invadir o quarto do em busca de preservativo seria ousadia demais. Andou silenciosamente pelo corredor e parou em frente a porta do quarto do e da . Com todo o cuidado, abriu a porta e assim que adentrou o quarto, foi surpreendido com as vozes do casal de amigos. Ele pararam de conversar assim que o o viram.
- ? Hey! Que bom te ver por aqui. - sorriu.
- Podemos te ajudar? - sorriu da mesma maneira. Eles continuavam bêbados.
- Eu duvido. - disse em baixo tom.
- O que? - não havia entendido o que ele tinha dito.
- O que vocês estão fazendo, afinal? Por que não estão dormindo? - não entendeu o que é que eles estavam fazendo, já que ambos estavam deitados na cama, mas estavam com roupa.
- Estamos discutindo sobre o sexo entre os animais. - explicou, séria.
- Fala pra ela que as tartarugas fazem sexo sem o casco, por favor! Ela não acredita! - também falou sério. Por um minuto, achou que eles estivessem brincando, mas era real. Eles não estavam só bêbados. Eles pareciam dopados.
- Vocês só podem estar de brincadeira. - os olhou, perplexo.
- Escuta, estamos tendo uma discussão realmente importante aqui. Você pode… - fez sinal com a mão. Ela estava expulsando o do quarto.
- É claro. - afirmou, olhando para os dois como se fossem dois malucos.
- Então, a casca faz parte do charme. - voltou a sua atenção para o e eles voltaram a discutir sobre o assunto, enquanto dirigia-se a porta do quarto.
- Que charme? Desde quando a casca de uma tartaruga é charme? - revidou. O motivo da discussão deles só fez com que ele tivesse certeza que eles estavam completamente bêbados. abriu a porta e saiu, segurando-se para não rir.
O plano do havia ficado um pouco mais complicado do que ele imaginava. estava fora de cogitação e o poderia acordar a qualquer momento, já que ele não estava tão bêbado. Restava o . Encarou o quarto em que o amigo dormia com a perguntando a si mesmo se ele era tão louco para seguir em frente com aquilo. Naquele momento, a necessidade foi mais importante do que o medo de ser pego. abriu lentamente a porta do quarto e procurou saber se o e a estavam mesmo dormindo. Conseguiu ouvir os roncos do amigo da porta, o que o deixou mais tranquilo.
entrou no quarto sem fazer qualquer barulho e já foi logo procurando a carteira do . Ele sabia bem que o amigo costumava guardar os preservativos lá. avistou a carteira em cima do criado-mudo, que ficava exatamente ao lado do . Ele pensou três vezes antes de arrumar coragem para se aproximar da cama. Quando chegou ao criado-mudo, olhou para o amigo e viu que ele dormia tranquilamente. Esticou o braço e pegou lentamente a carteira nas mãos. não percebeu que havia pego a carteira ao contrário. Com isso, duas ou 3 moedas caíram no chão, fazendo um barulho estrondoso. Ele apenas fechou os olhos e segurou a respiração, rezando para que o amigo não acordasse. Segundos após o barulho das moedas, o quarto voltou a ficar silêncio e ele resolveu voltar a abrir os olhos. e continuavam dormindo. Suspirou aliviado e abriu rapidamente a carteira. Os olhos dele chegaram a brilhar quando ele encontrou o preservativo. O pegou e devolveu rapidamente a carteira no criado-mudo. Afastou-se lentamente da cama, abriu a porta e saiu do quarto. Ao chegar do lado de fora, ele finalmente conseguiu respirar fundo.
O tempo que o usou para pegar o preservativo, eu usei para pensar. Eu pensei no que ele havia me dito naquele hospital e pensei na promessa que ele havia feito ao Mark. Como eu posso ficar com ele, sabendo daquela promessa? Para ele é bem fácil quebrar promessas, mas para mim as promessas eram muito importantes. Eu já havia sofrido com a quebra de uma promessa e sabia muito bem o quão doloroso isso era. Eu não desejava isso para ninguém. Com isso, me levantei da cama e vesti novamente o meu hobby. Voltei a deitar na cama e coloquei um lençol em cima do meu corpo, já que eu estava decidida a dormir. Não demorou quase nada para que a porta do meu quarto fosse aberta. Eu estava deitada de costas para porta, por isso, eu não pude ver quem era, mas eu sabia muito bem que era o . Pensei em fechar os olhos e fingir que estava dormindo, mas ele saberia que eu estava fingindo.
Quando o entrou no quarto e me viu deitada daquela maneira, ele deduziu o que estava acontecendo. Ele deveria saber que citar a promessa feita ao Mark seria um erro. Mesmo assim, ele se aproximou, deu a volta na cama e se deitou calmamente ao meu lado, virando o seu corpo de frente para o meu. Nos olhamos algum tempo em silêncio.
- Ainda não acredito que você fez isso. - Eu disse, sem deixar de olhá-lo.
- Nem eu. - sorriu fraco, olhando em meus olhos.
- Onde você conseguiu? - Eu me referia ao preservativo.
- Na carteira do seu irmão. - disse em meio a uma careta.
- Não brinca. - Eu fechei os olhos, negando com a cabeça. - Você é mesmo maluco. - Eu disse, deixando um sorriso escapar.
- Você sabe que eu sou. - concordou. Mais um silêncio e os olhares continuavam. Ele estava esperando que eu me manifestasse.
- Eu reconheço muito todo o seu esforço… - Eu comecei a dizer e ele me interrompeu.
- Mas… - deduziu.
- Nós não podemos fazer isso. Você sabe que é errado. - Eu afirmei, séria.
- É errado querer ficar com a garota pela qual eu sou apaixonado desde os… Eu não sei… 12 anos? - Ele perguntou, sem qualquer intenção de cobrar alguma coisa de mim.
- Não diga isso. - Eu pedi encarecidamente. Apesar de ter ciência de que ficar com ele aquela noite era errado, eu ainda era humana que tinha sentimentos e vontades. Era difícil ficar ouvindo ele dizer esse tipo de coisa.
- Nenhuma promessa pode estar acima dos meus sentimentos e das minhas vontades. - disse.
- Então, talvez fosse melhor você parar de fazê-las. - Eu sugeri.
- Talvez seja. - Ele reconheceu. - Mas todas as minhas promessas são sinceras. Quando eu as faço, eu faço pra valer. Eu não falo da boca pra fora. - tentou se explicar. - O problema é que a vida é curta demais para se abrir mão de coisas tão importantes por causa de uma simples promessa. - Ele completou.
- Mas… você e o Mark? Isso não é importante? - Eu questionei.
- É claro que é! Ele é o meu irmão e… eu devo a minha vida a ele. - afirmou, sério. - E é exatamente por isso que é muito mais fácil de quebrar essa promessa. - Ele completou, me fazendo olhá-lo, sem entender.
- Jura? E por quê? - Eu perguntei, achando um pouco engraçado. Que tipo de argumento era aquele?
- Ele é o meu irmão! Não importa quantas besteiras eu faça, ele vai continuar sendo o meu irmão. Não tem como quebrar esse vínculo. - respondeu com um sorriso. - É completamente diferente quando é com alguém que não é com a família. Por exemplo: se um dia o seu irmão descobrir o que já aconteceu entre nós, ele vai querer me matar e provavelmente não vai mais querer olhar na minha cara, mas você… ele vai perdoar. Você é irmã dele. Não tem como quebrar esse vínculo. - Ele complementou o seu argumento.
- Você pensa mesmo em tudo, não é? - Eu neguei com a cabeça, tentando evitar um sorriso.
- Eu sou um gênio! - gargalhou.
- Ok, mas e eu? Eu não costumo quebrar promessas. - Eu percebi o esforço dele para me convencer a continuar com aquilo. - Como eu posso te ajudar a quebrar a sua? - Eu perguntei.
- Você tem razão. - me pareceu conformado demais. - É por isso que… - Ele sorriu. - Eu te prometo aqui e agora que… eu vou ficar com você essa noite. - fez uma nova promessa.
- Ah, não! - Eu demonstrei indignação.
- Parece que eu acabei de fazer outra promessa, não é? - fingiu estar aflito. - Não acredito! - Ele fingiu, negando com a cabeça.
- Você não fez isso! - Eu sorri, incrédula.
- Bem, parece que você vai ter que me ajudar a quebrar uma promessa essa noite. - ergueu os ombros em meio a um sorriso malandro.
- Você não presta, Jonas. - Eu cerrei os olhos na direção dele.
- Eu vou te deixar escolher qual das promessas eu devo quebrar. - Ele voltou a ficar um pouco mais sério. - Mas antes, eu queria te aconselhar a usar o seu coração e… - hesitou por alguns segundos. - Eu quero te lembrar que… - Ele se aproximou antes que eu tivesse qualquer reação e selou carinhosamente os meus lábios. Quando nossos lábios se descolaram, ele manteve-se bem próximo. - Eu sou louco por você. - sussurrou, bem próximo ao meu rosto. Meu coração parou por alguns segundos. Fiquei tão alucinada com o beijo, a aproximação e o sussurro, que não deixei que ele se afastasse. Segurei o rosto dele com as minhas mãos e levei a minha boca até a dele, beijando-o mais uma vez. Assim que terminei o beijo, abri os olhos e dei de cara com o melhor sorriso dele.
- Me desculpa, mas… eu prefiro quebrar a promessa que você me fez. - Foi difícil para mim dizer aquilo e ver o sorriso desaparecer no rosto dele. Eu me sentia um pouco culpada, pois fui eu que comecei aquilo, não é? Fui eu que beijei ele primeiro.
- Eu entendo. - Apesar da expressão de decepção, ele foi compreensivo.
- Mas eu não me importo se você ficar. - Eu disse, antes que ele pensasse em se levantar da cama. - Eu sinto falta de acordar ao seu lado. - Eu completei com um fraco sorriso.
- Eu acho que posso fazer esse sacrifício por você. - não escondeu sua felicidade diante do meu pedido.
- Obrigada. - Eu levei a minha mão até a dele e a acariciei.
Conversamos mais um pouco e, antes de dormir, definimos algumas condições para que aquilo funcionasse: eu poderia tirar o hobby e dormir só com a camisola, mas eu teria que me cobrir com o lençol; e o podia tirar a regata para dormir, mas teria que manter a bermuda. Achamos melhor não conversarmos muito para não correr o risco de falarmos alguma besteira, que pudesse me fazer mudar de opinião, mas não abrimos mão dos olhares. Eu adorava olhar pra ele e senti-lo tão perto de mim. se sentia da mesma maneira, mas a sua parte favorita era me ver dormir. Sempre que conseguia, ele costumava me esperar dormir para ficar me olhando. Foi exatamente isso o que ele fez naquela noite. Eu acabei dormindo e ele ficou ali, me olhando com um sorriso bobo no rosto. fez isso até adormecer.
Na manhã seguinte, eu fui a primeira a acordar. Era impressionante como o fato de acordar e vê-lo ao meu lado me trazia uma enorme tranquilidade e uma felicidade fora do normal. Fiquei observando os traços do rosto dele, enquanto ele dormia. Ele realmente era maravilhoso. Só parei de olhá-lo porque eu precisei ir ao banheiro. Quando eu voltei para o quarto, ele infelizmente já tinha acordado.
- Hey. - Eu sorri, me reaproximando da cama e me deitando novamente ao lado dele. Ele me olhou, ainda meio sonolento.
- Hey. - disse com a voz rouca, me arrancando um sorriso involuntário. - Que horas são? - Ele perguntou. Eu me virei e peguei o meu celular.
- São quase 9 horas. - Eu disse, devolvendo o celular no criado-mudo.
- Já? - reclamou, passando as mãos pelo rosto. - Eu tenho que sair daqui antes que alguém acorde. - Ele se sentou na cama.
- Eles não devem acordar tão cedo. - Eu deduzi, considerando o estado deles na noite anterior.
- De qualquer forma, eu… - levantou-se da cama e pegou a sua camiseta, colocando-a em um de seus ombros. - Eu vou… - Ele apontou em direção a porta.
- Tudo bem. - Eu queria que ele ficasse mais, mas eu não insistiria. Ele saiu do quarto visivelmente atordoado. Ele ainda estava bastante sonolento. Ouvi a porta do banheiro sendo fechada e deduzi que fosse ele.
Decepcionada por estar sozinha novamente, pensei seriamente em voltar a dormir, mas o sono não quis colaborar. Virei de um lado pro outro e constatei que não conseguiria dormir novamente. Com isso, resolvi levantar da cama. Demorei algum tempo para decidir trocar de roupa. Tirei a camisola e vesti somente o sutiã, já que já estava vestindo calcinha. Fui até a minha mala e a revirei por algum tempo até decidir qual roupa vestir.
aproveitou que já estava no banheiro e fez a sua higiene matinal. A água jogada em seu rosto foi o que fez com que ele acordasse de vez. Saiu do banheiro e olhou para o corredor. Tudo parecia muito silencioso, ou seja, todos ainda estavam dormindo. Como eu disse, a ressaca faria todos eles dormirem um pouco mais. Com isso em mente, achou que poderia voltar ao meu quarto. Ele havia percebido o quanto eu queria que ele ficasse um pouco mais comigo.
Sem nem pensar duas vezes, ele entrou no meu quarto. Eu fui pega de surpresa. Eu até tinha escolhido a minha roupa e estava prestes a vesti-la, mas quando ele entrou eu ainda estava só de calcinha e sutiã. Quando o me viu daquele jeito, ele paralisou. Eu também não tive qualquer reação. Os olhos dele percorreram o meu corpo sem que ele dissesse absolutamente nada. A cara dele chegou a me fazer sorrir. Ele só deixou de me olhar para virar-se em direção a porta e trancá-la. Eu não sabia o que estava acontecendo. bem que tentou respirar fundo e pensar em qualquer outra coisa que não fosse o que ele tinha acabado de ver, mas foi inútil. O seu desejo falava mais alto do que qualquer outra coisa.
- Eu não sabia que você… - Eu tentei me justificar, mesmo sabendo que eu não precisava. Tudo aconteceu totalmente sem querer. - Eu achei que você não fosse voltar. - Eu completei, vendo ele vir na minha direção. Peguei a blusinha que eu tinha separado e estava prestes a vesti-la, quando um dos meus braços foi puxado repentinamente. Eu até tentei dizer alguma coisa, mas o beijo que ele me deu foi mais rápido.
Mesmo sendo pega totalmente desprevenida, eu não vou negar que a pegada foi surreal. O beijo foi extremamente intenso e as mãos dele apertando a minha cintura não me deixaram qualquer escolha. Foi tão inesperado e avassalador, que eu nem tive tempo de pensar em promessas. As mãos dele deslizaram pelo meu quadril e chegaram nas minhas coxas. Ele as segurou e me tirou do chão, levando elas até a sua cintura. aproveitou para me levar até a cama e me jogou em cima dela, trazendo o seu corpo por cima do meu.
- O que você está fazendo? - Eu perguntei, aproveitando a interrupção do beijo.
- Quebrando a minha promessa. - selou os meus lábios em meio a um sorriso safado. - Eu quebro quantas promessas for preciso. Eu não me importo. - Ele selou mais uma vez os meus lábios. Ficar com você é tudo o que eu mais quero. - afirmou, olhando em meus olhos. Fiquei tão hipnotizada, que não consegui reagir ou evitar o que eu também queria tanto. Ele redirecionou os seus beijos para o meu pescoço e uma das mãos percorreram lentamente todo o meu corpo. As mãos dele simplesmente me deixavam louca e, de repente, as coisas começaram a ficar lentas demais para mim. Resolvi tomar o controle da situação. Joguei o meu corpo contra o dele e me coloquei em cima dele. A primeira coisa que eu fiz foi desabotoar a bermuda dele. Depois, comecei a depositar beijos na barriga e depois no peitoral dele, chegando ao seu pescoço. já estava maluco e eu gostava disso. Ele segurou o meu rosto e o levou ao encontro do dele para que ele voltasse a me beijar. Nos beijávamos empolgadamente em meio a várias mãos bobas, quando a pior coisa que poderia ter acontecido, aconteceu!
- ! - Era o , esmurrando a porta. O beijo foi interrompido imediatamente e o literalmente me empurrou de cima dele e me jogou na cama.
- Ei! Está maluco? - Eu sussurrei, furiosa. Ele acha que eu sou o que?
- Puta que pariu! Eu sabia que ele ia descobrir. - colocou as mãos no rosto, em choque.
- Calma. - Eu pedi, tentando manter a paciência.
- ! Acorda! Eu preciso de um remédio. Ou… de muitos remédios. - gritou mais uma vez, tentando abrir a porta.
- Se veste de uma vez! - estava em pânico e começou a jogar minhas peças de roupas em cima de mim. Não era a primeira vez que ele reagia assim. Dois anos e nada mudou. - Saí logo daqui. - Ele estava desesperado. Peguei o primeiro travesseiro que encontrei pela frente e ataquei na cara dele.
- Esse quarto é meu, idiota! - Eu estava muito brava com a atitude imatura dele.
- Desnecessário. - pegou o travesseiro com raiva e o jogou sobre a cama.
- Desnecessário é esse seu chilique. - Eu respondi na mesma hora.
- O que eu vou fazer? - olhou por todo o quarto.
- Que tal agir como um homem? - Eu sugeri, cruzando os braços.
- Que? - me olhou, fazendo careta.
- O que aconteceu com: ‘Depois eu me resolvo com ele!’? - Eu repeti a frase dele, tentando engrossar a voz.
- Você quer que eu faça isso agora? - perguntou com um sorriso sarcástico.
- Quero! - Eu o desafiei. Eu já estava exausta de ficar me escondendo e mentindo pro meu irmão.
- Agora? - perguntou novamente, tentando me enrolar.
- Agora! - Eu afirmei, rolando os olhos.
- Mas ele está de ressaca! - argumentou.
- ! Qual é! - gritou outra vez.
- Você disse que faria! - Eu cobrei o que ele tinha me dito na noite passada.
- Eu disse que depois eu resolveria, mas eu não disse quando. - abriu os braços e sorriu, achando que a desculpa me convenceria.
- Você é mesmo um babaca! - Eu fiquei ainda mais furiosa. Depois de tudo, ele ainda tinha a coragem de me fazer de idiota. Deixei ele falando sozinho e fui até a minha mala.
- O que você está fazendo? - perguntou desesperadamente ao me ver indo em direção a porta.
- Eu vou dar o remédio pro meu irmão. - Eu me demonstrei indiferença.
- Espera… - tentou evitar, mas quando viu que eu estava prestes a abrir a porta, se escondeu atrás da cortina.
- . - Eu abri a porta, mas escondi o corpo, já que eu estava só de calcinha e sutiã.
- Ainda bem! - sorriu ao me ver. - Minha cabeça vai explodir. - Ele levou as mãos à cabeça.
- Eu imagino. - Eu fiz careta. - Esse remédio é ótimo. Um deve bastar. Vai ajudar bastante. - Eu entreguei a caixa de remédios nas mãos dele.
- Muito obrigado. - demonstrou estar realmente agradecido. - Está tudo bem? - Ele percebeu que eu estava um pouco escondida atrás da porta.
- Está! Eu estava trocando de roupa. - Eu me justifiquei.
- Ok. - não desconfiou em nenhum momento. - Vou até a cozinha tomar o remédio. Valeu mesmo. - Ele aproximou-se e beijou rapidamente o meu rosto.
- Melhoras. - Eu disse, preocupada. Eu sabia que era só uma ressaca, mas era instintivo, sabe?
- Valeu. - agradeceu novamente, enquanto se afastava. Eu voltei a fechar a porta e a tranquei.
- Você está maluca!? Ele podia ter me visto! - veio tirar satisfações.
- Que pena que não viu! Quem sabe assim você não resolvesse agir como homem sem precisar estar em cima de uma cama. - Eu mal olhei pra ele e já fui logo em direção a cama.
- Ainda isso? - perguntou, impaciente. Eu não respondi. - Por que isso é tão importante pra você, afinal? - Ele se aproximou.
- Eu não sei! Maturidade? Parar de mentir pro meu irmão? Contar para as minhas amigas sobre o fato de eu ter perdido a minha virgindade? Ver você finalmente me assumindo? Parar de ter roupas jogadas na minha cara? Fica à vontade pra escolher. - Eu disse, enquanto me vestia.
- Eu não sabia que você fazia tanta questão assim. - demonstrou um pouco de arrependimento. Ele se aproximou e eu me afastei, sentando na beirada da cama para colocar o meu tênis. - … - Ele disse em meio a um suspiro. Eu já sabia o que viria a seguir.
- Se você pedir desculpa, eu juro por Deus que eu vou jogar esse tênis na sua cara. - Eu ameacei, furiosa.
- O que você quer que eu diga? - abriu os braços, sem saber o que dizer.
- Eu quero que você dê o fora do meu quarto. Pode ser? - Eu disse, amarrando os cadarços do tênis.
- Sério? - me olhou com cara de tédio.
- Sério! - Eu afirmei, sem hesitar. - E vê se me faz um favor: mantenha distância do meu quarto, especialmente da minha cama. Se você não é homem para enfrentar o meu irmão, você também não é homem para estar na minha cama. - Eu encerrei o assunto de vez. ficou tão surpreso com a minha reação, que nem ao menos conseguiu responder. Colocou o seu orgulho no bolso e foi em direção a porta. - Ei! - Eu o chamei assim que avistei a camiseta dele no chão do quarto. Eu fui até ela e a peguei. - . - Eu o chamei outra vez. Ele parou de andar e virou-se para saber o que eu queria. Assim que ele virou, peguei a camiseta e a joguei em seu rosto. - É sua, né? - Eu sorri ironicamente. Era muito bom devolver na mesma moeda. - E vê se dá uma passada no banheiro pra conferir se a cueca continua limpa. O susto foi grande, né? - Continuei com a ironia. cerrou os olhos, enquanto negava com a cabeça. Ele achou melhor não dizer nada. Virou-se de costas e andou até a porta, enquanto vestia a sua camiseta.
Depois de sair do meu quarto e dar dois ou três passos no corredor, foi surpreendido pelo meu irmão, que saiu repentinamente de seu quarto e começou a andar em sua direção. tentou identificar a expressão no rosto dele. Achou que, talvez, o tivesse desconfiado de alguma coisa e estava voltando para o meu quarto para matá-lo. tentou demonstrar tranquilidade, mas estava pronto para sair correndo, se preciso fosse.
- Já está acordado, Jonas? - estranhou ao ver o amigo de pé naquele horário.
- Eu… estou voltando do… banheiro. - disse, tentando disfarçar a gagueira.
- Eu também preciso ir ao banheiro. Estou com uma puta ressaca. - reclamou, fazendo careta.
- Vai lá. Melhoras, cara. - deu alguns tapinhas no ombro do amigo e se afastou o mais rápido que conseguiu.
Sozinha no meu quarto, descontei os meus ataques de fúria nos lençóis da cama, que eu estava tentando arrumar há uns 10 minutos. A atitude dele diante do meu irmão era muito frustrante. nunca teve coragem para enfrentá-lo. Nem mesmo coragem para assumir para o que estávamos namorando ele teve! Meu irmão descobriu por acaso. Sem contar que antes do acidente que ocasionou a minha segunda perda de memória, nós também brigamos por esse mesmo motivo: o medo de contrariar o . Eu estava muito cansada daquilo.
Só saí do meu quarto naquele dia, pois estava muito preocupada com a ressaca de quase todos que estavam na casa. Fui ao quarto do e confirmei se ele havia tomado o remédio da maneira certa. Aproveitei e dei o remédio para a também. Fiz o mesmo com o , a , a Meg e até mesmo com o , que nem tinha bebido tanto. Ao ver o estado deles, me senti obrigada a ir para a cozinha para fazer uma sopa para todos eles. A sopa os ajudaria um pouco.
manteve-se em seu quarto durante o resto da manhã. Ele pensou sim em tudo o que eu havia dito pra ele e até cogitou a remota hipótese de contar tudo ao , mas ele mudou de ideia quando concluiu que esse seria o fim da amizade deles. não conseguia nem pensar nessa possibilidade.
Todo mundo sabia que eu era péssima na cozinha, mas eu conseguia me virar em algumas coisas. Eu não sabia se eu era tão ruim na sopa, porque aquela seria a primeira sopa que faria na vida. Não poderia ser tão difícil assim, né? Juntei todos os legumes que eu havia encontrado na geladeira e joguei dentro da panela. Eu estava dando o meu melhor para fazer a melhor sopa de todas. Minha paz acabou quando o entrou na cozinha. Ele manteve-se um bom tempo em silêncio, me observando e eu continuei fingindo que ele não estava ali. Tive a brilhante ideia de colocar na sopa alguns vegetais, que eu também havia encontrado na geladeira.
- Essa sopa é para ajudá-los ou para matá-los? - brincou para tentar quebrar o clima. Ele se referia ao e aos meus amigos. Abandonei a panela no fogão e me virei para fuzilá-lo com os olhos.
- A sopa, na verdade, é pra você e é pra matar sim. - Eu cruzei os braços, sorrindo ironicamente. Ele percebeu que eu ainda estava brava.
- Até quando você vai me tratar assim? - perguntou, querendo trégua. Eu ignorei completamente a pergunta, pois ele já sabia a resposta dela. Quando ele percebeu que eu não responderia, ele se aproximou. - E se ele nunca mais quiser olhar na minha cara? E se a nossa amizade acabar? - pensou na possibilidade.
- Algum dia ele vai acabar descobrindo. Qual vai ser a diferença? - Eu perguntei, me virando para olhá-lo. - Você não acha que é melhor ele saber por você? - Eu completei.
- Ele vai me matar. Você sabe que vai! - tentou usar outro argumento.
- Se eu me lembro bem, da última vez que escondemos alguma coisa dele, quem quase morreu fui eu. - Eu forcei um sorriso, me lembrando de quando o meu irmão descobriu que eu e o estávamos juntos. A minha recordação parece ter feito ele pensar um pouco.
- Eu… - hesitou alguns segundos, antes de terminar a frase. - Eu vou contar pra ele. - Ele finalmente disse. - Está bom assim? - se aproximou um pouco mais e parou em minha frente. - Eu vou contar pra ele. - Ele repetiu, percebendo que eu já estava olhando para ele de maneira diferente.
- Contar o que? Pra quem? - entrou repentinamente na cozinha e deu poucos passos para trás, afastando-se de mim. Mesmo com o afastamento, eu mantive os meus olhos sobre ele, esperando que ele mantivesse a sua palavra.
- O que? - fingiu que não tinha entendido a pergunta.
- Você estava dizendo pra que ia contar alguma coisa pra alguém. - disse, impaciente.
- É! Eu disse! - sorriu para o amigo, visivelmente nervoso. - Eu… - Ele hesitou. - Eu estava aqui dizendo pra ela que eu precisava contar pro… - Mais uma hesitação e eu já tinha certeza de que ele ia dar pra trás. - Mark que… eu quebrei a TV dele. - demonstrou alívio por ter encontrado uma boa desculpa. - Eu apertei alguns botões do controle remoto e a TV não quis ligar mais. Eu não sei o que eu fiz. Ele vai querer me matar. - Ele sustentou a sua mentira. A desculpa dele voltou a me tirar do sério. Me segurei ao máximo e tentei voltar a minha atenção para a panela que estava no fogão. Cheguei a derrubar a tampa da panela.
- Vai com calma, . - me olhou feio e depois voltou a dar atenção ao . - Então, você precisa arrumar a TV antes que ele veja que você estragou. - Meu irmão aconselhou.
- Ou ele podia ser sincero com o Mark e contar tudo pra ele. - Eu interferi na conversa. Minha frase foi direcionada ao .
- Pra quê? - me olhou feio. - Pra que contar se ele pode evitar confusão? - Ele completou. dividia seus olhares entre eu e o meu irmão.
- Porque é o certo a se fazer! - Eu argumentei, como se fosse óbvio.
- , você não sabe de nada. - rolou os olhos, voltando a sua atenção pro . - Arruma logo a TV e ele nem vai ficar sabendo. O que os olhos não veem, o coração não sente. - Meu irmão deu o pior conselho de todos. Era exatamente isso o que o queria ouvir.
- E se fosse com você? Você ia ficar feliz que ele escondesse coisas de você? - Eu tentei outra vez.
- Se ele quebrasse a minha TV? Eu ia matar ele. - respondeu, sem hesitar. - E é exatamente por isso que era melhor que eu não soubesse. - Ele ergueu os ombros. Olhei pro e ele fez careta e ergueu os ombros, como se dissesse: ‘Viu? Eu te disse!’. Engoli seco e respirei fundo, tentando controlar a minha vontade de matar aqueles dois idiotas.
- Era exatamente isso o que eu estava tentando explicar pra ela. - concordou com o meu irmão.
- Não liga pra ela. - sussurrou para o amigo, apontando um dos dedos na minha direção. Mesmo estando de costas, eu percebi o que ele estava fazendo.
- Já melhorou da ressaca, ? - Eu perguntei, sem coragem para olhar para ele.
- Mais ou menos. - respondeu, sem perceber o quanto eu estava furiosa com ele. - Eu só vim pegar um copo de água pra . - Ele explicou, aproximando-se do filtro. - E como está essa sopa? - Meu irmão perguntou, tentando olhar dentro da panela.
- Quando estiver pronta, eu chamo vocês. - Eu disse, séria.
- Valeu mesmo. - agradeceu, enquanto ia em direção a saída da cozinha.
- Valeu pelas dicas. - também agradeceu o amigo pelos valiosos conselhos. Meu irmão saiu da cozinha. Eu continuei de costas para o , fingindo que eu estava prestando a atenção na panela de sopa, mas a verdade é que eu estava com tanta raiva, que eu não conseguia nem olhar para ele. manteve-se em silêncio e me observava de longe, pensando se deveria se aproximar ou não. Ele achou que valia a pena tentar e foi se aproximando lentamente. Eu percebi a movimentação dele e notei quando ele parou bem atrás de mim.
- Corre. - Eu fechei os olhos, tentando não explodir de vez.
- Mas… - tentou argumentar.
- Sai daqui, Jonas. - Minha ordem soou mais como uma ameaça. Ele percebeu a minha fúria só pelo meu tom de voz. Ele até pensou em insistir, mas ele me conhecia bem e sabia que o melhor a fazer era se afastar e me deixar sozinha.
saiu da cozinha sem dizer absolutamente nada. No fundo, ele sabia que eu estava com a razão. O problema é que ele não conseguia colocar aquilo em prática. O simplesmente não conseguia contar a verdade pro meu irmão e eu não conseguia mais viver daquele jeito. Eu não conseguia aceitar que ele realmente queria continuar me colocando em uma situação como aquela, em que eu tenho escondê-lo atrás da cortina ou embaixo da minha cama para que o meu irmão não soubesse que eu não era mais virgem. Era inadmissível para mim que o tivesse coragem de invadir o quarto do meu irmão no meio da noite para roubar um preservativo e não tivesse a coragem de assumir para ele que o nosso relacionamento já havia chegado em outro patamar. Eu estava no meu limite.
Deixei o assunto e toda a minha irritação de lado e fui chamar todos as pessoas que estavam de ressaca na casa para virem até a mesa de jantar para que eles pudessem comer a sopa que eu havia preparado com tanto empenho e carinho. Modéstia parte, o cheiro que vinha de dentro daquela panela estava sensacional. Todos se sentaram na mesa e já não pareciam tão mal quanto antes. Aparentemente, o remédio havia começado a fazer efeito. também se juntou a nós na mesa, mas foi por livre e espontânea vontade, porque eu não o chamei em nenhum momento.
- O cheiro está ótimo. - elogiou.
- Está mesmo e, acredite: eu estou muito surpreso por estar dizendo isso. - disse, debochado.
- Para de falar besteira. A sopa está maravilhosa. - Meg me defendeu.
- Está mesmo! Parabéns, . - sorriu pra mim.
- Obrigada. - Eu fiquei até sem jeito com os elogios. Não era muito comum.
- Tem uns negócios aqui no meio que eu nem sei o que são, mas está muito bom. - também elogiou.
- Tem de tudo ai dentro. - Eu ri, sem emitir qualquer som.
- Arrasou, cunhada. - piscou um dos olhos pra mim.
- Eu vou repetir só por consideração a você, . - brincou, enchendo outro prato de sopa.
- Eu nem sabia que eu gostava de sopa. - disse, fazendo com que a maioria risse.
- E você não vai comer, Jonas? - perguntou, olhando para o amigo, que não tinha dito nada até então.
- Eu… - estava prestes a dar uma resposta afirmativa, quando eu me adiantei e peguei a panela nas mãos.
- Ele não vai, porque… - Eu coloquei o restinho de sopa no meu prato. - Infelizmente, acabou. - Eu sorri falsamente, fingindo lamentar. me olhou, como se dissesse: ‘Sério?’.
- Demorou, Jonas. - Meg achou graça.
- Ainda bem que você não está de ressaca. - ergueu os ombros.
- Come outra coisa. - aconselhou.
- Aqui. - Eu me levantei e fui até a fruteira. - Come essa maçã. - Eu disse, jogando a maçã da direção dele. Ele conseguiu pegá-la, mesmo sendo pego desprevenido.
- Obrigado. - agradeceu, me olhando torto.
- Então… - Eu voltei a me sentar. - Como foi a noite de vocês? - Eu perguntei.
- Estava todo mundo muito louco. - gargalhou ao se lembrar.
- Nem todo mundo. O estava bem consciente. - Eu estava oficialmente ‘ligando o foda-se’ e o percebeu.
- O também não bebeu muito. - tentou tirar o foco de si mesmo.
- Eu lembro de quase tudo. - confirmou, afirmando com a cabeça.
- E você, ? Não lembra de nada? Alguém invadindo o seu quarto durante a noite, talvez? - Eu perguntei e o afogou-se com a maça, quase cuspindo-o para fora.
- Como assim? - me olhou, confuso.
- É impossível! Eu verifiquei se a porta da casa estava trancada antes de dormir. - tentou evitar a tragédia.
- E você, ? Não deu falta de nada? - Eu olhei para o meu irmão, mas senti os olhos de me fuzilarem.
- Tipo o que? - arqueou uma das sobrancelhas, sem entender.
- Suas cervejas. - interferiu novamente. - A Meg tomou várias delas ontem a noite. - Ele estava tão nervoso, que suas mãos chegavam a suar frio.
- Confesso que não lembro de nada, mas isso soa como algo que eu faria. Desculpa ai. - Meg forçou um sorriso ao olhar para o meu irmão. - Valeu por me entregar, Jonas. Não esperava menos de você. - Ela ironizou.
- Você ficaria surpresa, Meg. - Eu afirmei, mas dessa vez eu olhei para o .
- Eu duvido muito. - Meg fez careta.
- Uma palavra pra você, Meg: Amber. - relembrou.
- É mesmo! Eu tinha até me esquecido. - Meg disse entre uma colherada e outra. - Vocês têm razão. Me entregar pro não foi nada. - Ela completou.
- Amber. - Eu disse em meio a um suspiro. - Não foi com ela que você perdeu a sua virgindade, Jonas? - Ele ficou até pálido.
- Por que estamos falando disso mesmo? - perguntou, me encarando.
- Eu gosto de saber de histórias sobre a primeira vez das pessoas, vocês não? - Eu perguntei e olhei para todos da mesa.
- Como se você soubesse alguma coisa sobre o assunto. - sorriu, debochado.
- E… se eu souber? - Eu disse e todos a minha volta paralisaram.
- , só porque você assiste essas séries adolescentes que só falam de sexo, não significa que você sabe. - estava tão seguro em relação a minha virgindade, que estava cego. Ele nem sequer cogitava a possibilidade. O olhar que o me lançava implorava piedade.
- Cuidado com o burro. - Meg suspirou, negando com a cabeça. Ela se referia a lerdeza do meu irmão em interpretar o que eu estava tentando dizer. deixou de me olhar para olhá-la e eu aproveitei a oportunidade para rir sem emitir qualquer som. fechou os olhos, sem acreditar no que estava acontecendo.
- O que você disse, Meg? - Meu irmão a olhou com um pouco mais de desconfiança. pisou no pé da namorada.
- Eu… fui burra… por ter bebido tanto. Minha cabeça parece que vai explodir. - Meg colocou uma das mãos na cabeça, fingindo uma terrível dor de cabeça.
- Nós devíamos voltar pra cama. Até a noite nós vamos ter melhorado. - quis tirar a namorada dali, antes que ela dissesse mais alguma besteira.
- Boa ideia. - Meg entendeu a intenção do namorado e aceitou a ideia.
- Vamos fazer o mesmo, amor. - sugeriu, achando melhor tirar o meu irmão dali.
- Vamos. - concordou, levantando-se da mesa.
- Obrigada pela sopa, ! - agradeceu.
- Estava maravilhosa! - Meg completou, antes que eles saíssem da sala de jantar.
- Divina! - piscou um dos olhos pra mim.
- Já pode casar. - completou, enquanto se afastava ao lado da namorada. Na mesa, sobraram apenas o , a , o e eu.
- Eu não sei o que está acontecendo entre vocês, mas resolvam isso bem rápido. - sussurrou, irritado.
- Ninguém precisa morrer nesse final de semana, né? - sorriu com sarcasmo.
- Alguém fala com ela! - apontou na minha direção.
- Foi você quem causou tudo isso e você sabe! - Eu cuspi as palavras na direção dele e me levantei da mesa para não surtar de vez.
- É sério! Fala com ela, cara. - pediu encarecidamente ao amigo.
- Eu? - apontou para si mesmo. - Com ela brava desse jeito? - Ele riu, negando com a cabeça. - Se vira, amigo. - deu alguns tapinhas no ombro do amigo.
- ! Você vai me ajudar, não vai? - sorriu carinhosamente para a amiga.
- É claro que eu vou ajudar. - devolveu o sorriso. - Minha ajuda é: arruma as suas coisas e dá o fora daqui. - Ela foi sincera. - Eu não me lembro de já ter visto ela assim tão brava. - completou. - Quer dizer, eu até lembro, mas não vou contar para não te assustar. - Ela fez careta.
- Isso é muito reconfortante. Valeu mesmo. - ironizou.
- Vai lá! - empurrou o amigo em direção à cozinha, que era onde eu estava.
sentia uma mistura de nervosismo com raiva. Ele estava com raiva por causa do meu comportamento na mesa de jantar. Todas aquelas insinuações deixaram ele maluco! odiava se sentir ameaçado e pressionado daquele jeito. Para ele, eu tinha que respeitar a sua decisão de não contar nada para o meu irmão. Ele não entendia que, para mim, dizer a verdade para o era importante. Ele não entendia o quão frustrante era para mim saber que o medo dele de enfrentar o meu irmão era maior do que a vontade dele de estar comigo. Ele não entendia o quanto eu me sentia ridícula, quando ele me obrigava a agir como uma adolescente boba e inocente.
Depois de pensar muito na melhor maneira de ter aquela conversa, decidiu que era melhor pegar um pouco mais pesado comigo, já que a conversa civilizada não tinha dado certo. Quando ele entrou na cozinha, eu ainda estava mexendo com os pratos na pia, mas eu estava ciente de que ele viria atrás de mim a qualquer momento.
- Olha pra mim. - pediu, sem se importar em ser gentil. Ele estava bem atrás de mim. - Olha pra mim. - Ele pediu mais uma vez. - Então, você se acha muito esperta e valentona, mas não tem coragem nem de me encarar? - Ele provocou. Mesmo sabendo que era exatamente isso o que o queria, eu tive que olhar.
- Você querendo falar de coragem? Logo você? - Eu cruzei os braços, enquanto sorria ironicamente.
- Você tem noção do que você quase acabou de fazer? - ignorou completamente a minha frase e foi direto ao ponto. - Você tem noção de que isso é muito maior do que um dos seus caprichos? - Ele me encarou. - O que você está querendo com tudo isso? A terceira guerra mundial? - Ele perguntou retoricamente.
- Você disse que ia contar! - Eu perdi a paciência de vez.
- Eu mudei de ideia! - não hesitou em responder. - E você não pode me obrigar a fazer isso! - Ele completou.
- Eu não preciso te obrigar a nada. - Eu ergui os ombros, demonstrando indiferença.
- E o que isso quer dizer? - Ele sabia que havia algo por detrás daquela frase.
- Quer dizer que se você não contar, eu conto. - Eu ameacei em meio a um sorriso.
- Você está blefando! - não me levou a sério.
- Estou? - Eu arqueei uma das sobrancelhas.
- Então, você vai contar pra ele? - perguntou em um tom sarcástico. - E o que você acha que ele vai fazer? Te dar um abraço e dizer que está orgulhoso? Te dar uma aula sobre sexo seguro? - Ele sorriu. - Ou você acha que quando ele ficar sabendo, vai sobrar só pra mim? - achou que o argumento seria convincente.
- Lembra o que você me disse ontem sobre quebrar promessas? - Eu perguntei e ele demonstrou estar confuso. O que uma coisa tinha a ver com outra? - Você disse que era mais fácil quebrar as promessas, quando elas eram entre família, porque não interesse o tamanho da besteira que você fizer, família sempre continua sendo família. - Eu refresquei a memória dele. - Quando o souber, ele vai ficar muito bravo e decepcionado comigo, mas como você mesmo disse, eu e ele vamos continuar sendo família. Ele vai acabar me perdoando. - Eu respondi, acabando com o argumento dele.
- Você só pode estar brincando. - negou com a cabeça, incrédulo.
- Eu não estou brincando, Jonas. - Eu afirmei, ficando mais séria. - Se você não contar, eu conto. - Eu dei o ultimato, antes de me afastar e deixá-lo sozinho na cozinha.
Depois daquela conversa, ficou um pouco mais apavorado. Ele me conhecia bem e sabia que as minhas ameaças eram legítimas. Ele sabia que eu não estava brincando, porém, ele ainda tinha esperanças de que poderia me fazer mudar de ideia. Cogitou novamente a possibilidade de contar de uma vez tudo para o . Chegou a ir até a porta do quarto dele, mas simplesmente travou. Ele realmente não conseguia. Aproveitou que todos na casa estavam dormindo e foi para o seu quarto para pensar no que deveria fazer.
Todos acordaram um pouco depois das 5 horas da tarde. Decidimos que tomaríamos banho e depois pediríamos pizza. A maioria estava melhor da ressaca, mas preferiram ficar em casa naquela noite. foi quem pediu as pizzas. Eu não tinha mais visto o até o momento em que as pizzas chegaram e todos tivemos que nos reunir na mesa de jantar. Eu percebi que ele estava um pouco inquieto e me olhava a todo o momento. Eu não sabia o que aqueles olhares queriam dizer.
- Eu peguei a bebida, mas esqueci os copos. - fez careta.
- Eu pego os copos. - Eu fui a primeira a me manifestar e já fui logo me levantando da mesa.
- Eu ajudo ela. - levantou-se imediatamente, indo atrás de mim. Eu logo imaginei que teríamos uma nova discussão. Eu já não aguentava mais. - . - Ele me chamou, me fazendo parar de andar e olhá-lo, sem qualquer paciência.
- O que foi? - Eu respirei fundo, tentando manter a paciência.
- Eu pensei muito em tudo o que nós conversamos. - disse, se aproximando. - E eu… - Ele olhou para o meu rosto de bem perto. - Eu… - não conseguiu dizer mais nada. Ele simplesmente se aproximou de vez e me beijou. Correspondi ao beijo mesmo estando completamente ciente de que aquele beijo era só mais um dos argumentos dele para me convencer a desistir de contar toda a verdade para o .
- Não acredito que vocês também esqueceram o katshup. - reclamou, depois de ter colocado a pizza em seu prato. - Eu vou pegar. - Ele se levantou e foi em direção a cozinha. Quando entrou, se deparou com o inesperado: eu e o nos beijando. Eu interrompi o beijo na mesma hora, quando percebi que alguém tinha entrado na cozinha. Olhei para o meu irmão e ele não parecia tão surpreso. - Eu nunca vou me acostumar com isso. - rolou os olhos. olhou para o amigo e depois voltou a me olhar. Diante das circunstâncias, eu achei que aquele era um bom momento para acabar com aquilo de uma vez por todas.
- Conta pra ele, . - Eu pedi, olhando nos olhos do . Ele arregalou os olhos.
- Me contar o que? - demonstrou curiosidade.
- Eu… vou contar. - estava visivelmente em choque. Ele não esperava por aquilo.
- Estou esperando. - o pressionou, sério. Pela minha expressão, ele imaginou que era algo grave.
- Eu preciso te contar que… - hesitou mais uma vez. Ele me olhou novamente e depois voltou a olhar para o meu irmão. - Eu e a … nós… - Ele bem que tentou, mas o resto da frase simplesmente não saía. - Nós estamos juntos de novo! - afirmou com um enorme sorriso. Eu quis morrer. A quantidade de palavrões que vieram na minha mente naquele momento era incontável. Fuzilei ele com os olhos e ele percebeu.
- Não me diga. - ironizou, reagindo normalmente à notícia. - Estou em choque. - Ele ironizou.
- Nós não íamos te contar, mas achamos que não era certo esconder alguma coisa de você, não é, querido? - Eu fingi um olhar apaixonado, mas sabia o seu real significado.
- É. - concordou com um sorriso forçado.
- Bom saber que vocês concordaram em ser honestos comigo dessa vez. - sorriu.
- 100% honestos! - Eu ironizei, sorrindo para o meu irmão. - Aliás, é exatamente a honestidade que mais me atrai nele. - Voltei a olhar pro . - Eu fico maluca só de pensar. - Eu disse, depois de levar uma das minhas mãos até o rosto dele e apertar suas ambas bochechas.
- Fico feliz por vocês. - tentou encerrar o assunto de uma vez. - Eu só vim pegar o ketchup. - Ele foi direto ao que realmente importava naquele momento.
- Vamos comer, meu bem? - Mais uma ironia minha e ele estava visivelmente aflito. - Eu estou morrendo de fome. Preciso matar de uma vez o que está me matando. - Eu sorri de maneira ameaçadora e me afastei, saindo da cozinha.
- Idiota. - suspirou, passando uma de suas mãos pelo seu rosto.
- O que foi? - achou que o amigo tinha falado com ele.
- Não é nada. - estava bastante preocupado.
- Você não vem? - perguntou com o ketshup em suas mãos.
- Eu vou. - confirmou, acompanhando o amigo até a sala de jantar.
Furiosa era muito pouco para me descrever naquele momento. Eu me sentei na mesa, pensando na melhor maneira de trazer o assunto à tona. Se eu tinha alguma dúvida em fazer aquilo, tinha me dado toda a certeza que eu precisava. descobriria tudo naquela noite. Agora, não seria somente por necessidade, mas por vingança por ter sido feita de idiota tantas vezes com aquela história. sentou-se na mesa e mal conseguia me olhar. Os movimentos dele eram calculados. Ele sentia que a qualquer momento, a qualquer movimento seu, a bomba poderia estourar.
Terminamos de jantar e eu ainda não tinha conseguido uma boa oportunidade para falar tudo o que eu queria. permaneceu mudo durante toda a refeição. Tinha momentos em que eu achava que nem respirando ele estava. Ele estava aterrorizado e eu estava adorando. Quantas oportunidades eu dei para que ele contasse tudo para o meu irmão? Quanto tempo eu deixei que ele levasse a nossa situação daquela maneira? Quantas vezes eu tive que me fazer de idiota e inocente por causa dele? Quantas vezes eu senti raiva por ver que ele não era capaz de enfrentar o meu irmão para que pudéssemos voltar a pensar em ter um relacionamento mais sério? Quantas vezes senti como se tivesse dormido com um adolescente babaca? Chega!
- Sábado a noite e não podemos cogitar em sair de casa ou em beber. - Meg suspirou. - Me diga que vocês têm algo em mente. - Ela fez careta.
- Podíamos jogar cartas. - sugeriu. Estávamos todos sentados no sofá.
- Quantos anos você tem? 65? - rolou os olhos.
- Podíamos brincar de esconde-esconde. Seria engraçado e a casa é ótima para isso. - sugeriu, empolgada.
- Não precisa exagerar. - negou com a cabeça.
- Com tanta compatibilidade, ainda não consigo acreditar que vocês dois são um casal. - gargalhou.
- Eu gostei da ideia da . - se manifestou, recebendo olhares perplexos do meu irmão. Em sua cabeça, esconde-esconde seria a brincadeira mais inofensiva que eles poderiam brincar. Ele sabia que eu estava procurando uma boa deixa para iniciar o meu show.
- Você está bem, ? - estranhou.
- Seria divertido. - sorriu, ergueu os ombros.
- Para quem é bom em esconder, deve ser bem divertido mesmo. - Eu disse, olhando fixamente para ele.
- E poker? - sugeriu, tentando desviar o foco de mim e do . Ela também havia percebido que havia algo acontecendo entre nós.
- Demora muito para acabar. - Meg reclamou.
- E se jogássemos ‘Eu Nunca’? - Eu sugeri com um enorme sorriso. Era perfeito!
- Essa foi boa. - parecia ter gostado da ideia.
- Eu estou dentro! - não pensou duas vezes.
- Não! Eu não quero jogar isso. - recusou na mesma hora.
- Fica assistindo. - Meg afirmou com um falso sorriso.
- Por mim… - ergueu os ombros, demonstrando indiferença. No mesmo instante, chutou o pé do amigo por baixo da mesa. - Nós temos que jogar outra coisa. - Ele mudou de ideia repentinamente. Eu desconfiei que o tinha interferido em sua decisão.
- Você joga, não é, ? - Eu me adiantei para que ele não interferisse na resposta dela também.
- Jogo! - afirmou com a cabeça.
- Eu também jogo. Então, o e o são os únicos que não vão jogar. - concluiu.
- Por que você não quer jogar, ? - Eu cerrei os olhos na direção do meu melhor amigo. Queria ver se ele teria coragem de mentir na minha cara.
- Porque… - não sabia o que responder.
- Porque ele não pode beber bebida alcoólica! Aliás, nenhum de vocês pode. - respondeu pelo amigo. Ele estava se esforçando para evitar aquela tragédia.
- É mesmo. - fez careta.
- Nós jogamos com doses de refrigerante! - Eu resolvi rapidamente o problema. Me levantei, fui rapidamente até a cozinha e voltei com uma garrafa de refrigerante e um pacote de copos plásticos nas mãos. Comecei a distribuir um copo para cada um para não perder tempo. - Você vai jogar. - Fiz questão de colocar um copo na frente do . - E você também. - Fiz o mesmo com o . Eu sabia que ele estava tentando acobertar o amigo.
- Faz muito tempo que eu não jogo isso! - Meg estava empolgada.
- Como é que joga mesmo? - perguntou, sem ter certeza das regras.
- Cada pessoa vai falar uma frase relativa a uma atividade, começando sempre com ‘Eu nunca’. O resto do grupo que já fez essa coisa, é obrigado a beber uma dose de refrigerante. Quem nunca fez, não precisa beber. - explicou para todos.
- Não pode mentir! - avisou a todos.
- Quem começa? - perguntou.
- A e ai a ordem segue no sentido horário - foi o único a se manifestar. Ele foi bem esperto, porque com a sua sugestão, eu seria a última a jogar. No momento da sua sugestão, nós trocamos olhares. Ele estava me desafiando.
- Pode ser eu. - concordou. - Encham os copos. - Ela orientou. Fomos passando a garrafa de refrigerante para que cada um enchesse o seu copo.
- Começa, . - Meg a incentivou.
- Ok! - disse, pensativa. - Eu nunca… me apaixonei à primeira vista. - Ela disse, sem beber o seu copo. Meg, e foram os únicos a beber. O fato de o ter bebido realmente não me comoveu nem um pouco.
- Que fofo. - sorriu toda desconcertada para o namorado e ele mandou um beijo pra ela.
- Argh. - fez cara de nojo. - Minha vez, né? - Ele quis acabar com o momento de melação.
- Manda! - deixou que o amigo falasse.
- Eu nunca fiz sexo com duas pessoas diferentes até hoje. - disse, ansioso pelas respostas. Meg foi a primeira a beber. Mesmo estando em dúvida sobre o que fazer, acabou virando o copo. As duas pessoas eram eu e a Amber.
- Sempre me surpreendendo, Jonas. - mostrou-se impressionado. Mais uma vez, ele não desconfiou de nada. Confesso que o recuperou um pouquinho do respeito que eu tinha por ele, quando virou aquele copo.
- E você, Meg. - olhou para a amiga com um sorriso safado.
- Eu não me orgulho disso. Acreditem. - Meg referia-se ao se ex-namorado babaca. - Ok. Sou eu agora. - Ela pensou por poucos segundos. - Eu… nunca beijei alguém do mesmo sexo que o meu. - Meg surpreendeu todos. Ninguém bebeu seu copo.
- Bebe aí, . Todo mundo já sabe. - brincou, fazendo com que a maioria risse.
- Que original. - rolou os olhos e negou com a cabeça.
- Tadinho. - Eu defendi o meu melhor amigo. - Sua vez vai chegar. - Pisquei para ele e ele piscou de volta.
- Você, amor. - olhou para a namorada. Era a vez dela.
- Ok. Eu nunca… beijei uma líder de torcida. - A pergunta de foi totalmente direcionada aos garotos. Ela sempre teve essa curiosidade. , e foram os primeiros a virar suas doses.
- Desculpa, amor. - bebeu por último.
- Ah, não! - Meg fez careta.
- E não surpreende ninguém. - Eu disse em meio a uma careta.
- Eles são tão tapados, que é bem capaz que todos estejam falando da mesma líder de torcida. - disse, fazendo com que eu e as garotas gargalhássemos.
- Considerando que o foi o único corajoso a ficar com a Jessie, não pode ser a mesma pessoa. - sacaneou o amigo.
- Que gracinha. - cerrou os olhos na direção do amigo. - Posso falar? - Ele perguntou, olhando com cara de tédio para os amigos, que ainda riam.
- Vai em frente! Sua vez. - disse, tentando conter o riso.
- Certo. - disse, tentando pensar na melhor frase a ser dita. Ele tinha um plano. - Eu nunca dancei sensualmente para provocar alguém. - Ele disse, me olhando com um sorriso idiota no rosto. Ele estava mesmo me provocando? Virei o copo de uma vez para mostrar a ele que eu não estava me sentindo nem um pouco intimidada por ele. Meg também bebeu.
- Você fez isso? - perguntou, me olhando sério.
- Fiz. Mais de uma vez, aliás. - Eu disse com prazer. Eu queria enfrentar o de todas as maneiras. A estratégia dele de tentar causar um mal estar entre eu e o , achando que isso me faria recuar e não contar a verdade não funcionou.
- ! - resmungou, surpreso.
- Vê se cresce, . Eu não tenho mais 15 anos. - Eu disse sem um pingo de paciência. Meu irmão ficou tão indignado com a minha atitude, que não conseguiu responder. - Sua vez, . - Eu mudei completamente o foco da conversa.
- Eu nunca… fiz sexo na cama ou na casa de um amigo. - sorriu malandramente para o meu irmão.
- Acho que isso foi pra mim, né? - reconheceu, antes de beber mais uma dose de refrigerante. foi obrigada a fazer o mesmo. Para a surpresa de todos, e Meg também viraram os seus respectivos copos.
- Mentira! - abriu a boca, surpresa.
- Espera. Foi na minha casa? - Eu me lembrei que eles dormiram no mesmo quarto da última vez que o foi pra Nova York.
- Foi mal. - Meg forçou um sorriso.
- Não teve como evitar. - ergueu os ombros.
- Meu Deus. - não conseguia parar de rir.
- Não teve como evitar? Cara, você precisa parar de ficar perto do . - também estava rindo.
- O que você fez com o nosso garoto prodígio, Meg? - brincou com a Meg.
- Eu até poderia te ensinar, mas acho que você já sabe. - Meg respondeu em um tom mais baixo. cerrou os olhos na direção dela, enquanto fazia careta.
- Depois dessa, vou até pegar mais leve. - referia-se ao jogo. Ele pensou por alguns momentos. - Eu nunca disse ‘eu te amo’ sem realmente amar. - Ele disse segundos antes de virar o seu próprio copo. Eu, Meg, e também viramos os nossos copos. - Não estou falando de você, Meg. - avisou a namorada.
- Eu também não, . - sorriu carinhosamente para o namorado. e eu não dissemos nada, mas sabíamos que não estávamos falando um do outro. Amor nunca foi problema para nós dois.
- Agora, é a vez da . Ela é a última. - disse. Todos passaram a me olhar.
- Minha vez. - Eu disse com um sorriso discreto. Fiz questão de olhar pro para ter certeza de que ele estava apavorado.
- Manda uma boa. - Meg pediu, esperando que eu dissesse alguma coisa.
- Eu tenho uma ótima pra vocês. - Eu mordi o meu lábio inferior, tentando evitar o sorriso.
- Por que não jogamos poker agora? Essa brincadeira já deu, né? - tentou evitar a catástrofe.
- Deixa ela falar! - me conhecia bem e sabia que algo estava por vir. Ela estava curiosa para saber o que era.
- Posso falar? - Eu estava em êxtase com aquilo. Não que eu desejasse a desgraça alheia, mas eu esperei muito por aquele momento e o merecia muito tudo o que estava prestes a acontecer com ele.
- Fala logo! - me incentivou a falar.
- Eu… - Eu respirei fundo antes de terminar a frase. - Eu nunca fiz sexo com alguém daqui. - Assim que eu terminei a frase, todo mundo começou a tomar os seus copos de refrigerante. Olhei para o de longe e o vi fechar os olhos por poucos segundos em meio a uma expressão de lamentação. Aquilo só fez com que eu me sentisse mais motivada a pegar o meu copo nas mãos e bebê-lo sem qualquer remorso. acompanhou todos os meus movimentos e ao me ver virar o copo, a expressão no rosto dele mudou.
- , deixa de ser lerda. Você ainda não entendeu como o jogo funciona? - achou que eu tivesse me confundido. - Você só bebe se você já fez o que você ou outra pessoa diz nunca ter feito. - Ele me deu uma bronca. continuava sentado, mas sua vontade era de sair correndo. Todas as outras pessoas que estavam no jogo começaram a perceber o que tudo aquilo significava. Todo mundo estava paralisado, esperando a bomba explodir.
- Eu sei disso. Eu sei jogar esse jogo. - Eu não achei que estaria tão tranquila quanto eu estava. Meu irmão demorou poucos segundos para processar a informação.
- Você está dizendo que você já… - mal conseguiu terminar a frase, quando me viu afirmando com a cabeça. Todos permanecerem em silêncio. Sem uma brincadeira, risada ou deboche. A primeira coisa que o fez foi olhar para o . Seus olhos foram direto para o copo de refrigerante do melhor amigo, que continuava cheio. não tinha tido coragem de tomar. - Você não está falando sério. - Meu irmão voltou a me olhar. Ele disse em meio a um sorriso nervoso. aproveitou para olhar para o .
- Você vai morrer. - disse, sem emitir qualquer som. Ele estava em pânico.
- O que eu faço? - arregalou os olhos, desesperado.
- Seja homem! Beba isso! - Meg apontou para o seu copo. Todos estavam falando com o sem emitir som.
- Corre! - aconselhou.
- Me desculpa, , mas eu estou falando sério. - Eu ergui os ombros. Não havia nada que eu pudesse fazer a respeito.
- Não! Você não está! Você não pode estar! - já estava surtando. Ele estava em fase de negação. Deixou de me olhar e encarou cuidadosamente cada um de seus amigos. Para ele, poderia ser qualquer um deles. foi o último a ser encarado. Ele era o único que não tinha bebido o refrigerante, mas ele estava nervoso demais para ser inocente. A expressão no rosto dele o entregava completamente. - … - Ele chamou o amigo, que nem conseguia olhar para ele.
- Amor, calma. - tentou intervir na situação. mal olhou para ela.
- Olhe pra mim, . - pediu em tom de ordem. atendeu o seu pedido, mas manteve-se em silêncio. - Você sabe alguma coisa sobre isso? - O tom de voz do meu irmão estava me assustando.
- . - também tentou contornar a situação.
- Fica fora disso! - aumentou o tom de voz, apontando um dos dedos na direção do . - - Eu estou falando com você, Jonas! - Ele manteve o tom de voz quando voltou a encarar o . - Você sabe alguma coisa sobre isso!? - Meu irmão perguntou novamente, mas dessa vez sua frase soou como uma ameaça.
- Jonas, se você não vai beber a porcaria do refrigerante, me dá aqui que eu bebo por você. - Meg cometeu a gafe, mas não dava para dizer que tinha sido sem querer. cutucou a namorada. Ela só fez o meu irmão ficar mais furioso. Ela também me arrancou boas risadas, que eu tive que abafar para não serem ouvidas.
- FALA, PORRA! - gritou na direção do .
- Calma. - disse, depois de me olhar por poucos segundos. - Vamos conversar. - Ele mediu as palavras, que soaram como uma confissão para o . Meu irmão fuzilou ele com os olhos e negou incessantemente com a cabeça.
- FILHO DA PUTA! - levantou do chão com sangue nos olhos. saltou do chão feito um ninja e correu imediatamente para trás da mesa de jantar, que acabou ficando entre os dois.
- , vamos conversar. - pediu, ofegante.
- VOCÊ QUER CONVERSAR? SOBRE O QUE? SOBRE COMO VOCÊ ME FEZ DE IDIOTA? SOBRE COMO VOCÊ TIROU A VIRGINDADE DA MINHA IRMÃ? - terminou a frase e tentou alcançá-lo, correndo para um dos lados da mesa. correu para o lado inverso.
- NÃO FOI ASSIM! - tentou se explicar. - EU FUI RESPEITOSO. EU SEMPRE FUI MUITO RESPEITOSO COM A SUA IRMÃ. - Ele queria explicar que não tinha sido uma coisa só por prazer. Tinha muito amor envolvido também.
- Você foi respeitoso? - fingiu ter ficado contente. - Que fofo! Agora, eu estou tão mais tranquilo e feliz por você ter TIRADO A VIRGINDADE DA MINHA IRMÃ, SEU IMBECIL! - Ele deu um soco na mesa.
- O que você foi fazer? - se aproximou de mim, me dando uma bronca.
- Já estava na hora, você não acha? - Eu respondi, sem qualquer culpa.
- QUANTAS VEZES? - perguntou, tentando ficar mais calmo.
- UMA VEZ! - diria qualquer coisa que o favorecesse. cerrou os olhos, pressionando-o. - DUAS VEZES! FORAM SÓ DUAS VEZES. - Ele corrigiu, imediatamente.
- Se eu descobrir que você está mentindo… - ameaçou. A mesa de jantar ainda estava entre eles.
- FORAM TRÊS, QUATRO… CINCO VEZES. EU NÃO LEMBRO, CARALHO. EU NÃO LEMBRO. - nunca tinha se sentido tão pressionado na vida. Ele estava em pânico. Ele nunca tinha visto o daquele jeito. Quando ele terminou a frase, meu irmão apoiou as mãos na mesa, como se precisasse de poucos segundos para respirar e digerir aquela informação.
- Você não deveria ter feito isso, . - negou com a cabeça e manteve os olhos fechados por poucos segundos. - Eu vou acabar com você. - Ele fez outra ameaça. - EU VOU MATAR VOCÊ! - tentou alcançar o novamente, correndo para um dos lados da mesa. correu para o outro lado. - PARA DE FUGIR! - Ele gritou, furioso. - VOCÊ É HOMEM PRA COMER A MINHA IRMÃ, MAS NÃO É HOMEM PRA ME ENFRENTAR? - cuspiu as palavras.
- ! - e se aproximaram para tentar segurar o meu irmão.
- SE ALGUÉM ENCOSTAR EM MIM, VAI MORRER JUNTO COM ELE. - ameaçou e , que pararam de se aproximar na mesma hora.
- NÃO É ASSIM! NUNCA FOI ASSIM! - tentaria se explicar novamente. - EU GOSTO DELA. EU SEMPRE FUI APAIXONADO POR ELA. NÃO FOI DO JEITO QUE VOCÊ ESTÁ PENSANDO. - Ele estava desesperado.
- E COMO FOI? NO BANHEIRO DO METRÔ? NA PORRA DO SEU CARRO? OU FOI EM UM MOTEL? - não esperou a resposta. Tentou outra vez alcançar o e quando o viu correr para o lado contrário, decidiu resolver aquilo de uma vez, subindo na mesa de jantar. não teve outra alternativa, se não correr. Ele foi na direção do quintal da casa e meu irmão foi atrás dele. parou em um dos lados da piscina e parou do outro lado. A piscina estava entre eles.
- Você vai me ouvir! - afirmou, irritado. Ele tinha que ter o direito de se justificar.
- Você me traiu da pior maneira possível! - esbravejou. - Eu confiei em você! Eu confiei a minha irmã a você! - Ele completou, indignado.
- EU NÃO QUERIA ISSO! - gritou.
- NÃO QUERIA ISSO? ELA TE OBRIGOU, ENTÃO? VOCÊ ESTÁ DE BRINCADEIRA COMIGO! - ficou ainda mais indignado. - VOCÊ ACABOU DE ASSUMIR QUE ISSO ACONTECEU MAIS DE 4 VEZES. VOCÊ ACHA QUE EU SOU IDIOTA? - Ele foi para um dos lados da piscina e correu para o outro.
- EU NÃO QUERIA TE DECEPCIONAR. EU NÃO QUERIA QUEBRAR A SUA CONFIANÇA. - explicou-se melhor. - Eu nunca quis que você se sentisse assim. - Ele falou de maneira mais calma. - Mas… aconteceu. - ergueu os ombros. - Nós estávamos namorando e estávamos apaixonados e… aconteceu. - Ele não conseguia ser mais honesto do que aquilo.
- POR QUE VOCÊ NÃO ME CONTOU? - não se sentiu nem um pouco melhor com as justificativas do amigo.
- Pra quê? Pra você me dar outro soco? Pra você me mandar ficar longe dela? - perguntou retoricamente. Todos acompanhavam a briga.
- NÃO INTERESSA! NÓS ÉRAMOS AMIGOS! VOCÊ ME DEVIA ISSO. - não cedia de jeito algum.
- … - não sabia mais o que dizer. - Você sabe tudo o que eu já fiz por ela. Você sabe como eu me sinto em relação a ela. - Ele fez uma breve pausa. - Uma vez, você me disse que estava feliz por ela estar com um cara como eu. Você disse que não poderia imaginar ninguém melhor pra ela. - relembrou. - Nós somos melhores amigos, cara. Você me conhece. Você sabe das minhas intenções. Você sabe o respeito que eu sempre tive por ela e por você. - Ele tentou ser o mais sincero possível.
- E é exatamente por isso que eu não esperava isso de você. Eu esperava de qualquer pessoa. Qualquer pessoa, . - demonstrou sua enorme decepção. - Menos você. - Ele negou com a cabeça. Infelizmente a conversa deles começou a me fazer sentir um pouco de remorso. Não era nem por pena do . Era questão de ser justa. A conversa também dizia respeito a mim e eu sabia que o estava sendo sincero.
- … - Eu me aproximei do meu irmão.
- Eu não quero falar com você. - Ele respondeu, decepcionado.
- Eu sei que você se sente traído. Eu sei que você sempre sentiu a obrigação de cuidar de mim. - Eu tentei dizer as palavras certas. - Eu respeito e amo você por isso, mas… você não vai poder me proteger para sempre. Você não vai poder impedir que o meu coração seja quebrado milhões de vezes. Você não vai poder me impedir de tomar as minhas decisões erradas. Você não vai poder impedir que eu viva todas as experiências que qualquer garota vive. - Minhas palavras fizeram com que o me olhasse. - Eu reconheço que o foi um idiota por não ter te contado tudo isso antes, mas… você precisa saber que ele sempre me respeitou muito e nunca forçou nada ou se aproveitou das inúmeras vezes que eu estive vulnerável. - estava impressionado com a minha atitude. - Desculpa se eu te decepcionei e se eu não sou tudo o que você esperava que eu fosse, mas tudo o que aconteceu entre eu e o aconteceu exatamente da maneira que eu queria e com o meu total consentimento. Ele não fez nada sozinho. - Eu finalizei. Meu irmão passou uma de suas mãos pelo seu rosto. Minhas palavras só serviam para deixá-lo mais nervoso e angustiado com a notícia.
- Vocês me dizem essas porcarias como se elas mudassem o fato de que vocês tem feito sexo há meses. Pelas minhas costas! - voltou a olhar para o .
- Me desculpa, cara. Eu não sei o que mais eu posso te dizer. - abriu os braços.
- Que tal se você calasse a boca? - encarou o amigo pela última vez, antes de se afastar em silêncio e entrar na casa. e foram atrás do amigo.
nunca tinha visto o tão decepcionado e isso fazia com que ele se sentisse muito mal. Ele estava sentindo uma mistura de culpa e raiva. preferia mil vezes ter levado alguns socos, ao invés ouvir do amigo as palavras que ele tinha ouvido. Ele se sentia o pior amigo e a pior pessoa do mundo e tudo isso, graças a mim! Mesmo estando em lados opostos na piscina, levantou o seu rosto e me encarou.
- Valeu mesmo! Está feliz? - ironizou, retirando-se da área da piscina antes mesmo que eu conseguisse responder.
- Idiota! - Eu gritei na direção em que ele tinha ido.
- Não se importe com isso. Você sabe que ele está nervoso. - tentou me acalmar.
- Agora, ele está fazendo parecer que a culpa é minha! - Eu estava muito brava.
- É exatamente isso o que ele quer! Desencana disso. - Meg me apoiou.
- Deixa isso pra lá. - me abraçou.
- Vocês também acham que eu fiz mal em contar tudo? - Eu quis a opinião delas.
- Eu acho até que foi pouco! - Meg foi a primeira a se manifestar.
- Olha, não vou negar que eu fiquei um pouco em choque com a maneira que tudo aconteceu. - foi sincera.
- Mas se era algo que você precisava falar e que estava te fazendo mal, você fez bem em contar. - foi extremamente compreensiva.
- Eu entendo os motivos dele e sabia que isso poderia abalar a amizade dele com o , mas aconteceu! O que ele queria? Que vivêssemos a vida toda fingindo que nada aconteceu? - Eu tentei me explicar.
- Só o mesmo para te pedir um absurdo desses. - Meg rolou os olhos. - Tudo bem que ele tem uma pegada memorável, mas isso não dá o direito de ele fazer o que quiser. - Ela completou.
- Pegada? Como você sabe da pegada dele? - estranhou.
- Eu tenho flagrado muita coisa nesses últimos meses. - Meg forçou um sorriso. Seu comentário me arrancou um sorriso sincero. - Eu não vou muito com a cara do . Vocês sabem! Mas… eu tenho que reconhecer que quando esses dois se juntam, não há extintor no mundo que separe. - Ela completou, fazendo as meninas rirem.
- Para com isso, Meg. - Eu rolei os olhos.
- Jura!? - estava impactada com a notícia.
- Eu sempre vi o sendo tão romântico. Eu nunca imaginei esse lado dele. - mostrou interesse no assunto.
- Só de falar no assunto, eu já sinto vontade de pular nessa piscina. - Meg apontou na direção da piscina.
- Vocês não estão falando sério! Uma guerra acontecendo lá fora e vocês falando besteira? - Eu rolei os olhos.
- Você está certa. Vamos lá. - se conscientizou e foi indo na direção da casa. Fomos atrás dela.
- Depois você vai me contar tudo! - sussurrou aos risos. Eu apenas neguei com a cabeça e olhei feio para a Meg. Por que ela foi contar?
Depois de ter deixado o quintal, foi direto para o lado de fora da casa. Ele notou que as vozes de seus amigos vinham de lá. Ao chegar na porta, avistou o , que estava sentado em uma pedra enorme que tinha na frente da casa, enquanto e estavam de pé na frente dele e tentavam acalmá-lo. Jou passou pela varanda e percorreu metade do caminho sem qualquer medo de levar uma surra.
- Deem o fora. Eu quero conversar com ele. - foi direto ao ponto. Ele queria resolver o assunto de uma vez.
- Deixa pra amanhã, . - aconselhou, ficando entre os amigos.
- Agora. - insistiu. se levantou e olhou para o amigo.
- Deixem ele falar. - pediu. e continuavam na frente dele.
- Não. - não gostou da ideia.
- Ele disse que quer conversar e eu vou ouvi-lo. Só isso. - tentou demonstrar que estava calmo.
- Até parece. - negou com a cabeça.
- Está tudo bem. - tranquilizou os amigos. - Qual é! - Ele insistiu para que eles saíssem.
- Eu já me acalmei! Vão de uma vez. - os apressou. Mesmo contrariados, e se afastaram e voltaram para a varanda, onde eu e as garotas também observávamos a cena de longe.
Quando e os deixou sozinhos, e se olharem. Eram olhares completamente diferentes. se sentia traído, enquanto o se sentia culpado. Meu irmão não se moveu e, por isso, o teve que se aproximar. Ele estava ciente de que não sairia daquela conversa sem ao menos levar um soco do melhor amigo.
- Eu não vou mais fugir. - disse para que o amigo soubesse que ele estava cedendo. - Você está bravo comigo e tem todo o direito de estar. Eu sei o que eu fiz e, apesar de não me arrepender, eu sei que esconder isso de você foi errado. - Ele reconheceu. - E, por isso, eu peço desculpas. - finalmente se desculpou. Achou que a sua sinceridade faria com que o meu irmão visse a situação de uma outra maneira, mas ele estava errado. respondeu, dando um forte soco no rosto do . Aquele soco era questão de necessidade para ele. Era o jeito que ele tinha de extravasar a sua raiva.
- Você jogou toda a confiança que eu tinha em você no lixo, Jonas. - falou para ele, que ainda estava com a cabeça baixa por causa do soco. Quando o conseguiu levantar a cabeça para encará-lo novamente, ele foi surpreendido com um segundo soco. - Eu não quero as suas desculpas. Eu mal consigo olhar pra você. - Com a cabeça novamente baixa, cuspiu todo o sangue que acumulou-se em sua boca. - Você deveria ter me contado. - Meu irmão o encarou com decepção. - Como você pode perceber, você estava certo. Eu quebraria a sua cara de qualquer jeito, mas diferente do que você imaginou, eu não vou pedir que você se afaste dela. Eu vou te pedir pra você se afastar de mim. - disse, dando poucos passos para trás.
- Espera. - ainda achava que pudesse consertar as coisas.
- É o melhor pra você. Eu não sei até quando eu vou aguentar essa vontade de quebrar cada osso do seu corpo. - ameaçou, afastando-se de vez.
Todos observaram a cena com uma expressão de dor. Os socos foram realmente muito fortes. Meu irmão passou por todos nós e nem ao menos nos olhou. foi atrás dele. O continuava lá parado e parecia estar tentando lidar com seus próprios ferimentos. Estávamos com tanta pena dele, que demoramos para cogitar a possibilidade de nos aproximarmos dele.
- Eu vou lá. - foi o primeiro a se manifestar.
- Deixa que eu vou. - Eu disse logo em seguida. Eu me sentia na obrigação de ir até lá. Não que eu me sentisse culpada, mas fui eu que acabei causando tudo isso, não é?
- Não piore as coisas, está bem? - me aconselhou. Eu entendi o que ele quis dizer.
não parava de cuspir sangue e um dos lados de seu rosto ardia e doía bastante. Ele estava de costas e, por isso, não viu que eu me aproximava. Não disse nada até me colocar de frente para ele. Se ele percebesse que eu estava indo falar com ele, ele poderia se afastar. Quando percebeu que tinha alguém em sua frente, levantou a sua cabeça. Confesso que fiquei bastante sensibilizada ao ver o rosto dele todo machucado. A boca dele estava vermelha por causa do sangue e havia um pequeno corte embaixo de um dos olhos dele, que não estava sangrando, mas estava bastante inchado.
- E ai? Foi tudo do jeito que você sempre sonhou? - perguntou, me olhando com frieza.
- Eu não vim pra brigar. - Eu me esforcei para ignorar sua ironia. - Me deixa dar uma olhada nisso. - Eu me referia aos ferimentos. Tentei me aproximar, mas ele se afastou.
- Não precisa. - recusou.
- Deixa de ser teimoso. - Eu tentei me aproximar novamente, mas ele se esquivou.
- Eu já disse que não precisa! - reafirmou, irritado. - Qual o problema? Está com remorso agora? - Ele me provocou.
- Eu não estou com remorso, porque eu não tenho motivos para sentir remorso. - Eu estava tentando muito me manter calma.
- Que tal os dois socos que eu acabei de levar? - As insinuações e as ironias começaram a me irritar bastante.
- Não vem com essa. Você sabe que a culpa é só sua! - Eu respondi de forma mais ríspida. - Eu pedi milhões de vezes para você contar pra ele! Eu te dei muito tempo pra isso. Eu te avisei que se você não contasse, eu contaria! - Eu jamais admitiria que ele jogasse a culpa em mim.
- E você escolheu o melhor momento para fazer isso, certo? No meio da droga de um jogo! - disse, passando reto por mim. - Você queria que ele soubesse? Você queria acabar com a nossa amizade? Meus parabéns! Você conseguiu. - Ele disse, antes de cuspir sangue novamente. Eu quis gritar com ele e xingá-lo, mas eu achei melhor manter a discussão ao invés da briga.
- Você não é homem nem para assumir a sua culpa, não é? É tão mais fácil jogá-la pra cima de mim. - Ao terminar a frase, eu estava pronta para me afastar dele. Era impossível conversar com ele.
- Não sou um homem? Você tem certeza?- A resposta dele me fez ficar. Ele estava furioso e não engoliria aquilo calado. - Porque eu me lembro de ter sido um homem todas as vezes que você precisou! Eu fui homem pra te esperar por malditos 6 anos! Eu fui homem pra salvar você mais vezes do que eu posso contar. Eu fui homem pra deixar de viver o meu sonho para que você vivesse o seu! Eu fui homem pra levar uma bala por você! - cuspiu as palavras na minha cara. - Esse é o tipo de homem que eu sou. - Ele bateu em seu peito. - Eu tive uma única fraqueza e ela não me define. Você deveria saber. - Ele finalizou de maneira estúpida.
- O homem que costumava dizer que faria qualquer coisa por mim. O homem que disse que jamais me decepcionaria de novo. O homem que eu escolhi para perder a minha virgindade. - Eu mantive o meu tom de voz, mas a expressão em meu rosto era de decepção. - Isso também soa familiar pra você? - Eu perguntei retoricamente. - Esse homem que você mencionou e o homem que eu mencionei são as mesmas pessoas, mas, por algum motivo, eles não se parecem nada com o homem que você está sendo hoje. - Eu disse, antes de me virar de costas e deixá-lo falando sozinho. Já no meio do caminho, eu parei e me virei novamente para olhá-lo, porque eu precisava falar mais uma coisa. - E da próxima vez que você pensar em fazer alguma coisa por mim com a intenção de jogá-la na minha cara em algum momento, não faça! Eu não preciso desse tipo de homem. - Me virei e voltei a me afastar para evitar que ele dissesse mais alguma coisa.
- Eu não fico mais um minuto perto desse babaca. - Eu disse para os meus amigos ao passar por eles e entrar na casa. Eu voltaria para Nova York ainda naquela noite.
Ouvir o se gabando por coisas que, até então, eu pensava que ele teria feito por mim sem qualquer intenção de receber algo em troca, sem qualquer interesse ou maldade foi um chute e tanto no meu estômago. Uma das coisas que eu mais admirava no era a maneira que ele fazia certas coisas por mim sem nem perceber e sem qualquer intenção de ser reconhecido por isso. Sempre foi uma coisa tão natural, pura e involuntária entre nós dois. Agora, tudo parecia uma grande farsa pra mim. Eu sabia muito bem que o estava irritado e machucado, mas isso não dava a ele o direito de ficar jogando essas coisas na minha cara. Aquilo havia me deixado bastante chateada.
- Não faz isso. - tentou interferir na minha decisão de ir embora.
- Eu não faria se realmente não fosse necessário. - Eu continuei jogando tudo o que era meu dentro da minha mala.
- Foi só uma briga. - Ela argumentou.
- Não foi só uma briga. Foi mais uma briga! Eu não tenho mais paciência pra esse tipo de coisa. Eu não tenho paciência pra esse idiota, que ainda não percebeu que ele não está mais no ensino médio! - Eu desabafei e descontei tudo nas minhas roupas, que eu continuava enfiando dentro da minha mala.
- Espera pelo menos até amanhã de manhã! Já está um pouco tarde. - estava muito preocupada.
- . - Eu parei o que estava fazendo e dediquei toda a minha atenção a ela. - Você sabe que eu te amo e que você é a melhor amiga que eu poderia ter, não sabe? - Eu perguntei e a vi afirmar com a cabeça. - Você sabe que se eu realmente não precisasse ir, eu ficaria aqui com vocês, certo? - Eu queria que ela entendesse que, apesar de eu querer muito passar mais algum tempo com os meus amigos, ficar na mesma casa que o estava me sufocando.
- Eu queria muito que você ficasse, mas eu entendo e apoio a sua decisão. - tentou sorrir, apesar do bico.
- Você é maravilhosa. - Eu a abracei carinhosamente.
- Eu sei. - disse, me fazendo rir. - Eu te ajudo com as suas coisas. - Ela sorriu assim que terminou o abraço.
- Obrigada. - Eu olhei para ela, extremamente agradecida.
Eu não levei mais de 15 minutos para arrumar todas as minhas coisas e conseguir enfiá-las dentro da minha mala. Da janela do quarto, eu consegui ver que o e o estavam conversando com o . Eu não me importava mais. Eu só queria ir embora. Eu estava pronta para ir embora, mas eu tinha mais uma coisa para fazer antes de ir: eu precisava falar com o . Eu não podia ir embora e deixar as coisas do jeito que elas estavam. Deixei a minha mala e a minha bolsa no corredor e fui até o quarto do meu irmão. Bati na porta duas vezes seguidas e ninguém respondeu. Eu sabia que ele estava lá dentro e, por isso, entrei de qualquer jeito.
- Nós podemos conversar, por favor? - Eu perguntei ao ver que ele estava deitado na cama. estava ao seu lado.
- É realmente necessário? - perguntou, sem me olhar.
- Muito. - Eu afirmei. se levantou, sorriu pra mim e afirmou com a cabeça como se dissesse: ‘Que bom que você veio.’. Ela saiu do quarto sem que ninguém pedisse. Ela sabia que precisávamos conversar a sós.
continuou na cama. Ele nem se moveu. Ele olhava para o teto e demonstrava estar pensativo, mas a verdade é que ele não queria olhar pra mim. Eu o conhecia muito bem e sabia que, naquele momento, ele estava mais decepcionado do que com raiva. Com isso, achei que poderia me aproximar. Me deitei ao seu lado, sem dizer uma só palavra e passei a encarar o teto também. Eu não sabia nem por onde começar.
- Lembra quando costumávamos a passar as férias inteira pulando nessa cama? - Eu me lembrei com um fraco sorriso no rosto. - Nossos pais odiavam que fizéssemos isso. - Eu neguei com a cabeça.
- E a tia Janice sempre nos defendia. - finalmente disse. Aquela também era uma boa lembrança para ele.
- É. Essa é uma boa memória pra mim. - Eu mantive o sorriso nostálgico em meu rosto. - Você sabe que eu ainda sou aquela garotinha, certo? Nada mudou e nunca vai mudar. - Eu queria que ele soubesse. manteve-se em silêncio por algum tempo.
- Eu sempre quis te proteger de tudo e agora eu sinto como se eu tivesse falhado. - tentou se explicar.
- Você não falhou! Você nunca falhou. - Eu respondi na mesma hora. - Você sempre foi incrível. Você sempre foi o melhor de todos. - Eu completei.
- Eu queria que você tivesse me contado. - estava visivelmente chateado.
- Eu quis te contar tantas vezes, mas o receio que eu tinha da sua reação sempre me fazia desistir. - Eu neguei com a cabeça. - Com o tempo, eu fui amadurecendo esse pensamento e me dei conta de que eu precisava te contar. - Eu expliquei.
- É estranho pra mim, sabe? Te olhar como uma mulher adulta e independente e não mais como uma garotinha chata que precisava de mim pra tudo. - Ele finalmente me olhou.
- Talvez, eu já não precise de você para tudo, mas quem disse que eu não preciso de você? - Eu perguntei, olhando pra ele. - , eu ainda sou a sua irmã mais nova. Eu ainda preciso das suas broncas, dos seus cuidados, da sua proteção e especialmente das suas implicâncias. Eu não sei viver sem elas. - Eu disse, conseguindo arrancar um sorriso dele.
- Para com isso. Eu estou tentando ficar com raiva de você. - deixou de me olhar novamente, tentando disfarçar o sorriso.
- Olhe, você deveria ficar feliz por mim. - Eu continuei olhando pra ele.
- Por você ter feito sexo com o meu melhor amigo? - arqueou uma das sobrancelhas.
- Poderia ser bem pior, sabia? - Eu quis mostrar um outro lado pra ele.
- Poderia mesmo. Era só você ter feito sexo com o e o também. - disse, me fazendo rir.
- Poderia ter sido com o Peter! - Eu demonstrei o meu ponto de vista. - Poderia ser com um cara qualquer que eu conheci em uma balada. Poderia ser com alguém que eu não amava. - Eu completei.
- Você está tentando me deixar mais bravo? - fez careta.
- Não! Eu estou tentando te mostrar que isso foi uma coisa boa pra mim. Eu estava apaixonada, estava feliz e queria que acontecesse. - Eu expliquei. - Você sabe exatamente o que eu estou querendo dizer. Você já passou por tudo isso com a . - Eu queria que ele se colocasse no meu lugar.
- Mas isso não muda o fato de vocês terem me escondido tudo isso. - se sentou repentinamente. - Aliás, não é a primeira vez, né? - Ele relembrou, contrariado. Ele referia-se ao início do meu envolvimento com o . Não contamos pra ele e acabou muito mal.
- Você está totalmente certo! Eu sei que eu errei e tenho certeza que o também sabe. - Eu também me sentei na cama. - Eu sinto muito, mas você vai ter que me desculpar por isso. - Eu ergui os ombros. - Eu estava pronta para voltar para Nova York ainda essa noite, mas eu não conseguiria ir sem saber que está tudo bem entre nós. - Eu disse com um fraco sorriso.
- Não precisa ir embora. - negou com a cabeça. Ele achava que eu estava indo por causa dele.
- Eu preciso sim. Algumas coisas aconteceram e eu não quero continuar aqui. - Eu não dei muitos detalhes. Não queria que ele se preocupasse.
- Se você diz. - ergueu os ombros. Ele confiava em mim.
- Isso quer dizer que você me desculpa? - Eu forcei um sorriso, que chegou a fazê-lo rir.
- É… ok! - rolou os olhos. - Eu desculpo, mas… você vai ter que ter um pouco de paciência comigo. Eu vou demorar um bom tempo para digerir toda essa história. - Ele estava um pouco contrariado, mas acabou cedendo.
- Jura!? - Eu fiquei muito feliz. - Obrigada! - Eu o abracei imediatamente. - Obrigada por entender… um pouco. - Eu fiz careta ao terminar a frase. - Eu amo você. - Olhei para ele com carinho e dei um beijo estalado em seu rosto.
- Vai de uma vez. - Como sempre, tentou evitar mais beijos.
- Você é o melhor! - Eu me levantei da cama, empolgada e aliviada. Ele me viu sair do quarto com um sorriso no rosto. No final das contas, ele estava orgulhosa da pessoa que eu havia me tornado.
Saí daquele quarto com 20kg a menos nas costas. me esperava no corredor e segurava a minha mala. Ela soube que tudo tinha ocorrido muito bem por causa do sorriso aliviado no meu rosto. Contei a ela brevemente o que aconteceu e confirmei que realmente iria embora. Ela até tentou me convencer a ficar mais uma vez, mas não conseguiu. Eu estava decidida. Encontrei a no meio do caminho e me despedi dela. Ao chegar na porta da casa, ouvi as vozes do lado de fora. ainda estava lá.
- Você quer que eu cuide disso ou não, Jonas? - Meg perguntou, impaciente. Ela sabia que alguém precisava cuidar dos ferimentos dele e se eu não o faria, ela teria que fazer.
- E eu tenho opção? - suspirou longamente.
- É claro que tem! A ! - Meg disse como se fosse óbvio.
- Nós brigamos! E sabe o que isso quer dizer? Isso mesmo. Ela está querendo me matar. - forçou um sorriso. - Além disso, eu não vou pedir nada pra ela. - Ele completou.
- Deixa de ser idiota. - Meg rolou os olhos.
- Você também não é a minha maior fã, mas entre você e ela, eu prefiro que você faça isso. - era orgulhoso demais para se rebaixar e pedir a minha ajuda. - Mas, por favor, seja cuidado… - Ele ia dizendo, quando Meg o interrompeu.
- Fica quieto. - Meg pediu, aproximando-se dele. Ela segurou o seu rosto, o analisou de mais perto e constatou que não tinha sido nada mais grave, somente um pequeno corte no interior da boca e o inchaço causado pelo segundo soco. Nada que preocupasse. - Não é nada demais. - Ela concluiu.
- Como assim não é nada demais? Eu levei dois socos e está doendo pra caralho. - reclamou, fazendo careta.
- Deixa de ser dramático. - Meg rolou os olhos.
- Então, eu devo ficar aqui parado e vai melhorar sozinho? - cruzou os braços.
- Espera um pouco. - Meg afastou-se e foi em direção a porta da casa. Ao entrar, deparou-se comigo e com a . - O que vocês estão fazendo aqui? - Ela estranhou. - E por que essas malas? - Meg perguntou.
- Eu vou embora. - Eu expliquei na mesma hora.
- Por quê? - Meg arqueou uma das sobrancelhas.
- Porque eu não quero ser a segunda pessoa a socar a cara do hoje. - Eu fui sincera. - Por que não quer? Eu apoio totalmente! - Meg ficou empolgada, fazendo com que a risse.
- Ele merecia mesmo, mas eu não quero mais perder o meu tempo. - Eu sorri.
- Mas você vai agora? - Meg estranhou por causa do horário.
- Nova York fica perto daqui. - Eu argumentei. - Além disso, não está tão tarde assim. - Eu olhei no relógio, que marcava 9 horas da noite. - Ele ainda está lá fora, né? - Eu fiz careta.
- Eu estava dando uma olhada nos ferimentos dele. - Meg rolou os olhos.
- E ele vai sobreviver? - Eu brinquei aos risos.
- Ele acha que não. - Meg também riu. - Eu vou pegar um pouco de gelo. - Ela apontou na direção da cozinha.
- Eu pego. - tentou ajudar de alguma forma.
- E o seu irmão? Está chorando no quarto? - Meg perguntou, rindo.
- Eu conversei com ele. Estamos bem, mas… ele continua furioso com o . - Eu disse.
- Drama. - Meg fez careta.
- Aqui está. - voltou e entregou um saquinho com gelo nas mãos dela.
- Obrigada. - Meg piscou para a amiga. - Eu vou lá, antes que ele chame uma ambulância. - Ela debochou.
- Hey! - Eu a chamei, antes que ela se afastasse. - Vou aproveitar que você está cuidando dele e vou sair e ir pro meu carro. Depois, diga ao e ao que eu mandei um beijo para eles. - Eu queria evitar o de qualquer jeito.
- Eu falo. - Meg afirmou com a cabeça. - Nos vemos em Nova York. - Ela aproximou e me abraçou, despedindo-se.
- Obrigada por cuidar dele. - Eu agradeci, terminando o abraço.
- Tudo bem. - Ela negou com a cabeça. - Nos avise quando chegar em casa. - Meg pediu segundos antes de sair pela porta.
- Vou aproveitar que ela está cuidando dele e vou sair. - Eu disse para a .
- Eu te ajudo com a mala. - sorriu.
- Obrigada por tudo. - Eu a abracei antes que seguíssemos com o plano.
- Espero te ver em breve. - beijou carinhosamente o meu rosto.
- Eu também. - Eu devolvi o beijo, olhando para ela com carinho.
- Eu pego isso. - pegou uma das malas. Eu peguei a minha bolsa e algumas outras sacolas. A chave do carro já estava na minha mão. Ao sair para o lado de fora da casa, eu fui andando rapidamente em direção ao carro. Eu nem sequer olhei para a direção em que o estava.
- Devagar, garota! Está maluca? - reclamou da agressividade da Meg ao colocar o gelo em seu rosto.
- Para de choramingar! - Meg disse, sem paciência. - Segura esse gelo ai! Depois, vai ao banheiro e passa uma água nessa boca. - Ela disse.
Ouvi as reclamações dele, mas mesmo assim continuei ignorando-o completamente. Destravei o carro e abri o porta-malas, colocando todas as minhas coisas lá dentro. O barulho do alarme chamou a atenção do , do e, infelizmente, a do . Eles se viraram e olharam para a minha direção. e ficaram extremamente confusos. Eles não entendiam porque eu estava indo embora. me acompanhava com o olhar.
- O que ela está fazendo? - perguntou, perplexo.
- Voltando pra casa. - Meg respondeu a verdade.
- Fugindo, como sempre! Não me surpreende nem um pouco. - negou com a cabeça, visivelmente irritado.
- Obrigada de novo, . - Eu agradeci mais uma vez ao fechar o porta-malas. - Explica para eles depois. - Eu pedi mais uma vez. Eu me referia ao e ao .
- Pode deixar. - afirmou com a cabeça. Olhei a casa pela última vez e fui em direção à porta do carro.
- Segura isso. - entregou o saquinho de gelo nas mãos do e saiu, andando na direção do meu carro.
- ! - não aguentava mais confusão.
- Você está realmente fugindo? - gritou na minha direção. Eu ignorei completamente e abri a porta do carro. - Você é inacreditável! - Ele disse, me olhando através da janela do carro. - Qual o motivo da fuga desta vez? Medo de enfrentar os seus problemas ou está só querendo que eu vá atrás de você como eu fiz da última vez? - Continuei ignorando, enquanto colocava o cinto de segurança. - Cuidado com a estrada dessa vez! Eu não vou estar perto para te salvar de novo, mas você pode me ligar, se você precisar. - Ela referia-se ao meu segundo acidente, que aconteceu no mesmo dia em que o descobriu que estávamos juntos. Eu liguei o carro.
- Você é a última pessoa para quem eu ligaria. - Eu fiz questão de olhar na cara dele ao dizer aquilo. Saí com o carro antes que ele pudesse responder qualquer coisa.
- Garota mimada! - esbravejou, reaproximando-se dos amigos e pegando o gelo da mão de .
- Falou o que não devia… - Meg provocou.
- Dá um tempo! - respondeu, irritado. - Por que você ainda está aqui? Você já viu os meus ferimentos. Já pode parar de fingir que se importa. - Ele disse, impaciente.
- Cansei de fingir mesmo. - Meg aproximou-se repentinamente, tirou o saquinho de gelo da mão do e o jogou na direção das árvores. - O gelo também fazia parte do meu fingimento. - Ela afastou-se com um sorriso sarcástico. a fuzilou com os olhos.
- Como você aguenta, ? - olhou para o amigo, incrédulo.
- Ela não é assim. Você tem o dom de despertar esse lado maligno dela. - tentou segurar o riso.
- Quem deveria ter ido embora sou eu. - estava muito estressado com tudo o que tinha acontecido. Ele afastou-se dos amigos e foi em direção a casa. Ele precisava pegar mais gelo e precisava ficar sozinho.
Eu realmente não estava arrependida por ter voltado para casa. Eu sei que tomei a melhor decisão, mas isso não fazia com que eu me sentisse menos frustrada com o que aquele feriado tinha se tornado. Eu só não estava arrependida por ter ido até a casa do lago, pois eu tinha tido muitos momentos bons com os meus amigos. Por eles, o feriado prolongado valeu muito à pena. realmente tinha estragado o que poderia ser o final de semana perfeito. Eu ficava muito aborrecida só de pensar no nome dele.
Dirigi tranquilamente até Nova York. Enquanto eu estacionava o meu carro na garagem da minha casa, meus olhos curiosos tentavam adivinhar se o Mark estava em casa. A luz acesa da casa respondeu o que eu tanto queria saber. Desliguei o carro e nem sequer tirei a mala de dentro do porta-malas. Eu comecei a andar na direção da casa dele de forma extremamente espontânea. Eu não premeditei nada.
Até então, o meu plano era chegar em casa, comer qualquer coisa e dormir, mas alguma coisa dentro de mim falou mais forte quando eu botei os meus olhos na casa do Mark. Era como se eu precisasse vê-lo. Bati na porta duas vezes seguida e ninguém atendeu. Eu estava prestes a bater na porta pela terceira vez, quando ela foi repentinamente aberta. Mark estava em minha frente e seus olhos demonstraram surpresa ao me ver, mas os lábios sorriram espontaneamente. Não deixei que ele dissesse nada e simplesmente me aproximei e coloquei os meus braços em volta dele. Agora, eu sabia que era atrás do abraço dele que eu tinha vindo. Mesmo sem entender nada, ele me acolheu e me apertou. O abraço foi longo, mas mantivemos o silêncio enquanto ele durou.
- Está tudo bem? - Mark me olhou, preocupado.
- Agora está. - Eu respondi ao sorrir fraco.
- Entra. - Ele deu passagem para que eu entrasse e eu não pensei duas vezes.
- Desculpa ter vindo tão tarde. - Eu me sentia um pouco mal pelo horário.
- Nunca é tarde pra você! Você sabe. - Mark negou com a cabeça. - Eu estou feliz que você esteja aqui, mas… você não deveria estar viajando? - Ele me olhou, confuso.
- Eu deveria, mas… algumas coisas aconteceram e eu preferi voltar pra casa. - Eu me sentei no sofá e ele sentou-se na mesinha de centro da sala, ficando de frente pra mim.
- O que aconteceu? - Mark queria entender.
- Eu briguei com o . - Eu rolei os olhos ao falar o nome dele.
- Não me diga. - Mark ironizou, me arrancando um sorriso.
- Para. - Eu tentei não rir.
- Sobre o que foi dessa vez? - Mark manteve o sorriso de deboche.
- Sobre ele bancando um adolescente de 15 anos. - Eu fiz careta.
- Achei que ele só fizesse isso comigo. - Mark fingiu estar surpreso. - Eu tenho bastante experiência nesse assunto. - Ele me fez rir novamente.
- Então, por favor, me esclarece uma dúvida: É normal sentir vontade de matar ele todas as vezes? - Eu perguntei.
- É super normal! Não se preocupa. - Mark manteve o tom de brincadeira. - Dar um soco as vezes mata um pouco dessa vontade, mas eu não faço isso com tanta frequência. - Ele completou.
- O soco ele levou, mas infelizmente não foi de mim. - Eu lamentei.
- Você disse que o levou um soco? - Mark achou que não tivesse escutado bem.
- Dois socos, na realidade. - Eu o corrigi.
- Quem foi o sortudo? - Mark ficou curioso e eu voltei a rir.
- Não dá pra falar sério com você! - Eu tentei me manter séria.
- Eu só estou brincando. - Mark negou com a cabeça, enquanto sorria. Ele adorava me fazer rir. - Me conta. Que história é essa de dois socos? - Ele perguntou mais sério.
- Foi o . - Eu fiz careta.
- O seu irmão deu dois socos no meu irmão? - Mark queria ter certeza que tinha escutado direito.
- Deu. - Eu confirmei. - O descobriu tudo. - Eu não dei detalhes, pois achei que ele entenderia do que eu estava falando.
- Tudo? - Mark não tinha entendido.
- Tudo! - Eu afirmei, arqueando ambas as sobrancelhas.
- Ah… não. - Mark fez cara de dor. - Como ele descobriu? - Ele perguntou.
- Eu… contei. - Eu disse com um sorriso forçado.
- Então, você e o brigaram e você dedurou ele. - Mark deduziu.
- Você falando faz tudo soar muito mais vingativo do que realmente é. - Eu mordi o lábio inferior, tentando evitar o sorriso.
- E não foi por vingança? - Mark perguntou com desconfiança.
- Vingança foi um dos meus motivos, mas não foi o principal. - Eu expliquei. - O motivo principal foi o meu cansaço de sustentar essa mentira e de bancar a boba e inocente pra todo mundo. - Eu complementei.
- Eu entendo o que você está dizendo. - Mark, como sempre, foi compreensivo.
- Você entende? - Eu fiquei até um pouco surpresa. - O sempre morreu de medo que o acabasse descobrindo tudo. Ele já me fez passar por várias situações ridículas por causa disso. - Eu revirei os olhos, irritada só de lembrar. - Como vocês podem ser tão diferentes? Como vocês podem ter níveis de maturidade tão diferentes? - Eu perguntei.
- Por causa de toda a situação com a minha mãe adotiva e… a falta de um pai, eu fui obrigado a amadurecer mais cedo do que a maioria dos outros caras. Não foi por opção minha, mas aconteceu. - Mark ergueu os ombros, enquanto explicava, todo sério.
- Eu admiro muito você por isso. - Eu disse com um olhar de admiração.
- Você sempre diz isso. - Mark sorriu, sem jeito.
- Eu não sei porque, mas todas as vezes que eu passo algum tempo com o , eu acabo percebendo que te admiro muito mais do que eu imaginava. - Eu mantive o olhar de admiração. - Pode até soar um pouco estranho, mas… em cada briga ou em cada estupidez que o faz, independentemente da situação ou de onde eu esteja, por um milésimo de segundo, eu penso: ‘Se fosse o Mark, não estaríamos brigando. Se fosse o Mark, eu não estaria passando por isso.’ - Eu fui completamente honesta.
- Nós somos irmãos, mas somos muito diferentes. Nós pensamos diferente. Nós agimos diferente. - Mark explicou-se, tentando não demonstrar tanta empolgação com o que ele tinha ouvido de mim.
- Eu sei. - Eu concordei. - E essa é a melhor parte. Acredite. - Pisquei um dos olhos para ele antes de me aproximar e abraçá-lo pela segunda vez. Dessa vez, eu estava me despedindo. - Obrigada por sempre estar aqui, me esperando de braços abertos. - Beijei carinhosamente o seu rosto. - Saber que eu tenho alguém sempre pronto para me resgatar do pior é a melhor sensação do mundo. - Trocamos olhares por alguns momentos. Tive a impressão de que ele estava querendo me dizer alguma coisa e ele realmente estava. Mark adoraria me olhar nos olhos naquele momento e dizer que estava mais apaixonado do que nunca, mas ele não podia. Ele não podia por inúmeros motivos, sendo que o principal deles exigia uma grande decisão de sua parte.
- Boa noite. - Mark sorriu fraco, deixando claro que não tinha mais nada a dizer. Confesso que fiquei um pouco desapontada. Eu não me lembro de ter desejado tanto que ele se declarasse quanto eu desejei naqueles últimos segundos. A nossa relação mudou muito nos últimos tempos e eu tinha certeza de que eu nunca tinha sentido algo tão forte por ele.
- Boa noite. - Eu tentei sorrir para não demonstrar a minha decepção.
Caminhei de volta para casa sentindo um enorme conflito em meu peito. Mark e eu já tivemos sim os nossos momentos, mas as coisas nunca estiveram tão claras pra mim quanto estavam agora. Houve momentos em que eu me senti mal por não corresponder com a mesma intensidade os sentimentos que ele tinha por mim. Agora, eu me sentia mal por não saber lidar com a magnitude desses sentimentos, que acabaram me pegando de surpresa. Eu não sabia que podia sentir algo tão forte por ele.
O conflito interno do Mark era muito maior do que o meu. Além de seus sentimentos, ele tinha muitas decisões para tomar. Optar por uma coisa tão significava pra ele e ter que desistir de outra que era tão importante era extremamente difícil para ele. Mark realmente não sabia o que fazer.
A vida do também não estava nada fácil. Depois dos socos que havia levado do seu melhor amigo, de ter perdido sua garota e ter o seu final de semana arruinado, ele não via outra alternativa senão ir embora. não queria estragar o resto do feriado de todos os seus amigos e decidiu que a melhor coisa a ser feita era ir embora. Mesmo estando tarde, ele arrumou as suas coisas e as colocou em seu carro. e até tentaram fazê-lo ficar, mas foi inútil. estava pronto para ir embora, mas decidiu conversar pela última vez com o seu melhor amigo. Foi até o quarto do , bateu algumas vezes na porta e não foi atendido, mas isso não o impediu de dizer o que ele tanto queria dizer.
- Eu sei que você está me ouvindo, , e, por isso, eu vou te dizer o que eu tenho pra te falar daqui mesmo. - gritou, encarando a porta do quarto. também encarava a porta do outro lado, mas manteve-se deitado em sua cama. - Foram mais de 8 anos de amizade e eu tenho certeza que você me conhece o suficiente para saber que eu jamais faria nada que pudesse te decepcionar ou que pudesse prejudicar a nossa amizade. - Ele fez uma breve pausa. - Só você e eu sabemos tudo o que passamos juntos e tudo o que já fizemos um pelo outro. Todas as brigas, os trabalhos, as suspensões na escola e o nosso primeiro jogo no time da escola. - parecia estar sendo tocado pelas palavras do amigo. Ele levantou-se da cama e continuou encarando a porta de braços cruzados. - Se mesmo sabendo de tudo isso, você deixar que a nossa amizade acabe desse jeito, eu vou entender. - suspirou. - Mas eu confesso que vou ficar bastante decepcionado. Não decepcionado com você porque, como eu já disse, eu sei que eu errei e já nem sei mas como me desculpar por isso, mas sim decepcionado com toda essa situação. Nossa amizade sempre foi o tipo de coisa que eu sabia que jamais perderia. Sempre foi algo muito certo na minha vida. Eu esperava que mesmo depois de tudo, nos esforçaríamos um pouco mais para mantê-la. - Ele não sabia qual estava sendo a reação do , mas ele estava feliz por ter conseguido dizer aquelas palavras. - Eu realmente espero que essa não tenha sido a nossa última conversa. - finalizou. Esperou poucos segundos para ver se a porta seria aberta, mas foi em vão. Com isso, ele desistiu e deu poucos passos para longe da porta, que acabou sendo abruptamente aberta segundos depois.
- Presta bem a atenção, porque eu não vou te dar outra chance dessa. - gritou no meio do corredor. - Nunca, jamais… faça nenhum comentário sobre sexo na minha frente, especialmente se for sobre a minha irmã. - Ele decretou. - E se um dia eu flagrar alguma coisa, qualquer coisa, é melhor você mudar de país porque eu não vou sossegar até ter certeza de que você nunca mais fará sexo na sua vida. - disse com tanta ira, que chegou a deixar o perplexo.
- Mas… - bem que tentou argumentar.
- Não! Não fale. - apontou o dedo na direção do amigo. - Isso, meu amigo, sou eu lutando MUITO pela nossa amizade. - Ele cerrou os olhos. - Isso é, de longe, a melhor e maior coisa que eu já fiz por você. - suspirou. - Agora, dá logo o fora daqui, que eu já to com vontade de te dar outro soco. - Ele fez careta.
- Valeu mesmo, cara. - sorriu, feliz com a atitude do amigo. - Eu te amo! - Ele disse apenas para debochar do amigo.
- 10 segundos pra sair. - fechou os olhos, tentando manter a paciência.
- Estou indo! - riu, afastando-se do amigo e saindo do seu campo de visão.
Mesmo sabendo que o estava muito bravo e que demoraria algum tempo para superar quele trauma, estava muito mais aliviado por saber que a amizade deles continuava intacta. Ele despediu-se de todos os outros amigos, entrou em seu carro e seguiu o seu caminho para Nova York. Mark não estava esperando pela volta dele, mas certamente estaria acordado. Pelo menos, era isso o que ele achava.
- O que aconteceu com esse cara? - estranhou o fato da casa do irmão estar com as luzes apagadas.
estacionou o carro e dirigiu-se até a porta de entrada. Pensou em bater, mas preferiu não acordar o irmão. Usou a sua própria chave para abrir a porta e entrou. O silêncio da casa demonstrava que o Mark realmente estava dormindo, mas isso não o impediu de tirar as suas malas de dentro do carro e levá-las para dentro da casa. Mesmo sendo cuidadoso para não fazer barulho, acabou acordando o Mark, que pulou da cama, imaginando que a casa estava sendo assaltada ou qualquer coisa do tipo. Pegou uma de suas armas escondidas no quarto e a levou com ele para fora do quarto. Habilidoso como sempre, Mark fez todo o trajeto até a sala sem ser notado. Ao chegar lá, ele teve certeza que havia alguém na casa. O barulho vinha da cozinha. Com a arma já destravada e apontada para frente, ele seguiu em direção a cozinha e deparou-se com a porta da geladeira aberta. De onde ele estava, Mark não conseguia ver quem estava atrás da porta e esperou até o momento que a porta foi fechada para atacar. Quando o fechou a geladeira, deparou-se com a arma e com o seu irmão.
- Ei! Ei! - ergueu as mãos, tentando acalmar o irmão mais velho.
- Meu Deus, ! - Mark abaixou a arma na mesma hora, contrariado. - Você estava a 3 segundos de morrer. - Ele negou com a cabeça, ainda tenso.
- Eu só estava procurando alguma coisa pra comer. - se justificou.
- Mas o que você está fazendo aqui? Você não ia voltar amanha? - Mark perguntou, irritado.
- Eu ia, mas aconteceram uns problemas e eu acabei levando uns socos. - rolou os olhos.
- É… eu fiquei sabendo. - Mark afirmou.
- Ela já veio aqui contar pra você? Aposto que ficou falando mal de mim! - falou, irritado.
- Você dormiu com a irmã dele. O que você esperava? - Mark não lamentou nem um pouco.
- Não é tão simples assim. - fez careta. - Você é o meu irmão e a também fez sexo comigo. Por que não vai tirar satisfações com ela também? - Ele argumentou mesmo sabendo que as situações eram bem diferentes. Ele só queria ter um argumento.
- Não acredito que você me acordou para que eu ouvisse uma coisa ridícula dessa. - Mark suspirou, impaciente.
- Eu não vou conversar com você sobre esse assunto, porque você vai querer ficar defendendo a e nós vamos brigar. - negou com a cabeça. - Me fala ai o que você fez nesse feriado. E a sua reunião tão importante no trabalho? - Ele perguntou, enquanto comia um pacote de biscoito que havia encontrado no armário.
- O que tem a reunião? - Mark arqueou a sobrancelha.
- Sobre o que era? - perguntou, curioso.
- E porque você acha que eu te contararia? - Mark cruzou os braços.
- É sigiloso, né? - sorriu, desconfiado. - Ainda não acredito que eu tenho um James Bond dentro de casa. - Ele brincou.
- Eu posso voltar a dormir, né? - Mark fez careta.
- Sinta-se em casa. - ironizou. Mark rolou os olhos.
- Tente não destruir a cozinha. - Mark disse, virando-se de costas. - Lembre-se de que os móveis e a geladeira não são comestíveis. - Ele gritou da sala.
- Boa noite, Markey! - respondeu, tentando retribuir o deboche.
Naquele domingo, eu finalmente tive a oportunidade que eu tanto esperei para dormir. Eu nunca tinha dormido tanto na minha vida. Foi tão maravilhoso, que eu mal tive tempo de ficar remoendo a raiva que eu estava sentindo do e nem para me preocupar com os sentimentos que eu comecei a sentir pelo Mark. Foi o tempo que eu precisei para colocar a minha cabeça em ordem novamente, porém a minha vida continuava uma bagunça.
A raiva era uma das coisas que mais ajudavam o a não pensar em mim. Mark passou o dia todo fora por conta do seu trabalho e o acabou ficando sozinho, mas ele não teve um só momento de fraqueza. Mesmo estando tão próximo, ele não se lembrou de mim em nenhum momento daquele domingo. Pelo menos, não por enquanto.
O final do domingo se aproximava e o estava na frente da TV assistindo ao jogo do Yankees, como de costume. Ele esperava que fosse assistir ao jogo com o Mark, mas se contentou em assistir sozinho, depois que o irmão mais velho ligou avisando que chegaria em casa um pouco mais tarde do que o normal. O jogo já estava no fim e o Yankees estava perdendo. Tinha como aquela noite piorar? É claro que tinha! O celular dele tocou e foi só ver o nome do Steven no visor para que o seu domingo terminasse de vez. Ele hesitou bastante em atender, mas cedeu quando Steven ligou pela segunda vez seguida.
- O que você quer, Steven? - atendeu grosseiramente o celular.
- Ajuda… - A voz do pai estava tão fraca, que por pouco ele não tinha escutado. - Eu preciso… de… ajuda. - Ele disse com muita dificuldade. O tom de voz de Steven realmente preocupou o , que não esperava ficar tão nervoso, já que tratava-se do Steven.
- O que… - ficou tão em choque, que ele demorou poucos segundos para conseguir terminar a frase. - O que está acontecendo? - Ele perguntou momentos antes da ligação cair. - Steven! - gritou, angustiado. - Droga! - Ele esbravejou, sentindo-se na obrigação de fazer alguma coisa. Ele tinha recebido um pedido de ajuda. Como poderia ignorar?
não pensou duas vezes antes de vestir um casaco, pegar a chave de seu carro e ir às pressas até a casa do Steven. A reação do não o agradou, mas era algo mais forte do que ele. Algo que ele não conseguia controlar. Steven poderia ser a pior pessoa de todas, mas ele ainda era o seu pai. E se mesmo depois de tudo, aquele pedido de ajuda não passasse de uma brincadeira idiota, não responderia pelos seus atos.
Após dirigir o mais rápido que conseguiu, estacionou o seu carro em frente a casa do Steven e saiu rapidamente do carro, indo até a porta. As batidas na porta mais pareciam chutes de tão fortes que eram. Sem obter qualquer resposta, resolveu entrar na casa. Assim que entrou, avistou o seu pai caído no chão da sala. O coração dele quase saiu pela boca. Correu até o pai e ajoelhou-se no chão.
- Steven. - chamou por ele. - Steven! - Ele balançou o corpo do pai, fazendo com que ele abrisse os olhos repentinamente. Foi possível ouvir o seu suspiro de alívio.
- Eu… - Steven começou a dizer. - Não… - Ele tossiu com os olhos fechados. - Respirar. - Steven levou uma das mãos ao pescoço. Ele estava tentando dizer ao filho que estava com dificuldades para respirar.
- Eu vou chamar uma ambulância. - tirou o seu celular do bolso e começou a discar os números, mas Steven tirou o celular de suas mãos.
- Não. - Foi a palavra que o Steven conseguiu dizer em um tom de voz mais alto até o momento. - Eles não… podem saber… sobre mim. - Ele disse com dificuldade. - Ninguém pode saber. - Ele completou, fechando os olhos e tentando respirar com calma.
estava desesperado e não sabia o que fazer. O estado em que o Steven se encontrava deixava claro que ele não havia mentido sobre a doença nos pulmões. Mesmo sem entender absolutamente nada sobre medicina, sabia que o pai estava muito mal. Era desesperador ver alguém agonizando na sua frente sem poder fazer nada para ajudar. A ambulância não poderia ser chamada, pois Steven acabaria tendo que revelar seus dados pessoais e, com isso, descobririam a sua verdadeira identidade e saberiam que ele não tinha morrido. A situação era muto delicada.
- O que faço, então? - perguntou, nervoso.
- Nada. - Steven negou com a cabeça. - Eu só queria que você estivesse aqui quando… acontecesse. - Ele sorriu, olhando para o filho. A frase do pai só serviu para deixar o mais agoniado. - Eu tentei… ligar para o… seu irmão, mas ele não… - Steven negou com a cabeça. sabia exatamente o que o pai estava querendo dizer e um nó acabou se formando em sua garganta.
- Você me chamou até aqui para… te ver morrer? - A voz do ficou embargada no final da frase. Steven não conseguiu responder, pois teve uma nova crise respiratória, que acabou sendo muito pior do que a primeira.
foi obrigado a ver o pai se contorcer no chão. O corpo do Steven tremia e suas roupas estavam encharcadas de suor. Os olhos de se encheram involuntariamente de lágrimas, enquanto ele via a cena sem conseguir fazer nada para ajudá-lo. Lembrou-se de todos os anos em que ele desejou estar presente no que ele pensava ser os últimos segundos de vida do pai, quando aquele acidente aconteceu. Os últimos segundos eram reais dessa vez e o estava presente. O coração dele estava apertado e as mãos dele tremiam. Uma confusão de sentimentos e memórias levaram mais lágrimas até os seus olhos e o motivaram a tomar uma atitude. Apesar de toda a dor que o Steven já havia causado, não deixaria que o pai morresse. Não daquela maneira.
- Eu volto já. - olhou nos olhos do pai. - Aguenta, pai. - Ele pediu com tristeza. Era a primeira vez em meses que o o chamava de pai.
Steven ficou no chão, enquanto o levantava-se e saía da casa às pressas. Quando entrou no carro, segurou o volante e só então percebeu o quão nervoso e trêmulo ele estava. O nervosismo não o fez desistir. Ele precisava ajudar o seu pai, mas ele não conseguiria fazer isso sem ajuda médica. Ele precisava ir imediatamente para um hospital. Ele precisava de um médico e precisava de uma infraestrutura que só um hospital poderia fornecer a ele. Como o poderia mandá-lo para um hospital, sem que ninguém descobrisse a sua verdadeira identidade? Sem que todos, inclusive a sua mãe, soubessem que ele não havia morrido naquele acidente? não tinha as respostas destas perguntas, mas sabia exatamente para quem pedir ajuda.
Ao estacionar o carro em frente a minha casa, as luzes da casa demonstraram a ele que eu já estava dormindo, mas isso não o impediu de seguir em frente. As lágrimas ainda estavam presas nos olhos dele no momento em que ele bateu seguidas vezes na porta da minha casa. sabia que estávamos brigados, mas isso não fez a menor diferença para ele. Naquele momento de desespero, não existia amor próprio ou orgulho. só precisava ajudar o pai.
- ! - gritou da varanda da minha casa. Ele olhava na direção da minha janela, esperando que a luz do quarto se acendesse. - ! - Ele gritou novamente.
- Mas o que… - Eu me levantei da cama e deixei de lado o livro que eu estava lendo. Assustada, corri até a janela e ao abrir a cortina, vi o lá embaixo. Pensei mais de duas vezes se deveria descer ou não para abrir a porta. As batidas na porta demonstravam tanto desespero, que eu tive que descer. Alguma coisa muito ruim havia acontecido.
Antes de descer as escadas, vesti um longo casaco por cima do meu pijama. As batidas na porta continuavam e os gritos pelo meu nome também. Eu estava muito preocupada com o que poderia ser. e eu estávamos brigados. Ele não apareceria na minha casa daquela maneira se não fosse algo realmente urgente. As batidas na porta diminuíram, quando eu acendi a luz da sala. Eu abri a porta rapidamente e me deparei com um visivelmente angustiado e com olhos cheios de lágrimas. A breve troca de olhares que tivemos me fez ter certeza que algo muito ruim havia acontecido.
- Eu preciso da sua ajuda. - pediu com a voz embargada. - Por favor. - Ele me olhou com tristeza. - Me ajuda. - implorou, enquanto uma lágrima solitária escorria de um de suas olhos.
Capítulo 58 – Adeus
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- O que… - A tristeza nos olhos dele me deixaram tão preocupada, que eu não consegui completar a frase tão rapidamente. A princípio, eu achei que o motivo do desespero e da angústia dele era o Mark. Achei que algo pudesse ter acontecido com ele. - O que foi que aconteceu? - Olhei nos olhos do , sentindo meu coração estremecer.
- Meu pai. - A voz continuava embargada. - Eu acho que ele está morrendo. - Ele completou. Aliviada não seria a palavra certa para me descrever naquele momento. Eu voltei a respirar normalmente e o meu coração se acalmou, porém ter o chorando bem ali na minha frente fez com que a tristeza que eu sentia permanecesse a mesma.
- Como… - No primeiro momento, eu não entendi como eu poderia ajudar. Meus olhos foram imediatamente até o carro do , que estava estacionado em frente a minha casa. Eu imaginei que o Steven estivesse lá. - Onde ele está? - Eu perguntei, voltando a olhá-lo.
- Ele está na casa dele. Ele… não quer ir para um hospital, porque as pessoas vão descobrir a verdade sobre ele. - começou a falar tudo de uma só vez. - Ele me ligou e disse que precisava de ajuda. Eu cheguei e ele estava… - Ele negou com a cabeça. - Ele estava agonizando no chão e eu… eu não soube como ajudá-lo. Eu não sei como… - ergueu os ombros. Os olhos dele continuavam marejados.
- Calma. - Eu o interrompi ao perceber o quão nervoso ele estava. - Ele estava agonizando como? - Eu pedi mais detalhes.
- Ele… não conseguia respirar. - tentou engolir o choro. - Ele me disse há alguns dias que tinha uma doença nos pulmões. Eu… - Ele me olhou, perdido. - Eu achei que ele estava mentindo. Eu não acreditei nele. O Mark não acreditou nele. - negou com a cabeça.
- Hey. - Eu chamei por ele, colocando uma das minhas mãos em seu ombro. - Olha pra mim. - Eu pedi e ele atendeu o meu pedido. Olhei intensamente nos olhos dele e em poucos segundos eu consegui ver algo que eu tinha visto poucas vezes naqueles olhos: medo. Ele estava assustado de uma maneira que eu nunca tinha visto. - Você precisa se acalmar, está bem? - Eu fiz um novo pedido.
- É o meu pai, ). - tentou se justificar. - Ele não é a melhor pessoa do mundo, mas ele ainda é o meu pai e ele está morrendo. - Ele complementou. - Eu já passei por isso uma vez e não tive a chance de fazer nada para tentar ajudá-lo. Eu não quero que isso aconteça de novo. - Eu sabia muito bem o quanto ele se culpava por aquilo e também sabia que, mesmo que indiretamente, eu estava envolvida nesse trauma dele. Ele me salvou naquela noite. - Olha, eu sei que você tem todos os motivos do mundo para não ajudá-lo. Eu sei disso! - enfatizou. - E eu também sei que é pedir muito, especialmente para alguém que sofreu tanto por causa dele, mas… - Ele hesitou por alguns momentos. - Eu não sei se tenho o direito de te pedir isso depois de tudo o que aconteceu, mas se ainda existe alguma boa lembrança de tudo o que nós vivemos, eu peço que faça isso por mim. Não faça por ele. Faça por mim. - Os olhos tristes dele imploravam. - Ajude ele, por favor. - Não importa quantas brigas nós tivermos, vê-lo daquele jeito sempre vai me destruir.
- Eu quero te ajudar. - Olhei nos olhos dele novamente. - Você sabe que eu jamais negaria qualquer tipo de ajuda para alguém, especialmente se essa pessoa for você, mas… - Eu ergui os ombros. - , eu sou só uma estudante de medicina. Eu não sei qual a doença que ele tem e nem saberia como ajudar o seu pai. Eu sinto muito, mas eu não sei como ajudar. - Eu estava me sentindo muito mal por dar aquela notícia a ele. Eu queria muito ajudá-lo.
- O hospital. - me olhou de uma maneira diferente.
- Seria muito bom se ele fosse para o hospital. Os médicos lá são maravilhosos e poderiam tentar ajudá-lo, mas se o Steven se recusa a ir ao hospital. - Eu ergui os ombros.
- Ele só está se recusando a ir ao hospital por causa dos documentos. Se ele apresentar os verdadeiros documentos dele, as pessoas vão saber que, na verdade, ele não morreu. - explicou, sem dizer muito.
- Os documentos são necessários para o preenchimento da ficha do paciente. É um procedimento padrão do hospital. - Eu concordei, sem entender onde ele estava querendo chegar.
- E se os dados colocados na ficha do paciente fossem falsos? - sugeriu, esperando pela minha reação. - Você acha que é possível? - Ele perguntou.
- Você está me pedindo para falsificar os dados da ficha do Steven? - Dizer aquilo em voz alta soou como um enorme absurdo pra mim. Seria extremamente antiético e irresponsável da minha parte. Além disso, se o hospital descobrisse, eu poderia ser punida.
- Não. - negou com a cabeça. - Você tem toda a razão. Isso é… ridículo. É uma péssima ideia. - Ele xingou a si mesmo mentalmente por ter dado aquela ideia tão egoísta. Ele estava desesperado demais para pensar. - Eu… não sei o que fazer. - ergueu os ombros, enquanto negava com a cabeça. - Eu sinceramente não sei o que fazer. - Ele disse, deixando de me olhar e virando-se de costas. Ele sentou-se em um dos degraus da varanda.
Eu não podia ser hipócrita e fingir que eu não me importava. É claro que eu me importava. Era o ! O mesmo cara que eu tenho amado todos esses anos e que já fez inúmeras coisas por mim. Ele já havia me salvado tantas vezes. Ele já havia me ajudado dezenas de vezes sem nem pensar nas consequências. Nós já havíamos passado por tantas coisas juntos. Nós tínhamos uma história. Eu não conseguia lidar com o fato de que eu podia fazer algo por ele e eu não faria.
- … - Eu disse, me sentando ao lado dele. Olhei para ele e vi seus olhos marejados encararem o chão. Ele estava completamente perdido e desesperado. Ele não sabia o que fazer. - Eu… - Eu não sabia o que dizer.
- Está tudo bem. - virou-se para me olhar e ainda tentou sorrir. Eu sabia que ele tinha feito isso apenas para me acalmar. - Eu sinto muito por ter aparecido na sua porta esse horário e ter jogado tudo isso em cima de você. - Ele passou suas mãos pelos olhos, tentando eliminar as lágrimas acumuladas. - Eu acho que fiquei muito nervoso e… vim até a única pessoa no mundo que eu sabia que seria capaz de me acalmar. - Ele tentou se justificar. - Obrigado por ter me recebido. - levou sua mão até a minha e a segurou por segundos, antes de levantar-se.
Eu me sentia uma completa inútil. Eu me sentia impotente. Eu me sentia a garota egoísta, que tantas vezes o disse que eu era. Egoísta sim, pois eu não tinha sido capaz de arriscar o meu trabalho para salvar a vida do pai dele, quando ele havia arriscado a sua própria vida para salvar a vida do meu pai há algumas semanas. Muito egoísta sim por não estender a mão a alguém que eu me importava tanto, mesmo sabendo que eu era a única pessoa que poderia estendê-la. Talvez, aquela seria a melhor decisão a ser tomada, mas se eu a tomasse, não seria eu.
- Espera. - Eu me levantei e o vi parar e virar-se para me olhar. - Eu vou ajudá-lo. - Eu afirmei, parando na frente dele.
- Não. - negou imediatamente. - Você não pode… - Ele tentou me fazer desistir.
- Eu não me importo. - Eu o interrompi. - Não importa o que você diga, eu não vou virar as costas pra você. - Eu estava decidida, mas a expressão no rosto dele demonstrava que ele ainda não concordava com aquilo. - Você já fez isso por mim, lembra? - Poucas lágrimas alcançaram os meus olhos, enquanto eu mencionava o fato de ele já ter salvado a vida do meu pai. - Por favor, me deixe retribuir. - Um fraco sorriso surgiu no canto do meu rosto quando eu terminei a frase. Ele negou incessantemente com a cabeça e a abaixou, deixando de me olhar. Levou uma de suas mãos até a cabeça, bagunçou o seu cabelo e depois a desceu até o seu rosto. Os dedos pressionaram os seus olhos, tentando evitar que novas lágrimas escorressem de seus olhos. Ele não queria ter que aceitar aquela ajuda, mas ele sabia que não tinha outra opção. - Vai ficar tudo bem. - Eu quis consolá-lo. Me aproximei e coloquei meus braços em volta do pescoço dele. Ele relutou algum tempo, antes de ceder ao meu abraço. me abraçou tão forte, que me fez perceber o quanto ele precisava daquele abraço. Os dedos dele se entrelaçaram no meu cabelo. Eu consegui ouvir a respiração trêmula dele. - Ele vai ficar bem. - Eu disse assim que terminei o abraço. Fiz questão de dizer aquilo olhando nos olhos dele. - Você confia em mim? - Toquei o rosto dele, quando percebi que ele ainda mantinha-se muito pessimista.
- Muito. - afirmou com a cabeça com um fraco e emocionado sorriso.
- Certo. - Devolvi o sorriso, tentando mantê-lo calmo. - Me dê um minuto para trocar de roupa. Nós vamos até a casa do Steven e de lá ligamos para a ambulância. É melhor que eu esteja lá quando a ambulância chegar. - Eu disse e o vi apenas afirmar com a cabeça.
Apesar de parecer tão errado e tão estúpido da minha parte, eu estava muito feliz com o que eu estava fazendo. Eu não estava fazendo isso pelo Steven. Eu estava fazendo isso pelo , que não merecia perder o pai novamente. Eu me lembrava muito bem de como ele se culpava por não ter tido a oportunidade de ajudar o Steven no dia que aquele acidente aconteceu. Eu não podia deixar que ele voltasse a se sentir daquela maneira pelo resto da vida dele. Além disso, eu também estava fazendo isso pelo Mark. Apesar de tentar demonstrar a todo o custo o quanto ele não se importa com o pai, eu sabia que ele se importava. Eu sei que, para ele, perder outra pessoa vai ser terrível. Querendo ou não, e Mark tinha o sangue do Steven em suas veias. Eles eram família! E a maioria dos integrantes dessa família significava o mundo pra mim.
Enquanto eu terminava de me arrumar, aproveitou para ligar para o Mark e avisá-lo sobre tudo o que estava acontecendo. Depois de muito insistir, Mark finalmente atendeu o telefone e recebeu a notícia. Não dava para dizer que ele ficou desesperado, mas também não dava para dizer que ele não ficou preocupado. avisou que ele seria levado para o hospital em que eu trabalhava e Mark disse que o encontraria lá.
Já vestida, desci para o primeiro andar da casa e me encontrei com o do lado de fora da casa. Tranquei a porta da casa e seguimos juntos até o seu carro. Ele dirigiu o mais rápido que conseguiu até a casa do pai. Ele estacionou o carro e para a minha surpresa, manteve-se atrás do volante. Fiquei me perguntando se ele não desceria do carro.
- Você não vai descer? - Eu perguntei, virando o meu rosto para olhá-lo.
- E se ele… - não quis terminar a frase, mas eu entendi exatamente o que ele quis dizer. - Eu não quero ver. - Ele negou com a cabeça, encarando o volante.
- Eu vou até lá. - Eu não podia julgá-lo por aquilo. Eu abri e porta e saí do carro. - Liga para o hospital e peça uma ambulância. Fala que é urgente. - Eu pedi, olhando através da janela do carro.
- Eu vou ligar. - pegou rapidamente o seu celular e começou a discar os números.
Eu ainda não era uma médica formada, mas aquele tipo de situação já havia se tornado um pouco comum para mim. Apesar de não exercer a minha tão sonhada profissão, eu já havia presenciado muitas coisas estagiando naquele hospital. Porém, aquele momento em específico me deixou sim um pouco nervosa. Era o pai do e do Mark ali dentro. Ele tinha que estar vivo! Ao chegar na porta da casa, entrei sem hesitar um só segundo. Ele ainda estava caído do chão, mas ele não estava sozinho. Dois de seus capangas o cercavam e pareciam um pouco aflitos com a situação.
- Afastem-se. - Eu pedi para que eu pudesse me aproximar.
- Você? - Um dos capangas perguntou, estranhando a minha presença.
- Ela está estudando para ser médica. Lembra? - O segundo capanga sussurrou para o outro, mas eu consegui ouvir.
- Ele está morto? - Perguntaram, preocupados. Eu me ajoelhei ao lado do Steven e percebi que ele estava desacordado. Chequei o seu pulso na mesma hora e consegui sentir pouquíssimos batimentos cardíacos.
- Ele ainda está vivo. - Eu suspirei em voz alta. Fiquei de pé novamente e troquei olhares com os dois capangas. Eles me assustavam bastante. Eu não queria ficar sozinha com eles e, por isso, foi até a porta e fiz sinais com as mãos para o para que ele soubesse que o seu pai ainda estava vivo. Extremamente aliviado e esperançoso, saiu do carro e andou rapidamente na minha direção.
- Ele ainda está vivo? - perguntou em meio a um sorriso, incrédulo.
- Está. - Eu sorri para ele ao dar a boa notícia.
- Eu nem acredito. - passou por mim e entrou na casa. Aproximou-se de seu pai e parou ao lado dele, ainda de pé.
- A ambulância tem que chegar logo ou ele não vai aguentar por muito tempo. - Eu disse, olhando para o , que estava de costas pra mim.
- Ambulância? - Um dos capangas perguntou, assustado. os olhou pela primeira vez naquela noite. Ele nem tinha notado a presença deles ali.
- O que vocês estão fazendo aqui? - encarou ambos.
- Nós moramos aqui, garoto. - O capanga maior respondeu.
- Vocês chamaram uma ambulância? Ele não pode ir para um hospital. - O outro argumentou, irritado.
- Ele tem que ir para um hospital e ele vai! - afirmou com autoridade. - E se algum dos idiotas tiver algum problema com isso, é só dizer e nós resolvemos. - Ele enfrentou os dois caras que tentaram intimidá-lo.
- . - Eu o puxei pelo braço e o afastei dos dois desconhecidos. O barulho da sirene da ambulância foi o que evitou maiores problemas. Fiquei extremamente aliviada ao ouvi-lo.
- Vamos dar o fora. - Um dos capangas se intimidou com a chegada da ambulância. Eles não queriam ser vistos. O outro capanga hesitou algum tempo antes de desistir de enfrentar o e se afastou.
- É por aqui. - Eu gritei para o motorista da ambulância e seus auxiliares. Eles correram na minha direção e entraram na casa.
- Qual o problema? - Um dos enfermeiros perguntou, enquanto os outros dois colocavam o Steven em uma maca.
- Problemas respiratórios. Os batimentos já estão bem fracos. - Eu resumi o máximo que eu consegui.
- Depressa. - O enfermeiro pediu aos outros ao constatar que o caso realmente era grave. e eu fomos junto com eles até o lado de fora da casa e até a ambulância.
- Eu vou com eles. - Eu disse, olhando para o . Com os olhos, eu tentei dizer a ele que era melhor que eu fosse na ambulância.
- Eu vou logo atrás. - afirmou com a cabeça, demonstrando que havia entendido.
Depois de entrar na ambulância, as portas foram fechadas e ela foi guiada às pressas. De dentro da ambulância, eu consegui perceber que o carro não parou sequer em um semáforo. O enfermeiro sentado a minha frente já tinha feito diversos procedimentos com o Steven, que continuava desacordado. Ele respirava com a ajuda dos aparelhos.
A ambulância chegou no hospital e dirigiu-se imediatamente para a área de emergências. Obviamente, o não pode acompanhar a ambulância e teve que deixar o seu carro no estacionamento do hospital. Eu acompanhei o Steven até a porta de entrada da UTI. Os enfermeiros não me deixaram passar dali. Eu sabia que os médicos teriam muito trabalho com o Steven e, por isso, era fácil concluir que demoraria para termos notícias. Com isso, decidi que o melhor seria procurar o para tentar tranquilizá-lo.
Mesmo se esforçando bastante, Mark não conseguiu chegar ao hospital tão rápido quanto ele gostaria. Ele teve que terminar um de seus treinamentos antes de abandonar o trabalho. Deixou o carro no estacionamento do hospital e dirigiu-se à sala de espera, que era um lugar que ele conhecia muito bem. Mark acabou encontrando o irmão sentado em uma das cadeiras.
- ! - Mark chamou por ele ao se aproximar.
- Oi, Mark. - não tinha notado a sua presença desde então.
- O que aconteceu? - Mark queria saber os detalhes.
- A doença que o Steven falou que tinha... - negou com a cabeça. - Era verdade. - Ele completou.
- Como é que você sabe? Ele… pode estar fingindo tudo isso. - Mark procurou a resposta mais fácil, já que era difícil demais para ele reconhecer que o Steven não tinha mentido e, consequentemente, não tinha se recusado a fazer a doação ao por vontade própria.
- Ele quase morreu nos meus braços. - achou que suas palavras bastariam. - Ele me ligou para pedir ajuda. Eu fui até lá e o encontrei no chão. Ele mal conseguia respirar. - Ele detalhou o ocorrido.
- Encontrei vocês. - Eu me aproximei sorrateiramente de ambos. Eles me olharam.
- Como ele está? - perguntou na mesma hora.
- Eu não sei dizer com certeza. Levaram ele pra UTI e não me deixaram entrar. - Eu ergui os ombros. - Ele está em boas mãos agora. - Eu completei.
- Eu não acredito que, mesmo depois de tudo, você ainda está envolvida nisso tudo. - Mark afirmou, contrariado. Para ele, eu não tinha obrigação nenhuma de ajudar o Steven.
- Eu estou bem com isso. - Eu sorri para o irmão mais velho. - De verdade. - Eu quis tranquilizá-lo.
- Eu até tentei falar pra ela, mas… - ergueu os ombros.
- Eles vão querer os documentos do Steven. Espero que você tenha um bom plano. - Mark disse em um tom mais baixo, olhando para o irmão.
- Nós podemos conversar lá fora, por favor? - Eu tinha receio que alguém do hospital escutasse a conversa. Eu me afastei e fui em direção a saída do hospital e eles me acompanharam. Paramos na entrada do estacionamento.
- Eles te falaram alguma coisa sobre ele? - perguntou, supondo que eu não tinha uma boa notícia.
- Não me falaram nada e, provavelmente, não vão falar nada até amanhã de manhã. - Eu lamentei não poder dar uma boa notícia. - Mais um motivo para não ficarmos aqui no hospital essa noite. - Eu conclui.
- Como assim? Não é pior se o Steven ficar sozinho? - Mark perguntou.
- A ficha dele não pode ser preenchida se não houver nenhum conhecido para fornecer os dados. - Eu expliquei.
- Mas em algum momento a ficha vai ter que ser preenchida, certo? - concluiu, sem entender qual era o plano.
- Eu sei, mas… quando isso acontecer, é melhor que eu esteja no meu horário de trabalho. - Eu sabia que poderia resolver o problema pela manhã.
- Você tem certeza que você quer fazer isso pelo Steven? - Além de discordar da minha atitude, Mark também queria deixar bem claro que não ficaria chateado se eu desistisse de seguir em frente com aquilo.
- Eu não estou fazendo isso por ele. - Eu olhei para o Mark e depois olhei para o . A troca de olhares tornou-se constrangedora e, por isso, eu resolvi mudar o assunto. - Então, vamos pra casa? Não tem mais nada que possamos fazer aqui essa noite. - Eu apontei na direção do carro.
- Você tem razão. - Mark concordou com a cabeça.
- Eu… vou ficar. - disse, fazendo com que eu e o Mark olhássemos para ele.
- Se houver alguma emergência, eles vão me ligar, . - Eu argumentei, tentando convencê-lo.
- Eu sei, mas… eu não conseguiria ir pra casa e deitar a minha cabeça no travesseiro sabendo que ele está aqui sozinho. - se justificou, sabendo que poderia soar dramático. - Vocês podem ir. - Ele sorriu fraco. Conhecendo-o tão bem como eu conhecia, eu tinha certeza que ele queria estar por perto se acontecesse algo pior com o Steven. Diferentemente da outra vez, ele queria ter a chance de se despedir.
- Eu vou ficar com você. - Mark não pensou duas vezes. Ele não deixaria o irmão sozinho. - Você pode ir com o meu carro, . - Ele estendeu a chave na minha direção. A atitude dele só me fez admirá-lo ainda mais.
- Não precisa, Mark. - negou com a cabeça. - Você trabalhou o dia todo. Não é justo se você ficar. - Ele recusou na mesma hora.
- Não tem problema. - Mark parecia decidido.
- Olha, eu sei que você não quer me deixar sozinho. Eu agradeço a sua preocupação e aprecio o seu gesto de verdade, mas eu quero que você vá. - insistiu. - Eu trouxe a até aqui e agora não posso deixar que ela vá embora sozinha nesse horário. Além disso, ficar sozinho vai me fazer bem. - Ele explicou com toda a paciência do mundo.
- Eu posso ir sozinha. - Eu quis deixar claro que não me importava.
- Eu sei que você pode, mas eu não quero que vá. - me olhou, sério. - Por favor! Eu estou pedindo isso a vocês. - Ele queria ficar sozinho.
- Se isso é tão importante pra você, eu vou. - Mark cedeu, pois também havia percebido a necessidade do irmão de ficar sozinho.
- Valeu mesmo, cara. - estendeu uma das mãos e o Mark a apertou, aproximando-se para um breve abraço. - Se souberem de alguma coisa, me liguem. Eu vou dormir no carro. - Ele pediu.
- E se você precisar de qualquer coisa, você pode me ligar também. Eu venho, ok? - Mark colocou-se à disposição.
- Para de me dizer essas coisas. - sorriu e empurrou levemente o irmão, que também riu.
- Eu estou falando sério! - Mark gritou, afastando-se do e indo em direção ao seu carro. Eu achei que não havia mais nada para ser dito e simplesmente me virei de costas para ele com a intenção de acompanhar o Mark.
- Hey. - disse um pouco mais baixo. Tendo em vista que o Mark já estava um pouco distante, ele só poderia estar falando comigo. Na hora, eu me virei. - Obrigado. - Ele agradeceu com um triste sorriso. - Eu nunca vou esquecer o que você está fazendo por ele. - A gratidão estava nas poucas lágrimas presas em seus olhos, que ele tentou disfarçar.
- Mais algumas dessas e, talvez, nós ficaremos quites. - Eu respondi com um fraco sorriso. - Você vai ficar bem? - Eu demonstrei preocupação.
- Eu vou. - confirmou com a cabeça. O discreto sorriso no rosto dele era resultado do seu contentamento ao me ver preocupada com ele.
- Eu volto pela manhã. - Eu afirmei. Eu ainda olhava para ele, enquanto dava pequenos passos para trás.
- Ok. Eu vou esperar por você. Só pra variar. - O sorriso no rosto dele aumentou. Eu não disse nada. Eu apenas continuei olhando para ele por poucos segundos, antes de me virar de costas e me afastar de vez. Me aproximei do carro do Mark e entrei pela porta do passageiro, me sentando ao lado dele.
- Você acha que ele vai ficar bem? - Mark perguntou, dando a partida no carro.
- Eu acho que ele só precisa ficar um pouco sozinho. É difícil para ele aceitar que ainda se importa tanto com o Steven. - Eu fui sincera ao dar a minha opinião.
- É, eu sei. - Mark concordou.
- Sabe o quê? Como ele está se sentindo? - Eu aproveitei a oportunidade de entrar naquele assunto.
- O que você está querendo dizer? Que eu também me importo com aquele cara? - Ele me olhou mais sério.
- Eu sei você que se importa. - Eu não hesitei ao afirmar.
- O que? Não! - Mark negou na mesma hora. - Por que eu me importaria? Esse cara não significa nada pra mim. - Ele argumentou.
- Mark, ele é o seu pai. Eu sei que ele não é o pai que você sempre sonhou, mas isso não muda o fato de que ele é o seu pai. - Eu disse e ele ficou algum tempo em silêncio.
- Eu sei, mas é que... - Mark negou com a cabeça, contrariado. - Soa tão estúpido, sabe? O fato de eu me importar mesmo depois de tudo o que ele fez. - Ele rolou os olhos.
- Não é estúpido. É incrível da sua parte. - Eu o olhei com admiração. - Para ser bem honesta, eu não esperava nada melhor de você. - Minha frase fez com que ele me olhasse. - O que foi? - Eu sorri, sem entender os olhares.
- Eu queria muito ser esse cara que você vê em mim. - Mark disse, deixando um fraco sorriso escapar.
- Você é! - Eu não hesitei um só segundo. - Olha pra mim. - Eu pedi, quando percebi que havíamos parado no semáforo vermelho. Ele virou a cabeça na minha direção e eu levei uma das minhas mãos até o rosto dele. - Você é. - Eu reafirmei e vi o sorriso no rosto dele aumentar. Mark aproximou sua mão da minha e a deslizou pelo seu rosto, levando-a até a sua boca, onde ele depositou um beijo carinhosamente.
- Que bom que você está aqui. - Mark disse, depois de afastar minha mão de seus lábios. Ele me olhou pela última vez e voltou a dar atenção ao trânsito.
Não dava para negar o clima que se estabeleceu dentro daquele carro. Mesmo ambos tentando disfarçar, era impossível não perceber. Estávamos em um momento em que tudo em nós dois parecia falar muito alto. Os olhares, o silêncio, os sorrisos e os gestos, tudo era motivo para nos deixar desconsertados. Aquilo definitivamente era inédito para nós dois.
Ao chegarmos na rua das nossas casas, Mark estacionou o seu carro na garagem de sua casa e nós dois descemos do carro. Sendo a pessoa atenciosa de sempre, ele ofereceu-se para me acompanhar até a porta da minha casa. Era muito difícil recusar uma proposta como essa, sendo que tudo o que eu mais havia desejado nos últimos dias era estar perto dele. Fomos até a porta da minha casa, eu destranquei a porta e fui entrando, pois queria que ele entrasse comigo.
- Você quer beber alguma coisa? - Eu ofereci, me virando para olhá-lo.
- Não. Eu estou bem. Obrigado. - Mark agradeceu. Ele não parecia tão à vontade.
- Qual o problema? - Eu me aproximei, preocupada.
- Você tem certeza que quer mesmo arriscar o seu trabalho por causa do Steven? - Mark demonstrava muita preocupação comigo. - Quer dizer, eu sei que você está fazendo isso pelo . Eu entendo, mas… Eu não sei. Eu posso conversar com o se você quiser. - Ele sugeriu.
- Por que é tão difícil pra você aceitar que eu estou fazendo isso por você também? - O tímido sorriso em meu rosto não deixou que a frase soasse tão agressiva quanto parecia.
- Eu não quero que você se prejudique por causa de mim. - Mark negou com a cabeça.
- Você vale a pena. - Eu tentei tranquilizá-lo. - Eu sei que você provavelmente não vai acreditar, mas eu não tenho dúvida de que você vale a pena. - Mais um sorriso dele e mais uma vez eu não consegui controlar a minha reação a ele. As velhas borboletas voltaram a atormentar estômago.
- Vem aqui. - Mark segurou uma das minhas mãos e me puxou para um abraço. Se ele não fosse tão incrível, eu diria que ele estava fazendo aquilo de propósito e que estava tentando me provocar. Eu adorava o jeito que os dedos dele se entrelaçavam no meu cabelo. - Tanta coisa aconteceu hoje, que eu esqueci de uma coisa. - Ele terminou o abraço para poder olhar em meu rosto. - Você se lembra que dia é hoje? - Mark arqueou uma das sobrancelhas.
- Hoje é… dia 14, né? - Eu não entendi onde ele estava querendo chegar.
- Não é isso o que eu estou querendo dizer. - Mark riu, sem emitir qualquer som. - Hoje é um dia importante! Você não se lembra? - Ele ficou me olhando, esperando que eu lembrasse.
- Dia 14 de… - Eu comecei a dizer, quando a minha ficha finalmente caiu. - É mesmo! Faz 2 anos que eu me mudei para Nova York! - Eu afirmei, surpresa.
- Yay! - Mark comemorou.
- Meu Deus! Como você lembrou disso? - Eu perguntei, perplexa.
- Bem, foi um dia muito importante pra mim. - Ele ergueu os ombros, me fazendo voltar a sorrir feito boba. - Eu… até tinha planejado escrever um cartão para te agradecer por tudo nesses últimos 2 anos, mas aconteceu tantas coisas hoje, que eu nem tive tempo. - Mark lamentou. - Eu não tenho nada pra você. Quer dizer, eu até tenho, mas… não é o tipo de presente que eu gostaria de te dar. - Ele fez careta.
- Sério? Presente? E… o que é? - Eu fiquei muito curiosa. Não tinha nada nas mãos dele. O que poderia ser?
- É… um convite. É uma coisa do trabalho. - Mark colocou uma das mãos no bolso de sua calça e tirou de lá um papel. - Eu estou no meio de uma investigação e eu preciso muito ir a esse evento. - Ele me entregou o papel. - Eu não deveria estar te contando isso, mas… vai ter um outro agente em um outro lugar fazendo uma coisa muito importante e eu preciso ir nesse evento para ficar de olho em um suspeito em potencial. - Mark tentou me explicar, sem revelar tantos detalhes. - Levar alguém comigo vai ajudar bastante no meu disfarce. - Ele completou.
- Então, você quer que eu te ajude no seu disfarce. - Eu olhei pra ele, deixando de olhar para o convite.
- Não é só isso. - Mark sorriu e rolou os olhos. - Vai ser incrível passar um pouco mais de tempo com você. - Ele esperava pela minha resposta.
- Seus argumentos são bem convincentes. - Eu tentei controlar o sorriso.
- Isso é um sim? - Ele arqueou uma das sobrancelhas.
- É claro que é um sim. - Eu neguei com a cabeça, enquanto deixava um sorriso escapar. Eu jamais recusaria um convite dele. - Você pode contar comigo. - Eu afirmei.
- Sério? - No primeiro momento, ele ficou perplexo com a minha resposta positiva. - Obrigado mesmo! - Ele me olhou de maneira doce. A maneira com que ele me olhou me fez perder as palavras por alguns segundos. Fiquei olhando pra ele com um sorriso desconsertado, enquanto me perguntava como eu pude ter demorado tanto tempo para vê-lo daquela maneira tão intensa e indescritível.
- Eu não pretendia fazer isso agora, mas… eu também tenho um presente pra você. - Eu quebrei o silêncio constrangedor.
- Um presente? - Mark arqueou uma das sobrancelhas.
- Um presente. - Eu confirmei. - Feche os seus olhos. - Eu pedi.
- Por quê? - Ele ficou desconfiado.
- Você não confia em mim? - Eu abri os braços.
- Você não pode usar esse argumento pra tudo. - Mark fez careta, aos risos.
- É claro que eu posso! - Eu ri, sem emitir qualquer som. - Feche os olhos. - Eu insisti.
- Está bem! - Ele cedeu e fechou os olhos, sem saber o que esperar.
- Espera. - Eu pedi para que ele soubesse que demoraria um pouquinho, já que eu tinha que ir até a minha bolsa buscar o tal presente. Me afastei e me aproximei da bolsa, que estava em cima da mesa de jantar. De dentro da bolsa, tirei um embrulho, que eu havia feito naquele dia mais cedo. Voltei a me aproximar dele com o embrulho nas minhas mãos e parei bem na frente dele.
Segundos antes de colocar o presente nas mãos dele, eu o olhei. Como ele estava de olhos fechados, eu podia aproveitar aquele momento sem me preocupar com as minhas expressões bobas. Era estranho o fato de que todas as vezes que eu o olhava, eu tinha que me perguntar: ‘como ele poderia estar mais bonito do que antes?’. Os olhos fechados escondiam os estonteantes olhos verdes dele, mas o sorriso ainda estava lá e, particularmente, os lábios foram o que mais chamaram a minha atenção naquele momento.
Pensei diversas vezes antes de decidir tomar uma atitude que, apesar de não ser do meu feitio, era incentivada por cada parte do meu corpo. Dei dois passos na direção dele, me certificando de que eu não o tocaria. O rosto dele estava a menos de um palmo do meu, quando eu o encarei pela última vez. Fui aproximando lentamente o meu rosto do dele e fechei os meus olhos milésimos de segundo antes de tocar os meus lábios nos dele. Eu não sabia porque eu havia feito aquilo, eu só sabia que eu precisava fazer.
Mark foi pego de surpresa e mal conseguiu reagir. Ele não acreditou no que estava acontecendo. Não foi necessário que ele correspondesse, já que tratava-se apenas de um selinho inocente. Mesmo assim, o meu coração estava mais do que disparado. Eu me sentia como uma adolescente que estava dando o seu primeiro beijo. Foi surreal a minha reação. Eu jamais achei que um simples selinho causaria tantos efeitos em mim. Eu não imaginei que me sentiria daquela maneira novamente.
Em nenhum momento, tivemos a intenção de transformar aquele simples selinho em um beijo e isso não tinha a ver com o fato de querermos isso ou não. Aconteceu tudo de maneira tão simples, espontânea e mágica, que não conseguimos pensar em mais nada. Nem mesmo as nossas mãos tentaram fazer qualquer movimento. Meu coração que já estava acelerado, ficou ainda mais disparado. O selinho não foi tão longo, mas para nós dois parecia ter durado segundos. Descolei os nossos lábios e fui abrindo os olhos lentamente, enquanto afastava o meu rosto do rosto dele. Mark abriu os olhos a tempo de ver eu me afastar. Ele nunca havia me olhado daquela maneira. Nós nunca havíamos nos olhado daquela maneira.
- Bem… - Mark se atrapalhou ao tentar terminar a frase. - Obrigado pelo presente. - Ele sorriu, nervoso.
- Esse não foi o meu presente. - Eu neguei com a cabeça, tentando evitar que ele notasse o sorriso bobo no canto do meu rosto. Minha afirmação deixou o Mark um pouco confuso, mas da melhor maneira de todas. - Aqui. - Eu estendi o embrulho na direção dele. Ele deixou um sorriso escapar antes de pegá-lo das minhas mãos.
- Não precisava fazer isso. - Mark balançou a cabeça negativamente, enquanto abria o embrulho. Me mantive em silêncio, mas a verdade é que eu estava muito ansiosa para saber o que ele acharia do presente. Ele desembrulhou e finalmente segurou o meu presente nas mãos. Era um porta-retrato com uma das fotos que havíamos tirado na cabine de fotos há alguns dias. - Uau. - Ele me olhou com um enorme sorriso. - Eu adorei. - Mark voltou a olhar para a foto por alguns segundos. - Obrigado por isso. Isso é incrível. - Ele me olhou com carinho.
- Essa noite… foi inesquecível pra mim. Com essa foto, você não vai se esquecer dela também. - Eu tentei me justificar.
- Eu nunca vou me esquecer. Eu prometo. - Mark sorriu fraco, colocando uma mecha do meu cabelo atrás da orelha. A constante troca de olhares acabou resultando em um clima constrangedor.
- Então, para quando é o seu convite? - Eu disse qualquer coisa que deixasse tudo menos constrangedor.
- Para amanhã a noite. - Mark afirmou, fazendo careta. - Eu sei que é meio em cima da hora. - Ele percebeu a expressão em meu rosto.
- Não acredito. - Eu suspirei, decepcionada. - Eu tinha combinado com uma amiga de trabalho de substituí-la no horário do estágio dela amanhã a noite. - Eu realmente estava muito decepcionada por não poder aceitar o convite dele.
- Não tem problema. - Mark quis demonstrar que estava tudo bem. - Eu deveria ter falado antes. - Ele completou.
- Eu sinto muito. - Eu ergui os ombros. - Eu realmente queria ir a essa festa com você. - Eu fiz bico.
- Eu entendo perfeitamente. - Ele negou com a cabeça. - Vamos ter outras oportunidades, certo? - Mark sorriu.
- É claro que sim. - Eu confirmei com a cabeça.
- Legal. - Mark ficou um pouco sem graça. - Então, eu vou indo. Sei que você vai ter que ir pro hospital amanhã cedo e que precisa descansar. - Ele disse em tom de despedida.
- Sim, eu estarei lá amanhã bem cedo. Você também vai, certo? - Eu arqueei uma das sobrancelhas.
- Vou. Eu posso te dar uma carona. - Ele sugeriu.
- Combinado. - Eu concordei na mesma hora.
- Eu passo te buscar às 8 horas. Está bom pra você? - Mark perguntou.
- Perfeito. - Eu afirmei.
- Ok, então! - Mark sorriu, antes de se aproximar e me abraçar carinhosamente. Ele beijou a minha cabeça.
- Se precisar de qualquer coisa, você pode me ligar. - Eu me referia à situação do Steven.
- Só se eu precisar? - Ele deu um sorriso malandro, enquanto se afastava.
- Se não precisar, você também pode me ligar. - Eu ri, sem emitir qualquer som.
- Está bem. - Mark também riu ao abrir a porta. Ele acenou, antes de fechar a porta. Fiquei alguns segundos olhando para a porta e sorrindo igual a uma idiota.
Ao sair para o lado de fora da casa, Mark também paralisou com um sorriso desconsertado em seu rosto. Ele estava de costas para a porta e ainda estava tentando lidar com os seus próprios sentimentos depois daquele selinho inesperado, mas que, ao mesmo tempo, tinha sido tão esperado por ele. Aquele simples gesto da minha parte havia acendido uma esperança dentro dele que já havia se apagado há tempos. Aquele simples gesto deu a ele coragem para tentar retribuir a boa surpresa. Mark tirou o celular de seu bolso e, mesmo estando parado na minha porta, ele discou o meu número. Eu ainda estava na sala da minha casa, quando ouvi meu celular tocar. Fui até a mesa e o segurei nas mãos. Ler o nome de Mark em seu visor, me arrancou um sorriso ainda maior. Não fazia nem 2 minutos que ele tinha saído da minha casa.
- Eu deveria estar esperando por algo assim. - Eu atendi a ligação.
- Você não vai acreditar. Eu estou parado aqui na sua porta e me dei conta de que eu realmente estou precisando de uma coisa. - Mark virou-se de frente para a porta, pois sabia que eu a abriria a qualquer momento.
- Não brinca. - Eu ironizei, olhando para a porta de longe.
- Eu não te ligaria se não fosse tão importante. - Ele argumentou, tentando me convencer. Mesmo sem ter tanta certeza do que eu encontraria atrás daquela porta, eu me aproximei.
- Bem, nesse caso… - Eu abri a porta com o celular ainda no ouvido. - Eu não vou te deixar esperando. - Eu sorri ao olhá-lo. - Do que você precisa? - Eu já havia desligado a ligação. Mark se aproximou sem qualquer receio. Eu estremeci só com a possibilidade de ganhar o tão esperado beijo dele.
- Você realmente não sabe? - Ele perguntou, segundos antes de tocar o meu rosto com suas duas mãos e levar sua boca ao encontro da minha.
Não deu nem tempo de eu me perguntar se aquilo não passaria de um simples selinho. Ele aprofundou o beijo, fazendo com que os nossos corpos se aproximassem ainda mais. Eu estava tão entregue, que deixei que ele conduzisse completamente o beijo, que manteve-se lento até o final. Ao descolar os nossos lábios, ele roubou mais um selinho. Mark abriu logo os olhos, ansioso para ver a minha reação. Eu estava tão impactada com a atitude e com o beijo, que demorei alguns segundos para abrir os meus olhos. Ao abri-los, eu estava visivelmente atordoada. - Boa noite. - Mark retirou suas mãos do meu rosto e se afastou, sem me dar qualquer chance de responder. Acompanhei ele se afastar sem conseguir dizer nada, mas se eu pudesse dizer, eu pediria que ele me beijasse novamente. Eu pediria que ele me beijasse o resto da noite.
Mark voltou para a sua casa e só não estava mais feliz por causa do estado de saúde do seu pai. Ele mal conseguia comemorar direito o que tinha acontecido naquela noite. Deitou-se em sua cama e chegou a tentar dormir, mas não conseguiu. Ele precisou ligar para o antes para ter certeza de que ele estava bem.
Apesar de não me importar com o Steven e ter diversas outras coisas na minha cabeça no momento em que coloquei a minha cabeça no travesseiro, eu não pude deixar de pensar no estado crítico que o Steven se encontrava. A saúde dele interferiria diretamente na felicidade de duas pessoas muito importantes pra mim e, por isso, eu não conseguia deixar de me preocupar com aquele homem cruel e ignorante. Porém, eu não podia mentir e dizer que não tinha pensado no Mark. Eu fiquei sim lembrando daquele beijo. Eu fiquei sim surpresa com a proporção dos sentimentos que passei a ter por ele. Eu fiquei preocupada sim ao me dar conta de que a única pessoa por quem eu já tinha sentido aquilo havia sido o irmão dele.
Na manhã seguinte, eu acordei bem cedo e me vesti antes mesmo que o Mark chegasse. Sinceramente, eu não estava nem um pouco receosa ou preocupada com o que eu iria fazer. Eu ajudaria o Steven de coração totalmente aberto e sabia que, independentemente das consequências, eu não me arrependeria.
Eu já esperava o Mark há alguns minutos, quando ouvi a buzina do carro dele. Peguei a minha bolsa e o meu celular e saí da casa, trancando a porta em seguida. Caminhei até o carro, abri a porta e me sentei no banco do passageiro. Virei o meu rosto para olhá-lo pela primeira vez naquele dia e me deparei com uma cara de sono adorável e um sorriso doce.
- Bom dia. - Eu disse, me aproximando e beijando o rosto dele.
- Bom dia. Como você está? - Mark devolveu o beijo na bochecha.
- Eu estou bem. - Eu respondi, me afastando e colocando o cinto de segurança.
- E ai, já desistiu dessa ideia insana de ajudar o Steven? - Mark perguntou mesmo sabendo que a resposta seria negativa.
- Eu não vou desistir. - Eu neguei com a cabeça.
- Eu sei que não vai. - Mark fez careta. - E… como você vai fazer? Você… não tinha dito que trabalharia no turno da noite hoje? - Ele perguntou.
- Eu vou trabalhar a noite, mas… por causa do Steven, eu vou trabalhar no período da manhã também. - Eu expliquei. - O pessoal do hospital já está acostumado com as minhas horas-extras. Ninguém vai desconfiar de nada. - Eu sorri ao erguer os ombros.
- E a faculdade? - Mark perguntou, sabendo que as minhas aulas eram no período da manhã.
- Eu vou pegar toda a matéria com a Meg depois. Eu já combinei com ela. - Eu já tinha pensado em tudo. Mark não disse mas nada, mas seu olhar de julgamento falou mais do que qualquer coisa. - Por que você está tentando me fazer desistir disso? - Voltei a olhá-lo, depois de um longo silêncio.
- Não é isso. - Mark tentou se redimir.
- É sim! - Eu insisti.
- Ok! - Mark decidiu ceder. - Eu sei o quanto isso pode te prejudicar e pensar que você está fazendo isso por mim também… - Ele fez uma breve pausa. - Faz com que eu me sinta mal. - Ele completou.
- Eu entendo que esteja preocupado, mas saiba que eu sei exatamente as possíveis consequências de tudo isso e eu estou bem com isso. Isso não me desencoraja nem um pouco. - Eu fui completamente honesta. - Você e o já fizeram tanto por mim. Me deixe tentar retribuir. - Eu pedi com jeitinho.
- O que você decidir, eu vou estar do seu lado. - Mark cedeu ao perceber o quanto aquilo era importante pra mim.
- Obrigada. - Olhei para ele e sorri de maneira agradecida.
Apesar de todo o desconforto, dormiu a noite toda no banco detrás do seu carro. Acordou diversas vezes durante a noite com a impressão de ter escutado o seu celular tocar. O medo de receber notícias ruins era real. Ele ainda estava dormindo, quando eu e o Mark chegamos no hospital. Depois de estacionar o carro, Mark e eu fomos até o carro do para chamá-lo. Ele iria querer nos acompanhar.
- Ele está dormindo. - Mark sorriu pra mim, depois de olhar através do vidro do carro.
- Tadinho. - Eu suspirei.
- . - Mark chamou por ele, enquanto deu batidas sutis no vidro do carro. Apesar de ter se mexido, continuou dormindo. - Hey! . - Ele insistiu, batendo um pouco mais forte no vidro. Dessa vez, acordou. Para ser bem específica, ele levantou-se em meio a um pulo. nos olhou e fez careta ao nos ver. - Vamos. - Mark apontou na direção do hospital. espreguiçou-se, passou as mãos pelo cabelo na tentativa de arrumá-lo e pegou o seu casaco. - Bom dia. - O irmão mais velho disse, enquanto o saía do carro.
- Bom dia. - ainda estava com a sua voz rouca. Depois de sair do carro, ele me olhou. Eu acenei pra ele em meio a um fraco sorriso.
- Hey. - tentou retribuir o sorriso. - Alguma notícia? - Ele teve que perguntar.
- Nenhuma. Vou ficar sabendo agora. - Eu disse, triste por não poder dar uma boa notícia a ele. - Vamos lá! - Eu apontei com a cabeça na direção do hospital.
- Vamos. - confirmou com a cabeça.
Seguimos todos juntos até o hospital. Ao entrarmos, eu os acompanhei até a sala de espera e pedi que eles ficassem ali me esperando. Os deixei sentados e bati o meu ponto antes de ir até a sala em que as minhas coisas ficavam. Deixei a minha bolsa e vesti o meu jaleco. Agi como se aquela fosse uma manhã normal de trabalho, porque era exatamente isso o que ela seria.
Como havia outras duas estagiárias trabalhando comigo naquele mesmo período e elas estavam cuidando da área de vacinas e injeções, me ofereci para cuidar do preenchimento das fichas dos pacientes. As outras estagiárias costumavam odiar aquele setor, por isso, não foi nada difícil conseguir aquela função naquela manhã. Não seria a minha primeira vez e nem a minha última.
Felizmente (ou não), haviam muitas fichas acumuladas para serem preenchida. Com isso, seria mais difícil que alguém desconfiasse de alguma coisa. Comecei a preencher as fichas, deixando a do Steven mais pro final. Fui até a sala de espera mais de 5 vezes para falar com os familiares dos pacientes para pedir que eles me acompanhassem com os documentos do respectivo paciente para preencher cada uma das fichas. Quando chegou a vez do Steven, não foi diferente. Fui até a sala de espera e chamei o e o Mark. Eles me acompanharam até o balcão.
- Vocês estão com os documentos ai, certo? - Eu perguntei, tentando manter o mesmo protocolo de sempre.
- Documentos? - arqueou as sobrancelhas. Ele não estava com os documentos do seu pai.
- Eu preciso do documento. - Eu falei de maneira mais enfática. Mark entendeu exatamente o que eu quis dizer e pegou a sua carteira, me dando qualquer um de seus documentos.
Comecei a preencher todo o formulário com informações que eu mesma fui criando, enquanto eu fingia que pegava tais informações do documento que o Mark havia me dado. Eu criei até mesmo um nome novo. e Mark me olhavam, mas ao mesmo tempo demonstravam preocupação com os outros funcionários a nossa volta. O receio de que eu fosse pega por qualquer um deles era enorme.
- Vocês são sobrinhos do paciente, correto? - Eu perguntei, voltando a olhá-los.
- Somos. - confirmou na mesma hora.
- Como nenhum outro parente mais próximo compareceu ao hospital, vocês serão os responsáveis por ele, está bem? - Eu perguntei e vi os dois afirmarem com a cabeça. - Certo. Está tudo certo. O formulário já está preenchido. - Devolvi o documento para o Mark.
- Muito obrigado, . - Mark sorriu, extremamente agradecido.
- Tudo bem. - Eu neguei com a cabeça. - Eu só vou terminar de preencher o resto desses formulários e vou ver se consigo alguma notícia dele pra vocês. - Eu quis acalmá-los, pois percebi que ambos estavam apreensivos com o que eu tinha acabado de fazer.
- Obrigado. - Apesar do agradecimento simples, o olhar do falava mais alto do que qualquer outra coisa.
Eu não estava arrependida e também não estava nem um pouco receosa com o que eu tinha acabado de fazer. Eu fiz aquilo de coração tão aberto, que era impossível sentir qualquer outro sentimento que não fosse paz interior. Eu estava imensamente feliz e leve por ter retribuído só um pouquinho do que o e o Mark já fizeram por mim. Terminei de preencher os formulários e fui até a UTI para tentar cumprir a minha palavra e dar notícias aos irmãos Jonas.
- Bom dia! - Entrei na recepção da UTI e adivinha? - Oi, Knox! - Eu não consegui conter o sorriso. Seria mais fácil do que eu imaginei.
- Bom dia. - Knox sorriu, sem conter a empolgação.
- Eu preciso da sua ajuda. - Eu fiz careta.
- Se eu puder te ajudar. - Knox me deu total atenção.
- É que… um tio dos meus amigos está internado desde ontem à noite na UTI e eles estão desesperados por notícias. Você sabe me dar alguma informação? - Eu pedi com jeitinho.
- É claro! - Knox aceitou na mesma hora. - Você sabe o número dele? - Ele perguntou. Ele referia-se ao número do paciente, que servia de controle interno no hospital.
- Eu acho que é 051516. - Eu fingi estar um pouco em dúvida, mas a verdade é que eu já tinha decorado o número.
- O cara que não para de reclamar? - Knox fez careta.
- Ele mesmo! - Eu sorri, incrédula. Aquilo soava muito como o Steven.
- Ele chegou bem ruim ontem à noite, manteve-se estável durante a madrugada e acordou agora de manhã. Fizeram alguns exames ontem e o médico disse que traria os resultados hoje ou amanhã, mas ainda não apareceu. - Knox deu detalhes. As notícias me deixaram extremamente feliz. Não pelo Steven, é claro, mas sim pelo e pelo Mark.
- Que ótimo! - Eu demonstrei empolgação com a notícia. - Ok, eu preciso te pedir mais uma coisa. - Eu fiquei muito sem jeito em pedir outra coisa a ele depois do que eu tinha feito no nosso encontro.
- O que? - Knox voltou a ser gentil.
- Será que os meus amigos poderiam entrar para fazer uma breve visita? São os únicos parentes que se importam com o cara e estão muito preocupados. - Mesmo sabendo que o Knox não tinha autoridade para tal permissão, eu sabia que ele já havia feito algumas exceções em outras oportunidades.
- Bem… - Knox resistiu por alguns segundos. - São somente dois? - Ele perguntou.
- Só dois. - Eu confirmei.
- Ok, então… - Knox olhou em volta. - Acho que podemos dar um jeito. - Ele sorriu.
- Sério? - Eu perguntei retoricamente. - Obrigada, Knox! De verdade! - Eu quase o abracei por impulso. - Eu posso trazê-los agora? - Eu quis saber.
- Pode. - Knox afirmou com a cabeça.
- Obrigada! - Eu o agradeci mais uma vez, antes de me afastar e ir rapidamente até a sala de espera. Ao chegar lá, Mark e me olharam na mesma hora. Eu acenei com a cabeça para que eles se aproximassem.
- Oi. - Mark se aproximou.
- Hey. - Eu deixei um sorriso escapar.
- Aconteceu alguma coisa? - Mark perguntou.
- É claro que aconteceu. Está na cara dela. - disse, provando que me conhecia extremamente bem.
- Eu tenho notícias. - Eu fiz um certo mistério.
- O que foi? - estava muito ansioso.
- Bom, ele… - Eu hesitei poucos segundos. - Ele está acordado e consciente. - Eu dei a notícia.
- Você está falando sério? - ficou tão feliz, que achou que pudesse ser mentira.
- Estou. - Eu confirmei com um enorme sorriso. Da forma mais espontânea de todas, se aproximou e me abraçou forte. Enquanto o abraçava, olhei para o Mark, que tentava manter-se discreto, mas deixou um fraco sorriso escapar.
- Eu não posso acreditar. - terminou o abraço e olhou em meu rosto. O sorriso dele era enorme e só me deixou ainda mais feliz. Era tão bom colocar aquele sorriso no rosto dele. Eu me sentia tão bem!
- Os resultados dos exames ainda não saíram, mas ele está estável agora. - Eu dei mais alguns detalhes. - E, se vocês quiserem, vocês podem entrar para vê-lo. - Eu disse e vi os dois irmãos voltarem a me olhar.
- Nós podemos entrar? - Mark perguntou, perplexo. Ele e o irmão sabiam que as regras do hospital eram um pouco chatas quando tratavam-se de visitas de pacientes.
- Nós dois? - quis ter certeza.
- Vocês dois. - Eu confirmei, segurando o riso. - Eu conversei com um amigo meu e ele deixou que vocês entrassem. - Eu contei. - Aliás, o pai de vocês já está bem conhecido entre os enfermeiros. Eles o chamam de ‘o cara que não para de reclamar’. Dá pra acreditar? - Eu ironizei.
- O cara que não para de reclamar? Achei até que pegaram leve. - Mark sorriu.
- Parece até que estão descrevendo você. - olhou para o irmão.
- O que? - Mark arqueou uma das sobrancelhas.
- Você está sempre reclamando! Agora, já sabemos de quem você puxou essa sua mania irritante. - provocou o irmão.
- Eu reclamo? - Mark apontou para si mesmo.
- ‘Você estacionou o carro errado.’; ‘Você não tranca a porta da casa.’; ‘Você não sai do meu sofá.’; ‘Você comeu toda a comida da geladeira.’ . - fez careta, enquanto afinava a voz. - Você quer que eu continue? - Ele cruzou os braços.
- Cala a boca. Eu não falo assim. - Mark o olhou, impaciente.
- Hey! - Eu tentei interromper a discussão. Ambos me olharam. - Vocês vão entrar? - Eu sorri, tentando não rir da discussão boba deles.
- Você tem certeza que isso não vai dar nenhum problema pra você? - Mark perguntou, preocupado.
- Você já está fazendo muito por nós. - concordou com o irmão.
- Está tudo bem. O meu amigo é o responsável pelo setor hoje e ele liberou. Não vai ter problema algum. - Eu neguei com a cabeça.
- É o cara com quem você saiu? - Mark segurou o riso ao perguntar.
- Sim. - Eu neguei com a cabeça, enquanto me esforçava para não rir. - É o Knox. - Eu confirmei. Sem entender do que falávamos, olhou para nós dois.
- Você saiu com um cara chamado Inox? Tipo… o aço? - fez careta. Mark começou a gargalhar na mesma hora.
- Não! - Eu o olhei feio. - É Knox! - Eu rolei os olhos. - Vocês vão entrar ou não? - Eu cruzei os braços.
- Foi ele! Você viu. - Mark ergueu as mãos, alegando inocência.
- Vamos entrar. - esforçou-se para ficar mais sério, enquanto eu o fuzilava com os olhos.
- Me acompanhem. - Deixei de olhá-los e me virei, indo em direção a UTI. Eles me acompanharam. - Lembrem-se que vocês vão visitar o tio de vocês. - Eu disse, antes de entrarmos na ala da UTI. Knox estava anotando alguma coisa em um papel, quando eu me aproximei. - Oi. Eles estão aqui. - Eu disse ao me aproximar do enfermeiro.
- Claro. - Knox sorriu para os irmãos. - Podem entrar. É o terceiro quarto à direita. - Ele indicou.
- Obrigado. - Mark agradeceu, enquanto o apenas sorriu.
- Eu vou esperar aqui. - Eu não fazia a menor questão de ver o Steven e eu sabia que era recíproco.
- Você não vai com eles? - Knox estranhou.
- Não. Eu… - Eu não sabia como justificar. Eu não queria chamar a atenção ou causar qualquer tipo de desconfiança sobre a identidade do Steven.
- Eu precisava mesmo trocar o soro do paciente que eles vão visitar. Se você fosse com eles, já poderia fazer isso pra mim. - Knox sugeriu. - Eu tenho tantas coisas pra fazer e estou sozinho aqui hoje. Você faria isso, por favor? Ajudaria muito. - Ele pediu.
- Bem, eu… - Eu hesitei por alguns segundos. Depois do favor que ele havia me feito, eu não podia recusar ajuda. Olhei para os irmãos Jonas e eles me olhavam como se dissessem: ‘você pode vir. Tudo bem!’.
- Vamos. - Mark sorriu pra mim e apontou com a cabeça na direção do quarto.
- Então, eu vou. - Eu confirmei com um fraco sorriso.
- Muito obrigado! - Knox agradeceu. - Aqui está o soro. É só trocar. Você sabe, né? Já fez isso milhões de vezes. - Ele brincou.
- Claro que sim. Pode deixar. - Eu peguei o soro de suas mãos.
- Obrigado! - Knox agradeceu novamente. Andei ao lado dos garotos pelo corredor e estava nítida a minha apreensão por ter que me aproximar do Steven novamente. Eu simplesmente odiava estar perto dele.
- Você está bem? - Mark perguntou, antes de entrarmos no quarto.
- Eu estou bem. - Eu tentei sorrir para não preocupá-los, mas eu sabia que eles me conheciam o suficiente para ter certeza de que eu estava mentindo.
- Com nós dois por perto, você não tem motivos para se preocupar. - fez questão de me tranquilizar. Não consegui conter o sorriso ao ouvir aquela frase. Olhei para o Mark e ele piscou um dos olhos pra mim. - Vamos. - Ele disse, antes de abrir a porta do quarto. Os dois entraram na minha frente e eu entrei por último, fechando a porta atrás de mim.
- Finalmente, rostos conhecidos! - Steven suspirou ao ver os filhos. Ele ainda não havia me visto.
- Oi, Steven. - Mark respondeu, sem demonstrar qualquer empolgação.
- Como você está se sentindo? - aproximou-se da cama. Foi nesse exato momento que o Steven me viu. Eu ainda estava parada bem próxima a porta. Trocamos olhares tensos por alguns segundo e eu pude perceber a expressão em seu rosto mudar.
- O que essa garota está fazendo aqui? - Steven nem ao menos tentou disfarçar.
- Hey! - Mark estava prestes a condená-lo pela maneira que ele tinha falado comigo, mas eu o repreendi.
- Eu vim trocar o soro. - Eu não deixei que ele me intimidasse. Me aproximei do Steven e comecei a tirar a bolsa de soro vazio para substituí-la pela bolsa cheia. Mesmo estando receosa por estar bem ao lado daquele homem terrível, eu tentei me mostrar calma e focada no que eu estava fazendo.
- O que você está armando? - Steven virou o seu rosto na minha direção e me encarou. Eu o ignorei completamente. - Estou falando com você! - Ele segurou o meu braço e me fez olhá-lo.
- Por que é tão difícil de você aceitar que nem todo mundo é como você? - Eu me manifestei antes mesmo que os garotos reagissem a meu favor. Puxei o meu braço com força, fazendo com que ele me soltasse. Mark e se entreolharam e trocaram sorrisos discretos, enquanto eu continuei fazendo o meu trabalho.
- Eu não quero ficar nesse hospital. Eu não quero ficar perto dessa garota. - Steven reclamou para os filhos.
- ‘Essa garota’ salvou a sua vida. - fez questão de dizer.
- Salvou a minha vida? - Steven ironizou. - E por que ela faria isso? - Ele riu, debochado. A pergunta gerou um certo constrangimento. O Steven já me odiava por causa do meu interesse pelos filhos dele. Responder a pergunta dele dizendo que eu havia feito aquilo pelo e pelo Mark não era o ideal. - Ahh… mas que surpresa! - Ele deduziu a resposta diante do clima estranho que se estabeleceu. - Você fez isso por um deles, não é? Que fofa! - Steven não cansava de ser sarcástico. - Qual dos dois você está fazendo de idiota dessa vez? - Ele sorriu falsamente. O clima só ficava cada vez pior.
- Steven. - Mark chamou a atenção do pai.
- Ou são os dois? - Steven emendou outra pergunta.
- Independentemente dos motivos dela, você deveria agradecer por ela achar que você merecia ser salvo. - Mark não conseguiu se conter.
- Nós podemos falar sobre o que realmente interessa, por favor? - tentou mudar o assunto para evitar mais confusão. Ele também estava fazendo aquilo para tentar me preservar e eu percebi isso.
- Essa é uma ótima ideia, garoto. - Steven olhou para o filho. - O que eu estou fazendo aqui? - Ele ficou mais sério.
- Você está doente e está em um hospital. Qual a surpresa? - foi sarcástico.
- Eu não queria estar aqui. Eu te disse que eu não queria vir. - Steven não se intimidou.
- E o que você esperava? Que eu te deixasse morrer? Foi para isso que você me chamou na noite passada? Pra te ver morrer? De novo? - perguntou com um tom de indignação.
- Eu aprecio o seu gesto, . - Steven demonstrou sensibilidade com a frase do filho. - Aliás, me deixa muito feliz que você se importe. - Ele deixou um sorriso escapar. - Você também, Mark. Eu nunca imaginei ver você entrando nessa sala. - Steven olhou para o filho mais velho.
- Nem eu! Inclusive, já estou arrependido. - Mark tentou demonstrar indiferença. Pai e filho trocaram olhares.
- Vocês me trouxeram para esse hospital e agora vão ter que me ajudar a sair daqui. Eu não posso ficar aqui. - Steven disse, receoso.
- Você pode. - afirmou na mesma hora.
- Eles não podem saber quem eu sou. - Steven falou um pouco mais baixo, pois ficou com receio de ser ouvido.
- Eles não vão saber. - voltou a afirmar. - Graças a , eles não vão saber. - Ele completou ao me olhar por poucos segundos. Eu estava terminando de trocar o soro.
- O que? - Steven achou que tivesse entendido errado.
- Ela trabalha aqui. Ela colocou um outro nome na sua ficha para que eles não saibam quem você realmente é. - O filho mais novo explicou, me dando todos os créditos.
- Você deve estar se sentindo um idiota agora, não é? - Mark comentou ao ver perplexidade no rosto do pai. Mesmo sem querer, acabei olhando para o Steven. Eu já tinha trocado o soro e, por isso, pude me afastar dele. Fiquei entre os irmãos, mas eu estava 2 passos atrás deles. Olhei novamente para o Steven e nós voltamos a trocar olhares.
- Bom, eu tenho que admitir que eu estou surpreso e impressionado. Arriscando o seu trabalho por minha causa? Agora, eu estou me sentindo importante. - Steven voltou a ser sarcástico. Ele sempre usava aquele mesmo tom comigo. O jeito que ele me tratava não deveria me afetar tanto, mas afetava. Eu ficava muito irritada, mas ao mesmo tempo, eu me sentia muito triste por ser tão odiada sem ter feito nada para merecer aquilo. Aquele ódio me fazia muito mal.
- Não sinta. - Eu o encarei com firmeza, mas tive quase certeza de que haviam poucas lágrimas em meus olhos. Lágrimas de ódio? De medo? Não. Eram só resquícios da enorme força e coragem que eu tirava de dentro de mim para enfrentá-lo. - Como você já disse: eu não fiz isso por você. - Eu afirmei. - Mas, se por algum momento eu tivesse pensado que não valesse a pena fazer isso por eles, talvez, eu tivesse feito por você, porque esse é o tipo de garota que eu sou. Eu não te deixaria morrer. - Mesmo mantendo a compostura, eu estava muito feliz por poder finalmente enfrentá-lo daquela maneira.
- Suas palavras, seu jeito de falar… - Steven me olhou com deboche. - Exatamente como a sua mãe. - Ele complementou. - Você pode até enganá-los, mas a mim você não engana. - Steven cerrou os olhos na minha direção.
- Você pode conhecer o meu pai e a minha mãe, mas você não me conhece, Steven. - Eu fiz questão de responder. - Eu entendo o seu passado e os seus motivos para não gostar de mim, mas o seu passado não pode definir o nosso futuro. Não existe nenhuma história se repetindo aqui, porque se tivesse, um desses caras teria que ser como você. - Eu olhei para o e para o Mark. - E, felizmente, eles não são. - Eu estava muito aliviada por finalmente ter dito aquilo para ele. - Eu vejo vocês lá fora. - Eu disse em um tom mais baixo para os garotos, depois de deixar de olhá-lo.
Eu saí do quarto me sentindo até mais leve. Eu tinha buscado tanta coragem dentro de mim para poder encarar aquele homem perverso, que eu já nem sentia mais medo. Já fora do quarto, eu fechei os meus olhos e respirei fundo para tentar acalmar o meu coração. Ficar perto do Steven nunca seria uma coisa normal para mim.
- Como você se sente? - perguntou ao pai.
- Eu já estou ótimo. Já posso até voltar pra casa. - Steven sorriu para ambos.
- Isso quem vai dizer é o médico. - Mark o repreendeu.
- E a crise que você teve ontem a noite? Foi a primeira vez? - quis saber.
- Não. Não foi a primeira. - Steven negou com a cabeça, mais sério.
- E você nunca foi ao médico? - Mark perguntou, indignado.
- Eu não podia ir! Eu já disse. As pessoas não sabem que eu estou vivo. Elas não podem saber. - Steven falou um pouco mais baixo.
- Você deveria ter me falado! Eu teria dado um jeito de conseguir ajuda. - disse em tom de bronca.
- Como você conseguiu a ajuda dela? - Steven referiu-se a mim.
- Dá pra parar!? Essa sua implicância com ela já está passando dos limites. - perdeu a paciência. Mark também reagiu, mas sem dizer nada.
- Eu não quero a ajuda dela. - Steven tentou enfrentá-lo.
- Eu implorei a ajuda dela! - disse, irritado. - Droga! - Ele esbravejou. - Ela não se ofereceu para ajudar. Eu implorei para que ela te ajudasse! - repetiu.
- E agora, vocês dois vão ser gratos a ela eternamente, certo? - Steven voltou a ser sarcástico. - Agora, vocês dois estão ainda mais apaixonados por ela, não é mesmo? - Ele olhou para os filhos. A palavra ‘apaixonados’ deixou o clima um pouco mais pesado no quarto. e Mark se entreolharam, visivelmente incomodados com o comentário do pai. - Me escutem. - Steven chamou a atenção dos filhos. - Eu não quero ser parte disso. Eu não quero ser um pretexto para que vocês fiquem ainda mais próximos dela. Eu não quero ser o motivo que vai fazer vocês deverem algo a ela pelo resto de suas vidas. - Ele finalizou. Mark negou imediatamente com a cabeça e lançou um olhar de reprovação para o pai.
- É mesmo tão difícil pra você agir como um pai normal? - Mark perguntou, olhando seriamente para o pai. - Depois de tudo o que você fez, você está aqui nesse hospital. Nós estamos aqui! E você só sabe só falar dessa vingança ridícula que só existe nessa sua cabeça! - Ele esbravejou. - Honestamente, eu não sei porque não desistimos de você ainda. - Mark demonstrou um pouco mais de decepção. - Espero você lá fora, . - Ele ainda olhava para o pai. Virou-se de costas e saiu pela porta do quarto, deixando o irmão mais novo sozinho com o pai.
- O que aconteceu com você? - também demonstrava decepção ao dirigir-se ao pai. - Você era uma boa pessoa, gentil, engraçado e… bondoso. - Ele negou com a cabeça. - Você já perdeu tantas coisas com essa vingança sem sentido. É uma pena que você só vá se dar conta disso quando você perder de vez o que ainda te resta, pai. - estava visivelmente desapontado com as atitudes do pai. - Eu vou tentar voltar amanhã. - Ele disse, afastando-se da cama. - E vê se para de reclamar de tudo e de todos aqui. Você pode não ter percebido, mas eles só estão tentando te ajudar. - disse, antes de sair do quarto. Ele percebeu que suas últimas frases mexeram com o seu pai, mas ele não sabia o quanto aquilo era bom.
- Hey. - cumprimentou o irmão ao encontrá-lo do lado de fora do quarto.
- Eu tentei, cara. - Mark ergueu os ombros. - Eu não consigo não perder a paciência com ele. Ele não ajuda. - Ele completou.
- Eu sei. - teve que concordar. - Está tudo bem. - Ele sorriu fraco, dando fracos tapinhas em um dos ombros do irmão. - Vamos. - Eles foram na direção da saída da UTI.
Desde que eu tinha saído do quarto, eu estava na recepção da UTI com o Knox. Nós estávamos conversando e, a princípio, ele conseguiu me acalmar e me distrair. Estávamos falando sobre o movimento do turno da manhã, quando e Mark se aproximaram. Só ao olhá-los de longe, eu já percebi que o final da conversa deles com o pai não tinha terminado da melhor maneira. Eu não estava surpresa, já que estávamos falando do Steven.
- Já? - Knox disse, quando e Mark se aproximaram.
- É melhor deixá-lo descansar. - Mark respondeu, olhando discretamente para mim.
- Eu levo vocês até a sala de espera. - Eu me ofereci, enquanto eu dava poucos passos na direção da porta.
- Bom trabalho. Obrigado. - Mark cumprimentou Knox antes de se afastar.
- Valeu mesmo, Inox. - sorriu ao cumprimentá-lo. Notei que ele havia pronunciado o nome errado, mas quando ele passou por mim com aquele sorriso debochado que só ele tinha, eu soube que foi proposital. Saí da UTI atrás dos irmãos Jonas, depois de dar ao Knox o meu sorriso mais sem graça de todos.
- Muito engraçado, Jonas. - Eu ironizei, depois de me esforçar para alcançá-los no corredor.
- Me desculpa. Eu não consegui evitar. - segurou o riso para não me deixar ainda mais irritada.
- Eu sei bem que não. - Eu me esforcei para não deixar um sorriso escapar. - E como foi lá? - Eu perguntei aos dois.
- Exatamente como o esperado. - Mark ironizou. Nós chegamos na sala de espera e paramos ali mesmo. - É impossível lidar com ele. - Ele completou.
- Ele quer ir embora. - rolou os olhos. - Será que existe alguma possibilidade de ele receber alta? - Ele queria saber a minha opinião.
- Eu acho difícil que ele receba alta essa semana. Ele está na UTI, né? - Eu não fiquei feliz por recordar isso. - Mas, vamos esperar a resposta do médico. Os resultados dos exames devem sair no máximo até amanhã e ai vamos ter um parecer. - Eu disse.
- Se você souber de alguma coisa, você pode me ligar? - pediu. Apesar de tudo, ele ainda estava bastante preocupado com o pai. Ele não conseguia evitar.
- É claro que sim. - Eu afirmei, tentando tranquilizá-lo.
- Obrigado mesmo. - me olhou nos olhos ao agradecer. - E desculpa por tudo o que você teve que ouvir dele. Você está nos ajudando tanto e não merecia ouvir nada daquilo. - Ele desculpou-se pelo pai.
- Não se preocupa. - Eu neguei com a cabeça em meio a um fraco sorriso. - Está tudo bem. - Eu completei. Notei que ele ficou mais tranquilo com a minha resposta.
- Bom, eu preciso ir pro trabalho. Eu tenho um dia cheio hoje. - Mark disse em tom de despedida.
- Eu também preciso ir. Tenho uma reunião mais tarde. - disse.
- Você vai para o estacionamento também? - Mark perguntou para o irmão.
- Não. Eu vou passar no banheiro antes. - respondeu. - Eu te vejo mais tarde. - Ele cumprimentou o irmão. - E você, , mais uma vez: muito obrigado. - disse ao me abraçar carinhosamente.
- Não precisa agradecer. - Eu respondi, enquanto ele terminava o abraço.
- Até depois. - despediu-se antes de se afastar de vez.
- E você, tudo pronto para a festa de hoje? - Eu aproveitei para perguntar ao Mark.
- Eu vou passar pegar o smoking agora. - Mark fez careta ao mencionar a roupa.
- Você vai usar smoking? Não acredito que vou perder isso. - Eu brinquei.
- É mesmo uma pena que você não possa ir. - Mark fez bico. - Eu achei que nós finalmente iriamos poder colocar em prática tudo o que aprendemos na nossa aula de dança. - Ele riu, sem emitir som.
- Você só está dizendo isso porque eu não vou à festa! - Eu cerrei os olhos na direção dele. Eu sabia que ele não gostava de dançar.
- Não! Eu juro. - Mark negou na mesma hora. - Eu… realmente estava ansioso para dançar com você essa noite. - Ele ficou um pouco mais sem jeito. - Mas, tudo bem! Eu entendo que você não possa ir. Está tudo bem. - Mark não queria que eu me sentisse mal por não poder acompanhá-lo.
- Vamos combinar alguma coisa qualquer dia desses. - Eu sugeri.
- É claro. - Mark concordou, feliz com a minha sugestão. - Então, eu vou embora. Você precisa voltar para o trabalho. - Ele disse, quando uma equipe de médico passou por nós. Ele ficou com medo de me prejudicar.
- Ok. - Eu concordei, pois sabia que ele também precisava ir trabalhar. - Depois você me conta da festa. - Eu pedi.
- Eu conto. - Mark concordou. Ele se aproximou sorrateiramente e beijou o meu rosto. - Bom trabalho. - Ele sorriu pra mim.
- Bom trabalho. - Eu respondi, me esforçando para não sorrir como uma boba.
Acredite ou não: eu passei o resto do dia desejando ir naquela festa. Não era nem porque eu não queria desapontar o Mark, porque eu tinha toda a certeza do mundo de que ele realmente havia entendido a minha situação. Era porque eu queria estar com ele. Eu queria ser a companhia dele. Eu adoraria que todos me olhassem e me vissem como o par dele. Mesmo sem perceber, eu estava desejando passar todos os segundos do meu dia ao lado dele.
Meg chegou no hospital no início da tarde. Ela me fez perguntas e quis saber o meu motivo de não ir a aula naquela manhã. Felizmente, eu já tinha me preparado para responder aquelas perguntas. Contei para ela a verdade, só omiti o fato de que o homem que foi internado às pressas na noite anterior foi o pai do Mark e do . Ao invés disso, eu menti e disse que a pessoa que havia sido internada era um tio dos dois.
- Tio? - Meg estranhou. - Eu nem sabia que eles tinham um tio. - Ela fez careta.
- É irmão do pai dos garotos. Segundo o , ele não costuma visitar a família com tanta frequência. O Mark, por exemplo, nem o conhecia. - Eu menti novamente. Eu me sentia mal por estar fazendo aquilo, mas era necessário.
- E como ele está? - Meg quis saber.
- Ele chegou no hospital muito mal. Eu estou perplexa por ele estar consciente! - Eu disse.
- O médico não deu nem um parecer? - Meg perguntou.
- Ainda não. Até amanhã ele deve dar alguma notícia. - Eu expliquei a ela.
- E como estão os garotos? - Meg demonstrou preocupação.
- O está bastante preocupado. Ele conviveu mais com o tio, né? - Eu fiquei triste ao me lembrar dele. - E o Mark… - Eu neguei com a cabeça. - Ele finge que não se importa, mas eu sei que ele se importa. Você sabe como ele é. - Eu sorri ao mencioná-lo.
- Que sorriso é esse? - Meg ficou desconfiada na mesma hora. Ela me conhecia.
- Que sorriso? - Eu fiquei séria na mesma hora.
- Eu vi esse sorriso, ! - Meg cerrou os olhos na minha direção.
- Qual o problema com o meu sorriso? - Eu rolei os olhos.
- Você sorriu ao falar do Mark. - Ela continuou me olhando com desconfiança. - Você está me escondendo alguma coisa? - Ela não parava de me olhar, procurando qualquer deslize meu.
- Não estou escondendo nada. - Eu afirmei, me esforçando para ser convincente. - Agora, eu vou trabalhar. - Eu sai de fininho para evitar novas perguntas. Meg teve ainda mais certeza de que alguma coisa estava acontecendo, mas deixaria para me colocar contra a parede mais tarde.
A tarde passou bem rápida para mim. O hospital ficou bastante movimentado e eu não consegui parar um só minuto. Isso me fazia perder totalmente a noção de tempo. Quando eu me dei conta, o céu lá fora já estava escuro, mas diferentemente dos outros dias, eu não podia ir embora. Eu ainda tinha que cumprir com a minha palavra e cobrir o turno da noite de uma das estagiárias. Ao contrário de mim, Meg já estava indo embora.
- Vamos? - Meg entrou na sala em que guardávamos as nossas coisas. Ela começou a tirar o seu jaleco.
- Eu vou ter que ficar. Eu prometi substituir o turno da noite, lembra? - Eu fiz bico.
- Ah, é mesmo! - Meg fez careta. - Eu nem lembrava mais disso. - Ela completou.
- Justo hoje. - Eu suspirei.
- Por quê? Você tinha algum compromisso para hoje? - Meg mostrou-se curiosa.
- Tinha. - Eu disse com desânimo. - O Mark tinha me convidado para acompanhar ele em uma… festa do trabalho. - Eu não podia dar detalhes.
- É mesmo? - Meg sorriu com maldade.
- Não começa, Meg. - Eu revirei os olhos.
- Ok. Eu sei que tem alguma coisa acontecendo. - Meg me pressionou. - Qual é! Eu sou a pessoa que mais torce por vocês dois. Por que você não quer me contar? - Ela disse, me dando uma bronca.
- Por que se eu te contar, vai parecer que está acontecendo alguma coisa séria entre nós e eu… - Eu hesitei continuar. - Eu não sei o que está acontecendo. - Eu completei.
- Isso quer dizer que… vocês se beijaram. - Meg deduziu. Eu sorri para ela e neguei com a cabeça. Eu sabia que ela não desistiria.
- Sim. - Eu confirmei e na mesma hora senti o meu rosto corar.
- Awwwwwn! - Meg ficou toda boba e chegou até a me abraçar. - Não acredito que ele te convidou para ir a uma festa e você está aqui nesse hospital. - Ela me olhou feio.
- Eu sei! - Eu fiz careta. - Mas o que eu podia fazer? Eu tinha prometido para a outra estagiária que eu ficaria no lugar dela hoje. - Eu ergui os ombros.
- E que horas é essa festa? - Meg perguntou.
- Eu acho que começou às 19hrs. - Eu não tinha certeza.
- São… 19:30, certo? - Meg perguntou, olhando em seu relógio. - Se você sair daqui agora, acho que dá tempo de chegar até o final da festa. - Ela deduziu.
- Sair daqui agora? Meg, eu não posso. Eu ainda tenho que ficar aqui mais 3 horas. - Eu a olhei, confusa.
- Eu vou ficar aqui mais 3 horas. Você vai para casa se arrumar e vai para essa festa. - Meg falou com um sorriso.
- O que? - Eu achei que ela estivesse brincando. - Você está falando sério? - Eu arqueei uma das sobrancelhas.
- Estou! - Meg afirmou na mesma hora. - Anda. Pega as suas coisas. - Ela colocou minha bolsa em minhas mãos.
- Você está maluca? - Eu ri, sem acreditar. - Mas eu não tenho nem um vestido para ir. - Eu argumentei.
- , você quer mesmo ir a essa festa? - Meg colocou suas mãos em meus ombros e me olhou nos olhos.
- Eu quero muito. - Eu sorri, sem jeito.
- Então, você vai dar o seu jeito! - Ela respondeu. - Agora, vai! - Meg estava praticamente me expulsando da sala.
- Você não existe, Meg. - Eu a abracei rapidamente e beijei o seu rosto. - Fico te devendo mais essa. - Foi a última coisa que eu disse antes de sair pela porta.
MUDE A MÚSICA:
Saí do hospital feito um furacão e tentei evitar contato com todas as pessoas daquele hospital que poderiam falar comigo. Eu não tinha tempo para conversar. Eu já estava indo na direção do estacionamento, quando me lembrei que não tinha vindo de carro para o trabalho. Me xinguei mentalmente quando me dei conta de que ainda teria que pegar um táxi. Eu estava prestes a discar o número da empresa de táxi, quando vi um táxi deixando um passageiro na frente do hospital. Saí correndo feito uma louca e por pouco consegui chegar no táxi.
- Oi. - Eu entrei no táxi completamente eufórica. - Eu preciso ir pro shopping. Você conhece aquele que fica aqui perto, né? - Eu disse quase atropelando as palavras. O taxista confirmou que conhecia. - Vai o mais rápido que você puder. - Eu pedi a ele.
Eu já tinha um plano para conseguir chegar na festa antes que ela acabasse, mas ele era muito arriscado e tinha grandes chances de dar errado. Ciente de que seria impossível comprar uma roupa tão rápido, pois eu não tinha tempo para provar nada, eu decidi alugar um vestido. A ideia era alugá-lo sem nem sequer experimentá-lo. Como eu disse, era bastante arriscado. Eu poderia alugar o vestido mais bonito da loja, mas ao chegar em casa e experimentá-lo, ele poderia não me servir. Se isso acontecesse, ao menos eu não teria qualquer prejuízo financeiro, pois eu teria que devolvê-lo para a loja no dia seguinte.
Cheguei na loja e já fui logo procurando um vestido. Olhei em todos os cabides e nenhum me parecia bonito o suficiente. Os vestidos razoáveis certamente não me serviriam. Perdi 10 minutos naquela loja e não consegui encontrar nada! Eu já estava bastante chateada e conformada, quando uma vendedora finalmente me abordou.
- Posso ajudá-la? - A vendedora deu o seu melhor sorriso.
- Oi! Acho difícil você conseguir me ajudar. - Eu disse, frustrada. - Está acontecendo uma festa nesse momento e eu estava precisando de um milagre. - Eu sorri ao ver a vendedora rir.
- Essa festa… é chique? - A vendedora me analisou da cabeça aos pés.
- Sim! - Eu afirmei.
- Certo. Eu acho que tenho o seu milagre no meu estoque. Acabou de chegar e eu nem tive tempo de cadastrar e colocar preço. - A vendedora disse, afastando-se e indo até o estoque. O jeito convincente com que ela disse a frase, me deixou extremamente esperançosa. Meus olhos acompanharam ela se reaproximar com o vestido nas mãos. - Aqui. - A vendedora o colocou sobre o balcão e a única coisa que eu conseguir ver foi que o vestido era lilás. - Eu acho que vai servir perfeitamente em você. - Ela disse, enquanto tirava o vestido de dentro do plástico. Não sei se foi porque a minha expectativa estava muito baixa ou se eu estava desesperada para que aquele vestido desse certo, mas ao olhar para ele, meus olhos chegaram a brilhar. O vestido era simplesmente maravilhoso.
- Ele é lindo. - Foi amor a primeira vista. - Será que vai servir? - Eu fiz careta, preocupada.
- Eu tenho quase certeza que sim, mas por que você não experimenta? - A vendedora sugeriu.
- Moça, eu não tenho tempo. - Eu neguei na mesma hora. - Eu vou levar esse. Se não servir, vai arruinar a minha noite, mas vou arriscar. - Eu disse, indo na direção do caixa. - Quando eu devo vir devolver? - Eu perguntei, pegando a minha carteira.
- Pode ser amanhã mesmo. - A vendedora disse.
- Certo. - Eu concordei.
Depois de pagar o aluguel do vestido, agradeci a vendedora, peguei o vestido e sai da loja praticamente correndo. A pressa era tanta, que parecia que eu tinha demorado uma eternidade para chegar até o lado de fora do shopping, onde o táxi ainda me esperava. Entrei no carro às pressas e já fui logo passando o enderenço da minha casa para o motorista, que demorou um pouco mais de 10 minutos para me conduzir até lá.
- Muito obrigada! Pode ficar com o troco. - Eu praticamente joguei o dinheiro no motorista e saltei do carro.
Ao passar pelo lugar que o Big Rob ficava, entranhei o fato de ele não estar lá. Demorei alguns segundos para me lembrar que ele tinha me pedido folga naquela semana. Peguei a chave da porta na bolsa e a abri. Entrei na casa, voltei a trancar a porta e subi correndo a escada. Eu tinha tantas coisas para fazer em tão pouco tempo, que eu nem sabia por onde começar.
Enquanto eu tomava um rápido banho, eu pensava no calçado e nos acessórios que eu usaria. Ao sair do banheiro, fui direto secar o meu cabelo e aproveitei para ir dando uma arrumada nele. Com o cabelo pronto, fui até a minha caixinha de joias e escolhi os brincos, a pulseira e os anéis que eu usaria. Depois, fui fazer a minha maquiagem. Eu não tinha tempo para elaborar tanto, mas eu também não podia passar algo tão simples. Levei quase 20 minutos para terminar a minha maquiagem e logo em seguida fui pegar a sandália que eu havia escolhido usar. Uma hora depois e só faltava a parte mais importante: vestir o vestido. Sim, eu havia deixado a prova do vestido por último, pois o medo que ele não me servisse era maior que tudo.
- Vamos lá. - Eu peguei o vestido nas mãos. - Eu espero que sirva. - Eu disse em meio a um suspiro. Vesti o vestido com muito custo e muito cuidado, pois eu não podia estragar o cabelo ou a minha maquiagem. Mesmo sem olhar no espelho, fiquei feliz pelo vestido ao menos ter servido. Ainda de costas para o espelho, eu coloquei o cinto que tinha vindo como um acessório do vestido e coloquei a sandália que era praticamente da mesma cor do vestido. - Ok. - Eu respirei fundo, antes de conseguir coragem para me virar e encarar o espelho. Todo o meu nervosismo e receio foram recompensados com a sensação maravilhosa que eu senti ao me ver naquele vestido (VEJA AQUI). Tinha ficado perfeito.
Se eu tivesse mais tempo, eu ficaria o resto da noite me arrumando. Eu queria estar perfeita para o Mark, mas infelizmente eu não podia fazer nada a respeito. Eu já estava extremamente atrasada! Liguei para a companhia de táxi para que alguém viesse me buscar para me levar na festa e enquanto o táxi não chegava, eu aproveitei para dar uma melhorada no meu cabelo.
estava na casa do Mark e pretendia ficar lá o resto da noite. Ele tinha alguns projetos do trabalho para aprovar e, por isso, não poderia sequer sair para se distrair ou para beber alguma coisa. estava fazendo isso muito bem até o momento em que o telefone da casa tocou. Na primeira vez que ligaram, ele optou por não atender. Ele também ignorou a segunda ligação seguida, mas ele não fez o mesmo com a terceira.
- Alô? - atendeu a ligação, sem imaginar de quem se tratava.
- Boa noite. - Era a voz de uma moça. - Eu gostaria de falar com o Mark. - Ela completou.
- Ele não está. Posso te ajudar? - colocou-se à disposição.
- Você pode dar um recado para ele, por favor? - A moça gentil pediu.
- Claro. - concordou imediatamente.
- Eu trabalho na agência de viagens AZN e estou entrando em contato para informar ao senhor Mark sobre a promoção de passagem aérea para a Bélgica, na qual ele estava interessado. - A atendente disse da maneira mais natural de todas.
- Você disse… Bélgica? - ficou inevitavelmente surpreso.
- Sim, senhor. - Ela confirmou. ficou tão perplexo, que não conseguiu dizer nada por alguns longos segundos. - Posso deixar o meu telefone para que ele possa me ligar caso ele se interesse na nossa promoção? - A moça perguntou.
- Claro que sim. - respondeu e já foi logo anotando o número de telefone que a atendente foi passando.
- Muito obrigada. Boa noite. - A atendente agradeceu antes de desligar a ligação.
Ainda impactado com a notícia, ficou algum tempo com o telefone no ouvido. Bélgica? O Mark estava pensando em ir para a Bélgica? Por que ele não falou nada sobre o assunto? Quais motivos ele teria para esconder uma notícia daquela magnitude? Ele viajaria a trabalho? Ele viajaria a passeio? tinha muitas perguntas, mas só havia uma pessoa que poderia respondê-las. Seria extremamente difícil para o voltar a trabalhar depois daquele telefonema.
Em menos de 10 minutos, o táxi chegou. Peguei a minha bolsa e o meu celular e sai do quarto. Andei o mais rápido que eu consegui com aquele salto e cheguei no táxi em um tempo razoável. Depois de entrar no carro, peguei o convite da festa que o Mark havia me dado e passei o endereço para o motorista. Durante o caminho, olhei no celular para ver a hora mais de 5 vezes. Já passava das 21:30 e eu não sabia se conseguiria entrar na festa ou se eu ainda encontraria o Mark lá.
- Muito obrigada! - Eu paguei o motorista do táxi assim que ele parou o carro na frente do salão. Ao descer do carro, fiquei alguns segundos observando a decoração extremamente requintada do local. Fiquei com receio de não estar tão bem vestida quanto deveria, mas depois de tudo o que eu tinha feito para chegar até ali, eu entraria naquela festa mesmo se estivesse nua!
- Oi! - Eu sorri para o segurança enorme, que estava na porta do salão. - Eu sou uma convidada. - Eu forcei um sorriso.
- Está um pouco atrasada, não acha? - O segurança me olhou com desconfiança.
- Sim, eu sei. Eu… tive um contratempo e só consegui chegar agora. - Eu me esforcei para ser extremamente simpática. - Aqui. Eu tenho o convite. - Eu peguei o convite da festa na minha bolsa e entreguei para ele. Antes de me liberar, ele ainda hesitou em acreditar em mim.
- Está bem. Eu vou te liberar. - O segurança afirmou com a cabeça, afastou-se e abriu a porta do salão.
Ao entrar no salão, me deparei com dezenas de pessoas desconhecidas, mas que estavam extremamente elegantes. Felizmente, ninguém havia me notado entrar no salão. Considerando o trabalho do Mark e que eu era apenas a acompanhante dele, chamar a atenção poderia não ser bom. Comecei a andar pelo salão e meus olhos procuravam incessantemente uma só pessoa: o Mark. Fui passando por todas as pessoas da festa e não conseguia encontrá-lo. Cheguei a dar a volta toda no salão e nada! Eu já estava me convencendo de que ele já havia ido embora, quando eu o vi perto de uma das portas do salão. Ele falava distraidamente no celular. Foi inevitável não notar o quanto ele estava maravilhoso com aquele smoking.
Mark não fazia a menor ideia que eu estava naquele salão e que estava olhando para ele naquele exato momento. Eu não sabia muito bem como abordá-lo sem chamar a atenção de todos a nossa volta e, além disso, eu queria surpreendê-lo da melhor maneira que eu conseguisse e eu já sabia como fazer isso. Peguei o meu celular e me afastei um pouco de onde ele estava para evitar que ele me visse. Disquei o número do celular dele e continuei a olhá-lo de longe. Vi quando ele tirou o seu celular do bolso do smoking e deixou um sorriso escapar quando viu o meu nome na tela.
- Alô. - Mark atendeu, sem desconfiar de nada.
- Hey. - Eu disse, fazendo um esforço enorme para escutá-lo. A música estava um pouco alta. - Está tudo bem? - Ele logo pensou em seu pai.
- Está tudo bem. - Eu confirmei. Ele também estava com dificuldade para me escutar.
- Espera um segundo. - Mark pediu, enquanto andava na direção de uma das portas do salão. Ele saiu pela porta com a intenção de afastar-se da música e deparou-se com um belo jardim, que ficava nos fundos do salão. - Agora, pode falar. Eu não estava ouvindo. - Ele voltou a falar no celular.
- Como está a festa? - Eu perguntei, me movimentando no salão. Eu tinha visto onde ele tinha ido e estava indo atrás dele.
- Bem, um encontro com o Knox seria mais divertido. - Mark brincou, me fazendo rir.
- Então, eu não perdi nada. - Eu continuei andando no salão.
- Onde você está? - Mark notou a música no fundo da ligação. - Está no hospital? - Ele estranhou. Haviam muitas pessoas conversando e rindo a minha volta.
- Não. Eu acabei conseguindo sair mais cedo. - Eu contei, sem dar muitos detalhes. - E ai, eu resolvi vir para um ‘Happy Hour’ com o pessoal do hospital. - Eu menti, me segurando para não rir.
- Sério? - Mark nem tentou disfarçar a sua decepção. - Aposto que está se divertindo muito mais do que eu. - Ele comentou.
- Você tem razão. - Eu concordei, parando um pouco antes da porta pela qual ele tinha saído. Eu voltei a tê-lo em meu campo de visão. - Eu, inclusive, estou encarando um cara maravilhoso nesse exato momento. - Eu tentei irritá-lo.
- É mesmo? E… - Mark hesitou ao perguntar. - Ele está interessado em você também? - Ele estava muito incomodado.
- Eu não tenho certeza. - Eu fiz careta. - Mesmo depois do beijo, eu não tenho certeza. - Eu não estava mentindo sobre o beijo. Nós realmente havíamos nos beijado na noite passada, mas o contexto era outro.
- Beijo? Vocês… se beijaram? - Mark não conseguia acreditar.
- Sim. Aliás, foi incrível. - Eu continuei sacaneando ele.
- Eu… fico feliz que você esteja se divertindo. - Mark mais uma vez estava tentando disfarçar.
- Eu queria que você estivesse aqui. - Eu disse em meio a um fraco sorriso. - Você ia adorar conhecê-lo. Ele é… gentil, bondoso, engraçado, educado e… muito bonito. - Eu disse e ele ficou em total silêncio. Eu continuava olhando para ele da porta, mas como ele estava de costas, ele ainda não tinha me visto. - Ele… fica muito bem de smoking, sabia? - Eu perguntei de maneira retórica, sabendo que ele entenderia tudo dali alguns segundos. A expressão no rosto dele mudou. - Eu adoraria ir até lá e falar com ele, mas… eu ainda estou parada aqui, esperando ele se virar, me olhar e se dar conta de que eu estou aqui por ele. - Antes mesmo que eu terminasse a frase, Mark percebeu que eu estava falando dele. Ele sorriu na mesma hora, enquanto negava com a cabeça. Ele virou-se na minha direção com aquele mesmo sorriso desconsertante.
Quando nos olhamos pela primeira vez naquela noite, nós ainda segurávamos os nossos celulares no ouvido. Mark não sabia se estava mais feliz por me ver ali ou se estava mais impressionado com o quão bonita eu estava. Ele estava completamente em choque. Desligamos a ligação e eu comecei a andar na direção dele, enquanto trocávamos olhares e sorrisos. Parece besteira, mas aqueles poucos segundos que eu levei para me aproximar dele foram os mais mágicos entre nós dois. Mark sabia que eu estava lá por ele e eu estava muito mais do que realizada por estar ali com ele.
- O que você está fazendo aqui? - Mark perguntou, ainda sem acreditar que eu realmente estava ali.
- Eu vim salvar a sua noite. - Eu disse a mesma frase que ele havia me dito no dia do meu encontro com o Knox. Ele se lembrou disso. - Eu meio que… te devia isso, não é? - Eu completei.
- Você está… - Os olhos dele percorreram rapidamente o meu corpo. - Linda. - Ele completou, me olhando nos olhos.
- Obrigada. - Eu fiquei um pouco sem jeito. - E você definitivamente deveria usar smoking mais vezes. - Eu tentei devolver o elogio.
- Oh, não. Eu odeio isso. - Mark fez careta, olhando para o seu smoking.
- Eu gosto. - Eu levei minhas mãos até a gravata borboleta que ele usava e a ajeitei.
- O seu vestido também é muito bonito. Há quanto tempo você está planejando isso? - Mark me olhou com desconfiança.
- Um pouco mais de 2 horas. - Eu respondi, sabendo que ele ficaria surpreso.
- O que? Como assim? - Mark ficou confuso.
- Eu estava no hospital e não conseguia parar de pensar o quanto eu queria estar aqui com você. - Eu comecei a contar. - Então, a Meg se propôs a ficar no meu lugar e eu tive que correr e me arrumar em menos de 2 horas. Esse vestido, inclusive, foi alugado em 10 minutos. - Eu ri ao me lembrar de toda a correria.
- Não brinca. - Mark não acreditou.
- Juro. - Eu confirmei.
- Isso é loucura! Esse vestido parece ter sido feito pra você. Isso não pode ser verdade. - Mark ainda estava desacreditando.
- Bem, eu agradeço, mas… eu acho que foi sorte. Hoje deve ser o meu dia de sorte, porque não deu nada errado. Se tivesse dado, eu não estaria aqui agora. - Eu disse.
- Eu sinto muito, mas a sua sorte não é maior que a minha. A minha acompanhante é a garota mais linda dessa festa. - Uma frase dele e eu já estava completamente sem jeito novamente. Como sempre, eu fiquei sem palavras. Eu nunca sabia como reagir diante de palavras como aquelas.
- Que bom que eu consegui chegar a tempo. Eu pensei que você já pudesse ter ido embora. - Eu desconversei.
- Para ser honesto, eu realmente já estava indo embora. - Mark forçou um sorriso.
- Sério? - Eu fiz careta. - E o seu suspeito? - Eu disse em tom de voz mais baixo.
- Ele estava limpo. Ele não era o cara que eu estava procurando. - Mark explicou, contrariado.
- Ah, que pena. - Eu lamentei por ele.
- Não, tudo bem. - Mark negou com a cabeça. - Por sorte, você apareceu a tempo de salvar o resto da minha noite. - Ele voltou a sorrir. De onde estávamos, conseguíamos ouvir a música que vinha de dentro do salão. A música havia ficado um pouco lenta nos últimos minutos e era possível ver alguns casais dançando no centro do salão.
- Essa era a minha intenção. - Eu fiquei feliz por ouvi-lo dizer aquilo. - Se eu me lembro bem, você escolhe o que vamos fazer agora. - Eu novamente fiz referência a noite do meu encontro com o Knox. - O que você quer fazer agora? Invadir uma aula particular? Comer um hambúrguer? - Eu brinquei aos risos.
- Fácil! Eu já sei o que eu quero. - Mark respondeu na mesma hora.
- O que? - Eu perguntei, curiosa.
- Eu quero dançar com você. - Mark afirmou com um doce sorriso. Confesso que fui pega de surpresa, mas isso não me fez ficar menos encantada com a maneira que ele havia dito aquela frase.
- Você sabe, eu não gosto muito de dançar, mas… já que é você que está me pedindo. - Eu ironizei, fazendo com que ele risse sem emitir qualquer som. Ele estendeu uma das mãos na minha direção. - Aqui? - Eu estranhei.
- Em qualquer lugar que você quiser. - Ele ergueu os ombros. Eu estava tão absurdamente impactada com tudo aquilo e com aquele clima incrível que acabamos construindo, que eu não me importava onde nós iríamos dançar. Eu só queria dançar com ele. Eu levei a minha mão até a dele e ele me puxou para mais perto na mesma hora.
Começamos a movimentar os nossos corpos de um lado para o outro. Mark ainda segurava uma das minhas mãos e sua outra mão estava em minha cintura. Havia apenas um palmo distanciando o rosto dele do meu. Ele olhava nos meus olhos, todo sério, e eu não conseguia deixar de olhar aqueles olhos verdes que pareciam me hipnotizar. Apesar da proximidade, eu não estava nem um pouco nervosa. O Mark sempre me deixava muito tranquila em relação a tudo. Ele me acalmava só com o seu toque.
- Obrigado por estar aqui. - Mark agradeceu. - Eu sei o quanto você se esforçou para estar aqui hoje. - Ele completou.
- Você realmente quer saber por que eu vim até aqui essa noite? - Os olhos de Mark acompanharam os meus lábios, enquanto eles pronunciavam a frase.
- Por quê? - Mark perguntou, distribuindo olhares por todo o meu rosto.
- Por isso. Essa dança. - Eu deixei um sorriso escapar. - Eu queria dançar com você. - Eu finalmente disse. - Porque a última vez que fizemos isso, foi naquela outra noite. - Ele não deixava de me olhar por um só segundo. - E…. eu me lembro de pensar que, apesar de já ter dançado muitas vezes, aquela parecia a primeira vez pra mim. - Eu o vi sorrir ao final da minha frase. - E depois, eu fiquei pensando nisso por dias… e me dei conta de que não tinha a ver com a dança, tinha a ver com nós. - Eu fiz uma breve pausa, pois tentei ler a expressão no rosto dele. - Nós já vivemos muitas coisas juntos, mas naquele momento, naqueles poucos minutos em que nós dançamos, parecia a primeira vez pra mim. - Depois de terminar a frase, fiquei um pouco nervosa com a demora do Mark de dizer qualquer coisa. Eu tinha medo de estar vendo mais coisas do que realmente existia.
- Eu sei exatamente do que você está falando. - Mark finalmente disse.
- Sabe? - Eu fiquei tão aliviada ao ouvi-lo concordar comigo, que deixei um sorriso escapar.
Ouvir que ele sabia exatamente do que eu estava falando me deixou surpreendentemente feliz. Mais uma vez, os olhos dele desceram até os meus lábios para acompanhar o meu sorriso. Ele afastou-se por um momento, soltou a minha cintura e ergueu sua mão para me girar. Depois do giro, Mark voltou a me puxar para perto, mas ao invés de continuar segurando a minha mão, ele a levou até o seu ombro. Com isso, meus dois braços ficaram em volta de seu pescoço e os braços dele ficaram em volta da minha cintura. Estávamos inevitavelmente mais próximos naquele momento, mas ainda balançávamos lentamente os nossos corpos de um lado para o outro.
- Então, eu não estou ficando maluca. Realmente está acontecendo alguma coisa. - Eu perguntei, distribuindo olhares pelo rosto dele.
- Seria muito mais fácil dizer que tudo isso é coisa da sua cabeça, mas… quem eu estou querendo enganar? - Mark negou sutilmente com a cabeça.
- Eu sei. - Eu sabia que ele referia-se ao irmão. - Eu sei como isso pode soar para algumas pessoas, mas… - Eu hesitei. - O que eu posso fazer? Eu não posso controlar esse tipo de coisa. É o que eu estou sentindo. - Mesmo sabendo que não era necessário, eu quis me justificar. - Eu gosto de você. Eu não queria, mas eu gosto. - Eu finalmente consegui dizer aquilo em voz alta. - Desculpa se tudo isso vai causar algum tipo de problema entre você e o seu irmão. Eu não queria… passar por isso. - Eu rolei os olhos, me considerando a pior pessoa do mundo. Mark continuou me olhando com aquele sorriso fraco e ao mesmo tempo tão desconsertante.
- Desculpa, eu não ouvi mais nada depois de ‘eu gosto de você’. - Mark disse, me arrancando um sorriso.
- Talvez seja melhor eu… - A última frase dele me trouxe de volta para a realidade. Por poucos segundos, eu me arrependi de ter dito aquelas coisas para ele. Não por não me sentir daquele jeito, mas sim por saber que não era certo me sentir daquele jeito. Eu achei melhor me afastar e tentar ignorar que aquilo tinha acontecido, mas o Mark não deixou. Ele segurou a minha mão, evitando que eu me afastasse e voltou a colocar o meu braço em volta de seu pescoço.
- Não. - Mark sussurrou, me olhando de ainda mais perto. - Eu já te perdi tantas vezes. Eu já abri mão de você mais de uma vez. Eu não vou fazer isso de novo. - Ele disse, sem tirar seus olhos dos meus. A frase dele fez meu coração disparar inesperadamente. Eu não consegui dizer nada. Eu só fiquei olhando pra ele, enquanto pensava no quão maravilhoso ele era.
Em meio aos nossos olhares tão sinceros, Mark foi aproximando lentamente o seu rosto do meu. Os olhos dele passaram a revezar entre os meus olhos e os meus lábios. Eu não forcei qualquer aproximação, enquanto ele continuava aproximando o seu rosto do meu. Quando a ponta dos nossos narizes se tocaram, meus olhos se fecharam involuntariamente. Não demorou para que eu sentisse os lábios dele colarem nos meus. O beijo começou com um selinho, mas foi rapidamente aprofundado. Eu correspondi o beijo de todas as maneiras possíveis. Quem eu estava querendo enganar? Eu queria muito aquele beijo. Meu coração estava prestes a explodir por causa daquele turbilhão de sentimentos que eu senti. O coração do Mark já tinha explodido no momento em que ele me viu naquele noite.
Aquele beijo foi de longe o melhor beijo que já havia acontecido entre nós. Diferentemente das outras vezes, o que sentíamos pelo outro não parecia tão desigual dessa vez. Tudo entre nós estava sendo extremamente recíproco. Aquilo era novo para nós, especialmente para mim, que só havia me sentido daquela maneira uma única vez até aquele momento. Quando o beijo foi terminado por mim, ambos demoramos alguns segundos para abrir os olhos, mas quando abrimos encontramos o sorriso um do outro. Selei os lábios dele mais uma vez e ao descolar os nossos lábios, me aproximei ainda mais e o abracei. Com os seus braços ainda em minha cintura, ele apertou o meu corpo contra o dele. Fechei os meus olhos e senti ele depositar um beijo carinhoso em um dos meus ombros.
- Bom, nós já dançamos. O que você quer agora? - Eu disse, assim que terminei o abraço.
- Eu nem sei mais o que pedir. Não tem mais como superar isso. - Mark brincou, me fazendo rir, sem jeito.
- Você realmente já estava indo embora? - Eu perguntei.
- Estava. - Mark confirmou. - Eu não parei um só minuto desde hoje de manhã. Eu estava um pouco cansado e ia aproveitar para ir para casa, já que a minha acompanhante tinha me dado o bolo. - Ele explicou.
- Eu não tinha te dado o bolo! - Eu cerrei os olhos na sua direção. - Mas… eu entendo exatamente o seu cansaço. Eu também trabalhei o dia todo hoje. - Eu fiz careta.
- Eu sei. Eu percebi pela sua cara. - Mark levou uma de suas mãos até o meu rosto e o acariciou. - Você parece cansada também. - Ele completou.
- Nós podemos ir para casa, se você quiser. - Eu sugeri, demonstrando que não me importava.
- Você se esforçou tanto para vir até aqui e agora vamos embora? - Mark não tinha achado a ideia ruim, mas ele estava pensando em mim.
- Não tem problema. - Eu neguei com a cabeça. - Eu já ganhei a noite. - Eu disse e percebi que ele ficou um pouco impactado com a minha frase. Ele ficou alguns segundos me olhando com aquele sorriso bobo, que era extremamente adorável.
- Sério? - Mark não conseguia acreditar que eu realmente estava levando tudo aquilo que estava acontecendo entre nós tão a sério. - Eu quero dizer… tudo isso. É sério mesmo? - Ele perguntou.
- É claro que é sério! - Eu afirmei na mesma hora. - Deixa de ser bobo. - Eu neguei com a cabeça novamente. - Vamos. - Eu levei a minha mão até a dele e comecei a puxá-lo em direção a porta do salão. Mark não conseguiu disfarçar sua reação ao segurar a minha mão. Fazia muito tempo que não fazíamos isso.
Passamos discretamente por todo o salão. Apesar de termos os convites físicos da festa, não podíamos nos considerar convidados. Era uma festa particular e só estávamos ali por causa de um trabalho secreto do Mark. Com isso, precisávamos passar despercebidos e foi exatamente isso o que conseguimos. Depois de pegarmos alguns salgados do coquetel que, por sinal, estava maravilhoso, seguimos em direção ao lado de fora do salão e continuamos inconscientemente de mãos dadas até chegarmos no carro do Mark.
- Obrigada. - Eu sorri de maneira tímida, antes de entrar no carro. Ele havia aberto a porta para que eu entrasse.
- E então, quais os seus planos para amanhã? - Mark perguntou apenas para puxar assunto.
- Eu estava pensando nisso. - Eu respondi na mesma hora. - Como o seu pai já está melhor, eu acho que vou para a faculdade amanhã de manhã e a tarde eu vou para o hospital. - Eu contei.
- Isso é ótimo. Não tem necessidade de você ficar perdendo aula e se prejudicando por causa do Steven. - Mark fez questão de ressaltar.
- E você? O que você vai fazer amanhã? - Eu devolvi a pergunta.
- Eu vou ver se consigo ficar em casa amanhã. Eu tenho algumas coisas para resolver. - Mark fez careta.
- E… eu posso te ajudar nisso ou… - Mesmos em saber do que se tratava, eu ofereci.
- Não. Não precisa. Obrigado. - Mark deixou de prestar a atenção no trânsito por um segundo para me olhar. - São coisas que eu mesmo tenho que resolver. - Ele falou, deixando de me olhar. Conhecendo-o tão bem quanto eu conhecia, eu notei um pouco de preocupação no tom de voz dele.
- Está tudo bem? - Eu só queria ter certeza.
- Sim, está. - Mark afirmou na mesma hora, esforçando-se para me tranquilizar.
Mark tinha sim uma grande decisão para tomar e a preocupação e nervosismo tem feito companhia a ele há alguns dias. Ele não havia pedido a opinião ou sequer desabafado com ninguém. Ninguém sabia as milhares de possibilidades que já haviam passado na sua cabeça naquela última semana. E se as coisas já estavam difíceis para ele, depois daquela noite, as coisas pioraram ainda mais. Independentemente de qual fosse a decisão dele, não seria nada fácil.
Conversamos bastante durante todo o trajeto até a minha casa, aliás, até a “nossa” casa, já que nós éramos vizinhos. Mark poderia ter estacionado o seu carro em sua casa e ter me acompanhado até a minha casa, mas preferiu parar o carro na frente da minha casa e me deixar lá e depois seguir para a casa dele. Ele não queria chamar a atenção do . Ele não queria o que o irmão visse que estávamos juntos.
Mesmo o Mark sendo bastante cuidadoso e esforçar-se para ser discreto, não foi o suficiente. Ao ouvir o barulho do carro, foi até a janela da casa para ver de quem se tratava. Ele não tinha a menor pretensão de me ver ou até mesmo de ver o seu irmão. achou que pudesse ser um dos vizinhos, mas estava enganado. Ao afastar a cortina e olhar para o lado de fora, me viu saindo de dentro do carro do Mark. Estávamos tão distraídos, que mal percebemos que ele nos observou por alguns longos segundos.
Difícil explicar como o se sentiu ao nos ver juntos. Ele não viu um beijo e nem mesmo um abraço mais acalorado. Ele não viu nada demais, mas o que ele viu era mais do que suficiente para ele ter certeza de que alguma coisa estava acontecendo entre eu e o Mark. tem reparado algumas trocas de olhares e alguns gestos entre o irmão mais velho e eu. Ele não era bobo. Talvez, ainda não conhecesse o irmão suficientemente bem para conseguir interpretar um olhar, um sorriso e até mesmo um gesto, mas ele sabia bem como ver tudo isso através de mim. me conhecia muito bem.
Ao fechar novamente a cortina, demorou alguns segundos para conseguir interpretar o que estava sentindo. Era uma mistura de decepção e tristeza, mas, ao mesmo tempo, havia um sentimento de conformismo. Conformismo sim! sempre soube que o irmão era apaixonado por mim e também sabia que eu tinha todo o direito de gostar de uma outra pessoa, considerando as últimas besteiras que o havia feito. A maneira infantil com que ele reagiu a descoberta do sobre a minha virgindade talvez tenha sido a gota d'água pra mim. sabia que estava quase me perdendo de vez ou, talvez, isso já tivesse acontecido.
- Não precisava ter me trazido até a porta. - Eu parei bem em frente a porta da minha casa.
- Como não? - Mark sorriu. - Aliás, cadê o Big Rob? - Ele perguntou ao perceber que o local que o Big Rob costumava ficar estava vazio.
- Eu dei folga pra ele durante essa semana. - Eu expliquei.
- Então, é melhor você ficar um pouco mais atenta na hora de chegar e sair de casa durante essa semana. - Mark aconselhou, preocupado.
- Não precisa se preocupar. - Eu neguei com a cabeça. - Eu tenho um agente do FBI bem ao lado da minha casa. Nada de ruim pode me acontecer. - Eu brinquei em um tom de voz mais baixo.
- Claro! É claro que eu sempre vou estar aqui por você, mas… eu quero que você tome cuidado de qualquer forma. Combinado? - Mark estendeu uma das mãos.
- Combinado. - Eu apertei a mão dele, enquanto trocávamos sorrisos. Era adorável a preocupação dele comigo.
- Eu nem sei como te agradecer por hoje. - Mark ergueu os ombros.
- Eu sei! Amanhã, você me paga um sorvete. - Eu sugeri o mesmo que ele me sugeriu na noite do meu encontro com o Knox.
- Fechado. - Mark riu, sem emitir qualquer som.
- Eu também te agradeço pelo convite e pela noite. Foi bem curta, mas foi incrível. - Eu também ri.
- Nós poderíamos ter ficado mais e… - Mark começou a se lamentar.
- Não. - Eu toquei a mão dele. - Valeu a pena. - Eu afirmei, tranquilizando-o.
- Você não existe. - Mark levantou a sua mão que eu estava tocando e a levou até a sua boca, onde ele depositou um beijo. Logo depois, ele se aproximou e me abraçou. O abraço dele era tão incrível, que meus olhos sempre se fechavam espontaneamente quando ele me abraçava. - Eu te vejo amanhã. - Ele disse ao terminar o abraço e depositar um beijo carinhoso em uma das minhas bochechas.
- Eu vou cobrar o meu sorvete. - Eu disse em tom de brincadeira.
- Pode cobrar! - Mark riu, dando alguns passos para trás. Ele não queria que eu achasse que ele estava esperando qualquer beijo de despedida. Estávamos próximos sim, mas ainda não estávamos próximos o suficiente para trocarmos beijos a qualquer momento.
- Boa noite, Mark. - Eu sussurrei com um sorriso bobo que eu não conseguia conter, quando ele já estava entrando em seu carro. Eu estava caidinha por ele. Acenei uma última vez para ele, antes de destrancar a porta da minha casa e entrar.
Apesar de ter ficado menos de uma hora naquela festa, eu estava muito feliz por ter conseguido chegar até lá a tempo. Ver a expressão no rosto do Mark no momento em que ele viu que eu estava lá por ele foi inexplicável. Estávamos naquela fase em que qualquer coisa que ele fizesse, eu acharia a coisa mais doce e incrível de todas. Meus sentimentos sempre interferiram muito nos meus pensamentos, nas minhas decisões e nas minhas atitudes. Pelo Mark, eu teria ido naquela festa nem que fosse para ficar 5 minutos. Eu procurava todo e qualquer motivo para estar ao lado dele.
Mark chegou em casa com toda a certeza do mundo de que o não tinha visto e nem sabia de nada. Não era como se ele quisesse esconder do irmão, pois não era necessário. Ambos eram adultos e responsáveis por suas atitudes. Porém, Mark se importava muito com o irmão para expor toda a situação que estávamos vivendo de uma maneira tão boba. Mark sabia o que o sentia por mim e respeitava muito esse sentimento e, por isso, achava melhor não contar ao do nosso envolvimento naquele momento em que nem mesmo ele sabia se o que estava acontecendo entre nós realmente iria para frente.
- Hey. - Mark cumprimentou o irmão ao entrar em sua casa. estava sentado no sofá e havia alguns papéis em suas mãos. Depois de nos ver pela janela, ele havia voltado a trabalhar e pretendia agir como se não tivesse visto nada.
- E ai, Markey. - respondeu, sem olhá-lo. Seus olhos continuaram fixos nos papéis em suas mãos.
- O que você está fazendo? - Mark perguntou, aproximando-se do sofá.
- Trabalhando. - finalmente o olhou. - E você? Bancando o James Bond de novo? - Ele referia-se ao smoking.
- Eu estava trabalhando também. - Mark respondeu, fazendo cara feia.
- Sei. - voltou a dar atenção aos papéis.
- Você já comeu? - Mark sentou-se ao lado do irmão no sofá.
- Já comi. - confirmou.
- E você teve alguma notícia do Steven? Alguém ligou pra dar notícias? - Mark não havia percebido o comportamento estranho do seu irmão.
- Não. - negou. - E você, não ficou sabendo de nada? - Ele fez questão de olhá-lo ao perguntar. Já que o Mark estava comigo a noite toda, a chance de ele ter notícias do Steven era maior do que a do .
- Também não. - Mark respondeu. - Se não ligaram é porque ele deve estar bem. - Ele concluiu. - Eu… vou dormir. O dia foi bem cansativo hoje. - Mark levantou-se do sofá, mas não conseguiu dar mais de 4 passos.
- Não ligaram do hospital, mas ligaram da companhia aérea. - até tinha cogitado falar sobre o assunto em um momento mais oportuno, mas ele estava curioso demais para adiar.
- Ligaram? Pra mim? - Mark estremeceu na hora. Ele parou de andar e virou-se para olhar para o irmão.
- Pra você. - confirmou, olhando fixamente para o Mark. - Bélgica, né? - Ele arqueou uma das sobrancelhas.
- É. Talvez, eu tenha que ir pra lá por um tempo por causa do trabalho. - Mark sabia que não tinha outra saída senão contar a verdade, mas sem dar tantos detalhes.
- Quanto tempo? - o pressionou, pois percebeu o seu nervosismo.
- Não sei ainda. - Mark desconversou.
- Meses? - insistiu na pergunta. Mark o olhou, irritado.
- Anos. - Mark finalmente disse. - 3 anos. - Ele complementou em meio a um suspiro.
- 3 anos!? - arqueou ambas as sobrancelhas. - Você vai viajar pra Bélgica por 3 anos e achou que não precisava me contar? - Ele perguntou, surpreso.
- Eu ainda nem sei se eu vou. - Mark rolou os olhos, sem qualquer paciência para discutir o assunto naquele momento.
- Como não vai? É a Bélgica! Por que você não iria? - sorriu, sarcástico. Mark deixou de olhá-lo na mesma hora, enquanto negava com a cabeça. Naquele momento, soube que havia algo errado. - Por que você não iria, Mark? - Ele insistiu na pergunta mesmo com receio do que poderia ouvir.
- Pelo mesmo motivo que você não voltou pra Atlantic City. - Mark acabou de uma vez com todo o mistério. Ele estava falando de mim e o entendeu exatamente o que ele quis dizer. - Era isso o que você queria ouvir, não era? - Ele foi grosseiro antes de sair e deixar o irmão falando sozinho.
Aquela era a primeira vez em semanas que os irmãos Jonas se estranhavam. É claro que houve briguinhas bobas. Eles viviam provocando e irritando um ao outro, mas aquele pequeno atrito que eles tiveram foi muito mais relevante do que uma briga cheia de socos e gritos. A breve troca de olhares e de palavras foi o suficiente para que ambos percebessem o quão decepcionados eles estavam um com o outro. estava chateado porque percebeu que o seu irmão estava realmente apaixonado pela garota que ele sempre amou. Mark estava chateado porque o irmão o havia forçado a falar sobre um assunto que ele não gostaria de falar. Não dava para culpar nenhum deles.
não conseguiu mais trabalhar durante o resto da noite. Ele não queria assumir, mas estava bastante preocupado. Ele estava preocupado com a relação forte que ele sentia que eu e o Mark estávamos construindo. Não tratava-se de ciúmes, pois o sabia muito bem que o Mark não era como os outros caras. Mark era o seu irmão e ele não podia simplesmente insultá-lo e socá-lo na cara. A situação era completamente diferente de todas as outras vezes. sabia que se estivesse mesmo acontecendo algo mais sério entre o seu irmão e a garota que ele amava, ele não poderia fazer nada contra isso.
Mark demorou muito tempo para conseguir dormir. Apesar de estar bem decidido quanto ao que ele realmente queria e sentia em relação a mim, ele também se preocupava com a maneira que o se sentiria. A situação era muito mais fácil quando o Mark não se importava com o que o pensava sobre tudo aquilo. Agora, o Mark se importava e se preocupava muito com os sentimentos do irmão.
VOLTE A OUVIR A MÚSICA:
Na manhã seguinte, acordei bem cedo, pois eu tinha a intenção de voltar a minha rotina: ir a faculdade no período da manhã e ir para o estágio no hospital no período da tarde. Depois de tomar banho e me arrumar, ainda tive tempo de tomar café da manhã antes de sair de casa. Apesar de estar feliz por finalmente ir para a faculdade, eu estava bastante preocupada com as aulas que eu havia perdido nos últimos dias. Eu estava chegando na faculdade, quando o meu celular tocou. No primeiro momento, eu não reconheci o número que estava me ligando, mas decidi atender a ligação de qualquer forma.
- Alô? - Eu atendi, sem saber de quem se tratava.
- ? - Era uma voz feminina, mas eu não consegui reconhecê-la.
- Sim, sou eu. - Eu respondi.
- Oi! Desculpa te ligar a esse horário. - Ela disse o seu nome. - Eu trabalho aqui no hospital. - Ela completou.
- É claro! - Eu me lembrei na mesma hora quem era. Ela era uma das chefes dos enfermeiros do hospital, mas eu não tinha muito contato com ela, pois o plantão dela sempre era durante a noite. - Está tudo bem? - Eu estranhei a ligação.
- Na verdade, não. - A chefe dos enfermeiros não quis adiar ainda mais a notícia. - Você tem um conhecido aqui na UTI, certo? - Ela perguntou.
- Sim! Ele é… tio dos meus amigos. - Eu sabia que eles estavam falando do Steven. Quando eu soube que ela havia me ligado para falar sobre ele, senti meu coração apertar. A notícia não seria boa.
- Então, eu estou te ligando para falar sobre ele. - Ela hesitou por alguns segundos. - Ele teve uma noite muito ruim. - Ela contou. - Eu estava prestes a ligar para um desses telefones que estão aqui na ficha do paciente, mas me informaram aqui no hospital que você o conhecia. Diante das circunstâncias, eu achei melhor avisar você primeiro para que você dê as notícias aos seus amigos. - Diante da gravidade da ligação, parei o carro no primeiro estacionamento que eu encontrei.
- Claro. Sem problemas. Você fez bem. - Eu fiquei muito nervosa na hora.
- Você está ocupada agora? Você pode vir para o hospital? - Ela me perguntou.
- Eu posso! - Eu me prontifiquei a ir até lá na mesma hora.
- Eu estou aqui te aguardando. É melhor conversarmos pessoalmente. - Ela não queria dar qualquer notícia pelo telefone.
- Ok! Eu estou a caminho. - Não pensei duas vezes antes de dar a partida no carro.
- Até já. - Ela disse, antes de desligar a ligação.
A notícia me pegou tão desprevenida, que eu conseguia sentir as minhas mãos tremendo, enquanto seguravam o volante do carro. Não me importava se tratava-se do Steven. Eu não conseguia ser essa pessoa fria que eu queria ser. Com o coração na boca, desisti novamente da minha ida até a faculdade para ir até o hospital. Eu não sabia o que esperar. Eu não sabia se o pior já tinha acontecido.
Depois de estacionar o carro no estacionamento do hospital, me dirigi rapidamente até o balcão de atendimento. Falei com as atendentes que eu já conhecia e elas me informaram onde estava a chefe dos enfermeiros naquele momento e me deixaram entrar para falar com ela. Fui até a sala em que ela estava e bati na porta. Ouvi ela me pedir para entrar na sala e foi exatamente isso o que eu fiz.
- Oi! Pode entrar. - A mulher sorriu ao me ver e apontou na direção da cadeira, me deixando a vontade para sentar.
- Obrigada. - Eu agradeci a gentileza antes de me sentar.
- Que bom que você pode vir. - Ela ficou um pouco mais séria.
- Eu vim o mais rápido que eu pude. - Eu mal conseguia disfarçar o meu nervosismo. - Como ele está? - Eu tive que perguntar.
- Bem, para ser bem sincera, as notícias não são boas. - Ela lamentou. - Foi uma noite muito difícil para todos aqui. O médico acabou de ir embora, pois passou a noite em claro cuidando do paciente. Eu fiquei aqui apenas para te dar as notícias. - Ela contou.
- Ele teve outra crise pulmonar. - Eu deduzi na mesma hora.
- Ele teve a pior crise de todas. - A chefe dos enfermeiros afirmou com tristeza.
- Meu Deus. - Eu neguei com a cabeça. - Como ele está agora? - Eu perguntei com receio da resposta.
- O doutor conseguiu estabilizar um pouco a respiração dele, mas o pulmão está completamente comprometido. - Ela também balançou a cabeça negativamente.
- E ele está consciente? - Eu perguntei.
- No momento está, mas… nós não sabemos até quando. - Ela disse com uma expressão muito triste. Era tudo o que eu não queria ouvir.
- Isso quer dizer que… - Eu não conseguir completar a frase.
- Pode acontecer a qualquer momento, . - A chefe dos enfermeiros me confirmou. - O doutor acha que o pulmão não resiste até amanhã. - Ela completou.
- Oh, não. - Eu levei uma das mãos até o meu rosto, sem acreditar.
- Eu sei que essa é a pior notícia que eu poderia te dar. Eu queria que você soubesse antes dos seus amigos para que você decidisse se você prefere contar a eles você mesma ou se você prefere que eu conte a eles. - Ela colocou aquela difícil decisão em minhas mãos. Eu não soube nem o que dizer. - Eu sei que é uma decisão muito difícil. Tudo bem se você quiser que eu conte. - Ela tentou me tranquilizar.
Em tão pouco tempo, muitas coisas passaram pela minha cabeça. Eu pensei no Mark e em como eu contaria a ele que ele perderia outra pessoa. Eu pensei no e em como eu contaria a ele que ele perderia o pai pela segunda vez. Isso quebrava o meu coração em milhões de pedaços. Eu sabia que ambos sofreriam com a morte do Steven, mas eu também sabia que seria muito mais doloroso para o . Eu era uma das poucas pessoas que realmente sabiam o quanto ele havia sofrido com a primeira perda do pai. Eu só conseguia pensar no quanto ele havia sofrido da primeira vez por não ter conseguido se despedir de seu pai.
- Os meus amigos podem se despedir dele? - Aquela era a minha principal preocupação. Eu não podia deixar que o Steven fosse embora sem se despedir novamente.
- É claro. Eu libero a entrada dos dois. - A chefe dos enfermeiros afirmou na mesma hora.
- Então, eu conto para eles. - Eu decidi. Eu estava pronta para dar aquela notícia triste ao e ao Mark, mas eu queria mesmo era dizer ao que ele iria poder se despedir do pai daquela vez.
- Certo. Eu vou deixar avisado na entrada da UTI a visita dos seus dois amigos. - Ela disse.
- Muito obrigada por ter tido o cuidado de me chamar até aqui para me dar a notícia. Obrigada mesmo. - Eu agradeci por ela ter sido tão atenciosa.
- Sem problemas. - Ela sorriu pra mim. - Eu sinto muito por ter te dado uma notícia tão triste. - Ela lamentou.
- Tudo bem. - Eu neguei com a cabeça ao me levantar da cadeira. - Obrigada novamente. - Eu voltei a agradecer.
- Disponha. - A chefe dos enfermeiros sorriu mais uma vez antes de me ver sair pela porta de sua sala.
Eu estava em pânico. Eu não sabia como fazer aquilo. Eu não sabia como dar uma notícia como aquela. Tinha um nó na minha garganta, que mal me deixava respirar direito. Minhas mãos tremiam, enquanto eu segurava o meu celular. Eu não queria contar nada pelo telefone, por isso, liguei para cada um deles e pedi que eles viessem até o hospital. Ambos deduziram que alguma coisa tinha acontecido por causa do tom da minha voz.
Enquanto esperava os irmãos Jonas chegarem no hospital, cheguei a cogitar a possibilidade de ir até a UTI e ver o Steven pela última vez. Eu senti vontade de dizer a ele que eu o perdoava e também tive vontade de pedir perdão a ele, mesmo sabendo que eu não nunca havia feito nada para ele, mas achei melhor poupá-lo. Eu não queria que ele gastasse o pouco de força que ele ainda tinha para falar comigo. Mark e eram as prioridades.
Devido ao pequeno desentendimento na noite anterior, e Mark não trocaram sequer uma palavra durante todo o caminho até o hospital. Eu tive que segurar o choro quando eu vi os dois entrando lado a lado pela porta do hospital. Eu queria que eles tivessem demorado um pouco mais para chegar. Talvez, eu estivesse mais preparada para dar aquela terrível notícia a eles.
- Oi. - estava visivelmente mais preocupado.
- Oi, . - Eu o olhei, enquanto segurava a minha vontade enorme de chorar. - Mark. - Eu olhei para o irmão mais velho com carinho.
- Oi, . O que aconteceu? - Mark perguntou.
- Uma enfermeira… me ligou e me pediu parar vir aqui. Ela tinha notícias do Steven. - Eu nem sabia por onde começar.
- Boas notícias? - Mark ainda tinha esperanças.
- Más notícias. - respondeu por mim. Ele soube só ao me olhar.
- O pai de vocês… passou muito mal durante a noite. - Eu comecei a contar. Eu não conseguia olhar nos olhos deles. - Os médicos tiveram muito trabalho durante a noite. - Eu estava procurando ar.
- Como ele está agora? - Mark precisava perguntar.
- Agora, ele está consciente, mas… - Deixei de olhá-los para abaixar a minha cabeça e encarar o chão. Eu estava me controlando para não chorar.
- Fala, . - me pressionou. Ele já havia deduzido o que eu estava tentando dizer, mas ele precisava me ouvir dizer.
- O médico disse que o pulmão dele não aguenta até amanhã. - Eu consegui reunir forçar para voltar a olhá-los, mas meus olhos já estavam cheios de lágrimas.
No momento em que eu dei a notícia, foi bem nítida a diferença de reação de cada um deles. Mark parecia ter aceito a notícia e se conformou rapidamente com ela, apesar de demonstrar bastante tristeza. entrou em negação imediatamente. Ele negava com a cabeça e olhava para qualquer lugar daquele corredor, tentando aceitar a realidade daquela notícia. Mark não se moveu, enquanto o se afastou, encostou em uma das paredes do corredor e deslizou lentamente até o chão, onde ele sentou. Mark quis ir até o irmão, mas ele desistiu quando eu tomei a iniciativa de ir até o . Me agachei na frente dele e toquei o seu rosto, fazendo ele olhar para mim.
- Você quer se despedir dele? - Eu perguntei, olhando para os seus olhos cheios de lágrimas.
- Eu posso? - perguntou com a voz embargada.
- Sim, você pode. - Eu sorri, emocionada. - Vem comigo. - Eu segurei a mão dele e esperei ele para que nós levantássemos juntos. Segurei a mão dele durante todo o nosso caminho até a UTI. Mark nos acompanhou, mas não se manifestou em nenhum momento. - Você quer mesmo fazer isso? - Eu perguntei, quando paramos na porta do quarto.
- Eu quero. - afirmou, engolindo o choro.
- Fica calmo, ok? Se você deixá-lo muito nervoso, ele pode ter mais dificuldade de falar. - Eu expliquei.
- Está bem. - concordou, afirmando com a cabeça. Ele passou as mãos nos olhos e engoliu o choro que estava entalado em sua garganta.
- Fica bem. - Eu me aproximei e beijei carinhosamente uma de suas bochechas e depois, a sua testa.
me olhou pela última vez antes de tocar a maçaneta da porta e abri-la. Meu coração estava despedaçado. Na mesma hora, Mark me acolheu em seus braços e nós passamos a consolar um ao outro. entrou no quarto com cuidado e aproximou-se lentamente da cama. Ele só conseguia dizer para si mesmo que conseguia ficar calmo.
- Hey, pai. - disse da maneira mais calma que conseguiu. Ele não queria assustar o seu pai. Steven, que estava com os olhos fechados, abriu lentamente os seus olhos.
- Meu garoto. - Mesmo com a voz extremamente fraca, Steven disse. Ele sorriu ao ver o filho.
- Como você está? - tentou controlar a sua emoção ao ouvir o pai chamá-lo daquela maneira carinhosa. Ele o chamava dessa maneira quando ele era mais novo.
- Eu não sei, mas… eu preciso te dizer algumas coisas. - A voz de Steven continuava fraca, mas ele ainda conseguia falar. - Eu não sei se vou ter a oportunidade de dizer isso depois. - Ele continuou.
- Não. - recusou na mesma hora. - Descanse. - Ele pediu, preocupado.
- Me desculpa, filho. - Steven ignorou o pedido do filho. - Eu sei que eu errei. Eu sei que te decepcionei. - Ele olhou com tristeza para o filho. - Eu abandonei você. Eu abandonei a sua mãe. Eu não podia ter feito isso. - Steven estava querendo se redimir.
- Nós não precisamos falar sobre isso. - tinha ciência do quanto aquele assunto o machucava e, por isso, ele preferia não falar sobre ele. Além disso, ele não queria que o pai se esforçasse.
- Nós precisamos. - Steven insistiu. - Será a nossa última oportunidade de fazer isso. Será a sua última oportunidade de falar sobre isso pra mim. Eu sei que você precisa fazer isso. - Ele tentou incentivar o filho. abaixou a cabeça, deixando de olhá-lo. Ele negou com a cabeça, como se dissesse: ‘Por que você está fazendo isso agora?’. - Eu errei, . Eu não conseguia enxergar isso antes, mas eu consigo enxergar isso agora. - Steven fez uma breve pausa. - Eu deixei você e a sua mãe sozinhos. Eu sei que vocês sofreram muito e eu também sei que eu acabei deixando um fardo muito pesado pra você. - A voz dele continuava muito debilitada.
- Eu era só uma criança. - voltou a olhá-lo. - E, de repente, eu me vi sendo obrigado a ser o homem da casa. Eu tinha que cuidar da minha mãe. Eu tinha que enxugar as lágrimas dela e convencê-la de que tudo ficaria bem. - Ele fez uma breve pausa. - Eu não saia com os meus amigos, porque… eu não queria que ela ficasse sozinha. - Era notável as lágrimas que iam acumulando-se nos olhos dele. - E quando a minha mãe percebeu o quanto isso me afetava, ela se esforçava para parecer mais forte na minha frente. Ela já não chorava mais no meu colo, mas… ela chorava todas as noites antes de dormir. Ela não sabia, mas eu ouvia tudo e… eu só conseguia dormir quando aquele choro parava. - contou, esforçando para deixar as lágrimas escorrerem pelos seus olhos.
- Você não merecia isso. A sua mãe não merecia isso. - Steven ficou visivelmente emocionado.
- Eu não te culpava, pai. Você deveria ter estado lá, mas… não tinha sido culpa sua, certo? Tinha sido um acidente. - ergueu os ombros. - Mesmo desejando muito que você estivesse lá e mesmo tendo passado por tudo aquilo, eu não te culpava por nada. - Ele parou por alguns segundos para tentar se recompor. - Eu não te culpava até descobrir que não tinha sido um acidente. Você escolheu isso. - negou sutilmente com a cabeça. - Você escolheu fazer a minha mãe sofrer. Você escolheu me deixar sem um pai. Você escolheu acabar com o resto da infância que ainda me restava. Você escolheu arruinar cada dia dos pais que eu tive que passar sem você. Você escolheu, pai, colocar cada uma daquelas lágrimas nos olhos da minha mãe. - Cada palavra soava como um desabafo. Steven estava disposto a ouvir tudo aquilo. Ele precisava ouvir tudo aquilo do filho. Ele sabia que merecia.
- Eu sinto muito. Eu achei que estivesse te protegendo. - Steven ouviu cada palavra em lágrimas.
- Eu te odiei, pai. - As lágrimas se acumulavam cada vez mais em seus olhos e escorreriam pelo seu rosto a qualquer momento. - Eu ainda te odeio por tudo isso, mas… - tentou engolir o choro, mas não conseguia. - Eu também te amo. - As lágrimas escorreram de seus olhos ao dizer aquelas palavras. Ele rolou os olhos por um momento e negou com a cabeça antes de continuar. - Eu não consigo evitar. - ergueu os ombros. - Você é o meu pai. - Ele completou. Steven levou sua mão até a mão do filho e a segurou. Ele estava em prantos. - E eu entendo. Apesar de não concordar com tudo o que você fez, eu entendo. - fez questão de olhar nos olhos do pai. - Porque… eu também já fiz muitas besteiras para proteger as pessoas que eu amo. - Ele estava falando de mim, mas não só de mim. - Eu acho que devo ter puxado isso de você. - disse e viu o pai sorrir em meio as lágrimas. Mesmo vendo o pai sorrir, não conseguiu fazer o mesmo, pois o que ele estava prestes a dizer era algo muito significativo. - Eu te perdoou, pai. - Ele disse, sentindo um alívio enorme em seu coração. - Eu perdoou por tudo. - repetiu em meio a mais lágrimas, que dessa vez estavam acompanhadas de um fraco sorriso.
- Obrigado, meu garoto. - Steven também demonstrava estar aliviado. - Eu precisava disso. - Ele voltou a sorrir para o filho.
- Eu precisava disso também. - concordou, passando as mãos pelos seus olhos com a intenção de secar as lágrimas em seu rosto.
- E onde está o seu irmão? - Steven perguntou, tentando se recompor também.
- Ele está lá fora. - respondeu.
- Você acha que você pode trazê-lo aqui? - O pai pediu.
- É claro que sim. - confirmou com a cabeça. - Espere. - Ele saiu do quarto e deparou-se com o irmão mais velho logo na porta. Eu estava ao lado do Mark, que o olhou imediatamente e procurou em seu rosto qualquer vestígio de que o pior havia acontecido.
- E ai? - Mark perguntou, receoso.
- Ele quer falar com você. - respondeu, deixando-o visivelmente surpreso.
- Falar comigo? Por quê? - Mark arqueou uma das sobrancelhas.
- Eu acho que… - hesitou em terminar a frase. - Ele quer se despedir. - Ele disse visivelmente abalado. Mark não conseguiu disfarçar a tristeza enorme que sentiu em seu peito ao ouvir aquela frase.
- Não. Eu não quero fazer isso. - Mark recusou na mesma hora. Seria muito mais fácil para ele lidar com aquela morte sem que houvesse qualquer conversa de reconciliação ou de perdão.
- Do que você tem medo? De descobrir que você não odeia tanto quanto gostaria? - disse, tentando, de certa forma, incentivar o irmão a entrar naquele quarto. - Entre lá e ao menos o escute. - Ele aconselhou. - Ele precisa disso, irmão. - tocou o ombro do irmão e deu dois leves tapinhas. Mark deixou de olhar para o irmão e encarou aquela porta, que o deixava extramente desconfortável e nervoso.
- Ok. Eu vou. - Mark afirmou com a cabeça ao atender o pedido do irmão.
Mark sabia que havia grandes chances de se arrepender de ter concordado em entrar naquele quarto. Ele sabia que o pai não passaria daquela noite e, por isso, tentaria conseguir o seu perdão de qualquer maneira. Mark não sabia se estava pronto para perdoá-lo e também não sabia se algum dia ele conseguiria fazer isso. Existia muita mágoa envolvida naquele relacionamento e, ao contrário do , Mark nunca tinha visto um lado bom em Steven. Ao entrar naquele quarto, suas expectativas de encontrar um pai que ele admirava eram quase inexistentes, mas, talvez, ele encontrasse um pai que, apesar de todos os seus erros, merecesse ser chamado de pai.
- Mark. - Steven sorriu ao ver o filho mais velho. Mark aproximou-se da cama sem dizer absolutamente nada.
- Como o conseguiu convencê-lo a vir até aqui? - A situação debilitada do pai deixou o filho um pouco assustado, mas ele esforçou-se para não deixar esse sentimento transparecer.
- Ele não conseguiu. Eu vim contra a minha vontade. - Mark foi extremamente frio. - Ele disse que você precisava falar comigo. - Ele foi direto ao ponto.
- Uh… ok. Eu sei que eu mereço toda a sua grosseria e todo o seu desprezo por tudo o que eu te fiz passar. - Steven estava reconhecendo o seu erro.
- É, você merece. - Mark concordou na mesma hora.
- Você me lembra tanto a sua mãe. - Steven sorriu ao mencionar a minha tia Janice. - Quando ela ficava brava, ninguém conseguia fazê-la abaixar a guarda. - Ele contou.
- Por que você está dizendo isso? - Mark ainda estava tentando agir friamente.
- Na última vez que nós conversamos, nós brigamos. Eu disse algumas besteiras para ela e… ela disse que me odiava. - Steven contou. - Ela me afastou de você. - Ele completou.
- E você ficou bem triste com isso, certo? - Mark sorriu de maneira irônica.
- Eu não tive opção. Ela fugiu com você. - Steven contou.
- Ela estava me protegendo de você. - Mark argumentou.
- Eu sei que estava e… eu não a julgo por isso. Eu realmente não era uma boa influência para você naquela época, mas isso não quer dizer que eu não quisesse te ter por perto. - Steven estava sendo extremamente sincero e isso era muito visível.
- Para com isso. - Mark deixou de olhá-lo por alguns segundos. - Eu sei que eu sou uma consequência de uma vingança patética. Todos sabem disso! - Ele disse, irritado.
- Não. - Steven negou com a cabeça. - Olha, eu sei que você tem todos os motivos do mundo para não acreditar em mim, mas eu vou dizer de qualquer forma porque é a verdade. - Ele já apresentava um pouco mais de dificuldade de falar. - A gravidez da Janice não foi uma vingança, foi um acidente. - Steven fez questão de olhar nos olhos do filho ao dizer aquilo. - Mark, eu não vou mentir pra você. Eu não estava apaixonado pela sua mãe, mas eu tinha um carinho enorme por ela. Nós crescemos juntos. - Ele sorriu. - Quando eu descobri que o meu melhor amigo estava namorando a minha garota, a Janice ficou do meu lado. Ela foi a pessoa que mais me deu apoio. Ela cuidou de mim, garoto. - Ele pausou por alguns segundos para tentar recuperar o fôlego. O seu problema no pulmão não permitia que ele falasse tanto, mas ele estava se esforçando muito, pois ele precisava falar. - Acabou acontecendo de ficarmos juntos em uma noite e foi nessa noite em que eu a engravidei. Eu não planejei nada. - Steven finalizou.
- Por que eu deveria acreditar você? - Mark demonstrava um pouco mais de fragilidade diante dos novos fatos.
- Filho, eu estou morrendo. Eu não tenho motivo algum para mentir. - Steven disse com a maior serenidade. - Eu me lembro do dia que a sua mãe me contou que estava grávida. Eu… estava tão assustado, mas… ao mesmo tempo eu estava tão feliz. - Ele disse com um enorme sorriso. - Depois, tudo começou a dar errado. Foi um mal entendido atrás do outro. A Janice ficou sabendo sobre a minha discussão com o irmão dela e todos deduziram que tudo era parte de uma vingança. - Steven contou.
- Sempre a vingança. - Mark negou com a cabeça.
- O medo da vingança nos fez fazer coisas uns contra os outros. - Steven disse. - A Janice ficou com muita raiva quando deduziu que eu só tinha ficado com ela para me vingar da traição do irmão dela. Todo o amor que ela sentia por mim foi transformado em ódio. Ela foi embora sem me dizer para onde ia. - Ele continuou a contar.
- Steven. - Mark o interrompeu. - Eu sei o que está fazendo e sinceramente não sei se consigo acreditar em você, mas a verdade é que nada disso importa mais. Nada disso muda o que aconteceu. Nada disso muda o fato de que eu cresci sem um pai. - Ele resolveu interromper a história, antes que ele começasse a ficar ainda mais emocionalmente envolvido com ela.
- Eu sinto tanto por isso. - Steven ficou visivelmente emocionado ao se desculpar. - Eu sei que isso não muda nada, mas me desculpa, filho. - Ele abaixou a sua cabeça.
- Está tudo bem. - Mark tentou acalmá-lo, mas sem muita intimidade.
- Tem uma pequena parte da história que ninguém nunca te falou, porque ninguém nunca soube. - Steven passou a mão lentamente em seu rosto e secou suas lágrimas. - Você nunca esteve sozinho. - Ele voltou a olhar para o filho.
- Como assim? - Mark não entendeu o que o pai quis dizer.
- Depois que a Janice fugiu com você, eu te procurei por anos. Eu queria te conhecer. Eu queria saber se você se parecia ao menos um pouco comigo. - Steven sorriu, emocionado. - Quando eu finalmente descobri onde você estava, eu quis me aproximar, mas fiquei com medo de que a Janice sumisse com você outra vez. Então, eu… apenas acompanhava a sua vida de longe. - Steven continuou contando, enquanto via a expressão de surpresa e ao mesmo tempo de tristeza no rosto do seu filho mais velho. - Você não sabia, mas… - Ele teve que pausar para mais uma vez recuperar o fôlego. - Eu sempre ia até a sua escola. Eu vi quando você jogou o seu primeiro jogo na escola. Eu estava lá no seu primeiro gol. Eu vi a sua primeira briga e vi a maneira como você enfrentava aqueles garotos. - A cada frase do Steven, os olhos de Mark se enchiam mais de lágrimas. - Eu estava lá quando você deu o seu primeiro beijo naquela garotinha loira na porta da escola. Eu notei todas as vezes que você faltou na escola no dia dos pais. Eu vi você aprendendo a dirigir. Eu estava lá quando você comprou o seu primeiro carro, aliás, você tem um gosto para carros muito melhor que o do . - Ele disse e viu o filho sorrir para ele pela primeira vez. - Eu sei que eu falhei com você. Eu sei que eu deveria ter lutado mais por você. Eu sei que você sentiu muito a minha falta, mas… você nunca esteve sozinho, filho. - Steven começou a ter uma nova crise de falta de ar e começou a respirar com muito mais dificuldade. Com os olhos completamente cheios de lágrima, Mark assustou-se com a situação do pai.
- Pai. - Mark chamou pelo pai, aproximando-se da cama. Mesmo em meio a uma crise, Steven emocionou-se muito ao ouvir o filho mais velho chamando-o de pai pela primeira vez. Uma lágrima escorreu de um de seus olhos, antes que ele fechava os olhos para tentar recuperar o fôlego. - Eu vou chamar um médico. - Mark ia se afastar da cama, mas seu pai segurou a sua mão antes que ele se afastasse.
- Chame o seu irmão aqui. - Steven conseguiu dizer. Mark atendeu o seu pedido prontamente. Foi até a porta do quarto e chamou o irmão para entrar.
- O que aconteceu? - entrou no quarto, assustado. Notou a expressão assustada no rosto do Mark ao chamá-lo.
Os dois filhos de Steven estavam em volta dele naquele momento. Era tudo o que ele mais tinha desejado. Vê-los juntos dava ao Steven a maior paz que ele poderia desejar. Ele tinha recebido o perdão do e Mark já havia conhecido um pouco do seu amor de pai. Steven estava satisfeito, feliz e aliviado por ter conseguido dizer a eles tudo o que precisava dizer, porém, havia algumas últimas palavras que ele gostaria de dizer ao dois juntos. Ele pedia a Deus que lhe desse forças para conseguir dizê-las a eles a tempo.
- Aquela garota… - Steven começou a dizer. Ele referia-se a mim. - Eu sei que vocês dois amam aquela garota. - Os irmãos não trocaram olhares, mas nem foi preciso. - Eu não me importo mais. Ela é uma boa garota. Vocês tem o meu consentimento para serem felizes com que vocês quiserem, mas… - A voz de Steven estava mais fraca do que nunca. Os garotos tinham total consciência de que toda a força que ele estava fazendo para dizer aquelas últimas palavras resultaria em seu último suspiro. - Eu quero que me prometam que vocês não vão brigar. Me prometam que vocês não vão brigar por ela ou por qualquer outra coisa. Me prometam que vocês vão permanecer unidos desse jeito. - O pai fechou os olhos, pois já não estava aguentando.
- Eu prometo, pai. - prometeu ao segurar a mão do pai. Ele estava chorando.
- Eu prometo, pai. - Mark fez a mesma promessa. Os olhos estavam inevitavelmente marejados. Após as duas promessas, foi possível ver um fraco sorriso no rosto do Steven.
- Eu amo vocês, meus garotos. - A voz de Steven mal saiu, mas foi possível ler a frase em seus lábios.
Não demorou mais de 10 segundos para que a máquina que estava bem ao lado do Steven comprovasse que não havia mais batimentos cardíacos. soltou a mão do pai, mas o choro se manteve. Apesar de mais reservado, Mark também estava muito abalado. As lágrimas ainda estavam presas nos olhos dele, quando ele puxou o e o abraçou. Além de consolar o irmão, Mark também precisava daquele abraço.
O abraço durou um bom tempo. Os irmãos choraram nos braços um do outro. Eles estavam apoiando um ao outro. Não houve um momento mais forte entre os irmãos do que aquele. finalmente tinha alguém que entendesse exatamente a sua dor e o Mark não teria que passar novamente pelo triste sentimento da perda sozinho. Naquele momento eles tiveram a dimensão da importância que um tinha para o outro. Eles jamais conseguiriam passar por aquilo sozinhos novamente.
Eu já estava há alguns minutos do lado de fora do quarto. Eu estava esperando o Mark e o saírem para que pudéssemos conversar. Eu ainda não sabia o que tinha acontecido. Ninguém do hospital sabia. Eu não estava com pressa, mas o enfermeiro que estava responsável pela UTI naquele dia já estava começando a me olhar com impaciência. Com isso, eu infelizmente tive que entrar no quarto e pedir para que eles se despedissem de vez. Ao abrir a porta do quarto, eu me deparei com os irmãos abraçados e, no fundo, eu consegui ouvir o barulho do monitor cardíaco zerado. Os irmãos terminaram o abraço e me olharam. Havia lágrimas em ambos os rostos, mas o chorava ainda mais dolorosamente. Eu não hesitei um só segundo em abraçá-lo.
- Eu sinto muito. - Eu sussurrei, enquanto ele me abraçava muito forte. Ele continuou chorando nos meus ombros. Enquanto o abraçava, levei uma de suas mãos até a sua cabeça e acariciei o seu cabelo na tentativa de acalmá-lo. Mark aproveitou para sair do quarto e chamar algum médico ou enfermeiro para informar o que tinha acontecido.
- Eu não acredito que estou passando por tudo isso de novo. - disse aos prantos.
- Eu sei. - Vê-lo sofrer daquele jeito me matava. - Olhe pra mim. - Eu terminei o abraço para poder olhar em seu rosto. - Eu sei que está doendo, mas… ele estava sofrendo. Ele está muito melhor agora, não é? - Eu toquei o rosto dele e sequei as lágrimas que insistiam em escorrer. - E dessa vez, você conseguiu se despedir. - Meus olhos se encheram de lágrimas ao vê-lo chorar daquela maneira, mas sorri ao dizer aquela frase. - Dessa vez, sua mãe não vai sofrer. Você não vai vê-la sofrer. Você não vai ter que lidar com a dor de mais ninguém e eu sei que com a sua você se sair bem, porque você é forte o bastante para isso. - Notei que as minhas palavras ajudaram ele a se acalmar um pouco.
Eu não consegui dizer mais nada. Não deu tempo de fazer mais nada, pois o quarto foi invadido por um médico e por alguns enfermeiros. Na hora, eu não pensei em outra coisa senão tirar o do quarto. Haviam alguns trâmites que seriam realizados pelo médico e por sua equipe que ele não precisava ver. Mark já estava do lado de fora do quarto e ao sair, nós o encontramos. Eu e ele trocamos olhares e, apesar de ele demonstrar estar mais conformado que o , eu me aproximei para abracá-lo.
- Eu sinto muito, Mark. - Eu disse, apertando-o forte. Terminei o abraço e olhei em seu rosto. Ele sorriu de maneira triste. - Eu estou aqui. - Eu beijei o rosto dele com carinho. Ele deixou de me olhar para o irmão mais novo. Mark estava preocupado com ele.
havia se sentado em uma das cadeiras que tinham no corredor do hospital. A cabeça estava baixa, os olhos encaravam o chão e os braços estavam apoiados em suas coxas. Mark manteve-se de pé, mas levou uma das mãos até um dos ombros do irmão. levantou a cabeça e o olhou. Os olhos estavam marejados, mas ele tentou disfarçar, passando suas mãos em seus olhos.
- O que nós vamos fazer? Eu não sei… - referia-se ao corpo do pai. Ele não sabia como proceder, considerando que quem cuidou desses detalhes da outra vez foi sua mãe.
- Deixa que eu cuido de tudo. - Mark tomou a frente de tudo, como era o esperado.
- Eu fico aqui com ele. - Eu disse para o Mark para que ele não se preocupasse.
- Obrigado. - Mark agradeceu, depositando um beijo em minha cabeça.
Ao sair do hospital, Mark conseguiu resolver tudo sem muitos problemas. Levou um pouco mais de 4 horas para que ele providenciasse tudo. Ele tinha optado enterrar o Steven no mesmo lugar de sua mãe adotiva, pois como o terreno no cemitério já era dele, não haveria muita burocracia e não chamaria a atenção de muitas pessoas.
Eu fiquei ao lado do durante todo o tempo. Ele passou a maioria do tempo em silêncio e chorou silenciosamente algumas vezes. Eu segurei a mão dele em vários momentos e era nesses momentos que ele mais se mantinha calmo. O silêncio dele era tão doloroso, que chegava a doer em mim. Mesmo estando ao lado dele, eu sentia que seus pensamentos e que o seu coração estavam longe. Ele não disse nada, mas eu sabia que ele estava revivendo repetidamente cada momento em que ele passou ao lado de seu pai durante a sua infância.
O funeral estava pronto no momento em que o corpo de Steven foi liberado. Quando o Mark voltou para o hospital, ele e o irmão optaram por um funeral rápido e extremamente simples, já que mais ninguém faria questão de ir até o cemitério. A maioria porque achava que o Steven já estava morto e outros porque não perderiam um seu tempo para homenagear alguém como o Steven.
Quando o corpo do Steven saiu do hospital e seguiu para a funerária, onde ficaria por algumas horas, Mark conseguiu convencer o a ir para casa para descansar um pouco antes do enterro do Steven, que tinha sido marcado para o final daquela tarde. Eu mal tive tempo de me despedir deles, pois eles foram embora no exato momento em que a Meg chegou no hospital. Ela ficou sabendo muito rápido tudo o que tinha acontecido e como ela não sabia realmente a proporção daquela dor para os garotos, eu tentei mantê-la longe deles para evitar as perguntas que ela acabaria fazendo.
O silêncio reinou durante todo o caminho dos irmãos Jonas até em casa. Ao mesmo tempo que a situação dos irmãos era extremamente parecida, ela também era completamente oposta. Era óbvio que o Mark estava triste e estava sentindo um peso enorme no peito por ter perdido a última oportunidade da sua vida de ter um pai. A sensação de perda dele era diferente de todas as outras que ele já havia sentido. Era a perda de algo que ele nunca realmente teve.
E o , apesar de já ter chorado bastante, ele estava se segurando bastante quanto aos seus sentimentos. Ele estava revivendo o maior trauma da sua infância, o trauma de sua vida. A morte de Steven mexia em uma cicatriz profunda e dolorida que esteve esquecida e bloqueada dentro dele por anos. A primeira vez que o perdeu o pai era considerado por ele como o pior momento da sua vida. Apesar de já ter vivido muitas coisas, nunca mais tinha sentido a mesma dor e tristeza que ele havia sentido no dia daquele acidente. Agora, aquela antiga e esquecida dor estava voltando lentamente e ele ainda estava tentando contê-la com todas as suas forças, mas até quando ele conseguiria?
Ao chegar em casa, Mark e foram para os seus respectivos quartos. As palavras que o Steven havia dito ainda ecoavam na cabeça do Mark. Em 5 minutos, Steven conseguiu mudar completamente a concepção que seu filho mais velho tinha sobre ele. Bastou apenas 5 minutos e algumas palavras para que Mark se sentisse muito mal com aquela morte e sentisse uma vontade absurda de ter vivido alguns momentos de pai e filho com o Steven.
O teve o prazer de conhecer o Steven que o Mark estava desejando tanto conhecer. Deitado em sua cama, não conseguia dormir e também não conseguia chorar. Era como se ele tivesse bloqueado tudo dentro dele. Ele não queria sentir novamente a dor e o sofrimento que o assombrou durante toda a sua infância e adolescência. Em sua cabeça, as memórias de pai e filho não paravam. Era involuntário e ele não conseguia evitá-las.
Quando a funerária ligou avisando que o corpo estava seguindo para o cemitério, os garotos tiveram que se arrumar para irem até lá e eles não poderiam demorar, pois em menos de uma hora o sol iria se pôr. Mark foi o primeiro a ficar pronto e depois de poucos minutos, o encontrou na sala da casa. Ambos vestiam algo mais social, já que tratava-se de um funeral. Era questão de respeito.
- Pronto? - Mark perguntou para o irmão.
- Vamos. - confirmou com a cabeça.
Mark foi dirigindo durante todo o caminho até o cemitério. manteve-se em silêncio durante todo o tempo. Assim que eles chegaram no cemitério, foi um baque para ambos se depararem com o caixão, que por opção deles, estava fechado. Olhar aquele caixão deixou tudo muito mais triste e pesado para o e para o Mark. É naquele momento em que eles se deram conta de que tudo aquilo realmente estava acontecendo. Era o choque de realidade que ninguém quer receber.
O caixão foi conduzido até o túmulo da mãe adotiva do Mark. Dois funcionários levavam o caixão e o e o Mark foram atrás, acompanhando. Ao chegarem no túmulo, os garotos ficaram ali parados, observando os dois funcionários do cemitério fazerem o seu trabalho. Os olhos de Mark chegaram a se encher de lágrimas mais de uma vez, mas ele as secava antes que elas escorressem pelo seu rosto. O continuava sem expressar qualquer reação. Ele não estava chorando, mas a expressão de tristeza em seu rosto era nítida.
A morte do Steven também havia me abalado bastante. Eu não imaginava que sofreria tanto com a morte de alguém que já havia me feito tão mal. Eu deveria estar aliviada, mas eu não conseguia. Eu não conseguia fica bem sabendo tudo o que o e o Mark estavam passando. Eu me importava demais com eles para simplesmente ignorar o fato de que aquela pessoa horrível que havia morrido era o pai deles. Eu sabia que eles estavam sofrendo. Eu sabia o quanto deveria estar sendo difícil para o passar por tudo aquilo novamente. Não dava para ignorar isso.
Naquela tarde, eu pedi que o hospital me deixasse sair um pouco mais cedo do estágio. Eu pensei no e o Mark durante todo o dia. Eu só conseguia desejar tirar a dor e o sofrimento deles. Fui para a minha casa e ao chegar lá, deduzi que eles não estavam em casa. Eu sabia exatamente onde eles estavam e eu sabia que, apesar de tudo o que o Steven já havia me feito passar, eu precisava ir até lá. Eu precisava estar lá pelo e pelo Mark.
Depois de tomar um rápido banho, troquei a minha roupa branca por um vestido preto simples. Eu sabia onde o Steven seria enterrado, pois ouvi o Mark dizer ao quando eles ainda estavam no hospital. Por livre e espontânea vontade, eu peguei o meu carro e dirigi até lá. No caminho, parei em uma floricultura e comprei apenas uma solitária rosa branca. Talvez o Steven não merecesse, mas ele ainda era o pai dos dois homens mais incríveis que eu já havia conhecido.
Não demorei muito para localizá-los no cemitério que estava praticamente vazio. Reconheci o carro do Mark e, com isso, consegui encontrá-los também. Estacionei o meu carro bem atrás do carro do Mark e a batida da porta do carro chamou a atenção dos dois. e Mark viraram-se para trás e me viram. Mantive contato visual com os dois, enquanto eu me aproximava. Eles não acreditaram que eu estava ali. Steven havia me feito passar pelo inferno. A última pessoa que o e o Mark esperavam que fosse prestar as suas homenagens naquele cemitério era eu.
Ao chegar ao túmulo, parei ao lado dos irmãos. Senti os olhares deles sobre mim, enquanto em me abaixava e deixava a rosa branca sobre o amontoado de terra. Levei alguns minutos para orar pela paz do Steven. Apesar de tudo, eu não desejava mal a ele. Além disso, eu sabia que algum dia ele tinha sido uma boa pessoa. Eu não guardava qualquer mágoa dele.
Mark estava muito surpreso com a minha presença, mas da melhor maneira possível. Ele sabia que eu já tinha feito muito pelo Steven e que não precisava estar ali. Eu não precisava ter saído do meu trabalho para ir até ali prestar uma simples homenagem a pessoa que mais havia me feito mal. A minha presença ali só serviu para acalmar ainda mais o coração dele. Se ele já me admirava antes, agora ele me admirava muito mais. Assim que eu voltei a trocar olhares com ele, eu quis me aproximar. Passei meus braços em volta do corpo dele e ele me acolheu, como sempre. Coloquei a minha cabeça em seu peito e a inclinei para cima para olhar em seu rosto. Com os olhos marejados, Mark beijou a minha testa, me fazendo abraçá-lo ainda mais forte. O fraco e triste sorriso que ele havia me dado segundos antes de ele beijar a minha testa foi a demonstração de gratidão por eu estar ali naquele momento.
Ao contrário do Mark, não estava surpreso com a minha presença. Ele me conhecia o suficiente para saber que eu não desejaria estar em qualquer outro lugar naquele momento que não fosse ali. conhecia muito bem os meus defeitos, mas ele conhecia ainda mais cada uma das minhas qualidades. Independentemente do que o Steven havia feito para mim e para minha família, ele tinha certeza que eu estaria ali ao lado deles. Ele conhecia o meu coração. Ele conhecia a minha compaixão. Ele conhecia o meu amor. Mesmo assim, a minha chegada naquele cemitério foi o início do descontrole de todas os sentimentos e toda a dor que o estava tentando controlar. Eu tinha o poder de deixá-lo instável e desencadear nele qualquer tipo de sentimento. Segundos antes de abraçá-lo, eu olhei nos olhos dele e mesmo sem qualquer vestígio de lágrimas, eu consegui ver o quanto ele estava destruído por dentro e o quanto ele estava se esforçando para continuar de pé. Meu abraço fez com que ele sentisse vontade de parar de controlar tudo o que ele realmente estava sentindo. Com os olhos fechados, ele foi abrindo aos poucos o seu coração para a tristeza, para a dor e para aquele sentimento de perda.
- Estamos nessa juntos, ok? - Eu sussurrei e ele interrompeu o abraço. Ele me olhou, enquanto afirmava com a cabeça. Os olhos dele se encheram rapidamente de lágrimas e elas só escorreram quando ele voltou a olhar para aquele amontoado de terra e aquela singela rosa branca.
Depois de ter segurado os seus reais sentimentos por tanto tempo, começou a senti-los de uma só vez e eles invadiram o coração dele como uma avalanche. Mesmo tentando, ele não conseguiu controlá-los novamente. Estava doendo muito e ele sentiu que precisava sair dali. Quando vi o se afastar, eu soube exatamente o que estava acontecendo. Eu o conhecia como ninguém e sabia da sua necessidade de demonstrar força mesmo nos momentos mais difíceis. Ele fez isso por muitos anos, depois que o Steven havia morrido pela primeira vez. Ele estava tentando fazer isso novamente, mas eu não deixaria. Ele não precisava carregar essa responsabilidade.
Meus olhos acompanharam o se afastar. Eu vi quando ele fez a volta no carro do Mark e abaixou-se para que nós não o víssemos. agachou-se e manteve sua costa apoiada no carro. Com as mãos em seu rosto, ele chorava dolorosamente a perda de seu pai. Eu não pensei duas vezes em ir até lá. Eu não conseguia ver aquela situação e não fazer nada a respeito. Me aproximei do carro e ao vê-lo agachado no chão chorando daquela maneira, eu fui até ele na mesma hora. Eu nunca tinha visto ele chorar daquela maneira. Ele soluçava. Eu me agachei na frente dele e toquei os seus joelhos.
- … - Eu chamei por ele. As lágrimas já haviam invadido os meus olhos ao vê-lo daquela maneira. - Fala comigo. - Eu pedi com a voz embargada.
- Eu perdi ele… de novo. - me olhou. Os olhos estavam vermelhos, o rosto estava coberto de lágrimas e a expressão era de muita tristeza. É impossível explicar a maneira que eu me senti ao vê-lo daquela maneira. - Eu não queria passar por isso de novo. Não é justo. - Ele disse aos prantos.
- Eu sei. Eu sinto tanto por você. Eu não queria que você tivesse que passar por isso. - Eu disse, enquanto as lágrimas escorriam pelo meu rosto. - Se eu pudesse fazer qualquer coisa para tirar essa dor do seu peito, eu faria. - Eu segurei as mãos dele. - Eu não estava lá por você da primeira vez, mas eu estou aqui agora. - Eu toquei o rosto dele e sequei algumas lágrimas. - Ok? Eu estou aqui. - Eu reafirmei, me aproximando e o abraçando.
- Eu sei que eu só tenho feito besteira ultimamente, mas… - fez uma pausa para tentar se recompor. - Eu preciso de você. Fica comigo. - Ele pediu, chorando.
- Eu fico o tempo que você precisar. - Eu afirmei na mesma hora. Eu e o já havíamos passado por tantas coisas juntos e ele foi a pessoa que mais me ajudou quando eu perdi a tia Janice. Eu sentia necessidade de ajudá-lo.
- Eu sei que você acha o meu pai uma pessoa horrível, mas… - sentiu como se tivesse que me explicar alguma coisa.
- Não. - Eu o interrompi e também interrompi o nosso abraço. - Eu conheci o lado bom do seu pai muito antes de conhecer o lado ruim. Eu me lembro de cada história que você me contou sobre vocês dois. Eu me lembro do brilho dos seus olhos cada vez que você mencionava o nome dele. - Eu olhei nos olhos dele. - Eu estou aqui hoje por esse Steven. - Ele se acalmou um pouco, enquanto me ouvia falar. - Não interessa o que ele fez ou o que deixou de fazer. Ele é o seu pai, . De alguma forma, ele fez de você a pessoa que você é hoje. E… eu amo essa pessoa e sou muito grata ao Steven por ela. - Eu disse e o vi sorrir em meio a tantas lágrimas.
- Muito obrigado por estar aqui. Você não precisava… - começou a agradecer, mas eu o interrompi novamente.
- Eu precisava sim. - Eu afirmei com a cabeça. - Eu estou exatamente onde eu gostaria de estar. - Eu completei. Minha frase fez ele ficar me olhando. Apesar de já não estar chorando como antes, poucas lágrimas escorriam pelo seu rosto.
- Eu não paro de chorar. - disse, passando suas mãos pelo seu rosto.
- Chore o quanto você precisar. Chorar não é sinônimo de fraqueza. Chorar é consequência da sua força. - Eu disse secando novamente algumas de suas lágrimas. Ele continuava me olhando.
- Eu tenho tanta sorte por ter você na minha vida. - tocou a minha mão que ainda secava as lágrimas de seu rosto.
- Então, somos dois sortudos. - Eu respondi, sem jeito. Nós não éramos mais um casal e, por isso, esses momentos me deixavam um pouco constrangida. - Você quer ir para casa? - Eu perguntei, mudando de assunto.
- Eu… acho que é melhor. Eu acho que preciso lidar com algumas coisas antes de conseguir encarar aquele túmulo. - engoliu o choro.
- Certo. Então, espera aqui que eu vou falar com o Mark. - Eu me levantei do chão e me afastei. Fui até o Mark.
- Ele está bem? - Mark perguntou, preocupado.
- Não muito. - Eu disse em tom de lamentação. - Ele… quer ir pra casa. - Eu disse.
- Claro. Já está escurecendo mesmo. - Mark concordou na mesma hora. - Você veio com o seu carro, né? - Ele perguntou, olhando na direção do meu carro.
- Vim. Não tem problema. Eu vou sozinha. Vou seguindo você. - Eu não me importei nem um pouco.
- Está bem. - Mark afirmou. Eu saí e fui na direção do meu carro. Mark veio logo atrás, mas antes ele deu uma última olhada no túmulo do pai.
Quando o Mark chegou em seu carro, já estava de pé ao lado da porta do passageiro esperando que o carro fosse aberto. Assim que o Mark destravou o carro, ele entrou no carro e o fez o mesmo. A princípio, o trajeto foi feito em total silêncio, mas Mark não conseguia evitar a preocupação com o irmão, principalmente depois do que ele tinha visto no cemitério.
- Você está bem? - Mark deixou de dar atenção ao trânsito para olhar para o irmão.
- Eu estou bem. - confirmou, sem olhá-lo. - Eu… não sei o que aconteceu. A chegou e eu simplesmente… desmoronei. - Ele quis se explicar.
- Eu não esperava que ela fosse. - Mark comentou em voz alta.
- Eu esperava. Se não fosse pelo nosso pai, seria por… nós. - o olhou dessa vez.
- Ela tem sido incrível. Se não fosse ela, eu nem sei. - Mark tinha um pouco de receio de falar sobre mim com o irmão.
- Eu sei. - concordou. Ele também demonstrava um pouco de desconforto com o assunto. Na hora, a primeira coisa que veio a sua mente foi uma das últimas frases de seu pai, em que ele disse que os dois me amavam. - E sobre a Bélgica? Você contou para ela? - Ele perguntou.
- Não contei e nem vou contar. Eu não vou. Eu já decidi. - Mark afirmou sem pensar duas vezes. Aquela não foi uma simples resposta para o . Ele sabia muito bem o que significava. Continuou olhando para frente, enquanto conseguia coragem para fazer a pergunta mais óbvia de todas.
- Você realmente a ama, não é? - perguntou, sem conseguir olhá-lo. Mark ficou algum tempo em silêncio, decidindo se deveria responder ou não aquela pergunta.
- Amo. - Mark confirmou, mantendo os olhos na estrada. não ficou surpreso, mas ele precisava ouvir aquilo da boca do próprio irmão. - E segundo o Steven, você também ama. - Ele completou sem qualquer tipo de julgamento.
- Eu sempre amei. - também confirmou. - E então? Como vamos resolver isso? - Ele perguntou depois de algum tempo em silêncio.
- Fácil. - Mark disse, fazendo o irmão olhá-lo. - Ela escolhe. - Ele também olhou para o irmão ao dizer a frase.
- Ela escolhe. - concordou, sem hesitar.
Mark e aparentemente demonstraram tranquilidade ao afirmar que a decisão seria minha, mas, no fundo, eles estavam bastante preocupados e apreensivos com o que poderia acontecer. Mark sabia da história que eu e o tivemos e sabia o quanto ela significava pra mim. sabia o quanto eu e o Mark estávamos próximos ultimamente e sabia que, ao contrário dele, o Mark jamais havia me decepcionado.
Eu não sabia do acordo que os irmãos haviam feito e eu continuaria sem saber. O propósito deles com esse acordo não era me pressionar a escolher um deles, mas sim me deixar a vontade para escolher um deles no momento em que eu achasse melhor. E seria exatamente isso o que eu faria. No momento certo, eu acabaria fazendo a minha escolha. Seria inevitável.
Acompanhei o carro do Mark durante todo o trajeto até a rua da nossa casa. Eu estacionei o meu carro na minha garagem e ele estacionou o carro dele na garagem da casa dele. Eu desci do carro e não pensei duas vezes em me juntar novamente a eles. Eu estava bastante preocupada com os dois e não queria que eles ficassem sozinhos. Se eles precisassem de mim, eu estaria lá por eles.
- Entra. - Mark me convidou para entrar na casa assim que eu cheguei na porta. Eu entrei e fui na direção do sofá, onde o estava sentado. - Eu queria deletar esse dia da minha vida. - Ele suspirou ao sentar-se ao meu lado.
- Seria muito mais fácil. - Eu concordei com o Mark. não se manifestou em nenhum momento, ele apenas manteve-se sentado e me parecia bastante pensativo. - Vocês estão com fome? Eu posso fazer alguma coisa. - Eu tentei chamar a atenção dele, mas ele mal me olhou.
- Eu não estou com fome. Obrigado. - Mark sorriu pra mim, agradecido.
- E você, ? - Eu voltei a olhar para o irmão mais novo. Os olhos estavam fixos na parede da sala e seus pensamentos pareciam distantes. - . - Eu o chamei novamente e toquei uma de suas mãos. Ele despertou e olhou nossas mãos na mesma hora. - Você está com fome? - Eu perguntei novamente.
- Não. Eu estou bem. - disse, enquanto me olhava. - Eu não estou com fome. Eu não estou com sede. Eu… - Ele negou com a cabeça em meio a um fraco sorriso. - Eu não sei nem o que fazer ou… como seguir em frente depois de tudo isso. - desabafou, deixando de me olhar para encarar suas mãos.
- Eu sei que está sendo difícil e que vai ser difícil por um bom tempo, mas vai passar. - Eu só queria dar a ele um pouco de esperança. - Vamos, vem comigo. - Eu me levantei do sofá.
- Pra onde? - perguntou, sem entender.
- Eu vou te obrigar a dormir. Você precisa parar um pouco de pensar em tudo isso ou você vai acabar enlouquecendo. - Eu disse, tentando esconder o sorriso.
- Não. Não precisa. Eu não… - já ia recusando a minha sugestão, mas eu insisti.
- Precisa sim. - Eu afirmei, olhando-o seriamente. Ele me olhou com insatisfação e levantou do sofá, contrariado.
Mark acompanhou tudo em silêncio. Antes de me ausentar da sala ao lado do , lancei olhares para ele que davam a entender que eu voltaria dali alguns minutos. Conduzi o até o quarto de hóspedes, que já havia virado o seu quarto. Ele era teimoso e insistia em recusar qualquer tipo de ajuda que qualquer pessoa tentasse dar a ele. Eu o conhecia bem e sabia que o seria capaz de passar a noite acordado remoendo aquela dor incurável. Eu queria ajudá-lo. Eu queria poupá-lo ou ao menos amenizar um pouco do seu sofrimento.
- Então, agora você vai me colocar pra dormir? - ironizou, quando entramos no quarto. Ele sentou-se na cama e eu o olhei com desaprovação. - Eu estou brincando. - Ele negou com a cabeça. - Eu sei que você só está cuidando de mim. - sorriu fraco. Sua frase me fez baixar a guarda novamente. Eu me aproximei e me sentei ao seu lado na cama.
- Você sabe que vai conseguir superar tudo isso, não sabe? Você já fez isso uma vez. - Eu virei o meu rosto para olhá-lo.
- Foi diferente da primeira vez. Eu só tinha 10 anos e mesmo sentindo a falta dele, eu não entendia completamente o que tinha acontecido. Eu não sabia a magnitude de tudo isso. Não da maneira que eu sei agora. - Ele explicou.
- Se a primeira vez que você perdeu o seu pai não serve para te dar o conforto de que tudo vai ficar bem, então você pode me usar como referência. - Eu virei o meu corpo de frente para o dele. - Você estava lá por mim quando eu perdi a minha tia. Você me convenceu de que tudo ficaria bem e, agora, eu estou aqui para te convencer da mesma coisa. - Eu estava me esforçando.
- É diferente também. Quando você perdeu a sua tia, você não estava sozinha. Havia muitas pessoas a sua volta para cuidar de você e para garantir que você ficaria bem. - argumentou, me olhando atentamente.
- Incluindo você. - Eu fiz questão de ressaltar. - E agora, você tem a mim. - Eu segurei uma das mãos dele entre as minhas.
- Não. Eu não tenho. - deixou de me olhar por alguns segundos para encarar as nossas mãos. - Não mais. - Ele levantou o rosto novamente.
- Não é assim. - Eu sorri, negando com a cabeça. - Nós não estamos mais juntos, mas isso não muda o carinho imenso que eu sinto por você. Não muda a minha necessidade de cuidar de você e de ter certeza de que você está bem. - Ele não deixou transparecer, mas ficou bastante chateado ao me ouvir confirmar que realmente não havia mais anda entre nós. - Eu sei que você tem um péssimo histórico com ex-namoradas, mas eu tenho orgulho em ser a exceção de todas elas. - Eu sorri e consegui arrancar um sorriso dele também.
- Acho que não posso dizer o mesmo sobre mim. - negou sutilmente com a cabeça. - Aliás, eu ainda não consegui me desculpar pelo que aconteceu na casa do lago daquele dia. Eu fui um idiota, para variar. - Ele rolou os olhos.
- É, você é muito bom em ser um idiota e eu sou péssima em odiar você. - Eu ri, sem emitir qualquer som. - Está tudo bem. Eu já esqueci tudo isso. - Eu o tranquilizei.
- Tudo? - perguntou, me olhando um pouco mais sério.
A pergunta do realmente me pegou desprevenida. Eu sabia o que ele estava me perguntando e eu fiquei sem saber o que dizer. Soltei a mão dele por um momento e me levantei da cama para pegar uma caneta, que estava sobre o criado-mudo. Pela expressão em seu rosto, eu pude perceber que ele não estava entendendo o que estava acontecendo ali. Com a caneta nas mãos, eu voltei a me sentar de frente para ele na cama e peguei novamente uma das mãos dele. Com muito cuidado, eu desenhei o já conhecido coração na parte de cima da mão dele. sorriu involuntariamente ao ver do que se tratava.
- Nem tudo. - Eu finalmente respondi a pergunta dele. - Você não está sozinho. Você nunca estará. - Eu reafirmei. - Agora, eu vou deixar você descansar. - Sem qualquer hesitação, eu me aproximei e beijei o rosto dele. - Se você precisar de mim, é só ligar… ou tocar a campainha. - Eu ri, apontando na direção da minha casa.
- Pode deixar. - também riu sem emitir qualquer som. - Obrigado por tudo. - Ele disse em um tom um pouco mais alto, enquanto observava eu me afastar. Eu não respondi, mas sorri para ele antes de sair do quarto e encostar a porta.
Mesmo tendo sentido o seu coração disparar e as borboletas em seu estômago durante aqueles 5 minutos de conversa que tivemos, não conseguiu ignorar todos os indícios que eu dei de que, para mim, nós já não éramos mais um casal. Além de ter afirmado que nós não tínhamos mais nada, ele também havia notado que tinha me autodenominado como sua ex-namorada. Os indícios realmente não eram bons, mas o coração desenhado em sua mão era a única coisa que ainda dava a ele esperança.
Ao sair do quarto do , eu voltei para a sala e, com isso, voltei a me aproximar do Mark. Me sentei ao lado dele no sofá e eu fiz questão de demonstrar a ele o quanto eu estava preocupada com ele por causa da sua mais nova perda. Mark começou a me contar toda a conversa que ele e o seu pai haviam tido momentos antes da sua morte. Com lágrimas discretas nos olhos, ele me contou de um lado do seu pai que ele nunca tinha conhecido. Mesmo aparentando estar triste, dava para perceber o seu alívio e a sua felicidade em poder dizer em voz alta que, um dia, o Steven se importou com ele e que o amou como um pai ama um filho.
Nós conversamos por mais de uma hora! Em determinado momento, Mark deitou-se em meu colo e eu passei a acariciar o seu cabelo. As coisas entre nós iam acontecendo de maneira involuntária. Ele me fazia rir e eu conseguia fazê-lo esquecer do quão triste havia sido aquele dia. Nós nos dávamos muito bem e nunca ficávamos sem assunto. Tínhamos uma sintomia e uma afinidade inexplicável.
Não aconteceu nada demais entre eu e o Mark durante aquela conversa. Não nos beijamos e também não falamos sobre o beijo da noite anterior, mas para o nada disso era necessário. Desde o momento em que eu sai do quarto dele, ele aproximou-se da porta do quarto ainda entreaberta e com a costa apoiada na parede e sentado no chão, sentiu cada pedaço de esperança dentro dele se esvair, enquanto ele ouvia a minha conversa com o Mark. Com os olhos fixos no coração desenhado em sua mão, ouvia cada frase que saia da minha boca e a maneira com que eu pronunciava cada uma delas e tinha certeza que, pela primeira vez, os sentimentos do Mark estavam sendo igualmente retribuídos por mim. Diferentemente das outras vezes, conseguia sentir que aquele coração desenhado em sua mão já não era só dele.
Daquela noite em diante, muita coisa mudou. não cobrou nada de mim e também não cobrou nada do Mark, mas eu consegui notá-lo um pouco mais distante de mim. Ele não estava me tratando mal, aliás, essa nem era a sua intenção. Depois de perceber o meu real interesse no Mark, recuou um pouco. Ele achou que essa era a maneira certa de agir até que eu tomasse uma decisão definitiva entre os dois.
respeitava muito o Mark e também estava disposto a respeitar, pela primeira vez, uma promessa: a promessa que havia feito ao seu pai. Recuar e me dar espaço para tomar a minha decisão era a melhor maneira de evitar brigas com o Mark. Para ele, não era certo me pressionar, usar o nosso passado juntos ou se aproveitar das minhas fraquezas. Eu já conhecia tudo o que eu podia sobre ele. Ele não tinha mais nada para provar. A decisão estava nas minhas mãos.
A relação dos irmãos continuava a mesma. Eles nunca falavam sobre mim e muito menos sobre aquele acordo entre eles sobre me deixar escolher com qual deles eu queria ficar. A cada dia que passava, Mark e eu nos aproximávamos mais. Nós não éramos um casal, mas os climas constrangedores entre nós sempre acabava terminando em um beijo. A minha aproximação com o Mark me deixava muito feliz, mas o meu afastamento do fazia com que eu me sentisse péssima. No fundo, eu sabia que ele estava dando ao Mark a oportunidade de ter momentos e memórias comigo, que ele já havia tido.
Já havia passado quase uma semana do funeral do Steven. Aquela quinta-feira era só mais um dia normal pra mim. Eu estava voltando para casa, depois de sair do estágio no hospital, exatamente como eu fazia todos os dias. Ao estacionar o carro na garagem da minha casa, meus olhos ansiosos foram direto para a casa do meu mais querido vizinho. Notei que o carro do Mark estava na garagem e que o carro do não estava lá. Aquilo soou como um ótimo convite para ir até lá.
Mark e eu não estávamos fazendo nada errado e eu tinha plena consciência disso, mas eu não conseguia não me sentir mal expondo toda aquela proximidade que eu e o Mark construímos para o . Eu sabia como o se sentia sobre mim e eu não conseguia ignorar isso. Eu não conseguia fingir para ele que eu não estava sentindo nada pelo Mark. Isso me fazia muito mal e, por isso, eu preferia evitar essas situações desnecessárias.
Me dirigi até a casa do Mark e estava planejando sugerir qualquer programa para fazermos juntos naquela noite. Bati na porta mais de uma vez e quando ela foi aberta, meu corpo todo estremeceu. era quem estava do outro lado da porta e eu mal consegui disfarçar o meu constrangimento ao vê-lo. Ele percebeu quando o sorriso no meu rosto mudou radicalmente. Eu tive até dificuldade para conseguir falar qualquer coisa.
- Oi. - disse, quando percebeu que eu não ia conseguir dizer nada. - Você… está procurando o Mark? - Ele deduziu. Eu me senti a pior pessoa da face da terra.
- É… eu vi o carro. - Eu gaguejei.
- Ah, o carro dele não pegou hoje de manhã, então eu deixei ele ir trabalhar com o meu. - explicou com um sorriso tenso.
- Entendi. - Eu estava muito sem graça. - E você, está bem? - Eu perguntei para não me sentir tão mal.
- Eu estou bem. - respondeu. - E você? - Ele devolveu a pergunta para ser educado.
- Eu também estou bem. - Ao terminar a frase, nós nos olhamos e o clima ficou ainda pior. - Bem, eu… volto outra hora. Eu não quero te incomodar. - Eu tinha que sair dali o mais rápido possível. - Nos vemos por ai. - Foi a última coisa que eu disse antes de me afastar. Eu praticamente deixei ele falando sozinho. Não foi de propósito. Eu só estava muito nervosa.
Durante todo o caminho até a minha casa, eu fiquei pensando em milhares de maneiras de me matar depois do que tinha acabado de acontecer. Foi horrível! Eu mal consegui falar com o . Qual era o meu problema? Se até então o não se sentia no direito de me cobrar nada, agora ele sentia! O que foi aquilo? Quando foi que nos tornamos aquilo? Ele não gostou nada da maneira que eu o havia tratado. Simplesmente não parecia nós.
Eu entrei na minha casa tão atordoada, que nem ao menos tranquei a porta da casa. Coloquei a minha bolsa sobre a mesa e parei no meio da sala de jantar para tentar entender o que tinha acontecido comigo. Eu e o não tínhamos mais nada. Por que eu sentia como se devesse satisfações a ele? Isso estava me corroendo por dentro. Eu só conseguia pensar o quanto eu desejava não revê-lo tão cedo, mas o que eu não sabia é que ele estava indo até a minha casa naquele exato momento para tirar aquela história a limpo de uma vez por todas! Eu continuava parada próxima a sala de jantar, quando um barulho logo atrás de mim me fez perceber que eu não estava sozinha em casa.
- Shhh. Quietinha. - Uma voz masculina disse. Senti algo tocar a parte de trás da minha cabeça e não demorou muito para que eu deduzisse que tratava-se de uma arma. Minhas mãos começaram a tremer na mesma hora e eu senti o meu corpo todo gelar.
A princípio, eu não consegui identificar quem era, pois ele estava atrás de mim e eu não reconheci a voz. Levei minhas mãos para o alto involuntariamente. O silêncio na casa deixou em evidência o som de passos que vinham da cozinha para a sala de jantar. Naquele momento, eu soube que havia uma terceira pessoa na casa. Meus olhos ficaram fixos na porta da cozinha. Quem quer que fosse, passaria por aquela porta a qualquer momento. Mais alguns passos e aquela figura conhecida surgiu na porta da cozinha. Olhar para ele me fez entrar em desespero. - Casa bonita. - Ele disse com um sorriso nojento. - Não acredito que deixaram você morar sozinha em uma casa grande como essa. - O sujeito se aproximou de mim e parou na minha frente. Apesar de tê-lo visto poucas vezes, eu seria capaz de reconhecer o capanga do Steven em qualquer circunstância. - O que você acha de ser a nossa isca, hoje? - Ele sorriu, acariciando o meu rosto. Além de medo, eu também sentia nojo naquele momento. - Nós vamos fisgar um peixe grande essa noite. - O segundo capanga que mantinha a arma na minha cabeça disse em tom de deboche. - ? - chamou pelo meu nome, depois de encontrar a porta da minha casa entreaberta. Ele havia escolhido o momento errado para tirar as suas satisfações.
CONTINUA...
Nota da Autora:
Hey! Então, eu espero que estejam gostando da fanfic. Está dando muito trabalho, mas eu estou AMANDO escrevê-la. Eu me inspirei em uma outra fanfic que eu li e fiz as minhas MUITAS alterações (com a autorização da autora da mesma). Como vocês já perceberam, ela está em andamento. Eu vou postar de acordo com o que eu for escrevendo.
Hey! Então, eu espero que estejam gostando da fanfic. Está dando muito trabalho, mas eu estou AMANDO escrevê-la. Eu me inspirei em uma outra fanfic que eu li e fiz as minhas MUITAS alterações (com a autorização da autora da mesma). Como vocês já perceberam, ela está em andamento. Eu vou postar de acordo com o que eu for escrevendo.
Vocês devem ter percebido que nessa fanfic, os Jonas não são tão 'politicamente corretos' e nem tem uma banda. Eu achei legal fazer uma coisa diferente.
Enfim, deixe o seu comentário aqui embaixo. A sua opinião é importante, pois me incentiva a escrever ainda mais e mais.
Beijos e qualquer coisa e erro, mandem reply pra mim lá no @jonasnobrasil .
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